Parte II
Seu pai deixou-o com seu novo tutor, sem fazer nenhum barulho de anunciação ou o que fosse.
O grande homem estava quase horrorizado com a cena... Aquele menino brincava tão livremente pelo deserto quando criança, agora engaiolado e confinado a uma janela. Ao aproximar-se do jovem loiro, Rashid, achando que ele estivesse vendo as pessoas que passavam pela rua, assustou-se, pois ele apenas fitava a árvore que dava para a janela. Apenas isso. Sem entender, e nem querendo, fez-se presente, já que o rapaz até então não havia dado mostras de que notara que alguém apareceu em sua cela.
- Jovem Mestre?
Nessa hora o menino estremeceu um pouco, fruto de seu susto. Voltou o rosto para Rashid e falou.
- Oh, perdão... Eu não tinha visto o senhor. Peço que me perdoe.
A cada minuto que passava, Rashid ficava ainda mais assombrado... Ele parecia ainda mais pálido e frágil visto assim, de frente. E a tristeza e a melancolia presentes em seus olhos eram ainda mais fortes do que antes... Chegava a ser pungente. Quase sólida. Seus pensamentos foram interrompidos pela voz fraca e opaca do menino. Parecia não ter força nem vontade de estar vivo.
- O senhor será... Meu novo instrutor?
- Depende... Você me quer ver como um professor? Podemos ser amigos, se você quiser...
- A-amigos??? – seu semblante mostrava como ele estava confuso... – Não acredito que o senhor queira ser amigo de alguém como eu...
==========- Bom dia jovem... Ainda são sete e meia e você já se encontra aqui na biblioteca? – falou o bibliotecário. Nem sabia porque ainda se dignava a fazer tal pergunta para o jovem rapaz de aparência oriental, cabelos pretos amarrados em um pequeno rabo atrás de sua cabeça e olhos incrivelmente vivos.
- Bom dia senhor... O senhor sabe que esse é meu momento de refúgio... Eu já o expliquei. – Falou-lhe o jovem com um encantador sorriso nos lábios. Já fazia uns três anos que ele viera da China para os EUA junto de sua mãe, de seu pai e de sua já falecida esposa. Gostava muito de ler e de estudar nos momentos vagos que tinha do dia, antes que fosse para a universidade ou depois de tal. Era um vício que não conseguia largar... Até porque era assim que "afogava as mágoas".
- Bem, então... Sinta-se à vontade. Se precisar de ajuda é só me pedir... Ah, já ia esquecendo. O senhor tinha me pedido para achar aquele livro, não é? Pois bem, eu achei a única livraria da cidade que possui esse livro... E parece que eles também trabalham com encomendas...
- Puxa... Obrigado. E eu aqui o importunando com coisas tão banais...
- Imagina: livro pra mim nunca foi banal... E ainda mais ajudar um jovem tão interessado em leitura quanto você, coisa bem difícil... É um prazer... Bem... Boa leitura.
- Sim, e obrigado.
Wufei saiu da biblioteca em busca da tal livraria. Ele estava doido para encontrar esse livro, pois o ajudaria em sua faculdade de psicologia. Ele sempre gostou de estudar as pessoas, apesar de admitir e saber que é um pouco tapado. Mas as diversas reações que uma pessoa pode ter em uma mesma situação sempre o inquietou e o impelia a estudá-los.
Já fazia um bom tempo que ele não ia tão fundo em uma análise... Desde que conheceu sua esposa, Meiran.
- Parece que é aqui a tal livraria... – Fala Wufei ao chegar em frente à porta loja, mas quando ia entrar pára ao constatar o horário – Nossa! Já tudo isso? Droga... Vou acabar me atrasando! – E com isso dá meia volta e vai correndo em direção à faculdade.
==========- Hey, Barton, já pôs a sua roupa? Barton...? Barton!
- Esquece, ele já se foi.
- Droga... Até parece que ele é que é o especialista aqui!
- Ele é só um aluno, mas você tem que admitir seu potencial, né?
- Potencial... Só se for o potencial de ser devorado por um tubarão!
- Hahahahahaha! Não fale assim... Ele mergulha por esporte e lazer, logo, entrar aí pra ele é como uma terapia...
- Hn! Seja como for... Eu odeio esse comportamento isolado dele!
Embaixo d'águaUm rapaz fazia a "ronda" por ali, para verificar se achava mais alguma coisa da qual não soubesse a existência... Mas não achou nada. Porém, não achar nada novo não significa não impressionar tanto. Ele sempre foi fascinado pelo fundo do mar, e agora ele ficava, mais uma vez, deslumbrado com o que via. Criaturas de todas as formas, cores, temperamentos e tamanhos a sua volta, numa dança tão bela e graciosa quanto o flamenco[1]. Quem sabe, até mesmo mais exuberante e bela que a mesma. Não dava para não ficar admirado com o que se via ali embaixo. Ele se sentia em casa, em paz... Tudo bem: de uns tempos para cá ele vinha se sentindo mais... Vazio. Solitário. Mas a sua vida sempre fora assim... Por que sentir isso justamente agora? Ah, seja como for: mergulhar sempre o fez sentir-se mais livre, solto, vivo, em contato com a vida. Era a sua maneira e isso era tudo o que seu coração e sua mente pediam naquele momento. E era justamente por isso que ele tinha escolhido exatamente esse ramo de especialização para seu curso de biologia: biologia marinha. Fauna e flora aquáticas[2]. Tudo muito lindo. Belo por si só.
