"Mãos frias, coração quente, paixão ardente, amor para sempre"

(Provérbio Popular)

by Ayan Ithildin

- Eu vou-me embora! – proferiu Aioros irritado.

- Ficas! – ordenou Saori. – Ou então…

- Ou então o quê? – cortou Sagitário com um mau humor semelhante ao do irmão. – Catalogam-me como traidor? Isso já faz parte da minha vida, já uma vez fui chamado, lembras-te… traidor porque te salvei a vida…

Dâmaris entrou para o centro da arena sem armadura assim como Shaka.

- Saori, acho que a Dâmaris está doente. – Carlo estava seriamente preocupado. Saori olhou-o. – Ela vomitou a manhã inteira e não comeu nada… Não podemos adiar isto?

- Doente ou chantagista? – Saori levantou-se para prazer dos cavaleiros de prata que tinham um ódio consagrado aos de ouro, de maneira que tudo aquilo lhes dava um imenso prazer e dispensou o cavaleiro de Câncer. – Podem começar… já conhecem as regras.

Shaka contraiu os músculos. Dâmaris sentiu-se assustada. Assustada por causa dele, por causa da situação, por causa dos berros dos cavaleiros de prata, por causa do rancor de Athena… sobreveio-lhe uma náusea profunda e ela estremeceu e desconcentrou-se bruscamente. Shaka moveu-se ligeiramente na direcção dela. Acalma-te, acalma-te, pelo que há de mais sagrado, acalma-te… pensou angustiada. Shaka moveu-se novamente sem entender a rigidez dela e ela foi tomada por um terror profundo, perdendo o controlo total do seu cosmos. Saori encostou-se na cadeira petrificada quando sentiu um cosmos quente e meigo se erguer levemente de dentro dela. Shaka também o sentiu e ficou estático. Ikki pôs a cabeça entre as mãos desesperado, sem que ninguém entendesse porquê.

- O que estás tu a fazer, schifozzi (cobarde)? – berrou Dante de Cérbero para dentro da arena quando o cavaleiro de virgem se sentou no chão em posição de lótus, cerrou os olhos e uniu as mãos geladas de nervosimo, baixando ao mínimo o seu cosmos. Dâmaris olhou-o angustiada, novas náuseas percorrendo-lhe o corpo. Por favor, eu só a trouxe de volta comigo porque pensei que ia ser tudo diferente… Tia, tu deixaste-ma trazer, ela não pode morrer, não assim…

- O que é que ele está a fazer… - foi a frase mais ouvida pelas bancadas.

- Cala a boca, figlio de una putanna, antes que eu ta encha de merda! – berrou Carlo do outro lado da bancada, disposto a ir até ao outro lado cumprir a ameaça que tinha feito a Dante e enchê-lo de porrada também.

- Experimenta se tens coragem… - berrou o outro, provocando-o.

- Ora seu… - Carlo começou a preparar-se para ir mesmo até lá quando Ikki o segurou. – O que é que tu queres…

- Pára, eles precisam de nós… - Carlo olhou-o, estranhando a face congestionada de Fénix. – Carlo, a Dâmaris… ela…

- Foda-se… - Carlo voltou para ao pé dos outros e inclinou-se na bancada, sobrepondo a voz às pragas da bancada de prata. – SHAKA; acaba logo com essa merda!

- Eu não vou fazer um inocente pagar por um crime que nem crime é! – disse de repente Virgem, silenciando toda a gente.

- Ele quis mesmo dizer que… - Afrodite desmaiou em cima de Kiki que sufocou entre pedidos de ajuda infrutíferos ao seu mestre.

- Buda, não! – murmurou Mu fechando os olhos. Dâmaris levara as mãos enregeladas de medo ao ventre, baixando o rosto. A gravidez desequilibrava-lhe a confiança e o controle e o barulho e ameaças estavam a dar-lhe cabo do sistema nervoso.

- SILÊNCIO! QUEM FALAR AGORA MORRE! – berrou Saga de repente silenciando a bancada de prata.

- Putain, elle est fort c'est la… (Foda-se, essa é boa…) - murmurou Camus estupefacto e meio perdido.

- Eu vou lá buscá-la! – decidiu-se Miro.

- Espera aí, eu também vou! – Aioria pôs o pé no varandim.

- Calma aí, seus suicidas! Temos que fazer isto com calma, ela está-se a sentir mal. – Aldebaraan segurou-os pelo pescoço. De repente ouviu-se a coisa mais surpreendente do Santuário.

- SHAKA, CAGA-TE NISTO TUDO E AJUDA-A, PORRA! SE FOSTE HOMEM PARA FAZER UM FILHO TAMBÉM TENS QUE SER PARA O PROTEGER! – berrou Shion do "camarote" de Saori emudecendo toda a gente.

- Calma, Shion… - Dohko tentou apaziguar a situação. Shaka despertou a tempo de segurar a jovem que ficara sem forças nas pernas.

