Capítulo 2 - Treinamento Intensivo

A aula de História da Magia estava mais chata do que nunca. O professor Binns tentava a todo custo manter até mesmo a si próprio acordado - e estava tendo pouco sucesso nisso.

Hermione copiava, aborrecida, a matéria, bufava ocasionalmente, em vão, na esperança de tirar os amigos - que babavam descaradamente encima dos livros na carteira ao lado - do estupor em que se encontravam. A garota ficou chateada por não poder fazer uso de um gravador trouxa em Hogwarts. Aquilo certamente           pouparia muitos calos em seus dedos e algumas horas de sono durante as aulas do professor Binns.

Como os melhores amigos estavam morgados praticamente a aula inteira lhe  restava a árdua tarefa de manter o caderno atualizado e, assim, garantir uma boa nota para os três nas provas da matéria.

Gina, por sua vez, corria desabaladamente pelos corredores, intercalava alguns momentos em que andava devagar - displicentemente, como se nada estivesse acontecendo, quando eventualmente passava por uma sala de aula com as portas abertas para disfarçar a pressa e evitar ser chamada à atenção por algum professor. Havia combinado com Harry alguns minutos de "treinamento prático", como gostava de nomear o que faziam, antes do almoço na sala da AD. Mas o professor Flitwick a havia segurado um bom tempo depois da aula, impressionado com os feitiços para dar sustos que havia criado, inclusive fazendo com que ele mesmo se assustasse. Segundo o professor ela tinha um talento nato para pregar peças no outros, algo que Gina não considerou nem um pouco surpreendente, embora tivesse certeza de que os irmãos gêmeos se orgulhariam pelo reconhecimento.

Estava ansiosa para pedir desculpas ao amigo, como tinha tempo livre naquele momento e havia conferido no quadro de horários que Harry teria aula de História da Magia da uma às três da tarde, aquelas horas seriam perfeitas para que "treinassem" um pouco. Afinal, era mais fácil fugir da aula do professor Binns do que fazer a Murta gemer e chorar.

Ela chegou esbaforida na porta da sala em que estava Harry. Ficou alguns instantes parada, observando a turma adormecida, até encontrar quem procurava: Hermione. Ela, sim, estaria acordada. Gina acenou para a amiga, que sorriu como se estivesse sendo salva do purgatório.

- Cha-ma o Har-ry! - Gina moveu os lábios devagar e apontou para a carteira ao lado.

Hermione, que era péssima para ler lábios, fez o que lhe pareceu mais óbvio: cutucou Rony, que abriu os olhos remelentos de sono. Então segurou o amigo pelo queixo, virando-o na direção da porta, para a irmã, e sorriu, vitoriosa apenas pelo fato de não ser mais a única incomodada ali naquela sala mofada.

Rony, por sua vez, acenou para a irmã, voltando a afundar a cabeça na carteira. Gina deu um tapa na própria testa.

- Não! - ela sacudiu violentamente a cabeça e o dedo para Hermione. - Não e-ra o Ro-ny. E-ra o Har-ry. Har-ry! - novamente o inintelegível movimentar de lábios e uma expressão vaga de Hermione. Gina bufou.

"Melhor aluna da escola uma vírgula", pensou, irritada. Pegou então uma pena que tinha no bolso das vestes e desenhou na própria testa um raio, apontando em seguida para ele.

- Har-ry! - Hermione pareceu pensar por alguns segundos e sorriu, apontando para Harry, para confirmar. Gina quase bateu palmas enquanto acenava freneticamente que sim, que a amiga havia finalmente entendido.

- Harry? - Hermione chamou o amigo com um pouco mais de delicadeza do que havia tido com Rony. Parecia perdoar ao menos por deixá-la sozinha aturando as chatices do professor fantasma.

A garota pareceu não entender nada mas Rony, abrindo os olhos, esfregando-os mal humoradamente e olhando na direção dela e de Harry, como se o tivessem tirado de um sonho muito bom, fizeram com que Hermione esquecesse todo o estranhamento. Estava muito brava com Ronald Weasley agora para notar que Gina estava tirando outra coisa dos bolsos.

