Capítulo Vinte e Um - O Jogo Dos Sete Erros

Gina ergueu a cabeça quando Rony entrou no quarto de Harry, esperava por notícias ansiosamente. O ruivo estava acompanhado por Hermione e veio andando de cabeça baixa até ela. A irmã percebeu algo reluzir entre as mãos do irmão. Tinha o semblante arrasado e parecia extremamente triste. Hermione estava com os olhos vermelhos e inchados. Mesmo assim Gina acompanhou os dois com o olhar até Rony se aproximar da cama onde estava sentada. O rapaz respirou fundo, tomando coragem, e depositou hesitante os dois pedaços da espada de Godric Gryffindor, que estava sendo usada por Harry, encima da cama, em frente a ela.

Gina olhou a espada partida ao meio e fechou os olhos com força, como se aquilo pudesse dissipar o turbilhão de dor e desespero que sentia se formando dentro de si naquele momento. Permaneceu em silêncio por alguns instantes, como se estivesse sob a espécie de um transe, alheia a qualquer barulho exceto as batidas aceleradas de seu coração desconsolado. Rony colocou a mão no ombro dela e Gina abriu os olhos. Ele tinha marcas de lágrimas secas no rosto.

- Gina... - ele se sentou em frente a ela e a abraçou com força. Hermione se deixou cair sentada no chão e abaixou a cabeça. - Eu sinto tanto - disse com a voz abafada. - Ele partiu como um herói e... - ela se soltou do abraço.

- NÃO - gritou. - Não - completou calmamente, séria. - Ele não está... Morto - emendou com a voz miúda. Hermione ergueu os olhos cheios d'água para Rony, trocando um olhar preocupado com o namorado.

- Gina... - ela tentou começar mas foi interrompida por Rony, que sacudiu a cabeça, indicando que não deveria interferir naquele momento. Ele segurou as duas mãos da irmã, que o olhou nos olhos.

- Eu não queria ter que te dizer isso - ele tremia também, tentando consolá-la.

- Não Ron. Eu sei - disse, tentando se acalmar. - Ele não está morto - completou, convicta. Ele sacudiu a cabeça negativamente.

- Gina, eu vi... O corpo. Eu vi - disse, tentando se controlar. Hermione soluçava baixinho agora.

- É algum engano. Tem que ser... Eu saberia. Eu sentiria... - justificou, as lágrimas começavam a brotar nos olhos castanhos. Rony segurou o rosto da irmã entre as mãos.

- Eu amo tanto você. Não queria ter que te dar essa notícia horrível. Mas não podia deixar outra pessoa fazer isso com você. Ele disse que fez o que fez por você, por vocês dois - ela tremeu, sentiu o corpo doer, parecia estar se rasgando ao meio. - Gina, eu sei que é difícil. Harry era meu melhor amigo, meu irmão... - começou mas ela fez com que a soltasse.

- Não Ron. NÃO. Ele não está morto, não está. Não fale como se ele estivesse - ela continuou gritando. Hermione soluçava cada vez mais alto. Lílian começou a chorar em seu quarto. - Ele está vivo. Eu sei disso. Eu sinto... - soluçou, descontrolada. - Como ele pode estar morto e eu continuar com o meu coração batendo dentro do peito? Meu sangue continua a correr nas minhas veias. Eu não deveria estar sequer respirando se isso fosse mesmo verdade - disse, encostando-se à parede. Rony se aproximou mas ela escorregou até o chão. - Não me toque. Chama o Harry, Ron. Traz ele para mim, por favor. Eu quero ele aqui, comigo. Traz ele de volta para mim, eu te imploro... - disse, olhando desesperada para o irmão.

- Gina eu não posso. Eu... - ela levantou de repente.

- Eu quero vê-lo. Preciso vê-lo uma última vez... O corpo dele - disse, decidida. Rony fez uma expressão apavorada.

- Você não deve Gina. Vai ficar chocada com o que vai ver - tentou explicar.

- Eu nunca me chocaria de olhar para o rosto dele Ron. Eu quero vê-lo pela última vez - disse, decidida. Ele abaixou os olhos.

- Gina, você não deve ir vê-lo. Guarde a imagem que você tem dele vivo - disse, trocando um olhar com Hermione. Gina parou de chorar e olhou fixamente para o irmão.

