O mês de setembro estava passando depressa até demais. Os alunos já tinham tido algumas aulas práticas mas estavam particularmente animados com as aulas do professor Lupin, principalmente os do último ano, que já tinham o antigo professor como um de seus preferidos desde o terceiro.
Harry acordou animado aquela manhã. Teria aula dupla de Herbologia, matéria que não gostava muito mas que sempre era uma boa desculpa para estudar com Gina, que adorava. E, depois - e aí sim residia o principal motivo de sua animação - seria a primeira aula de Caça, com Remo Lupin e os gigantes. Rony e Hermione também não escondiam a animação na mesa do café.
- E então, Harry? Você acha que eu serei um bom caçador? – Gina riu.
- Bem, se for para caçar aranhas – caçoou. Hermione e Harry abafaram risadas. Rony fez uma cara feia para a irmã.
- Hey, não começa a implicar. Você está de mau humor porque nunca teve aulas práticas com o professor Lupin...
- Eu não estou de mau humor, Rony – ela cruzou os braços, emburrada. Mione sorriu.
- A questão não é se seremos bons caçadores. A questão é: será que vamos sobreviver às aulas? – Harry franziu a testa.
- Por que diz isso, Mione?
- Ora, você lembra das aulas dos nossos amigos gigantes? Enrolados do jeito que são é capaz de que no primeiro segundo alguém perca um olho, ou dois – torceu os lábios. – Ou alguma parte móvel, ou vital... Se é que vocês, meninos, me entendem – olhou para baixo. Harry e Rony fizeram caretas de dor e Gina não agüentou e riu.
- Ah, Mione, eu não acho que os gigantes nos ensinarão a caçar búfalos. Muito menos a castrá-los – as duas riram.
- Hey! Dá para vocês mudarem de assunto? – Rony protestou. As duas sorriram em resposta.
- Mas você acha mesmo que as aulas vão ser assim tão violentas? – Harry perguntou para a amiga. – Você ouviu algo a respeito em alguma reunião de monitores?
- Mione, se você ouviu algo por que não me contou ontem à noite, quando fui ao seu quarto? – Rony perguntou sem pensar mas antes que Harry percebesse algo de estranho Gina chamou a atenção do namorado para a mesa dos professores. Mione corou e deu uma olhada feia para o namorado, que fez uma nota mental para agradecer Gina depois.
- Olha lá Harry, o professor Lupin parece animado.
- Parece mesmo – sorriu e depois se voltou para a namorada. – Você vai ter aula de que essa manhã?
- Eu ia fazer uma surpresa mas já que você me perguntou – fez um pequeno suspense. – Eu fui liberada da aula da manhã e vou acompanhar vocês na aula dupla de Herbologia – os três ficaram animados.
- Isso é bom – Harry sussurrou no ouvido dela, rindo.
- Mas é para o senhor prestar atenção na aula.
- Eu juro que vou tentar – respondeu cinicamente.
- Sei, sei – disse, levantando-se.
Os quatro se encaminharam para a estufa número oito. A professora Sprout orientou os alunos a formarem trios. Teriam que retirar larvas das folhas das árvores e catar algumas lesmas do pântano, que haviam entrado acidentalmente na estufa.
- Sua especialidade Harry – Rony implicou quando a professora terminou de explicar.
- Ha ha ha. Ela falou recolher, Ron. Não explodir – ele próprio entrou na brincadeira e Hermione riu dos dois.
Os alunos se dividiram e começaram o serviço enquanto a professora explicava a diferença entre larvas e lesmas e por que as últimas deveriam ser removidas das árvores jovens principalmente.
- As larvas se alimentam das folhas e depois se grudam nos troncos, sugando a seiva das árvores. Se a planta é muito jovem pode não suportar. Principalmente se forem muitas larvas, como temos aqui – apontou para a árvore que Simas, Neville e Lilá estavam cuidando. Retirou duas larvas melequentas e as esmagou na mão. - Vejam. Esmaguem desse jeito. Essa gosma verde é o sumo da árvore não digerido, que estavam sugando, não são as entranhas delas – Neville recostou no tronco e desmaiou até o chão, esmagando mais algumas larvas no percurso. A professora riu. - Pelo menos o senhor Longbottom levou algumas com ele... Continuem, vamos queridos.