Calculando que seu tempo já estava para se esgotar, ele voltou a superfície e recebeu um olhar meio que atravessado de seu professor. Coisa, claro que, pra variar, ele simplesmente recebeu de forma a condizer esplendidamente com sua personalidade e humor: ignorou-o.
- Barton! Quantas vezes eu já disse...
- "É perigoso e você é meu aluno, portanto me obedeça." Muitas vezes. – Falou com a voz bem fria e distante enquanto arrumava seu equipamento de mergulho sem olhar para seu professor. Coisas corriqueiras de seu temperamento.
- E você, mesmo sabendo isso de cor, nunca obedece, não é? - Se fosse outra pessoa, nem ligaria pro que ele fazia e já teria desistido de tudo. Trowa era um rapaz excelente. Brilhante em tudo aquilo que se dignava fazer, mas seu isolamento era algo como uma irritante, chata e fria barreira de gelo. Todas as pessoas desistiam de perfura-la assim que esbarravam nela. Mas ele não. – Trowa... Você é um aluno brilhante. Você poderia ter escolhido qualquer profissão que não faria diferença. Você é bom em tudo que se presta em envolver-se... Você poderia, por favor, me obedecer? Nem que seja de vez em quando? Por favor. Pelo seu bem!
Trowa simplesmente continuou a arrumar seu material, sem ao menos olhar para o professor. Nem mesmo esboçar uma reação. Apenas levantou o material, colocou-o nas costas e dirigiu-se para o outro lado, arrumando a âncora.
Mas seu instrutor era alguém que lhe era totalmente alerta e sabia que, mesmo que ele não esboçasse nada, isso ainda era uma prova de que ele o ouvira. De verdade. E que agora, pelo menos, este seria ouvido.
==========Lá estava o que para muitos seria uma aula extremamente maçante, mas para ele ali estava aquilo que lhe serviria para o resto de sua vida. Cálculo. Era uma aula de cálculo avançado e ele estava mais do que dedicado. Prestava toda a atenção no que lhe era passado. Muitos até o chamavam de robô, justamente por mão reclamar do forçado período de aula. Sim: integral. O dia inteiro assistindo aulas de cálculo e física. Mas ele nem mesmo fechava os olhos.
E agora, lá estava ele tentando resolver um exercício proposto pelo professor. Para ele não era nada de mais, mas para outros estava um pouco "puxado".
- Hey, Yuy... Você bem que poderia ajudar a gente, não é?
- ...
- Ah, cara, não faz isso! A gente ta com dificuldade, pô! Você não vai ajudar seus amigos????
Yuy pára o que estava fazendo e olha para o lado: Jason.
- Jason, em primeiro lugar, você não é "amigo" e em segundo se você prestasse mais atenção no profesor do que nos seios de sua colega você bem que entenderia tanto quanto eu o que se passa nessa folha ridícula de matemática.
Nessa hora entra pó professor e prossegue com a aula.
-E então? Quem achou o resultado? Mas o resultado certo.
-E qual é o certo?
- O que está no quadro!
Todos os alunos que conseguiram ao menos rascunhar um desenvolvimento compararam seu resultado com o do quadro e quase todos os alunos soltaram bufadas de indignação: eles não haviam conseguido.
Porém, pra variar, apenas um aluno havia conseguido a proeza de achar o resultado certo, e ainda por cima com mais de uma resolução.
- Deixe-me ver, Heero... Isso. Muito bem! A primeira resolução está correta. Eu só peço que você deixe comigo para que eu possa analisá-la após a aula, OK?
- Sim senhor. – Respondeu de forma neutra. Esse era outro. Não era o que se podia chamar de expressivo. Mas não chegava a ser cem por cento apático. Era um bom rapaz. Um pouco quieto, mas ainda assim, um bom rapaz.
- Bem... A aula acabou. Dispensados...
==========-Maxwell! Acorda cara! A aula já acabou!
O rapaz olhou para cima, volvendo seus olhos violetas para o rosto divertido do seu amigo: Terry.
- O quê?
- Há! Você esta mesmo voando, hein? Vamos! Levante-se! Mova-se! A aula já acabou!
- Ah, tá. – ele levantou-se meio que cabisbaixo. Não era de seu comportamento agir assim. E ainda mais quieto! Não mesmo.
- Hey! Pode ir falando!
- Falando o que?
Terry olhou bem fundo daquelas duas poças de ametistas e falou ao parar de andar:
- Você não é assim, Duo. O que foi?
- Hn... – Respondeu Duo com um sorriso – É só preocupação mesmo.
- Bem... Eu acertei. Ponto para mim! – falou arrancando mais um sorriso de Duo – Mas ainda não corrigi o erro no sistema. Qual é?
- Um amigo meu. Ele é um doce de pessoa. Nunca vi uma pessoa tão doce e bondosa como ele. Mas...
- Mas...?
- Mas ele está... "Trancafiado".
- Trancafiado???? Como assim?
- Calma... É que ele está "doente" e ele está em seu quarto. Mas ele não pode sair de lá. Parece um passarinho numa gaiola... É tão triste vê-lo assim. Ele é tão doce, tem uma aura que exala bondade... E agora...
- E agora???
- E agora ele está mais morto do que vivo. Ele lá dentro, fechado, sem nem ao menos poder ir à cozinha sozinho! Aliás, sozinho ou acompanhado. Não faz diferença! Ele está mesmo preso. Acho que ele às vezes deve se esquecer de como que é o rosto de uma pessoa, de tão pouco que ele convive com as pessoas...
- Nossa... Que triste. Mas, se ele tem pouco convívio com as pessoas... Como você o conheceu?