- Como ele morreu, Ron? - perguntou, passando a mão pelo rosto, secando as lágrimas. Rony abaixou a cabeça. - Fala Rony. Me diz... - ele não queria contar. - ME DIZ. EU PRECISO SABER. EU TENHO DIREITO, POR MERLIN... - exigiu. Rony finalmente conseguiu encará-la.

- Houve uma explosão - fez uma pausa, compreendendo onde o irmão queria chegar. - Ele está desfigurado, Gina... - falou com um fio de voz rouca. Gina abriu instantaneamente um sorriso. Rony não compreendeu.

- Não era ele então - disse com certeza. Rony sacudiu a cabeça. - Eu quero vê-lo Ron. Só eu posso dizer se é realmente ele. Me leva lá agora - Rony não teve escolha. Ele pegou a irmã pela mão e a levou até a sala.

Allana estava sentada no quarto da filha, chorando com a menina no colo. Remo estava sentado ao lado dela em silêncio, segurando sua mão. Sirius havia voltado para o campo de batalha para resolver todas as burocracias do funeral e esperar o Ministério liberar o corpo para o enterro. Havia deixado o amigo tomando conta da esposa e da filha. Nenhum dos dois percebeu Rony descendo as escadas com Gina. Hermione veio logo atrás deles.

- Fique aqui. Allana pode precisar de alguma ajuda para Lili. Sirius está lá ainda. E o professor Lupin não tem o menor jeito com bebês - explicou de forma prática. Mione sacudiu a cabeça. Ele deu um beijo suave nos lábios dela. - Fique bem - disse enquanto entregava o Pó de Flu nas mãos de Gina.

- Eu vou tentar - ela fungou. Rony e a irmã entraram na lareira e foram para Godric's Hollow, onde havia uma enfermaria improvisada.

No caminho para a enfermaria Gina foi encontrando vários rostos conhecidos mas não reparou em nenhum deles. Viu as marcas da batalha. A cidade fumegava e havia manchas de sangue por toda parte, gritos de dor e desespero ecoavam das cabanas improvisadas. Caminhou até a última cabana, Rony a conduzia pela mão. Assim que entrou viu Sirius. Ele olhou penalizado para Gina. Estava debruçado sobre o corpo do rapaz e acariciava os cabelos negros e bagunçados, parcialmente coberto por uma bandeira da Grifinória. Gina caminhou até a cama onde o garoto repousava. Sirius se adiantou para ela.

- Você não deveria estar aqui - disse, preocupado.

- Nem você - respondeu, soltando da mão do irmão, que não conseguia mais andar. Gina se encaminhou até o corpo.

- Por que você a trouxe garoto? Ela é só uma criança... - Rony engoliu em seco e deu de ombros. Gina ignorou o comentário do padrinho de Harry.

- Deixem-nos a sós - ela disse, séria, de olhos fechados. Rony e Sirius se entreolharam.

- Gina...

- Deixe-me Ron. Por favor - os dois se entreolharam novamente e saíram. Ela também tinha o direito de se despedir do amor da sua vida.

Segurou a mão dele. Estava fria e pálida como mármore. Gina sentiu um frio na espinha. A bandeira cobria o rosto e parte do peito. Ela respirou fundo e a puxou aos poucos mas parou quando viu a enorme queimadura que deixava à mostra algumas costelas e o peito, com o coração em carne viva. Tremeu e fechou os olhos.

- Por favor. Não seja você. Não seja você - repetiu baixinho para si mesma numa ladainha. Então subiu um pouco mais o pano e viu o queixo e o pescoço arrebentados do rapaz. Teve ânsia de vômito e sentiu o estômago dar voltas mas precisava descobrir se era realmente seu Harry. - Não pode ser você. Eu sinto você ainda. Como poderia ser você? Eu sinto meu corpo vibrar. Sinto seu cheiro em mim. Você não pode estar morto. Não depois de ontem. Não depois de... Me amar daquela forma - ela soluçou. - Não é você! - disse, arrancado o resto da coberta. Ela viu que no lugar do rosto havia um buraco, um vazio.