Gina circulava por entre os trios de alunos, ajudando a separar as larvas das lesmas, já que as últimas não deveriam ser mortas, apenas retiradas. Passou por entre duas árvores e chamou a atenção de Goyle, que estava matando as lesmas e guardando as larvas.
- É ao contrário – disse educadamente. O garoto rosnou para ela algo intelegível mas ela ouviu a última frase.
- Sua pobretona miserável... – ela ia responder mas uma mão rápida grudou o garoto pelo pescoço no tronco.
- Retire o que você disse imediatamente – ela arregalou os olhos e encontrou os olhos cinzentos de Draco cintilando de raiva para o garoto corpulento, que não estava entendendo absolutamente nada.
Ela olhou o amigo, indicando que seria uma atitude muito suspeita que a defendesse daquela forma. Afinal, onde estava com a cabeça? Se ele se passaria por um pretenso Comensal como poderia estar defendendo uma Weasley? Draco pareceu ler a mente dela e, olhando sem emoção para a ruiva, repreendeu Goyle.
- Sou eu quem age aqui. Não faça nada que eu não mande, idiota – o garoto esfregou o pescoço e olhou para um Draco Malfoy frio e calculista como sempre, não desconfiou.
- Tudo bem Draco. Mas ela é uma Weasley – apontou para Gina, que não sabia se deveria continuar ali ou sair. Ela virou a cabeça ligeiramente para o lado e avistou Harry, que estava rindo de Rony, coberto de gosma de larvas dos pés à cabeça.
Os sons da sala foram abafados e ela não conseguia ouvir mais nada. Apenas via Harry rindo, sem que pudesse ouvir o som das risadas. Os lábios de Draco se moviam e pronunciavam palavras que não significavam nada para os dois mas ela também não ouvia. Goyle ria também mas não estava prestando atenção. Mione passou um pouco de gosma de larva no rosto de Harry, de brincadeira, e ele e Rony esmagaram uma larva com as mãos, sujando a garota, que deu alguns tapas neles, rindo. Gina sorriu. Tudo parecia em câmera lenta.
Draco continuava a provocá-la mas estava achando estranho que não tivesse reação alguma. Ela respirou fundo. Parecia estar dormindo acordada. Harry ainda ria quando Simas o cutucou e apontou na direção de Gina, indicando que estava sendo importunada pelo Malfoy, mas nem reparou no sonserino, olhando para a namorada.
Gina estava pálida e zonza. Assim que ele se virou para ela tentou sorrir mas não viu o rosto dele. Novamente, no lugar dos olhos, boca e nariz, havia um nada. Um buraco escuro. Harry estava sem rosto, como nos sonhos que ela tinha tido nas férias. E foi nesse instante que ela sentiu o corpo ceder.
Ainda viu lentamente Harry correr em sua direção, seguido por Rony e Hermione. Draco teve que se controlar para não a amparar mas pelo menos ela tinha caído em cima de um pequeno arbusto.
Harry chegou rápido e colocou a mão na testa de Gina. Estava ardendo em febre, como no dia em que ela tinha visto os corpos desfigurados. A professora Sprout foi chamada e ordenou que a garota fosse levada para a enfermaria imediatamente. Harry a segurou no colo e abriu caminho entre a roda de alunos que se amontoou em volta deles. Rony e Hermione acompanharam o amigo. Rony apontou o dedo para Draco, que estava tendo sérios problemas para rir da situação, já que estava tão apavorado quanto os outros três.
- Se você fez alguma coisa com ela, lançou uma azaração ou coisa assim, vai se ver comigo – Mione o puxou pelas vestes e seguiram Harry.
O garoto entrou na enfermaria com a namorada nos braços e a colocou deitada na cama. Os três se amontoaram em volta da cama, sob protestos de Madame Pomfrey, que tentou tocá-los de lá. Harry, que estava ajoelhado na cabeceira de Gina, sequer se mexeu. A enfermeira conseguiu expulsar Rony e Hermione, que saíram reclamando, mas o olhar de Harry e o que disse não a encorajaram a fazer o mesmo com ele.
- Me desculpe mas o único jeito de me tirar do lado dela é me estuporando, Madame Pomfrey. Eu só saio assim que ela acordar e se ela não me quiser aqui – disse, sem olhar para a mulher, enquanto segurava a mão da namorada.