- Ah, isso foi há alguns anos atrás...
- Bem... Se você está assim por ele... Por que você não o visita? Acho que ele ficaria um pouco mais feliz não?
- É... Acho que você tem razão. Acho que estou devendo isso a nós dois. – E falando isso, Duo seguiu caminho para a casa de seu amigo.
==========- Boa tarde.
- Boa tarde. Eu vim entregar essa encomenda para o senhor Winner.
- Claro Senhor...?
- Kushrenada. Treize Kushrenada.
- Ah, sim, entre por favor, senhor. Já chamarei o Senhor Winner.
Treize ficou apenas observando a rica sala de visitas. Aquele lugar era rico, cheio de detalhes e peças caras, mas frio e desprovido de felicidade. Suas famílias eram amigas há muito tempo. Tudo por questão de negócios. Mas esses "negócios" foram crescendo e a amizade sendo formada, até que laços inquebráveis foram construídos ao redor de todos. E era por isso que sua tristeza crescia a cada minuto que via aquela linda e ricamente decorada sala. Ele ainda se lembrava de quando ele era mais novo e que seu amiguinho, o Quatre, era uma criança tão cheia de vida. Ele era alegre, frágil e delicado, é verdade, mas ele era muito vivo e alegre. Fazia a vida daquela casa, agora tão... Vazia. Ele "adoecera" e lhe foi vetado todo e qualquer contato com o exterior. Até hoje ele não sabia o que aconteceu de verdade, mas sabia que Quatre estava preso como um condenado. Ou pior, como um frágil e inocente canário...
- Treize! – Ouviu-se uma voz quebrar sua divagação vindo pela escadaria, o que lhe fez voltar para trás.
- Olá, senhor Winner!
- Você continua com essas formalidades, não é?
- O senhor sabe que eu não posso evitar!
- Tudo bem então. O que lhe trouxe aqui?
- Ah, claro... Eu trouxe alguns livros que o senhor pediu... Lembra-se?
- Ah, é mesmo! Eu estava um pouco ocupado com o instrutor de meu filo, tanto que eu nem mesmo tinha me lembrado da encomenda... E olha que elas têm relação direta, não é mesmo?
- É sim... Er... Senhor... E como é que está Quatre?
Houve um silêncio enquanto os livros eram passados das mãos de Treize para as do homem.
- Quatre está bem... Dentro dos padrões possíveis.
- Mas o que aconteceu com ele para que ele tivesse que ficar afastado de todos?
- Não é que ele tenha ficado afastado de todos, como se fosse uma doença contagiosa, mas ele não estava e ainda não está tão bem a ponto de se locomover livremente... Quatre, por algum motivo estava apresentando uma acentuada fraqueza e ele estava impossibilitado de andar por muito tempo...
- Oh... Eu não sabia... Mas aí o senhor poderia ter providenciado uma cadeira de rodas, não?
- Não... O problema não se restringia a apenas as pernas... Ele estava muito debilitado, sabe? Por várias vezes ele acabou por delirar com coisas estranhas... Eu realmente me preocupo com o que possa acontecer com ele lá fora... E com os outros também...
Treize estava muito preocupado e chocado com o que acabara de ouvir... Realmente era uma pena que coisas tão ruins tenham acontecido justamente com Quatre... Justo Quatre que era amante da vida...
- E... Eu poderia vê-lo, senhor Winner?
- ... Claro Treize. Me acompanhe. Ele está com seu novo instrutor, mas acredito que não terá problema nenhum.
- O senhor tem certeza? Se for atrapalhar, eu posso voltar outra hora.
- Problema nenhum! Você é sempre bem vindo e Quatre estava precisando ver rostos diferentes... Eu não suporto a idéia de trancafiá-lo lá em cima, mas eu não vejo outra alternativa... Ele pode até estar melhor, mas eu não confio muito no que está acontecendo... – Falou o homem enquanto subia as escadas com Treize, indicando-lhe o caminho – Eu ainda prefiro, mesmo, esperar que tudo se resolva por completo...
- E quando isso vai acontecer? – Treize percebeu que o senhor a sua frente falava com pesar e mais para si mesmo do que para ele ouvir. Caminharam em silêncio até chegarem a porta do quarto. Antes de abrir, o senhor Winner respondeu:
- Eu não sei.
E abrindo a porta, logo em seguida disse:
- Quatre, visita para você.
==========- Por que eu iria querer ser amigo de alguém como você? E por que eu não seria? – Rashid estava confuso. Aquele garoto a sua frente era mesmo o jovem árabe que ele aprendera a amar como filho? Que trazia calor a todos com seu maravilhoso e inocente sorriso? Não... Não podia ser...
- É... Por que você seria? Eu não tenho nada a oferecer a você... Nada além de uma pálida e quase morta companhia... Minha presença mórbida não deve agradar a alguém... Por que agradaria você?
- Quatre... Você... Você se lembra de mim?
- ...
- Lembra...? Mestre... Quatre?
Arregalando os olhos, Quatre se lembra dessas palavras. Sim, sempre teve um homem que estava atrás dele como um escudeiro... Como um protetor. Sim, como ele não se lembraria de um homem grande que chamava uma delicada e frágil criança de mestre?! Ele até se sentiria feliz se não fosse a sua situação. Aquilo que o deixou encarcerado e incomunicável com o resto do mundo. Uma grande sensação nostálgica se apossou de seu coração, mas ele não deu bola, afinal, a nostalgia já era uma antiga companheira dele.