Um vazio da mesma forma que havia visto diversas vezes em seus pesadelos durante aquele ano. Olhou para a parte que restava da fronte e não viu nenhum sinal da cicatriz em forma de raio mas estava desfigurado demais para que isso servisse como identificação. Apertou os olhos, fechando-os com força, impressionada com o que estava vendo. Então se lembrou que aquela não era a única marca que ele tinha no corpo. Ela se lembrou que havia cortado a mão durante a detenção com Snape e teria que ter a cicatriz ainda. "A cicatriz", ela sorriu. "Em qual das mãos era mesmo?", pensou. "Direita." Deu a volta na cama e olhou sorrindo para a mão direita ilesa e sem marcas do rapaz deitado. Aquele não era seu Harry. Harry não estava morto. Ela deu um berro.

- Ron! - ele entrou na barraca correndo, seguido por Sirius. Gina estava caída no chão, chorando, mas era de felicidade. - Não é ele Ron. Não é - disse, abraçada ao ruivo. - Harry estava com a mão machucada, esse rapaz não está. Não é ele, Sirius. Não é ele – o homem sentiu o coração pular dentro do peito.

- Você tem certeza disso Gina? - ela sorriu.

- Tenho. Absoluta certeza - continuava a chorar de alegria.

- Por Merlin! - Sirius correu a mão pelos cabelos. - Então ele deve estar ainda no campo de batalha - deu um sorriso e saiu correndo mas Harry já estava sendo trazido por um dos bruxos do Ministério. Estava desacordado e tinha um baita galo na cabeça. As roupas estavam bastante sujas de sangue mas estava vivo. Gina tomou a mão direita dele na sua e mostrou o corte ao irmão, o lugar onde havia uma pequena cicatriz linear. Ela sorriu, satisfeita.

- Eu não disse a vocês? - disse, animada. Rony agora também estava emocionado.

- Hermione e Allana. Precisamos avisar as duas e o professor Lupin – Rony lembrou, Sirius acenou com a cabeça.

- Vou contatar o Aluado pela lareira e explicar tudo. Por Merlin, mais um susto desses e esse garoto me mata - disse, saindo da barraca depois de depositar um beijo na testa do afilhado.

Hermione e Allana ficaram tremendamente aliviadas e só não foram imediatamente para Godric's Hollow porque Sirius pediu que fossem para Hogwarts com Remo, já que logo Harry seria levado de volta para a escola.

Gina ficou o tempo todo acordada ao lado dele. Queria estar ali quando acordasse. Era de madrugada quando isso finalmente aconteceu, tinha passado horas apenas olhando para ele, feliz por estar respirando mais tranqüilo. Ele abriu os olhos abruptamente.

- Ai! - gemeu, levando a mão à cabeça, onde havia um curativo. A menina pareceu satisfeita ao vê-lo acordado.

Harry apertou os olhos para enxergá-la direito na penumbra da barraca mal iluminada por algumas velas gastas. Gina levantou, pegou os óculos dele e os ajustou no nariz de Harry. Ele fez uma expressão perdida e confusa. Ela passou a mão em seu rosto e sentiu as lágrimas arderem nos olhos.

- Que susto você nos deu - disse, colocando a mão sobre o peito. - Espere até eu avisar ao Sirius que você acordou - ele ergueu as sobrancelhas.

- Quem?

- Você não está ouvindo bem Harry? Sirius. Seu padrinho - ela olhou para ele, intrigada.

- Não. Eu estou ouvindo perfeitamente bem. Eu quero saber quem é você - perguntou seriamente. Ela o encarou, chocada por alguns instantes, mas logo percebeu que ele tinha os lábios contraídos, tentando prender uma gargalhada. Ela lhe deu um tapa no braço. - Hey! Gina, você não deve bater em um ferido - ele ria, divertido.

- Harry Potter, você é cruel - disse, rindo também. - Não teve a menor graça.

- Então por que você está rindo? - ela tentou ficar séria.

- Porque agora eu tenho certeza de que você está bem - ele ficou sem graça.

- Me desculpe pela brincadeira mas eu não resisti meu amor - disse, colocando a mão sobre a dela. Gina sorriu.

- Todos acharam que você estava morto - ele levou a mão à testa, onde ainda havia uma elevação.

- Não. No máximo poderia passar por um unicórnio agora mas estou bem vivo - ela riu.

- Mas todos acharam que não estivesse. Todos menos eu.

- Então você achou que eu estava vivo? - perguntou, curioso.

