Capítulo 12: A iniciação


Notas da Autora: Esse capítulo é um tanto incomum. Em determinados momentos, nós veremos coisas pelo PoV da Eilan, eu não consegui resistir a descrever a vivência dela da iniciação. Mas não precisam me xingar, eu não farei mais isso ^^ A parte referente aos cultos foi baseada no livro A Casa da Floresta.


Na manhã seguinte Gina estava bastante satisfeita. Eilan sorriu debochadamente para ela com malicia no café, fazendo-a se perguntar o que a garota sabia. Quando questionou a Sonserina, ela disse que não sabia nada – nem queria saber, apenas estava respondendo a cara com que Draco chegou na sala comunal da Sonserina. Depois tornou a convocar-lhe para a encontrar na frente do banheiro das monitoras às nove da manhã de sábado. Gina nem conseguiu se perguntar como sabia onde era o banheiro se não era monitora, mas, não fazia a menor diferença.

Colin, obviamente, se interessou em saber se tinha dado tudo certo mas não quis ouvir detalhes porque, segundo ele, essas coisas não era nada interessantes de ouvir ou imaginar. Os dois riram com gosto, juntos, e Marin riu com eles. As duas meninas fizeram as pazes mas certamente a ruiva não contaria a outra o que acontecera. Primeiro porque sua confiança estava ainda abalada. Segundo porque sabia que a menina não queria mesmo ouvir. Aquilo só traria mais dor, desavenças e tristeza para o relacionamento das duas, que tinham entrado em um acordo silencioso de não mencionar o relacionamento de Gina com Draco a menos que fosse realmente inevitável.

Mas apesar de todos insistirem em não a pressionar para saber o que acontecera ela sentia a necessidade de conversar com alguém. Alguém que gostasse dela e compreendesse o que estava passando. Alguém em quem confiasse e que tivesse passado pelo mesmo. No entanto parecia que todas as pessoas que poderia conversar estavam desinteressadas ou pelo menos não tinham condições de ajudar.

Foi movida por essa necessidade que se viu procurando a última garota que gostaria de falar sobre Draco.

Bateu de leve na porta de madeira do quarto da monitora-chefe e Hermione abriu em alguns minutos. A noite de quinta estava escura e fria, como era de se esperar do inverno no hemisfério norte. Por um instante imaginou se não estaria sendo pouco leal com o namorado ao falar o que pretendia para a garota mas pensando nos seus últimos encontros durante a semana, que apesar de não terem sido como o na sala de astronomia, vinham sendo muito animadinhos, ela se decidiu.

- Gina? – perguntou levemente surpresa. – Aconteceu alguma coisa?

- Posso entrar, Hermione?

- Claro – a garota lhe deu passagem. – O que houve?

- Nada demais. Eu apenas queria te fazer uma pergunta.

- Fale – falou, com uma expressão confusa.

- É sobre você e o Rony... - Hermione pareceu ainda mais confusa, como se aquilo fosse possível. - Vocês estão juntos tem quase um ano, não é? - A outra concordou com a cabeça, sem entender. - Vocês... Já... Ahn... Alguma vez... Já... Bem...

- O quê?

- Já... Fizeram alguma coisa além de beijos, mãos dadas e aquilo que todo mundo vê?

No mesmo instante se arrependeu de ter perguntado ao notar a amiga corar furiosamente e perguntar com ar embaraçado:

- O que aquele maldito Draco Malfoy andou te falando?

Gina ergueu as sobrancelhas.

- Ele não me disse nada. Por quê, isso é um sim? - A menina corou ainda mais.

- Deixe para lá. Ele tinha me dado a entender que... Mas... Se não... Por que o interesse?

- Você não respondeu a minha pergunta.

- Por que você quer saber?

- Responda minha pergunta e eu responderei a sua!

Hermione abaixou a cabeça, corando, e depois levantou, encarando a ruiva com ar de desafio.

- Já.

