Disclaimer: Os personagens de Inuyasha não me pertencem.


LÁ E DE VOLTA OUTRA VEZ


I know my dreams are made of you
(Eu sei que os meus sonhos são feitos "de você")
Of you and only for you
(De você e apenas para você)
Your ocean pulls me under
(O seu oceano me puxa pra baixo)
Your voice tears me asunder
(Sua voz me deixa em pedaços)
Love me before the last petal falls
(Me ame antes que as últimas pétalas caiam)
Beauty And The Beast – Nightwish


Sinto que meus olhos ficavam aguados cada vez que me lembrava de como havia sido "uma humana estúpida que não sabe qual é a hora para fazer as coisas certas".

O rosnar mal-humorado de Inuyasha nunca antes havia sido um motivo para acreditar que eu não era querida. Ainda que ele frequentemente conseguisse me tirar do sério, eventualmente percebi que ele nunca foi a pedra de gelo que sempre aparentou.

Jamais me importei com seus insultos, seu jeito ignorante, suas palavras rudes ou a maneira como rosna quando está aborrecido. Admito que penso que às vezes até pode ser divertido.

Como estávamos vivendo juntos, havia convertido como meta de vida enfurecê-lo. Adorava vê-lo resmungar. Lançava-lhe um "Bom dia, Inu-chan" quando acordava e um "Boa noite, Inu-chan" quando ia dormir. Ria quando via sua face adquirir um tom berrante de irritação, controlando seu temperamento para não gritar mais do que deveria. Sim, ele gritava bastante, mas tinha cuidado com certas coisas. Nós dois sabíamos que, uma vez ditas, havia algumas palavras que jamais poderiam ser retiradas.

Depois que derrotamos Naraku, a paz reinou parcialmente pela Sengoku Jidai – considerando que ainda ouço os gritos de Sango e Miroku.

Nunca consegui entender seu relacionamento. Mesmo depois de casados, as veias de Sango ainda latejam quando seu pobre marido tenta tocá-la em público.

Definitivamente, eles são o casal mais excêntrico e esquisito que já conheci, contando inclusive comigo e Inuyasha, que vive dormindo sobre as árvores quando é expulso de casa. A maneira como o rosto de Miroku está sempre vermelho e como a mão de Sango parece sempre pronta para socá-lo, porém, é incomensurável. Eu posso escutar de casa os berros dos dois, tudo com uma nitidez espantosa.

Tenho de dar razão para Inuyasha quando ele se mostra irritado pelas discussões que o acordam na madrugada. Sua audição aguçada deve fazê-lo sofrer. Se até eu, que sou humana normal, posso distinguir com perfeição os "Miroku, seu grande pervertido!" e os "Minha mão escorregou, Sango querida", que dirá ele? Seria trágico, se não fosse cômico.

Mesmo agora, que ela está esperando um bebê, com pouco mais de cinco meses e uma barriga enorme, as coisas não melhoraram. A tensão se aliviou, por sorte, mas em parte foi porque, depois de descobrir que seria pai, Miroku virou a pessoa mais compreensiva do planeta. Passou a seguir com atenção redobrada e dedicação ímpar seu trabalho como monge, ajudando pessoas necessitadas de vilarejos vizinhos.

Presumo que, agora que está ciente de que realmente vai ter uma responsabilidade maior que a de se manter fiel a Sango, quer dar um futuro digno à criança que está por vir.

Sua mudança sempre me surpreende. Jamais pensei que o veria como um verdadeiro pai de família.

Para mim, porém, as coisas não correram com a mesma facilidade.

É claro que eu sabia a loucura que havia sido me apaixonar por Inuyasha, dado sua personalidade difícil. Mesmo assim, eu o amava. Amava suas orelhas e a maneira como seus olhos conseguiam expressar todas as emoções que estava sentindo. Amava o som da sua voz ao pé do meu ouvido.

Nunca pude entender o desejo de Kikyou em transformá-lo num humano, mesmo com todo o preconceito que existia para hanyous. Já não poderia viver sem a cor dourada da sua íris ou, principalmente, sem suas orelhas. Eram as coisas mais deliciosas do mundo. Tão fofas e macias. Como uma pessoa poderia desejar propositalmente se abster do prazer de acariciá-las todas as manhãs? É um dos mistérios da vida que eu, particularmente, não gostaria de me privar para descobrir.

Só que, admito, me apaixonar por ele foi a coisa mais difícil que já fiz. Doía. Ainda dói. No que ele mede para amar, não mede forças para machucar.

Palavras não seriam o suficiente para descrever a imensidão da sua fúria ao descobrir que seria pai. Houve uma explosão de xingamentos, acusações infundadas, ameaças e, por fim, um completo silêncio. Ele apenas deu as costas, ignorou meus chamados, e desapareceu na floresta. Nunca olhou para trás.

