XII
Um dia negro
Allison e as três amigas corriam depressa em direção ao quarto das meninas. Estavam dispostas a fazer como antes: pular na cama de Tori, cantar, gritar e irritar Paulie mais uma vez...
Abriram a porta de um só sopapo e já entraram fazendo algazarra, a ponto de pularem na cama de Moller, começando a cantiga:
- É hora de acordar, suas vaga...
Pararam a cantoria subitamente. As três gurias interromperam as passadas em frente à cama de Tori, paralisadas.
- Que nojento! – exclamou uma das amigas.
Paulie e Victoria dormiram juntas na noite anterior e ainda estavam na cama àquela hora da manhã, nuas, debaixo do cobertor.
As meninas saíram apressadas do quarto, deixando Allison no mesmo lugar. A menina estava simplesmente estupefata, com os movimentos retesados, incrédula diante do que via... não podia ser. Era sua irm, sua própria irmã... dormindo com uma garota! O que fazer, o que pensar? O que estava acontecendo?
- Bedford, feche a porta... – murmurou Pauline, apertando os olhos, enquanto sentava-se e olhava para Allie Moller. Tori estava com os batimentos a mil, assustada e receosa da reação.
- Olha... sua, sua... sua irmã tem pesadelos... ela grita durante o sono...
Desta vez, a desculpa dos pesadelos não iria servir de nada. A própria Paulie estava hesitante, não sabendo ao certo o que dizer naquela situação, o que dizer para ela. Allie não conseguia reproduzir som algum, falar qualquer coisa... continuava parada, totalmente chocada:
- Uh...hum...
Mary sentou-se em sua cama, desnorteada, como se seu corpo não obedecesse aos seus comandos.
- Bedford! – chamou Paulie, apontando para a porta, aparentemente nervosa. Tori cobria-se, desviando o olhar.
Mouse então levantou-se num passe de mágica e guiou Allison até a saída, empurrando seu braço:
- Não é... não é nada disso que você está pensando...
A irmã caçula de Victoria saiu do quarto e Mary fechou a porta logo atrás, voltando até as cortinas de bambu, com expressão tristonha... já sabia que aquele dia não seria fácil. Talvez não só aquele dia... as coisas mudariam bastante. Gostaria de não ter presenciado esta cena.
- Saia... – murmurou Tori para Paulie, fitando o lençol da cama.
Pauline tocou levemente o rosto da moça com os dedos, colocando seus cabelos atrás da orelha. No entanto, Tori empurrou sua mão, nervosa:
- Saia da minha cama!
- Relaxa! Ela vai superar...
- Não, você não conhece Allison! Ela vai ficar histérica! Vai direto contar pros nossos pais... – exclamou a jovem Moller, com os olhos azuis tremendo.
- E daí? Dane-se, estamos no século XXI!
Tori a fitou, preocupada e assustada ao mesmo tempo.
- Não... você não entende... – falou, baixo, enquanto Paulie jogava-se de volta na cama, suspirando profundamente – Você não entende...
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Parecia que tudo agora daria errado em sua vida. Victoria estava envolta por um remoinho de sentimentos e emoções... como poderia ter deixado aquilo acontecer? Ninguém poderia ficar sabendo de seu romance, absolutamente ninguém a não ser Mary... agora era a sua irmã, sua irm! Além de suas amigas que, àquela altura, já deveriam ter contado para boa parte das alunas do internato... Meninas cochichavam... não podiam acabar com tudo assim... mas Victoria precisava impedir Allison antes que uma outra tragédia acontecesse em sua vida.
As duas irmãs estavam na entrada do colégio, a vários metros da escadaria que levava as alunas ao corredor principal.
- Eu juro por Deus, Allie! Foi ela que se deitou na minha cama... eu não sabia que estava ali...
- Ela se deitou na sua cama?!
Tori hesitou em responder logo; uma estudante passava por elas.
- Eu acho que ela gosta de mim... mas já disse a ela que não sou assim... – disse a primogênita, segurando seu paletó vinho sobre o ventre.
- Tori, isso é nojento! – exclamou a menina, franzindo a testa – Por que não faz alguma coisa? Conte para Ms. Vaughn, tenho certeza de que ela será expulsa...
- Tenho pena dela... por ser adotada, e tudo o mais.
- Tori, você é boazinha demais!