- Não. Eu sabia... Eu sentia você ainda - disse, entrelaçando a mão na dele.

Ela inclinou para dar-lhe um beijo mas Sirius e Dumbledore entraram na enfermaria e logo atrás deles vinha o Ministro da Magia, Alastor Moody. Harry tentou se ajeitar na cama mas não foi feliz na tentativa. Ainda estava tonto e dolorido demais.

- Fique deitado Harry - Sirius disse em tom paternal. - Você não precisa se levantar. Nós só queremos que conte exatamente como tudo aconteceu - o rapaz respirou fundo. Gina apertou a mão dele, encorajando-o.

Começou a contar tudo, desde o momento em encontrou o outro rapaz, um garoto muito parecido com ele e de sotaque francês carregado, que havia se perdido do resto do grupo. E que algum tempo depois entrou na antiga residência dos Potter. Não foi muito longe, até o momento em que Gerrard comentou que alguma coisa estava estranha. Harry então viu Voldemort e ele lhes lançou um feitiço. O outro rapaz instintivamente arrancou a espada da mão de Harry, para se defender.

O Lord das Trevas havia lançado um feitiço muito antigo, que ricocheteou na espada, partindo-a ao meio e fulminando o garoto e as paredes, lançando Harry a uma enorme distância do local. Só lembrava do estrondo do teto desabando e mais nada depois, não se lembrava de quem o tinha retirado dos escombros e nem o que tinha acontecido com Voldemort. Dumbledore ficou em silêncio enquanto Harry falava, assim que terminou o diretor olhou sério para ele.

- Isso significa que acabou mesmo.

- Como assim? - Harry perguntou, sem entender.

- Voldemort lançou um feitiço poderoso. Um feitiço que mataria o portador da espada de Godric Gryffindor. Um feitiço criado por Salazar, um feitiço que foi a perdição de Godric no passado. Mas, por ironia, no momento em que ele lançou o feitiço a espada não estava em suas mãos, Harry. Você não era o portador. E por ter invocado tal magia em vão Voldemort pagou um preço. Ele foi derrotado junto com a espada - Gina arregalou os olhos e Harry deu dois apertões na mão dela.

- Como assim derrotado? Quer dizer que...

- A guerra acabou Harry. É só o que posso dizer - Dumbledore disse calmamente, os olhos não traduziam nenhum sentimento.

- Nós vencemos - Alastor disse, sorridente. - Vamos começar a reconstrução de Godric's Hollow assim que enviarmos o restante dos Comensais da Morte para a prisão - Harry ainda não tinha compreendido.

- Então foi simples assim? Voldemort se autodestruiu porque invocou magia poderosa demais contra a pessoa errada e contra a espada de Godric? - Sirius sacudiu a cabeça.

- Nós vimos exatamente o local onde ele estava. Virou um monte de pó. O feitiço era para destruir o portador da espada mas era para atingir você, Harry. Como atingiu o outro menino, e não você, o feitiço se voltou contra o feiticeiro e o fulminou.

- Isso parece brincadeira de tão simples - disse, incrédulo. Gina também estava achando bom demais para ser verdade.

- Amanhã você será transferido para a enfermaria de Hogwarts. O Ministério promoverá um baile comemorativo para angariar fundos para a reconstrução da cidade. Afinal, o fim de Voldemort merece uma grande festa. Vamos fazer um baile em Hogwarts em comemoração - Moody disse, animado; Gina abriu um sorriso.

- Então... Estamos mesmo livres?

- Estamos querida - Sirius respondeu, sorrindo. Gina deixou um bocejo escapar.

- Agora vocês devem descansar. Todos dois! - disse, voltando-se para a menina. - Você não pregou os olhos desde que Harry chegou e precisa estar bem disposta para aproveitar bem o baile - deu uma piscadela para o afilhado. Gina sorriu.

- Eu não quero deixar Harry sozinho - Sirius riu.

- Harry também vai descansar. Eu trouxe uma poção do sono. Ele vai dormir por um bom tempo - Harry rolou os olhos para cima mas sabia que não adiantaria discutir com o padrinho. Gina concordou então.

- Descanse - ela disse para ele, dando-lhe um beijo na mão. - "Eu te amo" - ele leu nos lábios dela. Harry repetiu o gesto dela e colocou a mão sobre o coração.