Embora tenha doído sobremaneira, não lamentei o fato de Inuyasha ter partido. Não posso culpá-lo por não querer um bebê tanto quanto eu. Não foi uma armadilha, como ele possivelmente estaria pensando. Foi apenas o destino.

E, bem, ele que acreditasse no que quisesse, concluí, enfim, cansada de remoer suas palavras amargas. A despeito da nossa última discussão, a maternidade me encheu de confiança. De repente nada mais importava a não ser meu bebê. Eu estava feliz com a notícia e era só isso que deveria importar.

- Pense positivo, Kagome. Tai e sua criancinha irão nascer no mesmo período. Vai ser divertido levá-los para passear – como vinha fazendo todos os dias, numa agradável tentativa de me ajudar a melhorar o humor, Sango sorria brilhantemente na minha direção.

- Tai?

Naquela incrível tarde de primavera, com o agradável cheiro das flores que nasciam ao nosso redor, nós tomávamos chá, sentadas na varanda da minha casa.

Àquela altura, eu já estava com três meses de gestação. Três longos meses de gravidez. Três longos meses sem a presença de Inuyasha. Apesar de tudo, sentia-me perfeitamente bem. No quesito físico, não podia estar melhor, para falar a verdade. Nem mesmo havia tido enjoos ou tonturas.

- Sim. Nós pensamos bastante. Eu e Miroku, digo. Será Haruka, se for menina, e Tai, se for menino. Mas eu já tenho plena certeza de que será um garotinho. Você sabe, nós, mães, sentimos isso – ela depositou a xícara de porcelana (que eu trouxe da minha Era) sobre a mesa de madeira, acariciando o ventre protuberante.

- Eu sei – concordei com um curto movimento de cabeça, incapaz de conter o sorriso triste. Desde o começo eu sabia que seria uma menina. – Eu inclusive já sei até como vai ser minha pequena Mori.

Curvando ligeiramente a cabeça para o lado, curiosa, Sango apertou os olhos por um instante.

- Floresta? É um nome bonito – admitiu, suavemente.

- Lembra Inuyasha, não? – encolhi os ombros, com um suspiro. Por mais que quisesse, não poderia passar uma borracha em nosso passado e apagar todas as lembranças que tinha dele. Não havia porque mentir e dizer que sua partida não machucava. - A primeira vez que o vi foi numa floresta.

Após um curto instante de silêncio, Sango tornou a sorrir, apertando minha mão suavemente por cima da mesa. Ela sabia o quanto eu me sentia sozinha com seu desaparecimento. Mesmo assim, nunca me dera a falsa esperança de que algum dia ele fosse tornar a aparecer. Sempre se mantivera firmemente ao meu lado, consolando-me, porém sem alimentar falsas esperanças.

Todos nós conhecíamos Inuyasha. Todos nós sabíamos do seu humor volátil e da sua capacidade de guardar rancor. Se ele não havia voltado até então, era porque possivelmente nunca o fizesse. A raiva que estava sentindo devia ser realmente forte, se não amainara após algumas horas ou dias.

Pouco a pouco condicionei a mim mesma a aceitar sua perda.

- Mori vai ter cabelos prateados, olhos como os meus e orelhinhas brancas no topo da cabeça. Garanto que Tai irá se apaixonar por ela – falei com humor, piscando na sua direção, tentando deixar as más lembranças para trás.

- Oh, sim, seria uma notícia muito boa. Adoraria ser sua familiar de verdade, Kagome.

- Você já é, Sango.

Rompendo a distância que havia entre nós, ela me abraçou. Passou um dos braços sobre meus ombros, puxando-me contra si, suave, mas com um aperto que dizia claramente que estava ali para o que quer que eu pudesse precisar.

Apesar de tudo, eu me senti ainda mais sozinha. Era como se, mesmo com o calor de Sango, nada nunca fosse o suficiente para aplacar a solidão que tentava me engolir. Jamais me sentiria completa novamente sem a presença de Inuyasha.

- E Inuyasha?

- Ainda sem nenhuma notícia.

Eu mordi os lábios para não falar mais. Às vezes, durante a madrugada, pegava-me com os olhos inundados d'água, mas raramente me permitia chorar.

Sempre fui uma garotinha frágil. Sempre me deixei ser protegida pelo amor de Inuyasha. Sempre permiti que seus braços me acolhessem e secassem minhas lágrimas. Agora, contudo, eu era uma mulher. Uma mulher grávida. Podia cuidar de mim mesma sozinha. Seria capaz disso. Tinha que ser. Afinal, já não podia depender da boa vontade das outras pessoas.