Gina abriu os olhos alguns minutos depois, antes mesmo que a enfermeira trouxesse alguma poção, como se despertasse de um sonho ruim, sobressaltando o namorado. Sentou-se na cama bruscamente e abraçou Harry com força.
- O que foi que aconteceu com você? – ele perguntou, preocupado. Ela chorou por alguns instantes, acariciando o rosto dele.
- Eu pensei que tinha perdido você. Por alguns instantes... Foi como se tudo tivesse acabado. Eu senti falta do seu rosto...
- Hey, eu estou aqui. Foi só um sonho ruim. Você está muito abalada com tudo isso – limpou as lágrimas dela com a mão. – Talvez seja mesmo melhor que você não se envolva e...
- Não. Eu quero. Me deixe tentar – colocou a mão sobre os lábios dele. – Eu posso ser forte. Por você. Por nós dois – ele suspirou.
- Tudo bem Gi. Mas se cuide. Eu não vou agüentar ver você caindo assim de novo – ela sorriu.
Quando a enfermeira voltou com a poção viu que Gina já estava acordada e a examinando chegou a conclusão que deveria ter dormido durante a aula e que precisava descansar durante a tarde. Então, com a ajuda da própria garota, tocou Harry para fora. Não deveria perder aula só porque Gina perderia. Ela deu um gole da mesma poção que Harry tinha tomado no seu quinto ano e a menina dormiria um sono tranqüilo e sem sonhos. À noite estaria liberada para jantar com os outros.
Harry saiu muito a contragosto mas pelo menos teria uma aula divertida. Durante o almoço explicou para Rony e Hermione que Gina estava exausta e o quanto estava preocupado com ela. Rony comentou com o amigo sobre o quão ele próprio ficava preocupado com os sonhos da irmã e sobre o quanto ela era facilmente impressionável. Hermione discordou.
- Eu acho que vocês subestimam a Gina. Eu garanto que ela ainda vai demonstrar mais força que vocês todos juntos...
- Feminismo – Rony murmurou para Harry.
- Eu ouvi isso, Rony Weasley. Posso ser feminista mas não sou surda.
- Bem, Gina não vem mesmo para a aula? – desconversou.
- Não Ron – Harry respondeu, rodando distraidamente o garfo na mão. Hermione o cutucou para que mudasse de assunto.
- Bem, acho que a aula vai ser bastante interessante. Você não acha, Harry? – disfarçou pessimamente. Hermione sacudiu a cabeça e afundou o rosto nas mãos. Rony fez uma cara de injustiçado.
- É, deve ser... – respondeu sem emoção.
- Viu o que você fez? – criticou o namorado, mas estava quase rindo.
- Eu não fiz nada. Eu só estava curioso – ele chegou bem perto dela. – Não posso, não?
- A curiosidade matou o gato – ela respondeu antes de ganhar um beijinho de leve.
- Depois eu te mostro o que matou a gata – sussurrou baixinho no ouvido dela, que corou.
Terminaram de almoçar e foram para o pátio, que stava dividido por cordas, separando duas faixas de terreno para dois grupos diferentes de alunos.
Assim que Harry e os dois amigos chegaram Colossus veio recebê-los, animadíssimo. O gigante os colocou atrás de uma das cordas e mostrou as boleadeiras amontoadas no chão, separadas por tamanho e peso.
- É isso que vamos aprender hoje? – Rony cochichou para Hermione, que parecia estar muito empolgada.
- Tomara que seja – ela disse, sorrindo de orelha a orelha.
- Sua garota vai finalmente conseguir descontar a agressividade em alguma coisa que não seja você, Ron – todos riram.
- Cale a boca, Simas – respondeu, irritado. Mione deu um sorrisinho espevitado.
Alguns minutos depois todos os alunos do sexto e sétimo ano estavam organizados em dois grupos diferentes. Harry olhou para as colegas de quarto de Gina e ficou um pouco melancólico por ela não estar ali. Então se lembrou de verificar algo. Correu os olhos pelo pátio mas não avistou os cabelos platinados de Draco. Aquilo o deixou tremendamente aborrecido.