- CALMA NADA! E, TU, MU, SEU IMPRESTÁVEL, O QUE É QUE ESTÁS À ESPERA PARA TELEPORTÁ-LA PARA O HOSPITAL? ACABOU O ESPECTÁCULO!

- Shion, ela ainda manda nisto… - murmurou Dohko puxando-lhe a manga.

-MANDA NISTO O TANAS! CAMBADA DE FEDELHOS MERDOSOS QUE PRECISAM DOS MORTOS PARA VIVER! SAGA, O MESTRE DO SANTUÁRIO TEM PODER DE MORTE SOBRE OS DESORDEIROS, SEU IMBECIL! NÃO APRENDESTE NADA COM ARES, CACETE?!

- SHION; CALMA! – berrou Dohko. – SAGA, IMP'E-TE!

- Euuuu…?! – murmurou Saga, desnorteado e preocupado em partir ao meio quem tentasse magoar Shaka, Dâmaris, o bebé, os três ou fizesse qualquer outra coisa que o desagradasse. Kanon resolveu interceder, fazendo-se passar pelo irmão.

- CAMUS, PREPARA-TE PARA ANOTAR O NOME DE QUEM FIZER BARULHO A PARTIR DE AGORA… AS LATRINAS ESTÃO A PRECISAR DE UMA LIMPEZA…- os de prata começaram a protestar – FEITA COM A LÍNGUA!

Finalmente fez-se silêncio, apenas se sentia o cosmos de Shaka a tentar acalmar o bebé e Dâmaris. Ouviu-se alguém a fungar.

- Desculpem… - Saori levantou-se. – Desculpem-me, eu tenho sido tão idiota… Eu… perdoem-me… perdoa-me, Dâmaris… eu não quero que vocês lutem… o bebé… Mu, leva-os…

- O que é agora? – perguntou Shion irritado. Tal como o discípulo, gostava de locais isolados, mas ao contrário do discípulo, entrava em colapso no meio de confusão.

Saori olhou para trás, para Shura que lhe sorria, incentivando-a. Shura que parecia um gato a lamber os bigodes, um gato que se esgueirara sem ninguém dar por isso e fora o único com cabeça para resolver a situação, atacando Saori pelo ponto fraco, porque uma coisa que ele gostava era de tirar medidas… e as de Saori vinham-se a alargar bastante…

- Eu declaro as velhas regras abolidas… e anuncio a todos que estou grávida… do cavaleiro Seiya de Pégasus…

Ficou tudo boquiaberto. Shion pigarreou novamente em stress.

- SEU INÚTIL, TELEPORTA-OS JÁ! – Mu apressou-se a fazer o que lhe fora ordenado e os cavaleiros tiveram uma debandada geral nas mais diversas direcções, sobretudo na direcção do hospital.

As regras, foram, assim, abolidas, mas sempre se ficou na má língua que Saori apenas as tinha abolido por ela própria estar numa situação delicada. Mas Shura repetia que se limitara a fazer Saori crescer em dez minutos e ela fizera aquilo que a sua consciência mandara. E durante cinco meses, Saori andou com a consciência bem pesada, chorado por tudo o que era canto, mimando os habitantes do Santuário até ao limite, até que finalmente teve os… trigémeos.


»»»»»»»»8 meses depois do combate… que não sucedeu«««««««

- Senhor Shaka, faça o favor de se sentar, já disse que não pode entrar no quar… - o médico parou estupefacto em frente aos treze cavaleiros de ouro, cinco de bronze, três amazonas, quatro bebés e uma deusa que estavam do lado de fora do quarto, sete geladeiras gigantes cheias de cerveja e cadeiras espalhadas pelo aposento moderno, baralhos de cartas, dominó, revistas… festa completa. – ISTO É UM HOSPITAL NÃO UMA FEIRA!

- Doutor, pshiu! – criticou uma enfermeira que entrava no quarto com uma pilha de toalhas, deixando a porta aberta. Ouviram a voz dela lá dentro. – Vais ter uma menina linda, exactamente como tu. É só teres calma, meu anjo e deixar-nos tratar de tudo, fazeres o que dissermos. Vá, vamos começar com as técnicas de relaxamento respiratório…

- Ensinem… ai… ensinem essas técnicas ao Shaka… ai… ou melhor, dêem-lhe um sedativo… - disse a voz dolorida de Dâmaris lá de dentro, recheada de bom humor. Cá fora Shaka ficou da cor de um tomate e as gargalhadas ecoaram pelo hospital.

- Força, Dâmaris! Está toda a gente aqui! – gritou Afrodite. O médico irritou-se de novo.

- Isto é um hospital…

- O meu hospital. Então… - Saori sorriu. – Nós vamo-nos comportar. Além disso, precisa de alguém que tome conta do Shaka.