Rony não estava tão distraído assim e notou quando a irmã flutuou um pequeno pedaço de papel dobrado, passando como um pequeno floco de neve por ele e indo parar delicadamente nas mãos de Harry. Gina sorriu e piscou para o garoto, deixando-o para se virar com as explicações sozinho. Antes que fosse interrogado pelos amigos, Harry aproveitou os poucos segundos de perplexidade deles para ler o bilhete:

"Fuja da aula. Eu e meus lábios estamos disponíveis no momento. Estou na sala comunal. Beijos (Dã)"

Harry sorriu e guardou o bilhete dentro do livro de Feitiços. Pegou todo o material que estava encima da carteira e guardou na mochila em silêncio. Rony o observava com a testa franzida e marcada pelo cochilo. Hermione então resolveu perguntar.

- Aonde você vai, Harry? - estava muito curiosa.

- É, cara, aonde vai? - Rony aproveitou a deixa e perguntou também, muito desconfiado. - E que raio de bilhetinho da minha irmã foi esse? É algum recado importante? Sobre Você-Sabe-Quem? - arriscou um palpite. Hermione rolou os olhos para cima.

- É, Rony, Voldemort agora manda recados para Harry pela Gina - o professor de História da Magia e Rony tremeram pelo nome dito um pouco mais alto pela garota e o fantasma pigarreou para que falasse baixo. Ela então voltou ao assunto em questão. Harry havia ficado quase aliviado pelo quase início de uma discussão entre os amigos. - O que Gina quer com você? – fora muito objetiva para que pudesse escapar ileso.

"Droga, Gina, cadê você na hora de inventar uma explicação absurda?", pensou enquanto tentava encontrar o que dizer. Por fim acabou contando uma meia verdade.

- Ela está me ajudando com uma coisa - disse displicente.

- Coisa? - Hermione falou alto novamente mas agora, como não havia sido o nome do pior bruxo que já havia existido, apenas Simas ressonou atrás deles, incomodado pelo barulho da aula que estava atrapalhando seu cochilo. Rony novamente embarcou na frase da amiga.

- É. Coisa? Que coisa? - reforçou a pergunta, sem ter mesmo certeza de estar perguntando o que queria saber. Harry novamente amaldiçoou mentalmente a ausência de Gina e prosseguiu, insistindo na pobre versão da verdade que havia começado a contar.

- Gina está me ajudando numa matéria, num projeto - Hermione riu de modo irônico.

- Olha, Harry, você vai me desculpar. Eu sei que a Gina é muito esperta e inteligente mas ela está um ano atrás de nós. Eu diria que é impossível que ela saiba mais do que eu sobre qualquer assunto... Francamente, não sei por que você não pediu a minha ajuda... Isso é muito estranho - Rony pareceu concordar novamente.

- É isso aí, cara, é muito estranho... Por que você não pediu a ajuda da Hermione? - Rony tinha as orelhas vermelhas agora e Harry sabia que aquilo significava que teria problemas, por isso tratou de responder no ouvido do amigo.

- Acredite em mim, Rony, você não ia querer que eu pedisse ajuda a Mione pra isso - Harry pegou o material e levantou, deixando os amigos muito desconfiados para trás, desistindo de dar mais alguma explicação e gerar ainda mais perguntas. Afinal, Gina o estava esperando. Gina e seus lábios.

- Então? Minha irmãzinha não é inteligente o suficiente para a grande Hermione? - ele pôde ouvir a voz de Rony antes de chegar ao fim do corredor, seguido de um novo pigarro do professor fantasma, que não havia notado em momento algum sua ausência na aula.

Assim que Harry entrou na sala comunal se espantou por não encontrar Gina sozinha. A garota estava conversando com Colin e logo que entrou o garoto se levantou e saiu, para seu alívio.

- Até que enfim você chegou! Colin estava começando a me deixar maluca de tanto perguntar coisas idiotas - Harry sorriu enquanto largava o material sobre a mesa.

- E como você se livrou dele assim que eu entrei, tão rápido? - ela piscou.

- Talento feminino - Harry franziu a testa. - Digamos que eu disse a ele que se ele fosse embora eu lhe daria um beijo de agradecimento depois - Harry arregalou os olhos no mesmo instante, completamente escandalizado, e a menina riu com vontade. - Garotos... Acreditam em tudo que a gente diz... É claro que eu não disse isso a ele, Harry - o rapaz pareceu aliviado. - Mas isso não me impediu de prometer que se ele fosse embora naquela hora eu te convenceria a dar a ele uma foto autografada - Harry afundou na poltrona.

- É sério, Gina, está difícil saber o que é pior - ela deu de ombros.

- Uma garota luta com as armas que tem. E eu precisava ficar a sós com você, não?