- Nós sempre vamos estar por perto se você precisar, Kagome. Você sabe disso, não sabe? Nunca te deixaremos sozinha.

Sango acariciou minhas mãos, sorrindo com carinho.

- Obrigado - respondi com sinceridade, sacudindo a cabeça.

Respirei fundo, tentando reaver a tranquilidade.

- Acho que vou visitar mamãe – disse, pensativa. - Talvez aproveite para dar uma volta em Tóquio, passar em algumas lojas. Preciso começar a pensar em Mori. Ela precisa de roupas – tomei o último gole do meu chá, depositando a xícara vazia sobre o pires, e levantei, decidida a afastar as lembranças ruins.

Apagar o passado seria impossível. Mesmo assim, nada me impedia de erguer a cabeça e seguir para o futuro com um sorriso no rosto. Queria que meu bebê se lembrasse de mim como uma pessoa feliz, não como uma mulher amargurada pelo abandono do marido.

- Sim, é uma ótima ideia. Vai ser bom para você – anuindo, Sango também se levantou, embora com alguma dificuldade, e sorriu enquanto se despedia. – Vou aproveitar para começar os preparativos para o jantar. Miroku chega cedo hoje.

Ergui as sobrancelhas, curiosa.

- Jantar? – repeti, lançando uma curta mirada para o céu. - Mas o sol ainda nem se pôs.

- Quero fazer algo especial – ela corou, sem esconder o constrangimento.

Sorri, divertindo-me com seu embaraço.

- Entendo. Bem, acho que já vou para o poço. Quero aproveitar o que resta do dia – disse, com calma. – Talvez eu fique na Outra Era durante algum tempo. Não se preocupe. Eu voltarei.

Eu atravessei a barreira com um sorriso saudoso nos lábios. Fazia tempos que não via mamãe, Souta e vovô. Havia tido medo de voltar e não conseguir manter meu sofrimento para mim mesma.

Não havia sido fácil decidir entre o futuro e o passado. O futuro era brilhante e cheio de possibilidades e ninguém podia negar que mamãe não havia ficado decepcionada pelo fato de eu querer jogar tudo para o alto por causa de um homem. Mesmo assim, era no passado onde Inuyasha vivia e eu acabei colocando as necessidades do meu coração acima de tudo.

Mesmo com nossas discussões e com todas as privações da Sengoku Jidai, eu e Inuyasha éramos felizes. Nos divertíamos até mesmo com nossas brigas infundadas, às vezes. Havíamos construído uma casa e uma vida juntos, ajudando e protegendo das pessoas de nosso vilarejo, semeando a paz entre youkais e humanos.

Era difícil pensar que tudo tinha mudado.

A ausência de Inuyasha me fez repensar minhas perspectivas. Coloquei os pés no poço do templo e repentinamente me questionei se deveria permanecer onde estava. Por que perder meu tempo no passado, quando minha família estava no futuro? Por mais que Sango e Miroku tentassem ocupar o lugar solitário em meu coração, não existe nada que possa substituir o amor de mãe. Além disso, Sango e Miroku estão construindo sua própria família. Existiam limites para o quanto poderiam me manter ao seu lado.

Inconsciente de tudo o que acontecia em meu novo mundo, mamãe sorriu e me abraçou, ansiosa pela minha chegada. Convidou-me para tomar um chá – mais um – e colocar a conversa em dia.

Seu carinho e sua paciência me motivaram a despejar tudo que estava trancado na minha garganta desde o desaparecimento de Inuyasha. Afinal, para minha mãe eu não precisava continuar sendo forte. Podia ser apenas eu mesma, com as minhas dores, meus temores e, principalmente, minhas falhas.

Nós ficamos lá, deitadas sobre a cama do meu antigo quarto, comigo a abraçando forte, a cabeça sobre seu peito. Pareceram se transcorrer horas até que eu pegasse no sono.

Na manhã seguinte, ninguém perguntou o que havia acontecido.

Feliz com a minha volta, Souta sorriu e me deu um beijo no rosto, jogando a mochila sobre os ombros depois de alegar que precisava ir para o treino de futebol. Vovô, por outro lado, enfiou vários ofurôs em minhas mãos, afirmando que eu precisava me purificar. Disse que mais tarde derramaria sake sobre meu corpo a fim de que eu pudesse ajudá-lo na limpeza (não importando quanto tempo se passasse, vovô sempre seria vovô, afinal).

Eles não notaram ou comentaram minhas olheiras, nem questionaram o porquê da minha visita repentina. Longe das perguntas constantes de "Como você está?", feitas no Sengoku Jidai, eu parecia respirar bem melhor.

Na Era Feudal, mesmo que inconscientemente, eles me sufocavam de mimos e preocupações. O fato de ter sido abandonada não me tornava numa mártir ou numa suicida em potencial. Ainda mantinha em perfeito estado minhas faculdades mentais, obrigada.