- Rashid... Como não me lembraria...? – Falou num tom amargurado, mas com um fino e doente sorriso em seus lábios delicados, debruçando-se sobre o homem, num abraço fraco, mas cheio de sentimentos.
- Você se lembra do porque eu te chamar de mestre? – Falava Rashid correspondendo ao abraço dado por seu pequeno garoto.
- Não... Pra dizer a verdade – Falava Quatre com seu rosto apoiado no ombro forte do homem – Eu nunca soube o motivo. Nunca soube o que te levou a me chamar de Mestre. Sendo que seria muito mais cabível você chamar meu pai de Mestre...
Rashid apenas sorriu. Sim era mais lógico chamar aquele homem forte e decidido de Mestre do que aquela frágil criatura... Mas como se render aos encantos de criança tão magnífica?
- Hn... – Seu sorriso se alargou e ele passava uma mão pelos cabelos dourados e a outra passeava pelas costas enquanto soltava uma lufada de ar – Parece que você não se conhece, não é mesmo? Você sempre fora decidido, forte, inteligente, amável e se preocupava mais com os outros do que com a si mesmo... – Ele parou para encarar os olhos azuis profundamente – Você é um homem de fibra. Tem mais fibra do que muitos homens que eu conheci ou que existem! Você é mais homem e mais honrado que até mesmo seu pai... É um enorme prazer pra mim, poder chamá-lo de mestre e se eu pudesse ser seu seguidor...
Quatre olhava assustado para o homem a sua frente. Rashid era muito estranho... Ele nunca entendeu como que ele poderia nutrir tal simpatia justamente por ele! OK, OK... Quatre era sensitivo sim, sabia dos sentimentos de pai que Rashid tinha para com ele. E estava ficando desconcertado e perdido com tudo aquilo que ele estava sentindo e vendo. Aquela declaração era mais do que ele precisava ouvir. Sim. Ele se sentia muito mal. Estava sozinho, praticamente não tinha amigos. Vivia isolado do resto do mundo. Do resto até mesmo da CASA! Isso era praticamente paranóia! Ele nem mesmo podia descer da cama! Seu pai se preocupava e ele sabia que era para o próprio bem... Mas ele nem sabia direito como que era o sol... Nem como que eram as nuvens... Sua cor ao anoitecer, ao amanhecer... O cheiro das plantas só entravam nas suas narinas por causa da árvore que tinha em sua janela. O canto e a cor dos pássaros só preenchiam seus olhos e ouvidos por causa daquela árvore. Ele queria poder sair, se divertir. Brincar na água do rio e do mar, sentir a neve caindo do céu e esfriando o tempo. Ele queria poder se molhar com a chuva, sentir a lama entre os dedos dos pés... Queria, nos dias de sol, correr pelos gramados, fugir das abelhas e vislumbrar as borboletas...
- Eu o seguiria. – Foi a frase dita por Rashid, interrompendo seus pensamentos. Nesse instante Quatre volveu seus grandes olhos para Rashid e chegou a conclusão. Sim: ele queria viver a própria vida. Com os próprios pés, com os próprios olhos, com o próprio corpo... Com a própria vida...
- Quatre, visita para você...
Nesse momento a porta havia sido aberta e por trás dela saíram duas figuras: seu pai e...
- Treize!
- Olá Quatre! Como é que você está!? – Treize estranhou Quatre ter exclamado seu nome assim que o havia visto. Ele havia pensado que Quatre estaria mórbido, inexpressivo. Tudo bem que ele parecia cansado, pálido, que estava preste a ser decomposto... Mas esse ânimo na voz...
Ele olhou para o lado e viu que o Sr. Winner também teve a mesma reação. Ele não esperava que Quatre se portasse dessa forma. Ele estava em uma espécie de profunda depressão. Há quanto tempo ele não esperava por isso! Que seu filho desse mostra de vida... E olhando seus olhos... Dava pra ver que essa era a condição: ele queria viver. Seus olhos estavam brilhantes... E em um tom de azul que há muito não viam, e apenas esperavam...
- Bem... Eu estou bem, obrigado. Mas o que o traz aqui?
Dava pra perceber que ele realmente estava cansado e sua voz estava falhando. Sim, isso comprova que o seu estado deveria mesmo ser o mesmo que o seu "tio" tinha lhe falado. Algo despertou Quatre de seu transe. E quem disse que isso era ruim?
- Ah, claro, seu pai tinha encomendado uns livros... – Falou olhando para os livros nas mãos de seu pai.
- Ah, sim... Já que são para você, faça bom proveito, meu filho. Rashid, eu gostaria de acertar algumas coisas com você.
- Claro senhor Winner. – Respondeu olhando rapidamente para Quatre e depois para o chefe da casa. – Pode ser agora, se o senhor quiser.
- Sim, por favor. Quatre, Treize, fiquem a vontade. Com licença.
- Toda – responderam os dois jovens em uníssono.
A porta atrás deles se fechou e só então algo se fez ouvir: a voz de Quatre.
- Eu não sabia que você trabalhava com livros...
- Na verdade... Eu sou dono de uma livraria...
- Sério? Que legal! Eu fico feliz por você... – Quatre esbanjava boa vontade, mas estava na cara que ele estava passando por algo novo. Ele não estava mais como o pai do jovem havia dito. Tinha algo de tudo que foi analisado... Ele estava confuso...
- Quatre...
- Fale Treize – Respondeu Quatre enquanto olhava os livros que seu pai havia encomendado.
- Seu pai me disse que você não estava bem...