Mas ao contrário do que Harry pensava Draco não estava na enfermaria. Pelo menos não até aquele momento. Havia sido autorizado a permanecer na sala comunal. O professor de Poções e diretor da Sonserina havia permitido que usasse a lareira para se comunicar com o pai. É claro que agiria como se estivesse cometendo uma transgressão.
Demorou alguns minutos até que conseguiu se comunicar com a Mansão Malfoy. A lareira crepitou um pouco e o rosto altivo de Lúcio Malfoy apareceu. Draco franziu a testa.
- Olá pai – disse sem emoção. Lúcio olhou aborrecido para ele.
- O que está fazendo que não está na aula?
- Aquela aula idiota é para perdedores e sangue ruins. Como o infeliz do Weasley, a Granger metida e o maldito Potter – Lúcio pareceu avaliar a postura do filho.
- Então não julga necessário assistir aulas?
- Nenhum Malfoy deveria – respondeu, sério. – Está no nosso sangue. Nascemos para liderar, não para receber ordens de quem nos é inferior em inteligência, capacidade e linhagem – Lúcio pareceu satisfeito.
- Como os Weasley, por exemplo – testou o filho. – Com todos aqueles malditos filhos imundos, pobres, inúteis, estúpidos – Draco sentiu o coração acelerar os batimentos a cada palavra dita pelo pai mas manteve a mesma expressão de antes.
- Isso mesmo pai. Todos esses miseráveis inúteis e... – Lúcio sorriu.
- A pequena não lhe parece tão inútil, não é? – Draco teve que se conter para não pôr tudo a perder.
- Como assim? – perguntou, ofendido.
- Draco, eu tenho meus próprios meios de saber como anda a sua interação social na escola. Desde que mandei que se aproximasse da malditazinha. Sei que mantém contato com essa escória ainda – Draco sentiu as artérias pulsarem nas têmporas. Teve gana de enfiar o atiçador de brasas na goela do pai mas se manteve controlado.
- É claro que mantive contato. Que tipo de idiota pensa que sou? Sou seu filho. E pensei que me conhecesse o suficiente para saber que o que causa dor ao maldito e patético Potter pode ser considerado uma diversão para mim. E eu sei que ver a patética namoradinha comigo incomoda mais do que um pé no saco – Lúcio riu.
- Muito bem, e você acha possível tirá-la definitivamente do Potter? – Draco deu de ombros.
- Eu posso fazer o que eu quiser. Eu sou um Malfoy. E se eu tiver que tirar a namoradinha dele eu tiro – Lúcio riu mas ainda tinha um último teste.
- E quando nós formos destruí-la... – Draco nem pestanejou.
- Eu faço questão de fazer isso com as minhas próprias mãos, na frente do Potter – completou com ódio cintilando nos olhos cinzentos.
Mas o ódio era do pai, não de Harry Potter, muito menos de Virgínia Weasley. Lúcio pareceu satisfeito com a resposta firme e carregada de ressentimento do filho. Então, depois de uma boa avaliação, resolveu se manifestar.
- Draco, meu filho, talvez seja a hora de preparar você para algo melhor e maior do que Hogwarts, do que este mundo sujo de sangue ruins e trouxas – Draco sorriu.
- Nada me daria maior satisfação, pai – o tom era grave e solene. – E orgulho – achou por bem acrescentar. - Precisamos livrar o mundo dessa praga. E também de quem for contra nós – Lúcio sacudiu a cabeça, satisfeito.
- Nós manteremos contato – então a lareira voltou ao normal.
Draco esperou que o fogo se extinguisse por completo e deu um grito de horror. Segurou uma das almofadas e, jogando-a para cima, pulverizou com um feitiço. Ainda assim a raiva e o desespero que sentia não haviam passado. Caminhou de um lado para o outro mas não conseguia lidar com o que sentia. Não conseguia sequer identificar o que estava sentindo. Foi então que lhe ocorreu que havia uma pessoa que poderia ajudá-lo a lidar com isso.
Enquanto Draco travava a conversa mais difícil de sua vida Harry e os outros estavam recebendo uma aula nada usual. Os quatro gigantes serviam de caça para os alunos enquanto manejavam as boleadeiras sob a tutela do professor Lupin.
Hermione havia tentado demovê-los da idéia de serem a "caça" mas os quatro argumentaram que seria bastante divertido. E que mesmo a boleadeira mais pesada, a de dois quilos, ainda que atirada por um exímio estudante, não faria mais do que arranhá-los, já que eram fortes e resistentes.
