Cap. II

- Helena Granger?

- Bem, não propriamente. Na verdade, Helena Clunsk. Granger é meu sobrenome do meio, porque meus pais assim se chamavam, mas meu pai adotivo chama-se Rudolph Clunsk. - Parou, aparentemente sem fôlego. Continuaram a se olhar fixamente, ainda chocadas, mas com um cerscente senso de identificação.

- Você sabe quem é seu pai verdadeiro? - Hermione por fim perguntou.

- Nunca o conheci. Desde pequena soube que eu era adotada. Meus pais adotivos decidiram manter o sobrenome que tinha, e acrescentaram o deles.

Hermione pensou no pai. Vago, lento, exasperante, mas sempre totalmente honesto e verdadeiro. Pensou: "Ele não teria feito isso. Ele não teria feito isso sem nunca ao menos ter me contado. E mamãe, por que nunca mencionou nada?"

O silêncio se alongava entre as duas. Helena parecia não ter mais nada a dizer. Com esforço, Hermione procurou as palavras.

- Quantos anos você tem?

- Vinte e dois. Nasci sob o signo de gêmeos. Bem apropriado, se preferir.

"Minha gêmea. Minha irmã". - Mas o que aconteceu? - Quis saber Hermione.

- Bom, eles devem ter tido suas razões e não os culpo por isso. Sei que são trouxas e duas bruxas na família deve ter sido demais para eles.

- Mas, você fazia alguma idéia disso, quer dizer, que tinha um irmã?

- Não fazia a menor idéia. E você?

- Não. Isso é que me perturba.

- Porque isso a perturba? É um comportamento humano justo. Não se sentiram capazes de criar nós duas.

- Acho que eles deveriam ter-nos contado.

- E que benefício traria? Que diferênça teria feito?

Era óbvio que Helena estava muito mais divertida com a situação do que atordoada.

- Acho tudo isso fantástico - prosseguiu. - E o mais hilariante de tudo foi termos nos encontrado assim, por acaso. Já esteve neste restaurante?

- Nunca.

- Quer dizer que acabou de entrar?

- Cheguei a Londres esta noite. Estive em Hogwarts o ano inteiro.

- Isso torna tudo mais inacreditável do que nunca. Nessa cidade imensa... - fez um gesto com as mãos deixando a frase terminar por si mesma. - Passou os dedos entre os cabelos, da testa a parte de trás, um gesto que Hermione reconheceu, um pouco chocada, como sendo uma de suas manias. - O que fazia em Hogwarts? - Perguntou Helena.

- Eu sou professora lá, há mais de um ano. Estou de férias, então resolvi vir para Londres, um pouco de contato com o mundo sabe... - Era ridículo continuar a se sentir tão perturbada. Aliás, resolveu agir da mesma forma que Helena diante daquela situação excepcional. - E o que aconteceu com você? - a pergunta soava artificial como um convidado numa festa formal.

- Meus pais são pessoas maravilhosas. Quando eu tinha cerca de 3 anos meu pai foi trabalhar no ministério francês.

- Então você foi criada na França?

- Pode-se dizer que sim. Se não estávamos em Paris, estávamos em Roma ou Frankfurt. Você sabe como é.

- Seus pais são legais? Quero dizer...

- Sim. São ótimos, meu pai é bruxo e minha mãe trouxa, mas ela é bem acostumada com tudo, se é que me entende .

"E terrivelmente ricos", pensou Hermione, olhando para as roupas caras da irmã.

- Nós três estivemos fazendo uma viagem, agora estão em Nova York. Mamãe queria que eu ficassem por lá, mas eu tive que voltar para Londres porque...

Nesse momento foram interronpidas mais uma vez por Rory retornando com a garrafa de champanha e três copos. Ele retirou a rolha de cortiça e deitou o vinho, passando o gargalo da garrafa de um copo a outro sem derramar uma gota. Levantou o copo para brindar com elas.

- À reunião. A irmãs que se encontraram. E, eu acho, um ato de Deus.

