~ * ~ Primeiro encontro ~ * ~

Siegfried estava em seu escritório, este ficava em um prédio, no sexagésimo oitavo andar. Era um lugar amplo, com uma enorme janela de onde se podia ter uma bela vista de toda a cidade. Sua mesa ficava em frente à janela, assim quando quisesse admirar a vista lá fora, era só virar a cadeira para trás e apreciar. Seu escritório tinha uma pequena estante, com alguns livros que ele usava para suas pesquisas e também os livros que já escrevera. Sobre sua mesa, tinha um aparelho de telefone, um laptop e um relógio, não havia plantas em sua sala, as paredes brancas e nuas, nenhuma foto ou quadro, o que dava uma sensação de vazio para quem entrasse no escritório. O som do toque do telefone encheu o ambiente, e Siegfried, soltando um suspiro irritado, atendeu:

 

- O que foi agora? – perguntou impaciente. Era a décima vez que era interrompido naquela manhã – Eu não disse para a senhora que não queria ser interrompido?

- Desculpe-me, mas é que a diretora daquela faculdade que estava interessada no senhor para dar uma palestra sobre mitologia... Está aqui – respondeu a secretária. A secretária de Siegfried era uma senhora com seus cinqüenta anos. Muito eficiente e dedicada. Gostava do rapaz como se fosse seu filho, mesmo ele sendo grosseiro às vezes. Mas ela sentia que aquela não era sua verdadeira "imagem". Via que ele tinha um bom coração, já pudera comprovar isso algumas vezes, como quando ela descobriu que estava com câncer e Siegfried pagara todo o tratamento para ela. Enquanto ela não se recuperou completamente, tendo trazido o atestado médico para que ele tivesse certeza de que estava tudo bem, ele não permitira que ela voltasse ao trabalho. Ela era muito grata a ele. E era muito pesar que via tanta tristeza nos olhos do rapaz.

- Tudo bem, desculpe-me D. Valkíria– respirou fundo – Mande-a entrar – disse desligando o telefone em seguida - Só espero que não seja mais uma daquelas velhinhas que não entendem nada do assunto, mas adoram dar palpite no trabalho dos outros. Eu não vou aturar mais intromissão de leigos no meu trabalho - pensou já se precavendo contra àquela pessoa que nem ao menos conhecia, mas era sempre assim, ficava com um pé atrás com todo mundo. Depois de alguns instantes, a porta se abriu.

- Pode entrar senhorita Njörd – ele viu a secretária parada à porta mandando que sua "visita" entrasse. Esperando uma velhinha de quase oitenta anos, toda enrugada, parecendo uma uva passa, Siegfried não pôde evitar a surpresa ao vislumbrar uma jovem que devia ter pouco mais de vinte anos. Ela era linda, ele não podia negar. Tinha os cabelos prateados, curtos na altura do queixo em duas mexas laterais e o restante chegava até a cintura. Os olhos de um tom violeta. Ele nunca tinha visto olhos daquela cor. Ela era extremamente elegante. Vestia um terninho preto e sapatos de salto, também pretos, altíssimos. Assim que ela entrou, seu delicado perfume encheu o ambiente, deixando-o inebriado. Ele estava surpreso. A jovem também pareceu impressionada, esperava que o famoso historiador fosse mais velho, uns cinqüenta anos no mínimo, mas estava à frente de um rapaz de, no máximo, trinta anos de idade. Muito bonito e atraente. Tinha longos cabelos loiros, olhos azuis, alto, forte... Jamais passaria desapercebido. Era elegante, estava vestindo um terno preto, uma camisa azul mais clara e uma gravata azul turquesa. A cor da camisa realçava ainda mais seus belos olhos. Nunca o tinha visto antes, pois jamais tivera a oportunidade de comparecer a uma de suas palestras e ele sempre fugia de ter que dar entrevistas. Nem mesmo em seus livros tinham fotos dele. Odiava o assédio da imprensa que não respeitara a sua dor no passado, por isso passou a fugir dela. Não ia a programas de tv, não dava entrevistas a jornais e evitava sair de casa sem necessidade, para não correr o risco de encontrar algum paparazzi no caminho. Só saia de casa para ir ao trabalho. Hilda entrara em contato com ele através da editora que forneceu apenas o endereço de seu escritório.

- Como vai senhor Sleipnir?- disse a jovem de cabelos prateados e olhos violetas. Estendeu a mão para o rapaz. Siegfried tomou a mão dela, correspondendo ao cumprimento.

