Esclarecimentos

                Hilda estava em seu gabinete. Pensava na conversa que tivera com Siegfried. Será que ele a tinha perdoado? Suas lembranças vagaram pelos poucos, mas inesquecíveis minutos que passara nos braços dele antes de serem interrompidos. Do beijo que quase acontecera. Só lembrar daquele momento fazia o coração de Hilda disparar. Ela ouviu uma batida na porta.

- Pode entrar! – disse ela, erguendo a cabeça em direção a porta.

- Com licença senhorita. – disse o policial Hildegurd. – Espero não a estar atrapalhando...

- Claro que não... Entre! – o policial olhou para a trás.

- Com licença. – ele entrou e Hilda viu quando Siegfried entrou logo atrás dele.

- O que está acontecendo?! Siegfried... – perguntou ela. Siegfried olhou para ela e Hilda não pôde dizer o que ele pensando. Sua expressão estava séria.

- Será que tem uma sala onde poderíamos assistir a um filminho? – perguntou ele erguendo uma fita de vídeo com uma etiqueta na qual estava escrito "Evidência".

- Claro... Acompanhem-me. – ela pegou uma chave na gaveta e conduziu-os pelo corredor até a sala de vídeo. Hilda abriu a porta e deu passagem a eles. Hildegurd foi até a TV e a ligou, ligando também o videocassete.

- Senhorita... A imagem do ladrão está nesta fita... – disse ele colocando a fita no videocassete – Não se preocupe. Esse ladrãozinho não terá escapatória. O prédio está cercado. Daqui essa pessoa vai direto pra cadeia. – ele deu o play e a fita começou a rodar – A senhorita tinha razão. O dinheiro tinha sido furtado naquela mesma manhã, em que a senhorita deu por falta do dinheiro. – a imagem mostrava o momento em que Hilda entrara para trabalhar naquela manhã. O policial correu a fita um pouco e deixou na parte em que mostrava Hilda saindo da sala e fechando a porta. Fora nesse instante que, como ela relatara, estava indo a biblioteca. Cinco minutos depois alguém entra na sala.

Hilda ofegou ao reconhecer a pessoa assim que ela passou pela porta. O intruso entrou na sala e abriu todas as gavetas, cuidadosamente, para não deixar nada desarrumado. Pegou um envelope de papel pardo na última gaveta, enfiando-o na bolsa. Fechou a gaveta e saiu da sala fechando a porta. O policial correu a fita e se voltou para Hilda.

- Com é que eu não desconfiei? – disse ela em voz alta. Siegfried estava em pé, encostado no batente da porta. Em total silêncio.

- Ainda não acabou... – a fita mostrou o momento em que Siegfried entrara na sala e a breve conversa entre ele Hilda. Eles trocaram um olhar que não passou despercebido a Hildegurd que sorriu de lado. Diretora e professor perceberam o olhar do policial e coraram, voltando a atenção para a tela. Mostrou quando Hilda mexeu na última gaveta para fazer as verificações quanto ao dinheiro das mensalidades. Mostrou, também a conversa entre as duas irmãs. As ligações de Hilda. O momento da conversa entre ela e o senhor Hildegurd e o momento em que deixaram a sala. Cinco minutos depois, o ladrão voltara à cena do crime, desta vez para fazer uma ligação, depois de concluída, se retirou do local. Hildegurd desligou o videocassete e a TV e se voltou para Hilda – Além da fita, também foi encontradas impressões digitais, que não eram nem suas, nem de sua irmã, na mesa e na gaveta, e não eram do senhor Sigurd. O senhor Sigurd me disse que tem motivos para acreditar que ela não tinha intenção de ficar com dinheiro e sim de preparar-lhe uma armadilha.

- Armadilha... Por quê? – perguntou Hilda olhando para Siegfried. Este olhou para ela e disse calmamente.

- Mais tarde você entenderá. Eu lhe contarei tudo... – disse ele.

- Bom... Temos que prender a "gatuna"... – disse o policial.

- Ela deve estar em alguma das salas... Venham! – Hilda saiu da sala com Siegfried e Hildegurd a seguiram.

            Hilda caminhava rapidamente pela faculdade. Olhando em todas as salas. Parou em frente a uma, cuja porta estava fechada. Bateu.

- Entre... – veio a resposta. Hilda abriu a porta e Hildegurd entrou.

- Com licença senhorita Loki... – ele se aproximou dela e tirou a algema – A senhorita está presa pelo furto deste dinheiro aqui. – disse ele levanto um saquinho plástico com o envelope dentro.