- Obrigada - agradeceu Hermione.

- Felicidades! - desejou Helena.

Rory partiu mais uma vez, agora com os olhos completamente úmidos, e elas foram deixadas a sós, com a garrafa de champanha.

- Provavelmente vamos ficar bêbadas - falou Helena - mas não se incomode com isso. Onde estávamos?

- Você estava dizendo que dos Estados Unidos teve que voltar a Londres.

- Oh, certo. Mas agora, acho que vou para a Grécia. Talvez amanhã, ou depois de amanhã. Não decidi exatamente quando.

Parecia uma dama maravilhosa em uma vida impulsiva.

- Onde você está hospedada? - perguntou Hermione, imaginando que a resposta fosse um hotel de luxo. Contudo, parecia que o trabalho de Rudoph Clunsk rendia o bastante para comprar uma casa em Londres bem como em Paris, Frankfurt e Roma.

- Logo ali na esquina - respondeu Helena. - Sempre ando até aqui quando quero comer alguma coisa. E quanto a você?

- Você quer dizer, onde eu moro? Em Hogwarts, já disse: cheguei de lá hoje. Ia ficar com um amigo, só que não deu certo - Harry havia desmarcado na última hora, pois devido a algumas decisões dos seus superiores, ele era auror, teria que se mudar o mais rápido possível - portanto tenho que achar um lugar para ficar.

- Onde vai passar a noite?

Hermione contou-lhe sobre o pequeno quarto no Caldeirão Furado, a bagagem deixada lá de qualquer jeito e atmosfera sufocante.

- É um lugar deprimente. Mas não tem importância é só por uma noite. - Ela se deu conta de que Helena a olhava com uma expressão ousada e pensativa em seus olhos castanhos. ( Eu já olhei assim?, pensou Hermione. A palavra calculista surgiu em sua mente e teve de ser expulsa com esforço.)

Helena então declarou: - Não volte. - Hermione olhou espantada. - Quero dizer: vamos comer alguma coisa aqui e depois encontrar um taxi, ir e pegar sua bagagem. Iremos à casa do meu pai. Você poderá ficar lá. É ampla e tem uma porção de camas. Além disso se eu for para a Grécia amanhã, não verei mais você e temos tanto para conversar. Precisamos de uma noite inteira para isso. De qualquer modo, é ótimo porque poderá ficar na casa após eu partir. Pode ficar lá o tempo que precisar.

- Mas... - Por algum motivo, Hermione percebeu que estava procurando obstáculos a esse plano aparentemente maravilhoso. - Mas ninguém vai se importar? - foi tudo o que conseguiu sugerir.

- Quem deveria se importar? Eu combino tudo com os elfos. Papai nunca se importa com o que eu faço. E quanto a mamãe... - estava se divertindo com alguma coisa. Não terminou a frase e começou a rir. - O que diriam se pudessem nos ver agora? Juntas, ficando amigas. O que você acha que seu pai diria?

Hermione evitou a idéia. - Não imagino.

- Vai contar a ele que nos encontramos?

- Não sei. Talvez. Um dia.

- Foi uma crueldade fazer isso? - perguntou Helena pensativa de repente. - Separar gêmeas idênticas. Gêmeos idênticos foram feitos para ser duas metades de uma mesma pessoa. Separar-nos foi, talvez, como cortar essa pessoa ao meio.

- Nesse caso, eles podem ter nos feito uma bondade.

Os olhos de Helena estreitaram-se.

- Estou pensando: porque escolheram você e não a mim?

- Talvez tenham tirado a sorte com uma moeda - replicou Hermione levianamente porque, por algum motivo, não conseguia pensar no assunto.

- Teria saido tudo as avessas se a moeda tivesse caído do outro lado?

- Certamente teria sido diferente.

Diferente. Ela pensou nos pais com a lareira acesa e o cheiro de alcatrão da madeira queimada. Lembrou com ternura das férias passadas juntos.

- Desejaria que tivesse sido diferente? - Perguntou Hermione.

Helena sorriu. - Não.