Nesse momento Quatre parou de remexer nos livros e voltou sua cabeça para Treize, deixando-o falar e mostrando que estaria prestando atenção no que seria dito.
- Mas... Você está melhor do que eu esperava encontrar... Digo...
- Eu sei Treize... – Falou voltando seus olhos para baixo, observando os livros e suas mãos sobre os mesmos, com um leve sorriso em lábios... – Eu não sei mais como são as cores que o céu pode conceber para os olhos das pessoas. Não conheço mais cheiros e perfumes das diversas flores... Nem conheço muitas cores... Não sei como é a neve caindo do céu, não mais como é o gramado sob meus dedos, a lama envolta deles... O cheiro do mar... Como é sua água em meu corpo. Quero viver a minha vida. Eu me dei conta disso hoje. Eu não vivi até hoje... E gostaria de recuperar o tempo perdido.
Sim, ele compreendeu naquele instante: Quatre voltava a vida.
- Mas, Quatre... O seu pai irá deixar você sair do quarto?
Quatre olhou nos olhos de Treize com muita firmeza. Naquele momento Treize percebeu que a persistência fazia parte dele e que por nada no mundo ele desistiria de sua liberdade.
- Meu pai me ama... Ele sofre me vendo preso aqui... O seu sonho é que um dia eu possa sair daqui e viver como um jovem da minha idade. Um jovem comum... Ele vai permitir isso. E Allá estará comigo nessa hora. – Respondeu firmemente Quatre com um sorriso estampado no rosto.
Treize estudava as feições de seu amigo e quando percebeu que ele falava sério também sorriu...
- Espero mesmo que você consiga. Estarei rezando por você...
Quando não foi que, de repente, a porta mais uma vez foi aberta e a voz do pai de Quatre se fez ouvir:
- Parece que hoje é o dia das visitas, não?
- Há quanto tempo, hein Q?
Quatre arregalou os olhos... Sentia muita saudade de seu grande amigo...
==========- Senhor Winner... O que o senhor deseja falar comigo?
- Bem, Rashid... Eu só queria terminar de acertar as coisas com você: período de aula, local, pagamento e essas coisas...
- Ah, sim...
Ahmond havia percebido que algo de errado havia acontecido. Sentia que Rasid queria falar algo...
- Alguma coisa o incomoda...
- Hã? Ah, nada não senhor...
- Eu não fiz uma pergunta – cortou para logo poder se certificar – eu sei que você tem algo. Eu o conheço. Algo o deixa ansioso... O que é? Diga-me meu amigo...
- Senhor... – Rashid nem sabia por onde começar... – O mestre Quatre...
- O que tem o Quatre?
- Ele mudou...
Os dois permaneceram parados, se encarando... Sim, ele havia percebido: Quatre estava "florescendo". Ele finalmente começou a viver... Pelo menos dava mostra de querer tal...
- É... Eu vi...
- E o senhor também percebeu que ele agora não mais pode ser impedido, certo?
- O... O que você quis dizer com isso? – Ahmond[3] sabia, mas ele não queria acreditar no que estava para ouvir...
- Quatre irá sair daquela cama. – falou de forma que fosse mais clara e coerente para ser compreendido. Foi curto e grosso.
O Sr. Winner nunca iria aceitar assim, de forma rápida as mudanças que seu filho estaria por sofrer... Apesar de estar dando mostras de liberdade, Quatre ainda era... Ainda tinha...
- Mas Quatre não pode sair de casa! Seria muito perigoso... Ele pode... Ele pode...
- Eu compreendo o seu medo, e ele é mais do que justificável... Mas o que não é justificável é você prendê-lo aqui! Ele é um rapaz comu...
- Ele não é comum! – retrucou com velocidade e rispidez o jovem senhor. – Quatre não é normal...
- Mas você não pode tratá-lo como um anormal, como uma aberração! – retorquiu Rashid ao que lhe foi dito com aspereza. – O senhor deveria dar-lhe uma chance... Ele não é uma criatura má...
- Meu filho não é uma "criatura"... E muito menos uma criatura má...
- Então... – tentava a todo custo convencer o senhor da casa de que era o melhor a se fazer... – Deixe Quatre andar, viver, sorrir, ver... Ele precisa disso, mais do que ninguém!
Ahmond não queria aceitar... Ele sabia que deveria fazê-lo... Seu filho não merecia isso... Não merecia ser enclausurado... Não, não, não...
- O senhor sabe que, se o senhor não o fizer por bem...
Ahmond olhou pra Rashid de forma repreensiva...
- Você está me ameaçando? – ele sabia que não era isso o que estava acontecendo... Mas queria algo que servisse de empecilho.
- Não, e o senhor sabe disso... Mas o senhor também sabe que se não o fizer... Não poderá impedi-lo de qualquer forma...
Sim, era verdade... Quatre apesar de obediente era bem persistente e teimoso... E se ele não permitisse a saída de seu filho, e assim, pelo menos, conseguir controlar seus passos, ele sairia de qualquer forma, e seria muito pior, pois assim ele perderia todo o controle que ainda teria...
- É... Eu sei... Acho que não me resta nada a não ser...
Nesse momento a porta se abriu, revelando uma figura junto a empregada, que há muito não via naquela casa...
- Olá Sr. Winner!
- Sr. Winner, este rapaz disse que queria falar com o senhor.
- Oh, tudo bem Carla. Obrigado.
- De nada senhor. Com sua licença – e fazendo reverência, a moça se retirou deixando apenas os homens mais velhos e o jovem exótico.
- Como vai Duo? Já faz tempo que não o vejo.