Durante as duas horas que se seguiram, Shaka roeu-se de impaciência e nervosismo. Roeu as unhas, bebeu cerveja, amassou a camisa toda, levantava-se, sentava-se, passeava de um lado para o outro, suspirava, resmungava, sentava-se e levantava-se logo a seguir para recomeçar tudo de novo.

- Ay, hombre, acalma-te! – disse Shura por cima das suas cartas.

- É vero, Virgem, até parece que és tu que estás com contracções…

- Veni, vidi, vinci (Vim, vi, e venci…) - limitou-se Ikki a dizer mostrando uma mão cheia de trunfos.

- De novo! – reclamou Seiya. Pegou nas cartas e baralhou-as. – É preciso é calma, Shaka. Vai correr tudo bem…

- Fala a voz da experiência… - meteu-se Kanon rebolando os olhos.

- Qual experiência? Ele esteve quatro horas desmaiado… - cravou Miro.

- É, até eu peguei nos bebés primeiro… - concordou Saga enquanto Mu se ria.

- Ao menos eu aguentei-me ali, firme! – disse Aioria orgulhoso.

- Tão firme que quando tudo acabou estavas petrificado… - o irmão riu-se.

- AH coração de Leão! – casquinou Shina. Aldebaraan levantou-se e foi andar com Shaka pelo corredor e pela sala, com pena do amigo.

- Está quase, Shaka… - o indiano olhou-o e confirmou, engolindo em seco.

- As minhas preces foram concedidas… - disse Shura muito mais tarde, já Shaka estava pálido como a morte e visivelmente nervoso.

- Que preces, amore? – perguntou Shina levantando a cabeça do circulo de mulherada.

- Ver o Shaka no limite… - Afrodite levantou os olhos do livro e levantou-se, sentando-se ao lado do amigo.

- Ei, Sha… - esfregou-lhe vigorosamente as mãos geladas e suadas. – Queres um cházinho? Queres que vá fazer? – o indiano abanou a cabeça nervoso.

- Chá é para maricas! Ele quer é isto! – Aldebaraan entrou com uma caneca do seu famoso café fumegante a cheirar deliciosamente bem.

- Non, ele fica ainda mais nervoso! – argumentou Camus.

- Nervoso nada… olhem só… - Shaka engoliu de uma só vez metade do liquido. – Bom?

- Muito… - Aldebaraan sorriu e sentou-se do outro lado. O tempo continuou a arrastar-se. Shaka pensou em muita coisa, inclusive destruir o inventor de materiais à prova de som e o arquitecto do hospital… A porta do quarto finalmente abriu-se e Shaka levantou-se de um pulo. A enfermeira, uma freira calma e paciente, rechonchuda e a caminho dos cinquenta anos sorriu-lhe e aproximou-se pondo-lhe uma bebé nos braços.

- Uma bebé linda e perfeitinha. Parabéns! - Ficou tudo a olhar na expectativa enquanto o cavaleiro aninhava correctamente a bebé nos braços. Marin suspirou resignada.

- Até ele, não é, Oria… - Shaka contemplou a filha maravilhado, o rostinho perfeito e lisinho, o cabelinho de um loiro acastanhado, os olhinhos fechados mas de um desenho ligeiramente obliquo numa mistura sua e de Dâmaris, as orelhas pequeninas, o narizinho em forma de coração, as mãozinhas perfeitinhas, as unhas minúsculas cor-de-rosa, os dedinhos hábeis que lhe prenderam o dedo de imediato. A freira sorria benevolente esperando a pergunta seguinte.

- A Dâmaris? – perguntou Shaka levantando o rosto ansiosamente. Outra enfermeira pôs o nariz de fora.

- Está a descansar. Uma bebé tão grandinha deixa qualquer mãe exausta. Mas pode visitá-la, só tenha cuidado para não a agitar. – levantou-se tudo mas a mais velha pôs-se à frente da porta enquanto Shaka entrava.

- Calma! É preciso calma… - sentaram-se todos de novo, aguardando ansiosamente a sua vez de a visitar.

Dâmaris tinha os olhos fechados e o rosto exausto, pelo que Shaka se sentou silenciosamente no banco ao lado da cama enquanto observava a filha embevecido. Sentiu-se observado e olhou para cama, encontrando os olhos sorridentes mas cansados de Dâmaris.

- É linda, como tu… - murmurou beijando-lhe a testa e depois os lábios, roçando o nariz no dela.

- Kanya. – ela sorriu e passou a custo os dedos pela testa do cavaleiro, afastando-lhe a franja dos olhos. Antes que ela deixasse cair a mão, ele segurou-a carinhosamente e enlaçou os dedos nos dela. A enfermeira entrou dizendo que era hora "de dar a papinha à beb" e levou-a com ela. – Feliz?

- Muito feliz. Mas agora tens que dormir…

- Não te vás embora…

- Eu não vou… - ele começou a fazer-lhe festas no cabelo enquanto lhe dava a outra mão.


Próximo capítulo: "Epílogo"