Os alunos formaram quatro filas e atiravam sob o comando do professor. Quando já estavam bem treinados com os gigantes estáticos começou o treino com estes em movimento. Nesse instante alguns alunos começaram a se destacar, entre eles, surpreendentemente, Neville e, para grande choque, Hermione.
A Monitora Chefe não errou sequer uma vez e mesmo Colossus, o mais ágil dos quatro, não conseguiu escapar das boleadeiras da garota, que o derrubou duas vezes, com um golpe certeiro nas pernas.
Ao final da aula estavam todos exaustos mas satisfeitos. Haviam se divertido e aprendido algumas técnicas de apreensão e imobilização dos inimigos. Lupin estava feliz por ter recomeçado a dar aulas mas Harry ainda estava com os pensamentos na enfermaria.
- Agora se lavem e vão se preparar para o jantar – Vasta disse em tom maternal. Tinha algumas marcas roxas nas pernas mas tinha adorado ajudar os alunos e o professor Remo nas aulas.
- Muito bom o seu uso da lógica, Hermione – Miúdo comentou enquanto Colossus recolhia em uma só mão algumas dezenas de quilos em boleadeiras.
- É verdade. Como eu costumo dizer: "não há coisa que nossa Hermione não saiba fazer" – Hagrid se derreteu. Mione sorriu.
- Obrigado Hagrid – Rony estufou o peito. – A minha namorada é mesmo cheia de talentos – todos riram.
Assim que acabaram de ajudar os gigantes a recolherem o material os três subiram para a sala comunal. Tomaram um bom banho e desceram para o jantar. Harry estava ansioso para ver como Gina estava mas ela demorou um pouco pois tinha recebido uma visita na enfermaria. Assim que acordou encontrou um par de olhos cinzentos assustados olhando fixamente para ela.
- Draco? – bocejou e olhou a hora no relógio da enfermaria.
- Já passa da hora do jantar – ele respondeu sem tirar os olhos dela. Estava sentado na cadeira e debruçado na cabeceira da cama.
- Há quanto tempo você está aqui?
- Sei lá, ruiva, desde o meio da tarde, eu acho – Gina o olhou, tentando adivinhar o que tinha acontecido.
- E o que você está fazendo aqui?
- Eu esperava que você me ajudasse a entender isso também – Gina suspirou.
- Já conversamos sobre isso, Draco. Não me faça repetir...
- Não, ruiva, não é o que você está pensando. Nem tudo é sobre você, sabia? Bem, quase tudo, mas nem tudo... – ela riu.
- E é sobre o quê, então?
- Lúcio – os olhos dele fugiram dos dela quando disse o nome do pai.
- E o que tem seu pai? – ele bufou.
- Podemos esquecer esse pequeno detalhe um pouco?
- Qual?
- O fato de aquele bastardo maldito ser o meu "adorado" pai – Gina franziu a testa. - Eu só quero entender. O porquê – ele levantou e caminhou de um lado para o outro diversas vezes, sem dizer uma palavra.
- Você está me deixando tonta. E nervosa também, se interessa saber – ele olhou para ela e então atirou um jarro de flores na parede, espirrando água para todo lado. Gina sentou na cama. - Você vai falar o que está acontecendo ou me torturar com o seu mau humor é a sua melhor idéia de desabafar?
- Não. Não, ruiva – crispou os punhos. – Eu não quero desabafar. Eu quero torcer pescoços, ou quebrá-los. Ou ambos...
- O que houve, Draco?
Ele sentou na cama ao lado, de costas para ela. A penumbra não a impediu de ver que ele tremia. Passou as mãos nervosamente pelos cabelos. Gina se levantou, devagar, enquanto ele começava a falar.
- Eu falei com Lúcio essa tarde. Comecei o que me pediu – fez uma pausa. – Eu só não sei até onde vai isso – Gina parou em frente a ele, que tinha a cabeça baixa.
- E como foi? – perguntou, mais para encorajá-lo a continuar do que por curiosidade.
- Como você acha que foi, ruiva? Divertido? Uma linda e melosa conversa entre pai e filho? – debochou.
