A claridade incomodava, por isso ele virou-se para a parede, resmungando. Dormira bem, mas que mal havia em mais um pouco de descanso? Seu corpo implorava por uma cama macia e seca há dias. Acomodando-se melhor, puxou as cobertas para cima da cabeça. "Assim está bem melhor!"
Sua parte consciente estava quase sendo convencida a relaxar... "Hum... Talvez eles sirvam café depois das dez..."
CLICK. CLICK.
- Com licença. – um guincho estridente e alto ressoou da porta aberta. – Com licença! – mais alto. – C-O-M L-I-C-E-N-Ç-A! – um berro.
Convencido de que quem quer que fosse não pararia de perturbar, o loiro abriu os olhos cinzentos de mal-humor.
- Vá embora. – sibilou. – Não vê que eu não quero ser incomodado?
- Tro... trou... trouxe o seu café, senhor. Senhora pede e Winky obedece, mesmo que Winky seja atirada escada abaixo por bruxo mal-agradecido.
- Será que não se tem senso por aqui? – Draco sentou-se, fuzilando a elfa doméstica. – Não, não tem. Como poderia? É a casa do Potter. Deixe a porcaria da bandeja sobre o criado e suma.
Trinta minutos depois, o próprio dono da casa veio levá-lo ao banheiro. Propositalmente, demorou bastante, esperando enfurecer Potter. Entretanto, ele estava tranqüilo, apoiado na parede em frente, comendo uma maçã e sorrindo maliciosamente.
- Terminou de passar todos os cremes, Malfoy?
- Só encontrei os seus, Potter. – rebateu, em igual tonalidade jocosa.
- Interrogatório. Escritório virtual. – apontou para uma porta aberta no outro extremo do corredor. – Você primeiro.
- Ora, certamente serei condenado. – a voz de tédio chamou a atenção dos ocupantes do tal escritório. Sorriu com desdém. – Afinal, isso é uma reunião familiar, não um interrogatório.
De fato. Além dos Potter havia Black, Hunter, Lupin, Snape e dois aurores com distintivos da Federação – um deles era Virgínia - , e uma esteno-bruxa, chamada para registrar o depoimento com sua pena de repetição ultra-rápida.
- Onde estão seus fiéis escudeiros, Potter?
- Caçando a sua amiguinha, Malfoy. Sente-se. – indicou a cadeira no centro da sala.
- Vamos começar. – Lupin anunciou e todos tomaram seus lugares. – Nome?
- Você sabe meu nome, lobisomem. – o loiro arrastava a voz.
- Nome? – suspirou.
- Draco Malfoy.
- Idade?
- 25 anos.
- Ocupação?
- O que é isso? Cadastro de supermercado trouxa?
- Ocupação? – Lupin aumentou o tom, sugerindo que sua paciência estava no fim.
- Seção de importação e exportação de artigos mágicos no Gringotes... "E" raptor de filha de aurores grifinórios ridículos.
- Ótimo começo, Malfoy. – Black rugiu. A Potter tinha sérias dificuldades em mantê-lo sentado. – Você pode começar contando a razão do seqüestro.
- ...
- A lei permite utilizar o Veritasserum, Sr. Malfoy. – Snape sugeriu, em seu tom baixo e perigoso. – Em casos onde não conseguimos a devida 'colaboração'.
- Se me recordo, Sr. Snape, foi o senhor quem me aconselhou a não ceder ao inimigo. Quem me garante que depois não serei descartado?
- Como você se atreve, moleque, a nos comparar ao seu bando de bruxos medíocres? – Hunter indignou-se.
- Eu não tenho garantias, portanto, sem respostas. Me torturem se quiserem, usem as poções da verdade. Eu não colaboro sem garant...
- Eu garanto a sua integridade, Draco Malfoy. – Virgínia falou calmamente. Ele estranhou que ninguém protestou. "Deve ser normal ela se oferecer." – Defenderei você, caso seja necessário. – ela o encarava. – Embora eu duvide. Você colaboraria agora?
- Com prazer, Srta. Weasley. – ele sorriu, cínico, mas satisfeito pelo gesto.
- Então, queira ter a gentileza de nos dizer por que você e Cho Chang seqüestraram Elanor Potter?