- Eu estou bem. – falou, sempre com um sorriso a postos – Eu vim aqui porque estava com saudades do loirinho.
Ahmond sorriu em resposta. Duo e Quatre sempre demonstraram uma ligação muito forte de amizade. Como se fossem irmãos, de tão íntima que era essa relação. Mas Duo sumiu de repente e Quatre, que já era triste ficou ainda mais abatido.
Conhecia o jovem e não era de ontem. Já fazia muitos anos que ele conheceu o menino de longos cabelos e olhos violetas. Ele e seu filho conheciam o passado do menino a sua frente. E era justamente por isso que sempre achou fascinantemente estranho a interação que ambos possuíam.
- Por isso não seja. Ele está em seu quarto agora.
- Lógico – falou baixinho, com pesar, mais para si mesmo do que para os outros ouvirem. Foi um ato inconsciente, mas ainda assim falou. E foi ouvido.
- O que disse?
- Er... Nada! O senhor disse que ele estava no quarto dele, não é? Lógico! Ele está em casa... – tentou disfarçar muito mal, mas tentou... O Sr. Winner até achou graça da situação. Ele não ficou chateado com Duo pelas palavras dele... Muito pelo contrário.
- Ah, Duo... Deixe-me apresentar Rashid. Ele vai ser o professor de Quatre.
- Professor? Mas Quatre tem idade para estar na faculdade. Sem contar que Quatre sabe ler. Até melhor que eu!!
- Eu serei, na verdade, um tutor. Um reforço – explicou-se Rashid com um sorriso ante as palavras de Duo – Quatre é uma pessoa com uma mente brilhante, aguçada, que não pode ficar parada... Por isso é que eu irei lhe tutorar. Apenas exercícios. Ele... Já tem conhecimento suficiente para administrar uma empresa. Ele não precisa se "formar" em algo. Tem habilidade natural para a coisa.
- Nem me fale... Eu já vi o quão inteligente aquele loiro pode ser... Chega a dar medo, pode ter certeza!
Todos riram lá dentro. Duo sempre fazia isso com as pessoas... Mas o que ele dizia era a mais pura verdade: Quatre tinha um alto QI. Na verdade... Não que ele não o tivesse também, mas a sua vida não permitiu que ele tivesse a oportunidade de Quatre. De ter alguém para lhe aguçar a mente a seu nível de necessidade. Mas mesmo assim ficava feliz pelo amigo... Exceto pelo fato dele estar confinado a uma cama... A um quarto...
- Duo... – começou calmamente Ahmond – Quatre mudou.
- Como assim...? – ele ainda tentava absorver o que aquelas palavras queriam dizer... E ficou pasmo com tudo o que Rashid e Ahmond estavam lhe falando, explicando o que eles acabaram de concluir minutos antes deste chegar. E lógico que Duo não tinha como ficar mais feliz... E se dependesse dele, seria agora que aquele loiro sairia de seu confinamento.
- Pois bem – começou com um sorriso maior que seu rosto – onde se encontra Rapunzel?
- Vamos até lá... – sorriu-lhe o pai de seu amigo.
- Er... Sr. Winner?
- Fale Duo.
- Posso passear com Quatre?
- Claro. Você seria a melhor companhia que meu filho poderia ter. Eu confio em você.
E com isso ele abriu a porta do quarto de Quatre.
- Parece que hoje é o dia das visitas, não?
- Há quanto tempo, hein Q?
Quatre arregalou os olhos... Sentia muita saudade de seu grande amigo...
- Duo! – Não podia conter-se de tanta felicidade. Sentiu ímpetos de pular da cama direto ao pescoço do jovem de olhos ametista. Mas suas pernas fracas, que não estavam acostumadas a nadar já fazia algum tempo, mal puderam mover-se com precisão. O máximo que ele conseguiu foi, de forma débil, pôr-se de pé e mover-se de forma lânguida até o seu amigo. Ainda meio que vacilante, mas firmemente, foi até este, que veio de encontro ao mesmo, e abraçaram-se com todas as forças que poderia uma saudade guardar em peito. Com lágrimas nos olhos, ambos sorriam e choravam de tanta felicidade. Era um abraço caloroso, cheio de um afeto. Tão forte que qualquer um que estivesse no quarto naquela hora poderia sentir a intensidade do amor dos dois. Mas também era óbvio que era apenas amor de irmãos. Os dois e amavam como se ambos possuíssem na própria veia o sangue do outro. E isso era algo que não dava para ignorar.
Justamente por isso é que o Sr. Winner e Rashid retiraram-se silenciosamente deixando os jovens conhecerem-se e reverem-se.
Limpando o rosto do loiro, e com um sorriso em suas molhadas faces, Duo começa um diálogo.
- Quatre... Nossa... Parece que foi ontem que a gente se viu pela última vez... Você melhorou bastante, hein? – brincou, lançando um olhar nada casto de cima a baixo por sobre o corpo de Quatre, o que fez o loiro ficar vermelho, tirando uma gargalhada jovial de seu amigo. – Ah, não fique assim, você sabe que você é muito lindo... – e voltou a rir ao ver que Quatre corava mais ainda.
Mesmo feliz e tudo mais, ele não pode deixar de notar o homem ao lado deles, que o olhava com indiscutível curiosidade. Ao afastar-se e perceber que curiosidade ficou ainda mais aberta, Quatre tratou de repreender-se e apresentar os amigos.