Gina deu um passo à frente e ele encostou a cabeça na barriga dela, apoiando-se na sua cintura. Ela passou as mãos por entre os cabelos platinados dele, de forma quase maternal, como Molly fazia com ela quando estava nervosa, assustada ou triste.
- Está tudo bem, Draco. Você não precisa fazer isso – tentou confortá-lo mas ele começou a rir.
- Você não entende, não é mesmo, ruiva? Eu comecei algo que não tem fim. Eu empurrei a bola da rampa e agora ela só vai aumentar...
- Draco...
- E EU DISSE COISAS – ele berrou de repente, assustando-a. – Disse coisas – continuou suavemente. – Coisas que não deveria ter dito. Coisas que não sei da onde vêm. Coisas que não sou eu mesmo e que não sinto. Coisas que eu sei que Lúcio acredita e eu o mataria por apenas pensar em pô-las em prática – Gina apertou os olhos.
- O que você disse? – ele ergueu os olhos para ela, que adivinhou uma tormenta se formando naqueles olhos cinzentos de tempestade.
- Eu disse que teria você para mim e a destruiria, em frente ao Potter, e que isso me daria muito prazer e orgulho – Gina se afastou dele por alguns segundos, analisando a situação.
- E você realmente faria isso?
- Essa não é uma pergunta muito justa, Weasley – ele riu. – O que você acha? – ela deu de ombros.
- Me diga você o que acha...
- "timo. Eu venho aqui para você me dizer o que achar e você me pede o mesmo. O quão irônico isso é? – ele riu cinicamente.
- Não sei. Mas é o suficiente para te fazer perder o controle. Então deve ser muito...
- Eu sinto muito...
- Pelo quê, Draco?
- Porque eu queria isso. De verdade.
- Me destruir?
- NÃO! POR MERLIN! Eu detesto quando se faz de estúpida. Eu queria arrancar você do maldito quatro-olhos... – Gina ficou em silêncio. - Deixei você muda agora. "timo. Inédito. Palmas para mim – ele bateu palmas, sarcástico.
- Pare Draco. Pare de sentir pena de si mesmo. Isso não combina nada com você. E pare de tentar me fazer sentir culpada, porque você não precisa disso. Eu já me sinto. E não vou deixar de me sentir assim ou sentir mais culpa porque você decidiu se tornar o mensageiro da verdade aqui – ele se irritou.
- A questão é essa, Weasley. A verdade. A tênue linha entre o que eu disse que faria, o que gostaria de fazer e o que farei, não é mesmo? – ele caminhou até ela e esticou a mão mas deteve o movimento, crispando o punho.
- E o que você fará? Afinal, eu já sei o que disse e o que gostaria – ele riu.
- Eu creio que você já soubesse o que eu faria, desde antes de saber o que eu disse que faria e o que gostaria de fazer, ruiva... Mas você é cheia de charadas e mistérios – ela riu.
- Então...
- Então eu vou fazer o que combinei. Eu vou me fingir de malvado, colher o falso orgulho da família e apunhalá-los pelas costas. Eu sou bom nisso, afinal – Gina franziu a testa.
- Eu discordo de você – ele se espantou, sentado de novo na cama. – Eu não o considero um traidor, Draco. Isso não combina com você, de certa forma. E um dia você vai ser capaz de enxergar isso. De encontrar um meio termo. De enxergar você mesmo como eu vejo você...
- E como você me vê? – ela se aproximou dele e lhe deu um beijo estalado na bochecha.
- Como um menino assustado que só precisa de um pouco de carinho – ela o deixou com essas palavras. Sabia que Harry a estava esperando para o jantar. Só esperava que não estivesse muito aborrecido por sua demora.
Assim que entrou no Salão Principal o rosto de Harry se iluminou. Restavam poucos alunos ainda jantando. Ele levantou da mesa e caminhou depressa até ela, quase correndo. Assim que a envolveu em um abraço Draco passou atrás deles, dirigindo-se silenciosamente à mesa da Sonserina. Era bem óbvio que havia estado na enfermaria. Harry sentiu novamente um estranho zunir nos ouvidos. Afastou Gina do abraço e respirou fundo três vezes. Depois sorriu, satisfeito por ter controlado o ciúme, e voltou de mãos dadas com ela até a mesa da Grifinória. Ninguém reparou mas no aparador perto da porta todos os copos haviam trincado.