- Não estávamos atrás da menina. Fomos instruídos a pegar o tal pingente que ela usava. Por alguma razão que desconheço, Chang não conseguia tocar a jóia; então levou a menina junto.
- Sob ordens de quem agiram?
- Você não pode deduzir sozinho, Potter? Claro que foi Lúcio quem armou tudo.
- Desde quando ele tinha como alvo a jóia?
- Pouco tempo. Quando me procurou, ele parecia interessado na sua filha, Hunter.
- Como ele chegou a ter conhecimento do pingente?
- Uma foto de jornal. A luz que irradiava quase ofuscou a pequena Potter. Por isso, ele obteve informações sobre o poder do objeto.
- Quem passou informações a ele, Malfoy? Que eu saiba, só os Hunter teriam algo a dizer.
- Alguém que tivesse acesso a esta casa, Black.
- Só pessoas autorizadas podem entrar aqui, Malfoy.
- Acho que você foi o espião, Malfoy. – Sirius o acusou diretamente. Um silêncio pesado pairou pela sala. Não era permitido acusar um interrogado sem provas.
Na verdade, todos pensavam que tinha sido isso, mas não podiam apoiar a idéia sem suspeitar de cúmplices entre eles próprios. As casas deles eram as únicas que tinham lareiras ligadas à casa dos Potter.
- Seja como for, - Gina pronunciou-se. – o importante é saber o que Lúcio Malfoy fará.
- Ele quer poder. É a única coisa que eu sei. Ele, como seu desprezível Mestre, não anuncia seus planos. Mas ele precisa de força para ocupar um lugar de destaque, isso é claro. Vocês só precisam descobrir onde ele conseguiria, e como ele usaria o pingente para conseguir.
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Uma reunião entre os líderes dos aurores começou quando Harry levou Draco para o sótão. O interrogatório serviu para tirar algumas dúvidas, porém não esclarecia a razão de Lúcio Malfoy querer tanto o pingente e nem quem era o traidor. Poderiam cuidar dele mais tarde, apesar do assunto merecer atenção, mais urgente ainda era descobrir o 'que' Lúcio Malfoy pretende.
O Sr. Hunter tinha uma teoria.
Ele achava que Malfoy estava atrás de um artefato mágico que fora recentemente exposto no museu bruxo da Cornualha: a espada Caledfwlch, mais conhecida como Excalibur. Aquela mesma, a do Rei Artur. A espada forjada no Mundo das Fadas 'e' sua bainha que tornava quem a usasse invulnerável.
Muito raramente ela deixava o refúgio da Ilha do Dragão, em Avalon, e o curador do museu recebeu honrarias de rei por conseguir permissão para exibi-la durante três dias.
- Será que ele realmente quer a espada, Tim?
- É a única forma que vejo para o uso do pingente. O sujeito é ambicioso, Remo; e pode muito bem ter ficado louco o bastante em Azkaban para pretender enfrentar a Senhora do Lago e seus sacerdotes. Um objeto mágico para pegar outro, este sim, eficiente em batalhas. Ele estaria invencível.
- Ninguém sabe precisamente do que a jóia é capaz.
- Certo, Sirius. Entretanto, se eu fosse ele, assumiria o risco. Malfoy não tem nada a perder. Ele sabe que a Luz de Eärendil é capaz de guiá-lo até Avalon sem o auxílio da balsa.
- Concordo, mas precisamos esperar para ver qual o próximo lance. A jogada é dele e não sabemos se realmente está atrás da espada. Estaremos jogando antes de ver as cartas.
- Como ficamos? Avisamos o Ministério? Como explicar um destacamento de aurores?
- Remo, você contata o Sr. Weasley. Conte-lhe toda a verdade. Suspeito que haverá mais alguns ataques. Os desgraçados querem se aquecer.
- Quanto ao destacamento, temos que pensar em nomes... Quem vocês sugerem?
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- Uma expedição? – Harry foi pego de surpresa quando retornou ao escritório. Incrivelmente, os três bruxos tinham resolvido tudo em menos de quarenta minutos. (Geralmente demoravam horas discutindo detalhes.)
Harry achava entediante assistir às reuniões deles, por isso tinha passado para ver a filha e deixá-la quebrar seus óculos umas três vezes antes de voltar para o escritório.
- Timoth acha que Malfoy está de olho na espada, Harry. Um grupo vai a Avalon, só até as suspeitas serem confirmadas ou não.