- Oh, mas que falta de atenção a minha... Me desculpem... Duo, este é Treize Kushrenada, um antigo amigo da família e um grande amigo meu. Treize, este aqui é Duo Maxwell, um amigo de infância, mas já faz um tempo que a gente não se vê, né Duo? – falou com um sorriso adornando seu rosto e com um leve ar de repreensão, mas que era visivelmente brincalhão.
- Deu para notar – sorriu Treize – Mas me diga. Você parece novo...
- Sim, sou... Bem, tenho a idade do Quatre, né? Tô na faculdade ainda.
- Faculdade...? Eu me lembro da minha...
- Você fala como se tivesse terminado há mais de uma década, Treize! – falou Quatre – Duo, Treize é dono de uma livraria. Ela fica no centro da cidade...
- No centro da cidade... Por acaso seria a "Libri"[4]?
- Sim, ela mesma – orgulhou-se da reação que obteve do jovem simpático a sua frente.
- Eu vou muito lá... Tem ótimos livros. E todos os que eu consigo para a faculdade são de lá mesmo. Depois que a outra livraria me deixou na mão, mudando-se para outra cidade... Mas enfim. Agora que eu conheço o dono... He, agora vai ser mais fácil de se conseguir descontos – resolveu brincar um pouco, o que acabou tirando uma boa gargalhada de Treize.
- Pode deixar que eu vou me lembrar de te dar um desconto da próxima vez que você for lá. – E com um sorriso dirigiu-se a Quatre – Bem, Quatre, eu gostaria de poder ficar mais um pouco, mas eu tenho que voltar para a loja...
- Puxa Treize... Você realmente tem que ir? – insistiu.
- Tenho sim.
- Er... Não foi por minha causa, né?- Claro que não Duo... Mas eu realmente tenho que ver quem está recebendo os descontos. – brincou também – Mas sem brincadeiras, foi um prazer te conhecer e espero que possamos nos ver mais vezes.
- Ah, mas se você for amigo mesmo do Quatre você vai enjoar de me ver.
- Espero. Um beijo Quatre, pra você também Duo. Foi um prazer.
- Não quer que a gente te leve até a porta?
- Não precisa loirinho. E acho até melhor que você se arrume um pouco, afinal, pijama pode ser confortável, mas não muito formal. – E com mais um aceno de cabeça, ele foi-se.
- Cara legal esse, Q. – falou Duo, muito entusiasmado sentando-se na cama e balançando os pés como se fosse uma criança, enquanto observava a porta.
- É verdade – falava enquanto arrumava os vários livros que Treize havia lhe trazido – ele é um amigo de verdade... A gente é muito apegado.
- Deu pra perceber – Duo desviou a sua atenção da porta e voltou-a ao que Quatre fazia. Um livro em especial lhe chamou a atenção e começou a estudar a sua capa. Achou estranho, afinal, de que eram na verdade aqueles livros todos?
- Duo... Você tem estado muito ocupado?
- Não... – respondeu sem tirar os olhos daquele livro... Algo o chamava nele... E ele não sabia o que era. – Quatre, posso fazer uma pergunta?
- Claro Duo – parou ao ouvir o tom estranho de seu amigo.
- Sobre o que são esses livros?
- Sobre o que? Oras... São sobre administração. Não era essa a intenção de meu pai? – franziu o cenho.
- E que diacho de livro é esse aqui comigo? – falou, seu tom de voz subindo uma oitava.
- Esse com você??? Por que, ele é diferente?
Quatre aproximou-se mais de Duo e pode ler, no livro em sua mão os dizeres "Vidas Passadas".
- "Vidas Passadas"... – balbuciava em um tom quase morto, como se estivesse em transe. Seus olhos ficaram desfocados, mas Duo não percebeu e acabou tirando Quatre de seu estado de dormência ao continuar falando.
- Em que esse livro tem a ver com Administração de empresas? Haha, só se for como administrar um espírito. – debochou o rapaz de longa trança.
- Duo, não brinque com isso! – sentiu-se muito ofendido de repente, como se não devesse brincar com esse tipo de coisa – bem, outro dia eu peço para alguém devolver esse livro para Treize, hoje nem adianta mais, eu acredito.
- E por que outra pessoa? – começou Duo.
- Duo... Você sabe que eu não posso sair de cas...
- Agora você pode! – e divertia-se com o espanto no belo rosto pálido, os olhos azuis arregalados... Ele sabia que isso era cruel, mas não podia evitar de brincar, afinal, era um boa notícia e não era mentira. – Eu conversei com seu pai e... Ele permitiu que você saísse de casa... Eu posso sempre te acompanhar, pois ele ainda se sente inseguro quanto a você sair sozinho de casa... Mas com o tempo isso muda. Q, você ta livre!
Quatre ainda não podia acreditar... Ele finalmente estava livre de seu tormento? Ele poderia ver as pessoas, as plantas, os animais... Poderia? Nem dava para acreditar... Quando ele menos acreditava na sua sorte, quando ele começava a achar que era uma brincadeira de mau gosto, o loiro sente um abraço bem forte ao seu redor, acolhendo-o e aquecendo-o.
- Eu sei que parece surreal, mas acredite: você está livre Quatre! Livre, finalmente... Agora você pode andar por aí, conhecer as outras pessoas...Tudo o que Quatre pode fazer foi retribuir o enlaço. Se sentia livre de sua gaiola. Agora ele realmente poderia ser livre. Poderia ser igual aos outros. Endireitando-se e secando os olhos, Quatre com um belo sorriso estampando sua face, continua, tentando disfarçar sua excitação e nervosismo.
- Tudo bem. Então vamos continuar a arrumar esses livros que outro dia eu entrego a Treize.