- Vocês chegaram a... A... Aos finalmente? – era a vez de Gina corar.

- Não! – apressou-se a falar, corando, e depois relaxando um pouco. – Eu acho que não estou pronta... Mas... Por que o interesse?

- Hum... Nada... Eu apenas...

- Não me diga que você... Você e o Malfoy, quero dizer, Draco... Vocês não...?

- Também não – suspirou.

- Então por que...?

Gina olhou para os próprios joelhos e então pôs os olhos nos olhos da amiga e contou, detalhe por detalhe o que acontecera. A amiga não falara nada, não julgara e até sorrira, tudo que Gina sentiu ao se deitar na cama naquela noite, era apenas uma paz, por não ser a única, por não estar sozinha... Assim, dormiu.


Agasalhou-se bastante antes de descer na direção do banheiro das monitoras. Quando finalmente viu Eilan se espantou que estivesse usando uma túnica azul profundo de linho ao invés das vestes da escola. Havia algo de sobre-humano na visão da sonserina com aquela roupa, seus cabelos ondulados soltos caindo sobre seus ombros. Seus olhos se encontraram e não pela primeira vez em sua vida mas ao menos pela primeira vez com aquela garota, Virginia teve certeza de que aquele momento já acontecera centenas de vezes antes.

A loira se aproximou dela e beijou-lhe a face.

- Hoje eu vejo, a face da deusa reflete também em você.

- Como? – perguntou educadamente.

- Um dia, Virgínia, você entenderá. Um dia – ela suspirou e estendeu um embrulho para a ruiva. – Nós vamos visitar Caillean Malfoy hoje mas ela não estará sozinha e preciso que você use isto.

Entraram no banheiro das monitoras e vestiu a túnica bege que a outra lhe entregara. Quando se viu no espelho, pôde ouvir uma voz em sua mente. Por que, minha filha, nunca se dedica a mim? Quando virou para Eilan percebeu que esta estava em uma profunda viajem interior.

- Eilan? Eilan! – chamou e a menina sacudiu a cabeça,

- Vamos, vamos – respondeu etérea.

As duas caminharam até os jardins, onde a carruagem as levou para Hogsmeade. Gina estranhou mas Eilan disse apenas que Dumbledore sabia que estava indo e que ainda era muito cedo para alguém dar pela falta da ruiva.

- Não voltaremos hoje, ainda. Apenas de madrugada. Avisei o diretor que te levaria, e ele não se opôs. Acho que ele concorda que Caillean precisa te ver.

A grifinória não ousou perguntar mais nada. A carruagem parou suavemente na frente de uma mansão, Eilan desceu e a conduziu para os fundos da casa, que acabavam na Floresta Proibida.

Gina se assustou ao ver a quantidade de mulheres vestidas de túnica azul que se encontravam na parte da floresta aos fundos da casa branca enorme onde morava Caillean Malfoy. Notou que todas a olhavam com um ar ao mesmo tempo preocupado e indulgente, todas com a meia-lua gravada entre as sobrancelhas. Eilan, ao seu lado, andava de forma engraçada, como se deslizasse. Seus cabelos flamejantes e sua túnica bege a faziam um ponto destoante do conjunto. Seguiam pelo corredor formado pelas mulheres em direção aquela que era, claramente, a mais poderosa. Um véu azul cobria seus cabelos que começavam a ser salpicados por brancos, sua gargantilha e seus braceletes eram de outro e a meia-lua interrompida por uma linha de expressão.

- Filha de Don – falou gravemente, olhando para Eilan. – Você assumiu um compromisso, de se testar a fim de se tornar uma sacerdotisa da Grande Deusa. No entanto, menina Eilan, trouxe uma garota – seus olhos se demoraram por algum tempo em Gina, que estremeceu –, uma garota bruxa e não iniciada nas tradições e mistérios druidas, sabendo que não é permitido que veja sua iniciação.