- Dê-me a lista, Sirius... Rony e Mione não. Ela está grávida, esqueceram?... Gina. Bom, foi ela quem pediu? (Sirius assentiu.)... Elenna e eu. Acho que três bastam. Os outros estão ocupados.
- Tem mais um, Harry. – Sirius apontou um nome no final do pergaminho, que o afilhado fez questão de ignorar. – Ele também se ofereceu.
- Ele não. – respondeu enfático.
- Gina e Elenna concordaram.
- Não o quero. – falou, em tom definitivo.
- Ele tem um bom argumento.
- Qual? – ergueu uma sobrancelha.
- Elenna diz que não irá sem ele.
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"Posso falar com você?"
Gina assustou-se com o som da voz de Elenna ecoando em seus ouvidos. Harry tinha acabado de sair com Draco e ela respirava aliviada por não terem insistido na questão do possível traidor, já pensando em como consertaria a burrada do loiro.
"Tem que ser agora, Gina."
A ruiva encontrou os olhos cinzentos da meio-elfo postos nela, duros e questionadores. Sua cabeça inclinou-se sutilmente em concordância.
- Se não se importam, senhores, Gina e eu vamos deixá-los.
Elenna conduziu-a até o quarto de hóspedes onde Gina dormira na noite anterior. Esperou que ela entrasse, fechou a porta e indicou a cama para sentarem.
- Há quanto tempo vocês estão juntos? – perguntou em tom casual, mas os olhos concentrados na ruiva. Gina sabia que não poderia mentir ou esconder nada dela, nem adiantaria.
- Pouco mais de um ano.
- Conte-me.
A auror da Federação remexeu-se, incomodada pela pressão. Elenna, percebendo que a conversa mais parecia um interrogatório, amenizou com um sorriso.
- Não quero julgar você, Gina. Muito menos me intrometer na sua vida. É só que... Você concorda comigo que é estranho?... Uma Weasley e um Malfoy... – os olhos cinzentos tinham um brilho de diversão. – O que a fez confiar nele?
- Não sei, Elenna... – Gina observou-a um instante antes de decidir abrir-lhe essa parte tão íntima – Quando encontrei Draco em Estocolmo, eu tinha acabado de me separar de Sig. Lembra? Foi um pouco antes de você descobrir que estava grávida.
- Foi a separação mais tranqüila que já vi! – o sorriso continuava no rosto dela. Gina sorriu também.
- Sig é um ótimo amigo.
- E onde entra o 'Draco'?
- Eu estava andando na rua uma noite e nos esbarramos. Quase imediatamente ele começou a recitar: "cabelos vermelhos, vestes de segunda-mão...", aquela bobagem toda que ele falava em Hogwarts. Merlin, como ele me deixou irritada! Suspeitei. O que um ex-comensal estaria aprontando fora da Grã-Bretanha? Resolvi segui-lo, espionar mesmo.
- E foi então que você descobriu que ele estava sozinho, vivendo numa espelunca há meses, sem ter dinheiro além do que Narcisa Malfoy lhe enviava de má-vontade?
- Como voc...? – Gina arregalou os perplexos olhos castanhos. - Pare de ler a minha mente!
- Quero encurtar a história. – Elenna riu. – Desculpe, não resisti... Continue.
- Bem, - a ruiva olhou desconfiada para a Elfa. – ele estava fugindo na verdade, então passou a viver entre os trouxas. Foi aí que desconfiei de que ele havia traído a causa de Voldemort, o que se confirmou mais tarde. Por incrível que pareça, nos tornamos próximos. Das hostilidades iniciais, ele passou a me procurar para ter informações daqui, depois começou a me confidenciar alguns pensamentos... – Elenna notou o olhar desfocado e sonhador da amiga e reprimiu o riso. ("É o amor!") – Então, um dia ele me mandou uma mensagem por um garoto. Queria me encontrar numa lanchonete trouxa perto do escritório da Federação. Foi quando ele me beijou pela primeira vez.
Gina passou instintivamente a mão pelos lábios.
- Isso tudo foi assim, fácil?
- Claro que não! – a ruiva pareceu acordar. – Foram meses de idas e vindas. Ele não é fácil! Desconfiado, mimado, cínico, sarcástico...