- "Eu também" - ela leu a resposta em seus lábios.

Gina saiu e os dois foram descansar. Dormiram até quase a hora do almoço. Quando Gina acordou Harry já tinha sido transferido para a enfermaria de Hogwarts, era mais seguro e reservado, já que Godric's Hollow estaria em breve repleta de repórteres e bruxos curiosos querendo saber se os boatos sobre a morte do "menino que sobreviveu" eram verdadeiros.

A Ordem da Fênix julgava ainda necessário o sigilo sobre todo o desfecho da guerra, era melhor deixar a dúvida no ar. Ainda não se sabia ao certo quantos Comensais tinham sobrevivido ao ataque e se soubessem que Harry ainda estava vivo dificilmente tomariam alguma atitude precipitada e se exporiam ao Ministério, muito menos à Ordem da Fênix.

Gina ainda estava na sua barraca quando recebeu uma visita inesperada. Ela se sentou na cama e esfregou os olhos, dando um grande bocejo em seguida. O visitante a observava com um sorriso maroto nos lábios.

- Então os boatos eram mesmo verdade. Você está péssima - ela sorriu.

- Bom dia para você também Draco. Infelizmente eu não posso dizer o mesmo de você - estava extremamente bem arrumado e em comparação às roupas que ela usava, após dois dias sem dormir, o contraste entre o estado dos dois era gritante. Ele sorriu.

- Então ainda não foi dessa vez que eu me livrei do supergaroto maravilha – soltou um muxoxo. - É uma pena, sabe - completou sem emoção enquanto chutava o pé da mesa, que estava completamente torto. Gina o observou tentar duas vezes, então perdeu a paciência e chutou com tanta força que o pé foi separado da mesa, voando longe e a deixando definitivamente mais torta. Ele deu de ombros. - Bem. Não se pode ter tudo que se quer nessa vida - ela franziu a testa. Draco se aproximou. - Eu me referia ao conserto do pé da mesa, é claro - mentiu. - Não estava falando de... - ele travou. - Você sabe... - ela sacudiu a cabeça.

- Eu sei. Como você está? - perguntou, mudando de assunto.

- Vou indo. Eu acho. Pelo menos estou do lado certo dessa vez. O lado dos vencedores. Isso já é uma compensação - ela sacudiu a cabeça.

- Eu esperava que você se considerasse do lado certo por outros motivos - disse calmamente. Ele olhou dentro de seus olhos.

- Você sabe muito bem o que me fez escolher o lado de cá ruiva - ela ignorou o comentário.

- E quanto a Lúcio? - sabia que também havia rompido com o pai e que estava sendo complicado. Draco respirou fundo.

- Eu esperava que você me perguntasse isso. Digamos que Lúcio desapareceu convenientemente do mapa e eu não estou interessado em seu paradeiro - ela percebeu que aquele assunto fazia mal ao amigo e não mencionou mais.

- Você vai fazer o que agora? - perguntou casualmente, ele riu.

- Você disfarça muito mal. Realmente você não tem nada de dissimulada, o que é, de fato, uma pena - ela riu dessa vez.

- Você não respondeu a minha pergunta, Draco - insistiu.

- Muito bem - disse, sentando na cama ao lado dela. - Eu pretendia botar o panaca do Potter para dormir, sabe? Sacrificá-lo. As pessoas fazem isso com cães raivosos ou cavalos que têm as patas quebradas. Eu sinceramente acho que eu poria um fim ao sofrimento do infeliz - Gina sacudiu a cabeça. Ele fez uma pausa para olhar para ela e continuou. - Mas parece que o garoto cicatriz tem mais vidas que um maldito gato – a ruiva riu.

- Obviamente essa não é uma opção. Então você vai fazer o quê? - perguntou de novo. ele torceu os lábios.

- Acho que vou almoçar - ela deu um tapa no braço dele.

- Draco! Você não me respondeu - quase choramingou.

- Você sabe ser irritante mesmo Weasley. Eu ainda não sei o que farei da droga da minha vida depois de Hogwarts, se é o que quer saber. Eu já me sinto com sorte o suficiente se puder continuar a freqüentar a sociedade bruxa – respondeu, ríspido, mas se arrependeu depois, ao ver que tinha exagerado. Gina estava desconcertada.