- Me perdoe, senhora Miellyn – ela falou e pela primeira vez Gina pôde ver humildade em seus olhos e palavras – Esta menina bruxa, Virgínia Isabelle Weasley, é uma vidente e vim apresentá-la ao conselho do oráculo, por ordem de Caillean.

O olhar de Miellyn foi até a outra sacerdotisa com irritação.

- Sua iniciação será apenas à noite. Até lá, o conselho se ocupará de Virgínia – decretou Caillean. Miellyn ainda estava com o rosto fechado. – Senhora – falou brandamente. –, todas nós sabemos que a iniciação será depois do sol se pôr. Não caia na paixão pela sua posição, menina Miellyn.

- Caillean, você pode ser a chefe das feiticeiras, mas eu ainda sou a Suma-Sacerdotisa da Bretanha.

- Não questiono isso, Senhora – ela falou de forma desafiadora. –, mas sei que posso lhe dar conselhos mesmo assim. Eu tenho motivos suficientes para acreditar que Virgínia é uma peça importante na história da família que assumi e também reconheço seus dons. Eu nunca fui uma vidente como você, Miellyn, mas sei reconhecer uma.

- Ela não é uma sacerdotisa. Não tem nenhum sangue druida.

- Talvez não, Miellyn, mas isso não a impede de ser uma vidente. Vidente, eu digo, não oráculo como são vocês, sacerdotisas puras. Eu falo de bruxas.

- Nós a analisaremos – falou uma terceira mulher, que não se identificou. – À noite, antes que Eilan seja iniciada, nós a veremos. Não há mal nenhum que fique aqui enquanto isso. Não há mal nenhum, pois quem sabe um dia ela não venha se juntar a nós?

A Suma-Sacerdotisa acenou com a cabeça, apesar da discordância estar estampada em sua face.

- Então, será como Lotte disse – falou Caillean sorrindo. – Que comecem os ritos!

Uma das sacerdotisas mais jovens – talvez com menos idade que ela e Eilan – pegou em uma de suas mãos e outra a segurou pelo outro lado, começaram a rodar, rodar, e a música se espalhava pelo ar. As palavras saíam naturalmente da boca de Gina como se as conhecesse bem e de repente havia tanta harmonia a sua volta que deixou de se importar.


Gina se sentia exausta, como se tivesse passado o dia inteiro cantando e dançando, mas era apenas a hora do almoço. A governanta de Caillean, uma mulher chamada Nárnia, trouxe a comida e Lotte conjurou mesas. Claramente, aquilo não agradava em nada a Senhora Miellyn e Eilan parecia tão quieta e calada que chegava a assustar.

- Ela está apenas nervosa por conta da iniciação – falou Lotte suavemente. – Não se preocupe, querida, todas ficamos desta maneira, você também ficará.

- Eu? – perguntou, confusa. – Mas eu não pretendo me tornar uma de vocês.

- Você será – respondeu a outra, parecendo confiante. – Ou pelo menos participará da nossa vida. Eu te vi, menina Weasley. Muitas vezes, em Ottery St. Chapole. Muito perto de nossa casa de donzelas.

- Eu moro ali perto.

As horas se passaram rapidamente: houve mais cantoria e até mais danças, enquanto Eilan se retirava do convívio das demais sacerdotisas, sentada no chão da floresta, cuja neve tinha derretido naquela semana.

- Eu não entendi até agora por que me trouxe – falou a grifinória, sentando a seu lado.

- Você precisava ver Caillean. Eu posso estar de protegendo a cada noite, mas ela também estava. Mais que eu, suponho. Ou eu não teria tido forças para mais nada.

- Como assim?

- Eu fico semiconsciente – por todo o tempo a loira não virara o rosto para a outra. – Meu corpo descansa mas minha essência estava alerta, consciente, velando seu sono. Mas Dumbledore disse que... Provavelmente durante essa semana alguém vai vir... E banir Tom... - Gina suspirou, aliviada.

- Ele não falou comigo.

- Eu acho que estava esperando a confirmação. Suponho. Sei lá.