- Mas... O que é que você está dizendo...? – disse ela olhando para Hildegurd e se afastando.

- A senhorita tem o direito de permanecer calada. Tudo o que dizer pode e será usado contra você no tribunal. Tem direito a um telefonema. Tem direito a um advogado, se não puder pagar um, o Estado designará um...

- Você está louco?! Esse envelope foi encontrado nas coisas de Siegfried... Foi ele quem roubou... – disse ela apontando para Siegfried que estava parado, encostado ao batente da porta, os braços cruzados sobre o peito.

- Esta fita e as impressões digitais encontradas no gabinete da senhorita Njörd e neste pequeno selo metalizado, aqui, não são do senhor Sigurd, mas sim, suas.

- Mas...

- Nos registros da polícia tem as suas impressões digitais... Indiciada por dar um golpe na empresa onde trabalhava, hein? Quem diria...

- Eu não...

- Chega! Eu não tenho o dia todo. – Hildegurd avançou para Freya e pegou um de seus braços, fechando a pulseira da algema. Freya encarou Siegfried e ele retornou o olhar seriamente. O policial pegou-a pelo braço – Sinto ter interrompido a aula de vocês. – disse dirigindo-se aos alunos, que estavam chocados. Não eram fãs da professora, mas ladra...? Quem diria. Hildegurd pegou em um dos braços de Freya e conduziu-a para fora da sala.

            Hagen e Flear estavam conversando no corredor quando viram Freya vindo algemada, escoltada pelo mesmo policial que prendera Siegfried.

- O que será que houve? – perguntou Flear. Freya vinha com a cabeça baixa e em um momento, levantou a cabeça e encarou Hagen que arqueou a sobrancelha como quem diz: "Teve o que mereceu".

- Venha! – ele pegou a mão de Flear – Eu tenho o palpite de que isso te a ver com o caso do Siegfried. – eles pararam quando viram Hilda e Siegfried vindo pelo corredor.

- Hilda! – chamou Flear – O que é que está havendo? – perguntou se aproximando da irmã.

- Foi ela, Flear. – respondeu Hilda – Foi ela quem roubou o dinheiro e colocou nas coisas de Siegfried. Flear e Hagen se voltaram para Siegfried, este os encarou e disse:

- Eu preciso ir, agora. – os pais de Siegfried estavam chegando naquela tarde e ele tinha que ir ao aeroporto para encontrá-los.

- Siegfried... – Hilda segurou o braço dele. Siegfried se voltou para ela e fitou-a. Ele pôs a mão sobre a dela e disse:

- Eu posso procurá-la mais tarde? – ele perguntou. A presença de Flear e Hagen completamente esquecida.

- Claro... – ele levou a mão dela aos lábios, beijando-a suavemente. Hilda enrubesceu ligeiramente. Hagen e Flear se entreolharam, sorriram com a reação dos dois. Desta vez eles tinham que se entender.

- Eu passo na sua casa mais tarde, então. – ele olhou para ele e acariciou-lhe o rosto – Até logo, Hilda.

- Tchau, Siegfried.

- Tchau Hagen... Flear... – disse Siegfried já se afastando pelo corredor.

- Tchau Siegfried. – disse Flear.

- Até mais... – respondeu Hagen. Viram quando Siegfried sumiu pela porta e Flear se voltou para Hilda.

- Como...? – perguntou Flear referindo-se a como eles tinham descoberto que Freya era a ladra e não Siegfried.

- A fita de segurança filmou Freya vasculhando a gaveta, pegando o envelope e horas depois, quando o policial Hildegurd estava revistando a todos, ela foi até o meu gabinete outra vez e fez uma ligação.

- Ela ligou para a imprensa, certo? – disse Hagen.

- Acho que sim.

- Bem que eu desconfiei que eles tinham descoberto rápido demais. – disse ele – Foi uma armadilha.

- Mas... Por quê ela faria uma coisa dessas? – perguntou Flear. Hagen olhou para Hilda.

- Esse encontro que ele propôs... – começou Hagen e Hilda o fitou – É para... Ele pretende contar tudo não é? – perguntou ele.

- Sim... Ele disse que vai me contar absolutamente tudo. – respondeu Hilda.

- Que ótimo! Fará bem pra ele se livrar desse fardo que ele vem carregando há quase nove anos... – Hagen encarou Hilda.

-... – Hilda estranhou o olhar.

- Ele está confiando em você... – disse Hagen – Por favor, não o desaponte.

