18 anos... Sim, nesse dia eu fazia dezoito anos. Isso significava a minha entrada no mundo adulto e a minha saída do orfanato. Não podia mais ficar lá... Dona Matilde disse que arranjara um emprego na peixaria para mim, o que ela arranjava para todos, mas eu não queria ir. Queria ir para o centro de Londres ver se arranjava alguma coisa...
Eu não queria deixar a Pâmela, nem dona Matilde... As crianças então! Eu queria ver se o destino me colocava alguém na frente que me pudesse ajudar a encontrar minha família, se é que eu ainda tinha uma.
No dia seguinte eu iria embora e muita coisa iria mudar, uma confusão iria começar na minha vida.
Vanessa havia saído no ano anterior, ela foi para a peixaria... Não sabia como ela estava, mas esperava que não estivesse pior do que quando saiu do orfanato. Porque do jeito que era, a vida não lhe ia ser piedosa.
- Mel? – uma voz atrás de mim. Era a Pâmela. Eu me virei, ela chorava e me abraçou.
- O que foi? – eu perguntei.
- Vai embora amanhã, vai esquecer d'a gente... – ela me disse, entre soluços.
- Não, Pâm, eu nunca vou esquecer vocês! Vocês são a minha família, sempre foram! Principalmente você que sempre me deu força... Sabe, eu nunca fui adotada, mas... Mas eu acho que não teria uma mãe melhor que você.
- E eu gosto de você como se fosse minha filha, Mel – ela me disse, abraçando-me de novo.
- Escuta, eu vou embora, mas sempre que puder eu venho aqui e depois que eu conseguir uma casa, eu quero que você e dona Matilde me visitem! – eu disse, olhando nos olhos dela e me esforçando para não começar a chorar também.
- Olha, eu tenho uma coisa pra você... – ela disse, tirando algo do bolso. Era um tipo de amuleto. Parecia um mapa, mas era estranho, não tinha nada marcando coisa nenhuma. De um lado tinha um coração e um... A imagem não era muito nítida, mas parecia um lobo. E do outro lado tinha uma adaga e uma corrente se cruzando com outra. No meio deles passavam duas linhas, uma indo para o coração e outra para a adaga. – É um amuleto. Carregue sempre com você. Quando você estiver confusa, sente, pense no problema e deixe a mente livre, ele a ajudará a encontrar o caminho certo. Mas tome cuidado, o caminho certo nem sempre é o mais fácil e nem o que parece.
Eu não entendi muito bem a última frase que ela disse, mas iria tomar seus conselhos para a vida. Só esperava agir certo quando tivesse de escolher.
- Obrigada, eu nunca vou me separar dele, Pâm – eu disse, abraçando-a.
- Ah, menina... Eu via um futuro tão melhor para você, você não deveria ir para aquela fábrica de peixes... – ela disse. É, eu não queria ir para lá.
- Mas eu não vou pra lá – disse sorrindo. – Pâm, eu vou para o centro de Londres, vou ver se consigo me empregar em algum restaurante, quem sabe até acabar de estudar!
- Você vai conseguir, eu confio em você – ela disse e me abraçou.
[...]
- Obrigada por tudo que fizeram por mim, sou muito grata – disse, me despedindo de Dona Matilde e de Pâmela.
Algumas crianças abriram o berreiro! Era eu quem cuidava delas quando tinham pesadelos e etc, tinha de ajudar Dona Matilde e Pâmela de alguma forma.
E eu saí dali. O meu único lar durante dez anos. Dez rápidos anos, eu diria... Eu lembro como se fosse ontem de quando Dona Matilde me encontrou na rua, eu sem nenhuma memória. Mas de qualquer forma, agora é um começo para mim.
Fui até o meio do caminho, onde tinham duas estradas. Uma ia parar na fábrica de peixes. A outra iria para Londres. Eu parei e pensei... Se eu for para a fábrica, eu vou continuar sendo uma ninguém. Se for para Londres poderei tentar encontrar a minha família. Se bem que meu pai parecia tão desesperado que nem sei se está vivo...
"Heart don't fail me now
(Coração não me falhe agora)
Courage don't desert me, don't turn back now that we're here
(Coragem não me
abandone, não voltem atrás agora que já estamos aqui)
People always say life is full of choices
(As pessoas sempre dizem
que a vida é cheia de escolhas)
No one ever mentions fear
(Nunca
ninguém menciona o medo)
Or how the world can seem so long
(Ou como o mundo pode
parecer tão longo)
Or how the world can seem so vast
(Ou como o mundo pode
parecer tão vasto)
Courage see me through
(Coragem,
fique comigo)
Heart I'm trusting you, on this journey to the past...
(Coração estou confiando
em você, nesta viagem ao passado…)
Somewhere down this road, I know someone's
waiting
(Em algum lugar no fim
desta estrada eu sei que alguém está esperando)
Years of dreams just can't be wrong
(Anos de sonhos
simplesmente não podem estar errados)
Oh arms will open wide, I'll be safe and wanted
(Oh, os braços vão se
abrir, eu serei protegida e querida)
Finally home where I belong
(Finalmente em casa onde
pertenço)
Well starting here my life begins
(Bom, a partir daqui a
minha vida começa)
Starting now I'm learning fast
(Começando agora estou
aprendendo depressa)
Courage see me through
(Coragem,
fique comigo)
Heart im trusting you, on this journey to the past...
(Coração estou confiando
em você, nesta viagem ao passado…)
Home,
love, family; there was once a time I must have had them too
(Casa, amor, família,
houve uma época em que eu também os devo ter tido)
Home, love, family; I will never be complete until I find you (heyyy)
(Casa, amor, família,
nunca estarei completa até os encontrar)
One step at a time
(Um passo de cada vez)
One hope then another
(Uma esperança e depois
outra)
Who knows where this road may go?
(Quem sabe até onde esta
estrada pode ir?)
Back to who I was
(De
volta a quem eu era)
On to find my future
(Continuando
a procurar o meu futuro)
Still my heart still needs to know
(O meu coração ainda precisa
de saber)
Yes let this be a sign
(Sim que isto seja um
sinal)
Let this road be mine
(Que
esta estrada seja minha)
Let it lead me to my past
(Deixa que me conduza ao
meu passado)
Courage see me through
(Coragem,
fique comigo)
Heart I'm trusting you
(Coração, estou
confiando em você)
To bring me home
(Para me levar a casa)
At last
(Finalmente)
Então tomei o caminho para Londres. Pâmela tinha me dado algumas libras que dariam para passar pelo menos três dias em algum lugar até arranjar emprego.
Primeiro eu andei atrás de algum lugar que me hospedasse e tal, não podia andar pela cidade o dia inteiro e no final não ter onde ficar. Consegui um quartinho num bar. Tudo era muito velho, mas dava.
Depois peguei um jornal que jogaram fora e vi os lugares que estavam oferecendo empregos. Não eram muitos. Primeiro fui a um restaurante fino e eles não quiseram me empregar. Depois a um teatro velho, onde ainda tinham umas poucas e precárias apresentações, eles não quiseram que eu fizesse a faxina. E por último voltei ao bar em que tinha alugado o quarto, minha última esperança do dia. Eu quase implorei pelo trabalho! E então iria trabalhar de garçonete lá. Começaria no dia seguinte! Eu disse ao dono que não tinha como pagar a minha hospedagem e que precisava logo receber alguma coisa. Ele disse que eu era abusada, mas que na primeira semana ele me dava algumas libras.
Então era isso... Iria trabalhar lá até não sabia quando...