Victoria não mudou sua expressão. Olhou para o chão, fez um pequeno silêncio e então voltou a encarar a irmã:
- Então... você vai contar às suas amigas, não vai? Dizer-lhes a verdade... que eu não sou assim...
- Claro! Não sei como pude pensar que você era...
- E o papai e a mamãe – interrompeu, sentindo suas mãos suarem frio -, você não vai contar nada a eles, vai?
- Não, Tor... mas tem certeza de que você...
- Allie! Eu adoro garotos! – exaltou-se, tocando seu braço – Sou louca por eles. Na verdade, conheci um garoto lindo do R.A.B um dia desses... Jake. Ele ficou louco por mim...
- É? Você vai sair com ele? – perguntou Allison, notavelmente aliviada.
- Você está brincando? Nós iremos juntos à festa do Tim, na sexta.
- Allison! Venha! – chamou uma das amigas, do alto da escadaria.
A garota abaixou-se para pegar sua mochila no chão e sorriu para Tori:
- Não se preocupe, Tor, eu irei esclarecer tudo.
A menina correu, subindo as escadarias, de encontro às amigas. Victoria a acompanhou com o olhar... e começou a andar pelo caminho contrário, que levava ao pátio-jardim, fitando o chão...era, era preciso ou então ficaria maluca. Um nó na garganta terrível a sufocava, como se a esmagasse. Segundos depois as lágrimas começaram a rolar, livres finalmente.
Sabia o que havia feito, o que havia dito... pura mentira... não passavam de mentiras! Mas não havia outro jeito... oh, como gostaria que houvesse uma outra maneira. Como gostaria que Allie não as tivesse visto daquele jeito... de uma hora para outra, tudo virara de pernas para o ar. Tudo passava pela sua cabeça voando a alta velocidade... sons, imagens... e Paulie...
Levou a mão à boca, tentando controlar os soluços... Sua felicidade fora fragmentada.
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Mouse caminhou em direção aos armários do correio e abriu a portinhola correspondente, retirando um envelope. Não ficou muito empolgada... Estava isenta do que acontecia do lado de fora...
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Hora do almoço. Pauline Oster pensou que aquilo já havia passado – pelo menos para ela. Sentava-se sozinha em uma das gigantescas mesas, com a bandeja e o prato servido à sua frente, esperando as companheiras de quarto.
Mouse e Tori apareceram na entrada, carregando suas respectivas bandejas. Paulie levantou o braço a fim de chamá-las, como se nada tivesse mesmo acontecido, enquanto Allie e algumas colegas a olhavam fixamente e comentavam algo baixinho. Agora era outra história que corria pelos arredores do internato... mas desta vez prejudicava tão só a imagem da garota Oster...
Victoria Moller não conseguiu olhar nos olhos da garota. Passou pela mesa com a vista fixa no chão e aproveitou-se para sentar em outra, em frente à Cordelia, que a chamara.
Mary estranhou a atitude da garota e então sentou-se ao lado de Paulie, que olhou para Tori sem entender ao certo aquela reação.Estaria com vergonha? Afinal... por que mesmo não se sentava com elas, como fazia todos os dias? Por causa... daquilo...?
Cordelia olhou para a garota, franzindo a testa:
- Então... como você está?
- Ouçam... – começou a garota de olhos claros, com seriedade, futucando a comida com o garfo – em primeiro lugar, seja lá o que estejam falando, é tudo bobagem... estupidez... e sei que vocês não darão ouvidos.
Kara a olhou, sem falar nada.
- Claro que não – disse Cordelia, naturalmente – Mas mesmo que fosse verdade... o que há? Não se metam! Amadureçam.
- Mas não é verdade – cortou Tori, nervosa.
- Ei, minha tia é gay... e daí?
- É, mas eu... não sou... – murmurou, comendo uma pedaço de legume.
- É... eu sei que não.
Paulie continuava olhando para Tori, da outra mesa, indignada. Mary B. não sabia ao certo o que fazer ou dizer. Consolá-la? Mas o que diria?
- Ela está chateada. Dê-lhe um tempo.
Paulie desviou o olhar para o prato, um tanto magoada, apanhando uma rodela de pepino e comendo.
- Bedford... esse é um dia negro...
Notas da autora: Acho que o "ponto" da história foi atingido. As coisas agora começam a tomar um rumo diferente. Na próxima parte, comecem a acompanhar Paulie na luta para trazer Tori de volta n.n! E não se esqueçam do review, se tiver alguma coisa a dizer, ok? Até mais...