- Pode ficar tranqüilo, Hagen. – respondeu Hilda encarando o rapaz com um sorriso – Eu nunca o desapontaria ou magoaria.

- Acho bom! – disse ele sorrindo.

Hilda passara a tarde a noite inteira esperando por Siegfried. Mas ele não aparecera. Ela foi dormir curiosa e ligeiramente decepcionada por ele não ter aparecido. Talvez pudessem conversar na segunda-feira na faculdade.

Dia seguinte

Aquela reunião seria muito difícil. Entrou na e viu todas aquelas pessoas, que trabalharam com seu pai. Depois de uma ameaça de infarto que obrigou o senhor Sigurd a se afastar dos negócios, muitos daqueles empresários, muito mais velhos do que Siegfried; sentiram-se desconfortáveis por terem que ser guiados por uma "criança", como o tratavam no começo.

Demorou até que Siegfried conquistasse a confiança daqueles senhores, que passaram a admirá-lo. Viam nele um exemplo de determinação e inteligência.

E agora, lá estava ele. Sentindo-se mais inseguro do quando assumiu os negócios da empresa.

Postou-se diante da grande mesa que ficava no centro da sala e respirou fundo. Sentia todos os olhares sobre ele e aquilo o deixava desconfortável. Fechou os olhos e baixou a cabeça, apoiando as mãos sobre a mesa. Nesse momento sentiu uma mão lhe apertar o ombro esquerdo. Olhou para o lado e viu os olhos azuis que o guiaram durante toda a sua vida.

Seus pais chegaram na tarde anterior, enquanto ele estava na faculdade acompanhando o desenrolar dos fatos. E agora, aqui estava ele, parado em frente a quatorze pessoas, nervoso, mas tendo o apoio incondicional de seu pai. Ele viu os lábios do homem se curvarem em um sorriso de incentivo e encarou os olhos daqueles homens que esperavam uma explicação.

Ele explicou tudo o que tinha acontecido:

- Eu... Esse caso envolveu uma pessoa de meu passado... – não queria entrar em muitos detalhes – minha... Ex-noiva... – olhou de um a um – Com certeza ficaram sabendo o que houve. Saiu em todos os jornais e revistas. - Ela quis se vingar de mim e forjou essa história. Roubou o dinheiro da faculdade, colocou-o dentro de minha pasta, em meu armário e esperou. Quando deram pela falta do dinheiro e o policial Hildegurd começou com a revista, ela ligou para imprensa e armou todo aquele circo. – ele fez uma pausa, encarando de um a um, sabia que aqueles homens exigiam olho no olho, se desviasse o olhar demonstraria fraqueza, ou que estava mentindo, o que era imperdoável. – As câmeras de segurança filmaram tudo e ela já está presa. Minha inocência foi provada. – ele esperou algum comentário, mas apenas continuaram encarando-o. – Eu gostaria de lembrá-los de todos os benefícios que esta empresa trouxe aos senhores, quando estava nas mãos de meu pai. – olhou para o senhor Sigurd que acenou com a cabeça e voltou a olhar para os sócios a sua frente – Vocês viram a dedicação com que meu pai conduziu esta empresa durante anos e, modéstia à parte, como eu assumi e mantive o bom rendimento da empresa, apesar dos inúmeros projetos que mantive paralelamente como escritor e professor. – respirando fundo, ele continuou. – Bem... Minha permanência ou não como presidente da empresa depende da votação de vocês. Meu pai é o acionista majoritário... – disse olhando para seu pai – Mas eu não pretendo submetê-los a minha presença se isso não for do agrado dos senhores. – ele olhou para seu pai – Eu sei que caso seja necessário, meu pai pode conseguir alguém para me substituir. – tornou a olhar para os acionistas. - Eu acho que vou me retirar agora para a votação...