- Concordo - ele disse, sorrindo. - Só não sei que armas você vai usar para me convencer a dar a foto pro "mala" do Colin - Gina riu.

- Eu tenho muitos métodos e talentos para isso sabia, Harry Potter? - provocou. - Agora anda logo e me beija de uma vez por que daqui há pouco isso aqui vai estar cheio de "malas"  - Harry suspirou, resignado. A garota tinha razão, ele parou.

- E se alguém entrar? - Gina olhou para ele, irritada, como se tivesse feito a pergunta mais óbvia do mundo.

- Ninguém vai conseguir entrar, Harry, hoje é dia de trocar a senha e como Hermione decidiu que vai fazer uma reunião com todos os grifinórios não forneceu a senha nova a nenhum deles. E, a partir das duas da tarde, a Mulher Gorda foi autorizada pela Mione a barrar qualquer um que queria entrar aqui. Parece que Mione quer que os alunos entrem e usem a sala comunal de forma ordenada para poupar trabalho aos elfos domésticos ou alguma coisa ridícula parecida com essa... - Harry riu. - Então ninguém entra, já que são duas e meia agora. Temos até as três ou até que a senhorita "Encrenca" decida deixar os alunos entrarem ou a professora McGonagall interceda pelos pobres coitados... Ron é que ontem me pareceu furioso com isso mas hoje no café já estava apoiando Mione nessa idéia maluca. Ela também deve ter os próprios meios de persuadir pois convenceu meu irmãozinho genioso direitinho - Harry riu. - Então estamos sozinhos como deveríamos estar. Você tem meia hora para me esfolar os beiços com um treinamento intensivo... - Harry deu um riso maroto.

- Você está obviamente me subestimando, Gina. Em meia hora eu posso esfolar os seus lábios mais de uma vez - ela corou mas tentou disfarçar.

- Vamos logo com isso então – disse, impaciente, retirando os livros dela do sofá e colocando-os próximos ao material de Harry.

- Sentados ou de pé? - ele perguntou, sem jeito. Ela indicou o sofá.

- Assim é mais confortável - justificou quando ele sentou ao seu lado.

Harry se virou para a garota, novamente colocando as mãos em sua cintura, e aproximou o rosto, mas antes que pudesse fazer contato Gina interrompeu a investida bruscamente.

- Desculpe perguntar mas... Você escovou os dentes? - o garoto riu com vontade.

- Escovei sim, "tia Petúnia". Duas vezes, se quer saber - os dois riram e mais uma vez os lábios estavam unidos.

Daquela vez não foi tão rápido. Na verdade Gina começou a achar que o rapaz realmente tinha um certo potencial. Ele entreabriu um pouco os olhos para ver a reação da garota mas Gina, que tinha os olhos completamente abertos, fez com que ele se intimidasse e novamente fechasse a boca. "Má Gina", ela pensou, exatamente como Dobby pensaria naquele instante. Harry afastou a boca, um tanto quanto desapontado.

- Eu sou patético nisso, não é? Não tenho a menor chance nessa matéria. Eu não ganharia nem ao menos um sofrível - Gina suspirou.

- Não seja tão duro com você mesmo, Harry...

- "timo. Você nem ao menos tentou argumentar contra - ela abaixou a cabeça por ele ter sido ríspido e Harry percebeu que havia sido rude. - Desculpe, Gina... Mas isso é frustrante demais...

- Não tem que ser, Harry... Veja só. Quando eu comecei a namorar o Miguel eu também nunca havia beijado ninguém antes e tinha um nojo enorme daquela língua gosmenta dele - Harry fez uma nota mental pessoal para lhe agradecer um dia pelos pesadelos que causaria nele com o que havia acabado de dizer.

- Obrigado pelo encorajamento, Gina... Quem sabe um dia você também sinta o mesmo por mim? - ele disse, irônico, mas Gina ficou bem séria.

- Eu nunca sentiria nojo de nada vindo de você, Harry - ele se espantou com a resposta.

- Não sentiria?

- Não. Nem um pouquinho...

- E por que não?

- Por que eu amo você demais para isso? - ela respondeu automaticamente, como se dissesse algo óbvio. Harry ficou chocado e ia abrir a boca para dizer algo mas naquele exato instante o retrato da Mulher Gorda girou e a sala se encheu de alunos irritados. Provavelmente os planos de Hermione tinham ido por água abaixo.