- E também carente, com um humor bastante peculiar e até carinhoso, se a pessoa souber onde tocar, não é? Você com esse seu jeitinho...
- Que jeitinho? – a voz de Gina saiu estridente por causa da surpresa.
- Não esse de raposa felpuda! – Elenna zombou, rindo mais que nunca. – Desculpe, mas você está hilária, Gina... – ela respirou fundo e parou. – Você é meiga e paciente. Aposto que seu primeiro sentimento por ele foi pena.
- Foi. – ela confessou, ruborizando-se. – Depois, me senti feliz por ele me fazer lembrar de Hogwarts. Eu estava longe de casa, ele também. O ponto de vista dele é mais interessante que o nosso sobre alguns assuntos, sabia? E Draco não é mal. Um pouco vingativo, talvez... – a amiga levantou uma sobrancelha. - OK, ele é irritante, mas tenho certeza que ele não participou da batalha no castelo de vontade própria.
- Lúcio pode tê-lo enfeitiçado? – Elenna interessou-se.
- E... ele fala coisas... – as bochechas dela ficaram vermelhas. - Às vezes ele fala enquanto dorme... Acho que usaram a Imperio para obrigá-lo.
- Isso é possível... – a meio-elfo disse, pensativa. – E quando você voltou, isto é, vocês voltaram para a Inglaterra, Harry e eu colocamos sua lareira em sintonia com a nossa e ele pôde facilmente voltar ao serviço do pai.
- Não! – Gina negou veementemente, balançando a cabeça. – Sei que não foi certo eu ter escondido que ele estava comigo, mas se dissesse todos iam me recriminar, como farão quando descobrirem. Minha família não aceitaria, Elenna.
- Você nega que tenha sido a sua lareira que ele usou para entrar aqui ontem?
- Não. – Gina desviou o olhar para a porta. – Não nego. E não entendo. Ele jamais procuraria os companheiros do pai.
- Você confia nele?
- Confio.
- Por que?
- Simplesmente olho para ele e sei que está falando a verdade. Você sabe como é? – Elenna assentiu. – Não tem uma explicação palatável. Apenas sei.
- É o suficiente para mim.
- O pai pode tê-lo forçado. Usando chantagem. É a única explicação que imagino.
- Usando você. – Gina virou-se para ela. – Lúcio Malfoy sabe de vocês. Vi o medo de Draco quando olhou para você ontem e hoje no interrogatório. Draco foi procurado porque teria livre acesso a esta casa, a qualquer hora. O pai ameaçou machucar a namorada dele.
- Draco estava me protegendo...? – foi mais uma afirmativa que uma pergunta. Elenna apenas concordou com um gesto.
- Durante a noite, a Senhora do Lago me procurou. Ela disse algo que não compreendi na hora, mas que torna-se mais claro à medida que você fala, minha amiga. Precisamos falar com os outros.
A meio-elfo levantou-se e saiu como um furacão, carregando Gina até os outros aurores.
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O bruxo irrompeu no quarto onde Elenna preparava a bagagem, ouvindo U2 na caixa musical. Era tarde da noite e eles haviam discutido a tarde inteira por causa da escolha da meio-elfo.
- Por que você insiste nele, Elenna?
- Você é surdo, Potter? – ela suspirou e olhou-o como se ele estivesse sendo absurdo, tal qual o pai. – Recebi uma mensagem de Dian. Se ele não for, nem conseguiremos chegar à Ilha.
- Oh, Merlin!... – ele atirou-se na cama. – Você se responsabiliza por ele?
- Gina tomou essa tarefa. – ela sorriu, adivinhando o que viria a seguir. – Eu já tenho duas pessoas para zelar.
- Duas?!
- Elanor vai. – a Elfa disse rapidamente, olhando-o de esguela.
- Ah, essa não! – ele pulou, ficando em frente a ela. – Você ficou maluca?
- Você prefere que ela fique aqui, com Dobby e Winky? Avalon é um bom lugar. Tenho boas lembranças de lá.
- Não estamos indo em férias, Elenna! Podemos deixá-la com Sirius ou Timoth. Hagrid! Ele a adora, não se importaria de ficar com ela.
- Você não vai me convencer a me separar dela, Potter! – ela virou-lhe as costas, trocou de roupa e deitou-se, recusando-se a discutir o assunto.
Continua...