- Me desculpe - ela abaixou a cabeça. - É que eu me preocupo com você. É só. Não quero que você fique sozinho - disse sinceramente, sentindo-se um trasgo. Ele ergueu o queixo dela com a mão e a encarou.

- Eu vou ficar bem, se é o que te preocupa - respondeu, confiante. - Eu sempre fico. De um jeito ou de outro - estava hipnotizado pelos lábios dela. Gina percebeu e abaixou os olhos. Ele sacudiu a cabeça, para despertar do estado de transe.

- É muito tarde? - perguntou após um incômodo silêncio.

- Já passou da hora do almoço - respondeu mecanicamente.

- Então é muito tarde. Harry já deve estar... - Draco a interrompeu.

- Ele já está em Hogwarts. Black o levou hoje cedo - Gina se surpreendeu.

- Eles o levaram? Nem falaram nada comigo - ele confirmou.

- Eles não tinham tempo. Dumbledore e aquela corja de urubus velhos e depenados do Ministério levaram o seu namoradinho. A droga do lugar está começando a ficar cheia de imbecis da imprensa bruxa e curiosos. Quiseram proteger os chifres do precioso Potter. Não queriam expor o quatro-olhos ao ridículo de estar de cabeça quebrada - Gina sacudiu a cabeça, ignorando as ofensas. - Aliás - prosseguiu. - Eu vim para levar a jovem e triste viúva para casa - Gina franziu a testa.

- Como assim? Viúva? - ele deu um sorriso maroto.

- Na verdade a comunidade bruxa ainda não sabe que a cara feia do Potter não foi realmente arrancada. Então, como não sabem que o fabuloso "cicatriz" está vivo e algum engraçadinho fez o favor de informar à imprensa que você é a namorada do falecido, creio que vão se amontoar em cima de você como moscas no mel - ela suspirou. - Então eu fui escalado especialmente por Dumbledore para escoltar a senhorita até àquela pocilga deplorável que vocês, Weasley, ousam chamar de casa - ela ignorou o comentário sobre A Toca.

- Dumbledore lhe pediu isso pessoalmente? - ele deu uma gargalhada.

- Não exatamente - fez uma pausa. - Mas depois da surra que eu dei naquele seu irmãozinho intrometido a domador de Dragões eu acho que não teria condições de levá-la mesmo - disse, sério. - Então meu papel de cavalheiro é fazer isso por ele - dessa vez ela arregalou os olhos.

- Vo-você não bateu no Carlinhos, bateu? - estava na dúvida. Ele olhou dentro dos olhos dela e passou a mão pelo rosto corado da menina carinhosamente.

- É claro que não ruiva - disse, sorrindo. - Mas eu ameacei aquele seu outro irmãozinho, o petulante do Weasley, se você quer saber - ela suspirou, aliviada. - Você está ficando ingênua demais. Desse jeito você torna irresistível te assustar desse jeito - acrescentou maliciosamente. Ela deteve a mão dele e Draco cessou o carinho que fazia nas bochechas agora escarlates.

- Vamos - ela se encaminhou para a saída mas se lembrou de uma coisa - Draco, como é que o Harry foi encontrado, depois de até mesmo o Sirius ter dado ele como morto? - Draco olhou para ela de forma enigmática.

O olhar cinzento e penetrante poderia congelar qualquer um mas não a ela. Gina o conhecia bem demais para deixar aquela muralha gelada que usava para se proteger a impedir de ver o que estava sentindo. Ela estudou o olhar dele por alguns instantes. E dessa vez foi ele quem desviou o olhar dos olhos castanhos mornos e inquisidores.

- Foi você. Você o encontrou - afirmou, convicta

- Não quero falar sobre isso agora - disse, irritado, ela sorriu.

- Obrigada. Eu sei que deve ter sido difícil para você - ela o abraçou com força e ele ficou completamente desconcertado.

- Eu só não ia agüentar ver você do jeito que o vira-lata do padrinho do Potter ficou. O homem estava completamente fora de si. Chorava feito um bebê - disse, sem jeito.

- E como você descobriu? - perguntou, ainda abraçada a ele, que agora estava tentando decidir se era seguro retribuir ao abraço. Não confiava completamente em si mesmo.