As duas ficaram em silêncio enquanto as mulheres prosseguiam com a música e a dança. Parecia algum tipo de festa.

- Estão celebrando minha entrada do círculo das sacerdotisas. Mas talvez eu não deva...

- Por que não? Parece que você espera isso há tempos!

- Eu... Ah, você não entende... Eu... Quando você faz seus votos, você deve jurar...

- Castidade? – perguntou, lembrando dos comentários de Marin. – E...? Não acredito que isso te faça inapta.

- Pessoalmente, nem eu, Virgínia. Nem Caillean, nem Lotte... Mas é Miellyn quem decide das coisas, não nenhuma delas... Quando eu contei a Caillean ela me castigou severamente... Mas não quis que eu parasse de treinar, em nenhum momento disse que eu não poderia me consagrar. A maioria delas... Têm vidas normais, casamentos, filhos... Mas, seguem suas vidas guiadas pela vontade da Deusa... Só amaram os homens que Ela escolheu ou exigiu que amassem... Não eu. Eu me deixei levar.

- Foi Draco?

A menina se limitou a acenar a cabeça. O silêncio tornou a dominar a situação até que as sacerdotisas vieram dançar a volta delas e a própria Eilan se levantou para dançar, sendo abraçada e beijada por cada uma das mulheres conforme dançava. Sem notar, quase hipnóticamente Gina levantou e dançou com elas, dançou com Eilan e Lotte. Quando seus braços encontraram os de Caillean a força do olhar da mulher a atingiu, sem amedronta-la. Então soube que aquela mulher tinha, de alguma forma, mudado sua vida.


- Estamos aqui reunidas mais uma vez para discutir sobre uma menina indicada a nós por nossa amiga Caillean. Digo a todas vocês por que devemos falar desta menina: é uma vidente, à moda bruxa. Não tem parentes entre nós nem sangue bretão. Pelo contrário, os Weasleys são conhecidos por sua grande prole e pelo seu sangue puro. Mas esta é uma vidente, não raros em sua família... Viu, vê e verá, portanto, nos interessa.

As sacerdotisas do oráculo estavam sentadas em círculo enquanto as demais comiam à luz das primeiras fogueiras e estrelas. Gina estava sentada à esquerda de Caillean e à direita de Eilan. Nenhuma das duas, no entanto, a olhava.

- Virgínia Isabelle Weasley é a mulher predestinada – interviu Caillean. – Eu não sou uma sacerdotisa do Oráculo nem nunca tencionei ser a voz da Deusa mas sei de determinadas coisas, preservo minha família, seus costumes e história. A garota é a salvação do futuro da minha casa e eu desejo que seja instruída para controlar essa vidência. Mantê-la à salvo, manter o futuro dos meus a salvo. Mas não é egoísmo que me move, é proteção.

- Tenho que te dar esse crédito – falou Lotte. – Você nunca age apenas para se beneficiar.

- Portanto não juramos todas nós tratar cada mulher como nossa irmã, mãe e filha? Esta menina é nossa irmã e será minha neta. Logo, temos a obrigação e o prazer de ajudá-la.

Todas ficaram em silêncio até que Miellyn falou, a voz grave e contrariada.

- Virgínia Isabelle Weasley deverá ser internada em Valaineamon por um período de dois anos quando completar sua formação escolar. Em regime interno será iniciada e instruída nas artes de proteção e visão, após este período deverá deixar o santuário e seguir sua vida, jurando não transmitir os conhecimentos lá aprendidos para ninguém a menos que tenha a devida autorização da Suma-Sacerdotisa, ou seja, eu.

Gina olhou para o rosto severo da mulher, sua meia lua quase desaparecendo de tão forte que a linha de expressão marcava a testa, os olhos escuros a fitavam sem o menor traço de suavidade. Sentiu pouco apreço ou admiração por ela, não tinha a mesma postura amável de Lotte ou a mesma aura de poder e honra de Caillean. No entanto, caso concordasse, estaria subordinada a ela. E se Eilan, que era Eilan. conseguia fazer aquilo, também conseguiria. Mas havia algo mais importante do que Miellyn para que aceitasse.