- Que é isso rapaz! Ninguém tem nada pra esconder de você, não é mesmo? – disse seu tio, que estava satisfeito com aquela história toda. Talvez sua chance de assumir a presidência tivesse chegado afinal. Sempre achara um absurdo que seu irmão, ao adoecer, tivesse passado tudo para as mãos daquele "rapazote" e não para suas mãos experientes. Os outros acionistas se entreolharam. Todos sabiam da ambição de Ymir Sigurd. Ymir se levantou e colocou a mão no ombro direito de Siegfried. – A votação pode ser feita em sua presença. – o olhar de satisfação não passou despercebido pelo senhor Sigurd. Essa votação decidiria se Siegfried continuaria ou se o vice-presidente, Ymir, irmão mais novo de Muspell Sigurd assumiria. O senhor Sigurd olhava nos rostos de cada um de seus sócios e temia sua decisão. Não queria que sua empresa ficasse nas mãos de seu ambicioso irmão. Quando formara a empresa, achara que podia convidar o irmão para ser seu sócio. A empresa cresceu e os olhos de seu Ymir também. Ao perceber a ganância, resolvera vender algumas ações da empresa, ficando com 51% enquanto os 49% restante ficava divididos entre os outros quatorze sócios, sendo que seu irmão dispunha de 16%. Tinha consciência de que todos ali conheciam e sabia da competência de Siegfried, mas será que dariam mais uma chance a ele? Esperava que pudesse contar com o bom-senso de seus amigos. E, se fosse o caso, encontraria alguém para substituir o rapaz, mas jamais permitiria que sua empresa fosse administrada por Ymir. – Bem... Quem concorda com a permanência de Siegfried, que já demonstrou que apesar de ter levado os negócios adiante, o que eu diria se tratar de sorte... – disse olhando para o rapaz. Siegfried arqueou uma sobrancelha ao ouvi-lo. - Não consegue ficar muito tempo longe de escândalos. – Siegfried estreitou os olhos e seu corpo enrijeceu. Muspell percebeu a reação do filho e, tendo ciência de seu temperamento, às vezes explosivo, se aproximou do filho e sussurrou:

- Acalme-se! Ele está provocando você. Aguarde a decisão dos outros acionistas. – Siegfried olhou para o pai e respirou fundo. Ymir continuou:

- Talvez esteja na hora de uma pessoa mais experiente assumir. Espero que tenham o bom-senso na hora expor sua opinião... – Muspell o interrompeu.

- Bem... Acho que o que tinha para ser dito já foi dito... Vamos começar com a votação. – Muspell apoiou as mãos sobre a mesa. – Quem acha que Siegfried não está apto a continuar na presidência da empresa e que Ymir... – olhou para o irmão. – Ou outra pessoa que talvez eu venha indicar deve assumir seu lugar? – os acionistas se entreolharam e, apesar de não ter gostado da referência de Muspell de indicar outra pessoa, Ymir ergueu a mão e olhou ao redor da mesa. Seu sorriso morrendo no rosto. Os olhos de Muspell Sigurd se iluminaram. Siegfried respirou aliviado. Sabia da preocupação de seu pai em deixar a empresa nas mãos de seu tio ambicioso e cabeça-dura. Muspell se aproximou do filho sorrindo: - Acho que você acaba de ganhar mais uma chance, filho. – Siegfried sorriu e então ficou sério novamente, olhando para as cinco mulheres e os nove homens que compunham o conselho.

- Obrigado. Eu prometo que não vão se arrepender. – Siegfried estava radiante. Os acionistas confiavam nele e queriam que permanecesse à frente da empresa. Siegfried olhou para o pai sorrindo e este abraçou o filho, orgulhoso e satisfeito.

Siegfried e Muspell voltaram da reunião que tivera assim que foi a possível. O jovem historiador não lecionaria naquele dia. Estava afastado da faculdade, temporariamente. Segunda-feira estaria de volta, uma vez que o caso já fora esclarecido e sua inocência fora comprovada. Ele sentia um alívio imenso.

Durante aqueles dias, em que ficara como alvo de acusações, sentira-se como o próprio Atlas, carregando o peso do mundo em suas costas, sabendo o que aquela falsa acusação representava para sua vida e para os negócios de seu pai. Aquilo podia prejudicar drasticamente a imagem da firma que agora administrava. Felizmente os acionistas, mais do que sócios, os amigos de seu pai, decidiram que ele merecia mais uma chance.

Quando chegaram, sua mãe estava ansiosa por notícias. Depois de tudo devidamente relatado, eles se prepararam para o jantar. Niflheim Sigurd havia preparado um belo jantar para os amores de sua vida. Siegfried sentia falta da comida dela. A comida que ele preparava não era lá grande coisa, era comível, na falta de coisa melhor... O cheirinho de comida se espalhava pela casa todo, fazendo-o sentir água na boca... Mas... Teria que ficar para uma próxima oportunidade.

Continua...

Gente, oi como vão? Desculpem o furo da semana passada. Espero que tenham gostado do capítulo. Por favor, mandem comentários. Como eu ainda não decidi se o próximo capítulo será o último ou não, eu vou postar apenas esse esta semana e deixá-lo com um gostinho de quero mais... e terão... se... houverem comentários... Beijos a todos. Tchau.