- Eu achei que aquele corpo que encontraram estava muito diferente do Potter - Gina não entendeu.

- Como assim? O corpo estava desfigurado. Como você reconheceu? - ele sentiu o tempo do abraço ultrapassar os limites do suportável e a afastou, aproveitando-se do comentário dela.

- Eu sei lá Weasley. Você está tirando o dia para encher minha paciência? Quantas perguntas... - ela olhou séria para ele e cruzou os braços.

- A gente só sai daqui depois que você me responder isso Draco Malfoy - ele bufou.

- Tudo bem. Você não ia desistir mesmo, ia ficar me atazanando até que a gente chegasse naquele seu barraco mal acabado e eu ia acabar te contando, já que não seria capaz de estrangular você no caminho - fez uma pausa e acrescentou de uma só vez. - É o seguinte: Potter fede! - Gina não pode acreditar no que tinha acabado de dizer.

- Como é que é? - teve uma crise de risos. - Draco, o Harry não fede - ele olhou aborrecido para ela.

- Não é isso ruiva. Ele fede para mim. Não que eu tenha cheirado ele ou coisa assim, por Merlin, eu ainda estou no meu juízo perfeito. O dia em que eu cheirar o Potter me mande direto para St. Mungus - disse, irritado. - É que quando você odeia uma pessoa com todas as forças - Gina estava começando a compreender.

- Ou ama - ela completou. Ele sacudiu a cabeça.

- Você simplesmente... - disse calmamente.

- Sabe - completou, sorrindo. - Eu entendi. Eu também sabia que ele não estava morto.

- É. Eu sabia que o maldito ainda estava vivo quando olhei para aquele defunto e não senti alívio - Gina fez uma careta. - Você me entendeu - emendou. - Eu olhei para aquele corpo sem rosto e simplesmente não senti o que eu saberia que sentiria quando olhasse para o cara de cicatriz morto, entendeu? - ela sacudiu a cabeça.

- Eu só não compreendi uma coisa - ela segurou a mão dele. - Por que você foi procurar por ele? Talvez ele estivesse morto se você não tivesse feito isso - disse de forma delicada. Draco riu.

- Eu nunca vou deixar de imaginar o que teria acontecido se eu e a minha grande curiosidade mórbida não tivéssemos que ir mais pra frente no campo de batalha, até perto de onde encontraram o falso Potter morto - começou. - Mas então eu encontrei o verdadeiro Potter lá, caído e indefeso, não consegui simplesmente chutar as costelas dele e deixá-lo para trás. Eu poderia fazer isso por mim, acredite, eu e ele tínhamos um trato sobre isso, eu nem mesmo teria remorsos. Mas nunca poderia fazer isso com você. Se eu fizesse isso jamais poderia olhar de novo para você - disse, segurando o rosto dela com as mãos.

Draco fechou os olhos e não resistiu. Trouxe o rosto de Gina para perto do seu e tocou os lábios dela gentilmente com os seus. Ela se assustou no início mas retribuiu desajeitadamente. Ele abriu os olhos e a encarou, tentando esquecer o que tinha imaginado fazer. Definitivamente não seria desse jeito se a beijasse. Ela agiria de uma forma completamente diferente da que tinha fantasiado e nunca mais olharia para ele outra vez. Então ignorou o coração acelerado no peito e o impulso de beijá-la e a soltou.

- Vamos embora agora. Eu cansei desse assunto - ela deu de ombros.

- Tudo bem então - ele ergueu uma das sobrancelhas.

- Eu tinha dito que era para você parecer péssima ruiva. Mesmo você não sendo o tipo dissimulada vai ser fácil. Você está em um estado lastimável - ela sorriu.

- Ok Draco, vamos logo. Antes que você me encante com todo esse seu charme e delicadeza - ele se surpreendeu quando ela segurou sua mão e o puxou para fora da tenda.

Draco a conduziu pelo meio da confusão de pessoas gritando até uma carruagem. Acotovelou propositalmente alguns repórteres d'O Profeta Diário e d'A Gazeta do Mago durante o percurso. Xingou alguns curiosos de outros jornais e revistas que gritavam para Gina.

- Srta. Weasley, é verdade que agora a senhorita se mudará para a Sibéria?

- Como a senhorita se sente agora que Harry Potter está morto?