- Vou bem, senhorita...?- ele disse interrogativamente.

- Njörd, Hilda Njörd – respondeu sorrindo para ele.

- Senhorita Njörd. Sente-se, por favor – mostrou-lhe uma cadeira em frente a sua mesa.

- Obrigada – disse sentando-se. Siegfried sentou-se também enquanto se sentia observado meticulosamente. Hilda fitava o belo homem com muita intensidade, com um olhar cheio de admiração, o que o estava deixando incomodado.

- Algum problema, senhorita? – perguntou franzindo o cenho.

- Hã?- Hilda não entendeu a que ele se referia.

- Por que está me olhando desse jeito? – perguntou diretamente, soltando a mão dela.

- Desculpe, senhor Sleipnir – disse constrangida – Eu não esperava alguém tão jovem, pensei que tivesse no mínimo cinqüenta anos – ela o olhou e não resistiu – Se não se importa... quantos anos o senhor tem? - Siegfried olhou para ela estreitando os olhos antes de responder a pergunta.

- Eu tenho vinte e oito anos, senhorita. Também fiquei impressionado, esperava que fosse mais velha... Uns oitenta anos pelo menos – ela sorriu – Mas como dizem que é deselegante perguntar a idade de uma mulher... Acho que terei que ficar curioso.

- Belo truque, senhor Sleipnir. Eu não me importo de contar minha idade. Eu tenho vinte e quatro anos – disse ela sorrindo – Bem, senhor Sleipnir... Eu vim até aqui para falar com o senhor sobre meu convite para que apresente uma palestra na faculdade onde leciono... – disse tranqüilamente.

- Leciona? Disseram-me que era a diretora... – disse ele confuso.

-Sim, eu sou a diretora. Mas, não consegui me afastar da sala de aula e acho que a profissão de professor é maravilhosa – explicou ela.

- Tem toda a razão. E a senhorita ministra aulas de quê? – perguntou Siegfried.

- Geografia – respondeu ela.

-Uma matéria muito interessante – disse ele.

- Eu concordo com o senhor. Mas, voltando ao assunto da palestra... eu gostaria de saber quanto o senhor cobra por palestra? – perguntou ela.

- Eu cobro de cinqüenta a setenta e cinco mil, e tenho também uma condição – disse ele se recostando na cadeira.

- Bom, o preço é razoável... afinal o senhor é o maior historiador do mundo – disse ela, olhando com indisfarçada admiração, deixando-o constrangido e ao mesmo tempo envaidecido – Qual é a sua condição, senhor Sleipnir? – perguntou curiosa.

- Eu exijo que os cartazes sobre a palestra estejam em meu nome verdadeiro... – ela o interrompeu.

- Em seu nome verdadeiro? Com assim?

- Hoenir Sleipnir é um pseudônimo. Meu nome verdadeiro é Siegfried Sigurd, e é esse nome que eu quero que seja anunciado – respondeu.

- Tudo bem, mas... eu posso saber por que isso? – Siegfried arqueou uma sobrancelha, gesto que demonstrava uma leve irritação. Respirou fundo e respondeu:

- Eu não gosto da mídia, e uso um pseudônimo como meio para preservar minha privacidade. Quando virem o nome Siegfried Sigurd, não saberão quem é e então não se importarão em presenciar a palestra, e de tabela, não me incomodarão. Essa condição é mais importante para mim do que o dinheiro. Não preciso de dinheiro, cobro apenas por que valorizo o meu trabalho e quero que os outros também lhe dêem o seu merecido valor. Quanto a minha condição, se não concordar, não será o dinheiro que me convencerá a aceitar o seu convite – disse apoiando os cotovelos sobre a mesa – E então? Aceita ou não?

- Claro, é um direito seu manter sua privacidade – respondeu compreendendo-o.

- Então... estamos acertados? – perguntou ele.

- Claro, senhor Sigurd... posso chamá-lo assim?- perguntou indecisa.

- Sim, só não pode espalhar por aí – respondeu recostando na cadeira, dando um meio sorriso.

- Bem... – disse ela levantando-se – Eu já vou indo. Já tomei muito do seu tempo – ela estendeu a mão para ele – Eu ligo mais tarde para agendarmos o dia de sua palestra.

- Estarei esperando – disse Siegfried tomando a mão dela na sua. Quando suas mãos se tocaram, ambos sentiram um calor percorrer seus corpos fazendo seus corações dispararem. Siegfried, assustado com a sensação, largou a mão dela rapidamente – Até logo senhorita Hilda – disse tentando esconder sua reação.