- Por que? – falou alto e todas se voltaram para ela. – Por que eu devo estudar essas coisas?

- Caillean está a induzindo sem ao menos lhe explicar? – perguntou Miellyn com sarcasmo e desgosto. – Não conta muito a seu favor, não é? Facilmente manipulada, não é o tipo de pessoa que...

- Miellyn! – alertou uma sacerdotisa velha de cabelos prateados. – A menina não tem culpa se disseram a ela que viesse para seu bem mas nada mais lhe disseram. Tampouco culpe Caillean, nenhuma de nós teve tempo de conversar com a garota. Só menina Eilan poderia ter feito isso, no entanto não devemos a culpar. Tinha muito com que se preocupar.

- Mas, Ganeda...

- Não continue, Miellyn. Ainda sou sua mãe – seu rosto era tão sério quanto o da outra mulher, então sua expressão se aliviou e falou com a ruiva. – Jovem, nós te ensinaremos a se proteger dos sentimentos alheios, de forma a não prejudicar sua visão e a evitá-las ou chamá-las de acordo com as necessidades. Também te ensinaremos a se bloquear para espíritos malignos e a intervir em sonhos, transportar sua imagem, embora isso seja de pouco uso para uma bruxa.

- Então, Virgínia, filha de Molly – falou Caillean, poderosa e temível. – Concorda em se comprometer com a deusa e seus desígnios?

Ela ficou quieta por muito tempo, pensando em tudo que ouvira falar daquelas mulheres por seus pais e Marin. "São libertas, despudoradas e perigosas", ouvia sua mãe reclamar ao vê-las colhendo verduras próximas A Toca. "Foram as primeiras mulheres a terem o poder e sempre foram muito sábias mas ainda são religiosas de maneira fanática e todo fanatismo pode se mostrar uma fraqueza ou uma tendência maléfica, você vê, Slytherin era um fanático, Grindwald foi outro e Você-sabe-quem também o é" Diria Arthur. "Loucas. Acreditam em bobagens. São umas tontas, puritanas." Levantou os olhos até encontrar os azuis e frios da mulher que a chamara de irmã e neta.

- Comprometo-me.

- Compromete-se a tratar cada uma de nós como sua mãe, irmã e filha, e a cada irmã que vier a ti em paz?

- Comprometo-me.

- Compromete-se a não se entregar a homem nenhum, a não ser aquele que a Deusa designar a você?

As duas se encararam e depois olhou Eilan, que acenou a cabeça afirmativamente.

- Comprometo-me.

- Compromete-se a não revelar nossos ensinamentos a nenhuma pessoa e não trair seus votos?

- Comprometo-me.

- Por fim, está fazendo isso por sua própria vontade? Sem ser obrigada ou sem ser maltratada.

- Claro que...

- É uma formalidade.

- Estou.

- Então você está aceita no círculo da deusa.


- Tudo que você deve fazer – falou Lotte – é atravessar a floresta até chegar ao lago. Miellyn, Caillean e as outras estão lá te esperando – observou o rosto ao mesmo tempo calmo e apreensivo da jovem menina. "Cada vez mais jovens, essas meninas para o oráculo." – Não se preocupe, minha querida, você vai conseguir.

A loira acenou com a cabeça e começou a entrar mais pra dentro da floresta, pedindo a ajuda da terra e seus fundamentos para encontrar o caminho correto. Não temia os habitantes da floresta pois sabia que andava no passo tranqüilo das sacerdotisas. Elevou sua voz em um canto suave, honrando a lua que crescia no céu, sabendo que aquilo a protegeria de presenças hostis. Seus pés tocavam a terra úmida afundando, mas não sentia como se estivesse se sujando, apenas seguia em frente sem se importar com o mundo a sua volta, concentrava-se apenas em atravessar as árvores para chegar ao lago.