- A senhorita vai abdicar da magia e se casar com um Yeti?

Eram tantos absurdos que ela começou a ficar irritada, Draco estava tão aborrecido quanto Gina. Entraram na carruagem mas não havia espaço para os cavalos andarem, a multidão sacudia e batia na carruagem. Ele bufou duas vezes, ela abaixou a cabeça, desanimada.

- Nós não vamos conseguir sair daqui nunca - ele olhou para ela. Gina percebeu que o loiro tinha tido uma idéia.

- Eu vou dizer algo para eles. Vou dar algo para que escrevam. Espero que você não deixe de falar comigo por isso - Gina franziu a testa. Ele se levantou e abriu a janela, colocando parte do corpo para fora.

- Draco, o que você vai... - ele não deu atenção para ela.

- Hey! Cambada de abutres! - conseguiu a atenção de todos. - Se vocês puderem se afastar um pouco da nossa condução eu posso dar uma declaração em nome da Srta. Weasley - Gina enfiou o rosto entre as mãos. Com certeza falaria algo horrível. - Muito bem. Estou esperando - disse ameaçadoramente para alguns repórteres que ainda estavam próximos à carruagem. - Não quero ter que estuporar ninguém aqui - o grupo de pessoas se afastou. Draco deu um sorrisinho satisfeito.

- A declaração, Sr. Malfoy - um homem mal vestido e de óculos grossos pediu. Draco olhou para ele.

- Ouçam com atenção porque eu sou vou dizer uma única vez - Gina puxou as vestes dele.

- Entra Draco. Não precisa dizer nada. Eles já se afastaram. Vamos embora - choramingou.

- Quieta ruiva, eu quero me divertir às custas deles - disse baixinho para Gina, que respirou fundo.

- Sr. Malfoy? - outro repórter reclamou. Draco sorriu.

- A senhorita Virgínia Weasley está tremendamente chateada com os acontecimentos mas infelizmente não fará nenhum comentário, já que estamos saindo em lua de mel - Gina arregalou os olhos. Os repórteres ficaram chocados e Draco acenou, entrando imediatamente na carruagem, que partiu rapidamente.

- Draco, por que você disse isso? - ela estava tão chocada quanto os repórteres. Draco estava tendo uma crise de risos.

- Eu dei a eles o que comentar não dei? - ela colocou as duas mãos na cintura.

- Draco, você disse uma mentira, vai acabar com a minha reputação. Por Merlin, Harry vai te matar. Pior. Ele vai me matar - Draco riu.

- Vai nada ruiva, sossegue. Às vezes é bom um pouco de atrito entre um casal - Gina bufou e cruzou os braços. - Você vai deixar de falar comigo? - perguntou para ela, que não disse nada. - Por Merlin, você queria que eu fizesse o quê? E, depois, boatos não duram nada, lembra quando aquela estúpida da Skeeter espalhou que o panaca do Potter estava namorando aquela sangue-ruim? - Gina rolou os olhos para cima. - Ninguém acredita no que os jornais dizem. Mas se você vai deixar de falar comigo...

- Eu não vou - estava quase rindo também e ele percebeu.

- Você achou engraçado, não foi? Pode assumir - ela começou a rir.

- Realmente foi patético você em pé na carruagem, inventando mentiras - ele sorriu.

- É só nisso que eu sou bom - disse, orgulhoso. Ela sacudiu a cabeça.

- Não é verdade mas vou deixar você pensar assim, senão você vai ficar presunçoso demais.

A viagem foi rápida. Gina acabou dormindo com a cabeça apoiada no ombro de Draco, o que o fez ficar de péssimo humor, uma vez que odiava querer fazer algo e não poder, efetivamente, fazer. Queria poder abraçá-la, beijá-la, tê-la. Mas sabia que não poderia, que ela não permitiria, nunca. Então fechou os olhos e tentou ignorar o calor dela e seu cheiro doce o inebriando. Quando a carruagem parou os pais dela vieram buscá-la. Cumprimentaram Draco formalmente e depois Gina agradeceu e se despediu do amigo com um abraço.

- Vejo você em Hogwarts. No baile comemorativo - ele sacudiu a cabeça e partiu.

Gina agora estava ansiosa para ver Harry e esclarecer tudo sobre a declaração mentirosa de Draco.