- Até logo, senhor Sigurd – respondeu se retirando da sala dele rapidamente. Ela saiu fechando a porta atrás de si e se recostou nela. Seu coração ainda estava batendo acelerado. Estava assustada. Nunca sentira aquilo antes. Recompondo-se, ela saiu do enorme prédio onde ficava o escritório de Siegfried.

Ele estava em pé, passou a mão pelos longos cabelos e ficou olhando pela janela enquanto pensava sobre o que acabara de sentir. Há tanto tempo que não se sentia daquela forma. Não! Não permitiria que acontecesse de novo! Ela era bonita sim, mas não o subjugaria. Não seria um joguete nas mãos de mais ninguém, nunca mais. Tornou a se sentar em frente ao laptop e retomou seu trabalho. Passou o dia todo revendo o que havia escrito e pesquisando sobre sua nova empreitada. Já tinha escrito livros sobre as histórias de diversos povos. Sempre preocupado em conhecer tudo sobre suas culturas. Agora estava com uma idéia nova: queria escrever livros sobre os mitos de cada país. O dia passou rápido. Quando saiu do escritório já eram oito horas da noite. Desceu até o estacionamento e pegou seu carro. Deu a partida e saiu daquele prédio. No caminho para sua casa, ele foi pensando em tudo o que acontecera naquele dia. E principalmente na bela jovem que conhecera. Não conseguia evitar e isso o estava deixando furioso. Chegou em casa, colocou as chaves em cima da mesa e subiu até seu quarto. Já dentro do quarto, Siegfried tirou o terno, afrouxou o nó da gravata, para logo em seguida tirá-la do pescoço, pendurou-a em um cabide junto com as mais de cinqüenta que possuía.  Pendurou também o terno e procurou na gaveta de seu guarda-roupa algo para vestir. Dirigiu-se ao banheiro e terminou de se despir, entrando no Box. Abriu a torneira e deixou que a água morna escorresse por seu corpo, dando-lhe uma sensação de relaxamento. Quinze minutos depois, ele desligou o chuveiro. Enxugou-se e vestiu apenas uma calça de moletom. Foi para o escritório que tinha em sua nova mansão (ele se mudou de sua antiga casa quando o escândalo sobre o término de seu noivado eclodira) e colocou o laptop sobre a mesa, retomando seu trabalho do ponto onde havia parado. Como queria poder apenas trabalhar com o que gostava. Mas era o único herdeiro das empresas Sigurd, se não fosse pela confiança que seu pai depositava nele, já teria mandado aquele escritório às favas. Já eram nove e meia quando o telefone tocou:

- Alô – disse ele desligando o laptop.

- Senhor Sigurd? – perguntou uma voz feminina.

- Sim, quem está falando?

- Hilda Njörd... eu estive em seu escritório hoje pela manhã, lembra-se? – disse ela.

- E como eu poderia esquecer? - pensou ele lembrando-se da bela mulher que não saíra de sua mente durante todo o dia – Claro, senhorita Njörd.

- Bem, eu estou ligando para agendarmos sua palestra.

- Ah, claro – disse pegando sua agenda em uma das gavetas.

- Eu pensei se poderia ser no próximo dia dezenove... se não estiver muito em cima... – disse ela.  Siegfried folhou sua agenda e viu que não tinha nada para o dia dezenove – Não está muito em cima?

- O que? – perguntou, distraiu-se ao folhear a agenda e não ouvira o último comentário dela.

- Terá apenas três semanas para preparar-se...

- É o suficiente, não se preocupe. Modéstia à parte eu domino muito bem o assunto, será necessário apenas dar uma revisada em alguns pontos... mas... sim dia dezenove está bem – disse agendando a palestra para aquele dia.

- Bom, então está marcado. Até logo senhor Sigurd – disse, também tomando nota da data da palestra.

- Até logo senhorita Njörd – disse ele desligando o telefone. Tudo acertado, dali a três semanas, mais precisamente dia dezenove de maio aconteceria a palestra. Subiu para seu quarto e se deitou. Estava tão cansado que adormeceu quase que imediatamente.

Continua...

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Oi pessoal. Espero que tenham gostado deste capítulo. Como puderem perceber, é UA. Espero que não tenham ficado decepcionados. Beijão a todos e por favor... comentem. Tchau.