- O que você acha desse, querida? É lindo, não?

Compras.

Mamãe me mostrava roupinhas de bebês enquanto passeávamos por uma loja infantil do shopping. Sorri, observando o macacãozinho que ela segurava, e imaginei como seria Mori. Ainda era cedo, mas estava muito ansiosa para conhecê-la, mesmo que ela fosse semelhante ao pai. Aquela era uma dor com que eu teria de aprender a lidar.

- Adorei. Ponha na cesta, mamãe. Que tal levarmos esse cobertor? – mostrei uma pequena manta branca, recoberta por desenhos infantis na cor verde.

- É adorável, meu bem. Vou pegar algumas mamadeiras de vidro na estante. Não gosto das mamadeiras de plástico. Elas acumulam muitos germes.

Eu ri, observando-a se afastar, animada. Dada sua ansiedade, parecia que eu estava apenas a acompanhando ante a grande animação de ser avó. Ela parecia mais grávida do que eu no quesito de entusiasmo.

Voltei carregada de sacolas para a Sengoku Jidai, após muitas promessas de aparecer mais vezes na Era Atual.

Sango adorou os presentes que eu trouxe para Tai (tinha de ser uma boa madrinha, afinal). Parecia tão radiante com a gravidez que eu imaginei que, perto dela, não passava de uma sombra de felicidade. Mori, porém, não tinha culpa do meu desânimo.

Meu pequeno bebê sequer havia se formado direito e eu já sabia que não poderia amar tanto algo ou alguém quanto o amava. Mori havia sido a luz no fim do túnel desabado para mim, mesmo tendo sido então a causa da minha solidão.

Eu conversava com ela todas as noites, falando-lhe sobre o mundo e sobre como as coisas eram na vida real, pedindo-lhe para ser compreensiva com minha dor, pedindo-lhe para ter forças o bastante para me ajudar a sobreviver às provações que estávamos passando. Murmurava-lhe um "Boa noite" sempre que ia dormir, desejando que a manhã seguinte fosse bem melhor do que a anterior. Mori era, pra mim, a personificação das coisas boas no mundo. Eu me sentia impotente para negar o amor que aquela criaturinha já despertava em meu coração.

Então, depois de mais de um mês de silêncio absoluto, eu encerrava mais um dia, exausta. Havia tomado um banho no lago há algumas horas e já me preparava para dormir, embora ainda fosse bastante cedo.

Ouvi batidas na porta e fechei o robe com um suspiro.

Qual não foi minha surpresa ao me deparar com Inuyasha?

- O que você está fazendo aqui? – perguntei, após um instante de choque, no tom mais frio que consegui, o que foi um espanto, já que um nó de soluços contidos subia por minha garganta.

Quando ele me olhou, sabia que estava profundamente arrependido pela maneira como agira e que vinha pedir desculpas. Era o que Inuyasha sempre fazia, afinal: errava, falava o que não devia e depois voltava atrás de perdão.

Apesar disso, as lágrimas que eu derramei por ele ao longo daqueles meses não poderiam ser esquecidas com um olhar triste ou um conjunto de palavras suaves. As noites de solidão e frustração ainda doíam, vívidas em minhas memórias.

- Vim ver você.

- Constatar se tenho chorado bastante? – indaguei, secamente, abraçando-me num gesto inconscientemente protetor.

Inuyasha desviou o rosto, dando-me a impressão de que eu estava sendo muito dura. Logo concluí que tinha muito mais motivos para estar irritada. Afinal, que tipo de homem abandona a mulher após saber que vai ter um filho? Havia limites para o nível de imaturidade que eu poderia aguentar. Não éramos mais as crianças que havíamos sido um dia. Estava na hora de deixar o velho temperamento para trás.

Daquela vez, eu estava realmente furiosa, sei que ele percebeu. E não era só irritação, era também mágoa, muita mágoa e rancor por toda a tristeza que ele havia provocado. Senti que ia chorar.

Ele esfregou a nuca, suspirando. Seu jeito de criança envergonhada normalmente me dava vontade de abraçá-lo e beijá-lo até cansar. Não daquela vez. Simplesmente não podia fazê-lo. Não estávamos mais numa uma relação baseada só na fidelidade e paciência. Existia um bebê do qual eu era a maior responsável.

- Será que você pode me perdoar?

- Perdoar? – repeti, ligeiramente incrédula. Sacudi a cabeça.

Perdão era uma palavra muito forte. Eu deveria perdoá-lo por toda a dor que me fez passar? Meus lábios tremiam toda vez que me recordava das suas palavras frias, culpando-me pela gravidez de Mori. