Capítulo 1 - Lágrimas

Olhou para o garoto que dormia pacificamente, o rosto escondido pelas sombras do aposento escuro, a forma de seu corpo iluminada apenas pela luz pálida da lua invernal.
Em uma semana ele estaria partindo, e assim tornaria-se ainda mais distante.
E mesmo que ele parecesse tão distante, aquela lua que o iluminava era a mesma que se refletia em seus próprios olhos, que fazia sua face parecer fantasmagórica, e seus olhos, ainda mais mais misteriosos.
Com passos hesitantes, adentrou as sombras do quarto, sentindo-se estranhamente irreal. Era como se aquele quarto - em que entrara tantas vezes sem a menor cerimônia - fosse agora um outro mundo, distante e estranho. Mundo cujo mestre era o garoto que ela cobria, com carinho e determinação nos olhos, olhos turvados por lágrimas que ela impedia que caíssem a todo custo.
No entanto, nem todo custo fora suficiente para amparar as lágrimas mornas e delicadas que caíram sobre o rosto de seu noivo.
Tudo pareceu tão lento, tão indescritivelmente lento e claro, o som das lágrimas cortando o ar, o som do garoto se mexendo, despertando de seu sono, o som da garota levantar-se rapidamente e correr para fora do quarto, antes que ele a visse.
Encostou-se à parede, a respiração ofegante, soluços escapando dos lábios onde as lágrimas caíam, com seu gosto salgado e terno. Era inacreditável que mesmo quando ele estava inconsciente, sentisse aquela tensão angustiante, sufocante e que, apesar de ser tão grande, parecia aumentar a cada dia. Era inacreditável que ela, a sua noiva, sentisse tanto medo de contar a verdade. Tudo o que a cercava, agora, parecia inacreditável, como se toda a sua vida não tivesse passado de um sonho. Quem dera. Pouparia-lhe muita dor e sofrimento.
Não. Tinha que acabar com aquilo, e acabaria agora. Esperou até que a respiração se normalizasse, e voltou para a sombra e frescor do quarto.
Sentado no chão, como que esperando-a, estava o objeto de seus sonhos, desejos e angústias, observando-a com sua habitual expressão pacífica e distante.
- O que foi, Anna? Você está...você está chorando. - havia preocupação na voz dele, mas a garota de cabelos dourados não pôde deixar de lembrar que aquela era a mesma voz que ele dirigia a seus amigos quando tinham algum problema.
- Não importa.
- Anna...é claro que importa. O que houve? Me diga, anda.
- Não é nada, já disse! - ela ajoelhou-se no chão, de frente para o garoto, acalmando a voz. Negar não adiantaria de nada.
- Estou preocupada com você.
- Não precisa se preocupar, Anna. Eu vou ficar bem.

E sorriu, um daqueles sorrisos ternos e indescritíveis que o faziam tão especial. E, no entanto, mesmo assim, não era um sorriso especial, só para ela. Será que ele não a considerava especial? Ou será que seu noivado era apenas mais um fardo que tinha que carregar, e que carregava sem reclamar, como fazia com tudo?
- Anna, o que está acontecendo?
- Não quero que parta...sem que antes eu te diga algo...que quero dizer há muito tempo.
- O que foi, Anna? Tem alguma coisa errada? Diga, anda...

Ela fechou os olhos, tentando fingir que estava mais uma vez em frente ao espelho, ensaiando como poderia dizer aquilo que estava travado em sua garganta há tanto tempo. Prolongar o momento só traria sofrimento. Ela tinha que dizer logo, acabar com aquilo, e enfim encontrar a felicidade plena ou o sofrimento eterno.
- Yoh...eu te amo.

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O tempo parou. Eu podia ouvir o vento rugir lá fora, arrancando pétalas de flores de seus galhos, como se fosse derrubar a casa. A casa resistia, mas não eu. Como poderia dizer, àquele anjo de olhos tristes e magoados, algo que a entristeceria ainda mais?
Não havia nenhum modo delicado de dizer aquilo. Então tentei dizer devagar, calmamente, para que ela pudesse digerir cada palavra.
- Sinto muito. Não posso te corresponder.

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O tempo parou. Eu podia ouvir as batidas de meu coração, que iam ficando cada vez mais lentas, como se o mesmo congelasse. Eu podia sentir, vagarosamente, meus olhos se encherem de lágrimas que ardiam como o fogo do inferno. Não consegui pensar. Estava tudo tão anuviado, tão lento, tão estranho...o que eu faria agora? Como poderia viver para sempre com o homem que me rejeitou?
E então, eu saí. Yoh não tentou me impedir, talvez pensasse que eu queria ficar sozinha para refletir. Mas eu queria mesmo é que ele tivesse tentado me parar.
Saí, para o temporal que começava a se armar, para as ruas escuras e solitárias dos subúrbios. Mas não havia perigo. Nada seria capaz de me atacar. Afinal, eu ainda sou Anna. Mais triste, mais solitária, porém, ainda sou eu.
E então, o que acharam? Por favor, me dêem sua opinião, ou não escreverei mais capítulos. Com a contribuição de quem lê, esta será uma saga beeeeeeem longa, e garanto que muito interessante.
Não se esqueçam, sem reviews, sem novos capítulos (ou sem melhora de qualidade)!
Lady Macbeth