Ouviu o som de cascos e calou-se involuntariamente. Os centauros estavam ainda muito raivosos e cada vez repudiando mais os humanos. Talvez não a vissem como uma pessoa pacifica e tão preocupada com aquele ambiente quanto ela. Tremeu ao ver o centauro com longos cabelos castanhos aparecer por entre as árvores.

- Humana - ele falou com a voz forte e severa –, o que faz aqui?

- Estou a serviço da Grande Deusa – sua voz assumiu o timbre controlado que aprendera e o medo a abandonou.

- Não vejo em você o sinal Dela – respondeu rudemente. – Vejo roupas mas vestimentas não transformam pessoas em coisas que não são.

- Não vê o sinal Dela porque ainda não o tenho, estou agora em minha provação, ou estava até te encontrar, Centauro. Mas não vê que ela está em mim?

Sorriu brandamente para o meio-homem meio-cavalo e viu os olhos dele se abrirem com surpresa enquanto a encarava. Supôs que conseguia ver a Deusa através do seu rosto. "Minha filha, você é o reflexo de minha luz e de minha face", ouviu a voz dentro de si dizer.

- Siga em frente, humana. Você leva a face dela consigo, e todas aquelas que pertencem a Ela, são bem vindas nesta floresta.

- Que Ela te abençoe – respondeu cordialmente.

Seguiu por mais alguns passos, tendo a certeza de que estava na direção correta, até que toda a floresta pareceu refletir o luar e já não sabia aonde estava. Tentou se acalmar e encontrar o caminho correto mas parecia que aquelas árvores estavam trocando de lugar para que se perdesse. Não que isso fosse difícil na Floresta Proibida, mas assustava de qualquer maneira. Continuou a cantar, cada vez mais alto para se acalmar, e lentamente foi percebendo que aquela não era – não podia ser – a floresta proibida. Não com aquele brilho prateado nas folhas das árvores. Não com aquelas flores... Não com aquele poço de pedras que parecia ainda mais antigo que o castelo.

Eilan sabia o que fazer. Inclinou-se sobre ele, olhando para dentro do poço e vendo a lua que crescia refletida na água. Respirou fundo, controlando a respiração e o olhar, e as imagens começaram a passar...

Uma ilha sucumbia no oceano com uma esquadra de barcos a abandonando... Soldados atacavam homens, matando-os, enquanto as mulheres eram violentadas... Vingança, Senhora dos Corvos... Uma casa entre a floresta, e uma mulher, uma Suma-Sacerdotisa, com uma criança nos braços, uma dor além dos limites nos olhos... Sentiu seu coração se comprimir... Uma outra mulher abria a passagem entre as brumas e revelava uma ilha...

O passado se foi mas eu permaneci...

Guerra, homens morrendo... Um bruxo, um bruxo terrível... Hogwarts estava sendo construída e uma mulher jovem e ruiva sorria enquanto ia ao encontro do homem que reconheceu como sendo Gryffindor. Eles se abraçaram e ela viu o sorriso da mulher, que se refletia em Harry Potter. Outra mulher, sentada e vestida de azul profundo, levantou sua cabeça e sorriu brandamente: era Rowena Ravenclaw, e entre suas sobrancelhas estava a marca da Deusa.

O sangue dos meus filhos se misturou a outros mas eu os amei de qualquer maneira.

Ela viu a primeira discussão entre os fundadores e Slytherin partir. Mais uma vez, seu coração se comprimiu pelos olhos de Rowena, a dor mais forte do mundo. As visões começaram a se embaralhar, viu uma mulher loira se apaixonando por um bruxo, e ele a matando... Viu seu rosto e todos os rostos refletidos nos olhos que a olhavam... E agora em sua testa havia o sinal da Deusa.

Acordou tonta, e estava no limite da floresta, de encontro ao lago.