Duo apenas sorria. Ele conseguia sentir a felicidade que era para seu amigo loiro finalmente ser livre. E ficava feliz por isso também, óbvio. E claro, como um bom amigo, ele quer justamente aproveitar e mostrar o mundo para o loirinho, como se ele fosse um intercambista.
- E que tal amanhã? Acho que não teria problema se amanhã a gente fosse lá à tarde e devolvesse, certo? Até porque eu só vou ter aula na parte da manhã, e ainda assim só mesmo até as dez.
- Sério? – não conseguia mais disfarçar sua euforia – Digo... OK, então amanhã de tarde. Ah! E você pode vir então e almoçar comigo, né? – continuou, dessa vez pegando o tal livro para colocá-lo em cima da escrivaninha.
- E como que eu digo não para um olhar de cachorro pidão como esse? – e os dois começaram a rir, mas sem querer, Duo acabou por esbarrar em Quatre, deixando o livro cair, e fazendo com que seu conteúdo caísse.
Cartas.
Aliás, cartas não.
Baralho.
Baralho de Tarot.
Os dois se olharam e olharam simultaneamente o chão, onde as cartas encontravam-se.
Mas por que raios Treize teria lhe levado esse livro sobre vidas passadas???
- Mas o que é isso? – Quatre vocalizava suas dúvidas, que estavam em comunhão com as de Duo, enquanto abaixava-se para pegar as cartas. Ao tocar na primeira, ele parou, ficando em estado de dormência, transe, como se algo lhe prendesse a atenção como se prenderia a alma.
- Quatre...? - Duo começava a se preocupar com seu amigo abaixado como se a vida tivesse parado. Olhando para sua mão, ele via uma carta.
O Carro.
- Só existe uma coisa que o prende a esse mundo... E espero que você saiba ver e dessa vez não deixar a chance escapar de suas mãos... – uma voz arrastada e monótona saiu da boca do garoto ajoelhado. Parecia a dele, mas não era "ele". Um tom de voz que não era utilizado pelo garoto. E realmente assustava.
Pondo uma mão cautelosamente sobre o ombro do loiro, Duo perguntou, receoso de que ouviria.
- Quatre...?
- O que foi Duo? – piscando os olhos, parecia despertar de um transe e realmente estava confuso. Ele sentia como se algo tivesse acontecido, mas não sabia o que exatamente.
- Você ficou esquisito quando tocou a carta...
- O que? Esquisito? Mas como?
- Er... Acho melhor a gente esquecer... Ponha as cartas de volta e vamos lá pra baixo... Acho que é o mais sensato, né?
- Ta certo.
E os dois arrumaram as cartas de novo dentro do livro e resolveram esquecer (nem que temporariamente) o que havia acontecido. Tanto que não haviam falado sobre ele com Rashid e nem com o senhor Winner.
Mas, quando eles saíam do quarto, eles não perceberam que, de alguma forma, seis cartas encontravam-se sobre o livro.
==========CONTINUA...
[1] – alusão a bela e majestosa "Dançarina Espanhola".
[2] – perdão, mas é que é minha fascinação: o fundo do mar... Não existe ambiente mais exótico e apaixonante que este .
[3] – alusão as fics da Yoru no Yami ("Lábios de Sangue"). Me desculpem, isso não é cópia. Mas é que eu não me conformo com a idéia de um mesmo personagem com uns mil nomes difrentes... E como o nome do pai do Quatre não é revelado (assim como os das outras 28 irmãs dele), resolvi pegar emprestado, para que, assim, pelo menos cause uma sensação de familiaridade maior... Espero que me entendam...
[4] – "livro" em latim (perdão, é que eu morro de vontade de aprender latim >.
Bem... Me desculpem pela demora... Eu realmente não tinha notado que o tempo estava passando e perdi a noção. Até porque eu também fiquei no trabalho sem internet e ainda descobri que meu cooler estava com problemas e que para que meu PC não fosse para o espaço, seria melhor eu nem ligar o bicho... E só agora é que eu me dou conta de que a fic estava parada desde maio... Eu realmente peço perdão por tudo, OK? Não tinha percebido, mas, se tudo der certo, não demorarei tanto assim mais para escrever (talvez, no máximo, um mês), principalmente porque agora eu vou começar a estudar e, bem... Tempo será algo que terá horário em minha agenda T-T
Mas se tudo correr bem... Bem... Talvez semana que vem eu já tenha uma nova fic (sim, eu não tenho neurônios suficiente para escrever mais de uma fic por vez, mas não custa nada tentar, sem contar que é melhor, pois assim eu perco com menor facilidade a trama da história) e de um novo anime. Sem contar que estou com outros projetos, mas ainda não sei como eu desenvolveria essa fic '.E, finalmente agora (a0esar de ter sido muito cedo) acho que já deu para ter uma idéia do porquê do nome da fic ser esse (né Shanty Lee)?
E sim, mudei o formato do texto (parágrafos espaçados). Acho que assim, apesar de menos organizado na minha opinião, ajuda mais a vista. Então, para os que acompanham as minhas fics, por favor, se tiverem uma preferência entre os formatos de disposição do texto, me digam que eu o seguirei com prazer, OK?
E muito obrigada às garotas que me mandaram e-mails e deixaram reviews. Muito mesmo e a vocês eu peço perdão por ter demorado tanto, OK? Vocês podem me dar um belo puxão de orelha assim que quiserem, que se não eu não percebo.
Muito obrigada e eu espero seus comentários, OK? Beijos e até!
Otaku Chan
A atrasada