II

Mary, Tori e o novo quarto

            Mary Bedford e Victoria Moller subiam as escadas em espiral para o andar acima. Mary olhava ao redor com certa curiosidade, observando os detalhes. O frio no estômago continuava a incomodá-la, no entanto cedia espaço aos poucos...

            - A comida daqui é horrível, tipo hospital – dizia Tori, que ajudava a nova aluna a carregar as malas – A maioria de nós guarda a mesada para pedir pizza ou comida chinesa e... bem, você sabe, as anoréxicas comem os apagadores.

            Percebendo o silêncio da menina, Tori acrescentou:

            - Falo sério...

            Mary achou o comentário um pouco engraçado, no fundo. Obviamente que aquilo não era verdade (pelo menos a parte das anoréxicas). Pensou que Victoria fosse falar coisas melhores sobre o internato – mesmo das refeições... Mas o que importava é que sentia-se um pouquinho mais à vontade do que quando chegou. Talvez a forma direta de como Tori falava a deixara melhor...

            Parou por um momento ao observar uma estátua e continuou subindo.

            - Nós nos safamos com qualquer coisa aqui. Digo, qualquer coisa mesmo! – disse Tori animada, olhando para trás, enquanto Mary se cansava das escadas – Hum... você está fora de forma. Terá que correr conosco ou então vai enfartar antes dos vinte.

            Mary concordou internamente. Já estava ofegante apenas por subir alguns lances; o máximo de atividades físicas que fazia eram as aulas de esporte do outro colégio. Pelo jeito, iria se exercitar bastante ali...

            As duas chegaram no topo do lance de escadas. Mary olhou ligeiramente para as acomodações, sem dizer nada, ao tempo que Victoria lhe informava:

            - Então, esses são os banheiros e os chuveiros...

            Continuaram a subir mais outro lance. Mary desejou que fosse o último.

            - Qual é o seu nome mesmo? – perguntou Tori, com o mesmo tom alegre na voz.

            - Bem... as pessoas me chamam de Mouse. – respondeu, tímida.

            - Mouse?

            - Meu pai sempre me chamou assim.

            - Sério? Por quê? – perguntou, curiosa, fazendo uma pausa – Meu pai costumava me chamar de Princesa... Eu queria vomitar.

            - Mas é melhor do que Mouse!

            Tori usou um tom irônico ao revelar seu antigo apelido... no entanto parecia concordar que era melhor que o de Mary.

            Subiram mais alguns degraus até chegarem ao quarto no sótão onde Mary se instalaria.

            - Tá dáaaa! – exclamou Tori, abrindo a porta.

            Mary sorriu e entrou lentamente, passando por uma cortina de bambu, admirando seu interior. Certamente, era maior do que imaginava... Haviam três camas no quarto – que fez a jovem Bedford confirmar que mais uma dormia ali –, duas de um lado e uma de outro. A do meio estava coberta de roupas, assim como o chão ao seu redor.

            - A cama mais desarrumada é a minha... claro! Sou a mais relaxada. Oh, bem, eu não posso evitar. Deve ser raiva da mãe ou algo parecido.

            Mary não respondeu... mesmo porque não sabia o que responder. Achava-a bastante simpática e comunicativa. Começou a andar mais pelo quarto, seguida da nova companheira. Havia uma pequenina pia e uma grande janela na parede direita, ao lado de uma das camas, que dava acesso à vista do pátio. Um pôster com o mapa de Cuba e a imagem de Ernesto Che Guevara estava pregado ali também, junto com uma espécie de poema rabiscado na parede em letras de fôrma. Mouse não conseguiu ler. Havia mais algumas prateleiras com objetos pessoais das garotas e uns quadros alegres, e também uma mesa com um computador.

            - Essa é da Paulie, essa é minha e... esta é a sua – disse Victoria, apontando respectivamente para as camas da direita, do meio e da esquerda.

            Mary assentiu ligeiramente com a cabeça.

            Tori pôs a mala da menina em sua nova cama e dirigiu-se ao pequeno armário ao lado da mesma, apanhando algumas roupas suas que estavam penduradas na gaveta.

            - Desculpe... – murmurou ela.

            Tori sentou-se em sua cama e sorriu para Mary, tentando deixá-la mais confortável e bem recebida. Mas Mary parecia preocupada com alguma coisa e acabou por não sorrir de volta... apenas deu uma olhada em volta do quarto.

            - Ei! Olha, eu sei que é estranho no princípio. Mas agora aqui é muito mais o meu lar do que a minha própria casa – disse Victoria, levantando-se – Como os garotos perdidos de Peter Pan, sabe? Mas somos as garotas perdidas, certo? Perdidas e desvairadas.

            Houve um pequeno silêncio entre elas. Mary pensou que a comparação com os garotos perdidos fora um tanto quanto interessante... mas ainda precisava saber como funcionava.

            - Então, quando você acabar aqui, venha participar da festa conosco, Ok? – sorriu Tori.

            Ah... a festa na varandinha branca. Mouse novamente balançou a cabeça como um "sim" e depois Tori deixou o quarto. Mary começou a desfazer a mala que a garota deixara em sua cama, tirando um ursinho de pelúcia – razoavelmente antigo – e colocando-o no peitoril da janela. Em seguida, apanhou um retrato emoldurado e o abraçou – provavelmente o da falecida mãe. Estava melhor agora.

            Bedford caminhou lentamente até a janela e pôs seus óculos... dispôs-se a olhar um pouco o mundo lá fora, avistando duas meninas no balanço.

Notas da autora: Espero que esteja saindo tudo certo... -º. Deixem comentários!