As sacerdotisas estava em semi-círculo encarando-a, mas não viu sinal da menina grifinória em lugar nenhum. Estava tonta com tantas revelações mas as sacerdotisas cantavam suavemente à sua volta e lhe despiram. Ela estava nua e as mulheres em fila. De certa forma, sabia o que fazer: passou por entre as pernas de cada uma delas, indo em direção ao lago ouvindo as vozes se elevarem.

Sangue do nosso sangue

Amigas, mulheres irmãs

Para Esta será o amanhã

Trará o caminho que segue

Seus joelhos estavam ficando irritados pelo contato com a grama mas continuava, cada vez mais rápido, os olhos grudados no pedaço de lago à frente.

Irmãs e mais que irmãs

Mãe, filha e mulher

Parentes de sangue e fé

Eilan será nossa irmã

A água estava absurdamente fria, mas foi um alívio senti-la encostando em seu corpo. Subitamente teve a visão de si mesma olhando um homem de uniforme romano e outra mulher, que parecia ser ela também, com cabelos ruivos e olhos verdes, se entregando a um homem que parecia levemente com Slytherin e ao mesmo tempo parecia outro homem. "A mistura de sangue fortalece uma raça, desde que não se perca todo o conhecimento anterior." Pensou mas soube que aquela era a sabedoria da Deusa a inspirando. Aquela era a verdade que lhe tinha sido revelada. Um braço a puxou de volta e imediatamente sua pele estava seca embora seus cabelos estivessem encharcados, molhando as vestes que a fizeram vestir às pressas. Ela se viu encarando uma sacerdotisa mas não a reconheceu, nem a sua voz.

- Eilan, filha de Júlia, você está aqui para prestar seus votos a Grande Deusa. Promete seguir os desígnios da Deusa e não se deitar com nenhum homem a menos que o serviço dela assim exija ou que Ela indique aquele que deve ser seu consorte por todas as vidas?

- Prometo.

- Promete que servirá a Deusa acima de qualquer outro compromisso, seja como esposa ou filha?

- Prometo.

- Promete que não desobedecerá a voz da Deusa, e aceitará sê-lo caso a Suma-Sacerdotisa a escolha antes de morrer?

- Prometo.

- Então, Eilan, filha de Júlia, você deve tomar conhecimento da nossa maior sabedoria... "Os Deuses não exigem que sejamos todos conquistadores, nem mesmo que sejamos todos sábios, mas somente que sirvamos a verdade que nos foi legada até podermos passá-la adiante." Esse é seu voto, servir esta verdade até o final de sua vida, que recomeça hoje. Não importa para a Deusa o que fez até agora porque talvez não sejamos nunca dignas de servi-la, importa que sigamos sua sabedoria e a sirvamos com o melhor que podemos, minha mãe, minha irmã, minha filha e minha neta, Eilan.

Só então reparou nos olhos cheios de lágrimas de Caillean à sua frente e a abraçou, assim como todas as sacerdotisas, inclusive Miellyn, que também sorria. Então Ganeda picou com um espinho o espaço entre as sobrancelhas, proclamando-a sacerdotisa oficialmente, embora a Deusa já a tivesse aceitado no outro mundo.

- Tens um grande destino entre nós, pequena – falou Caillean abraçando-a, antes que tomasse o rumo do castelo com os passos lentos das sacerdotisas, a luz da Deusa ainda presente em sua expressão.


Notas da Autora: Muito obrigada por cada recomendação! E por cada nota dada a OE no Três Vassouras, muito obrigada... Isso tudo foi muito importante para mim... As frases "A mistura de sangue fortalece uma raça, desde que não se perca todo o conhecimento anterior." e "Os Deuses não exigem que sejamos todos conquistadores, nem mesmo que sejamos todos sábios, mas somente que sirvamos a verdade que nos foi legada até podermos passá-la adiante." foram retiradas do livro "A casa da Floresta", págs. 14 e 15. Obviamente, não me pertencem ^^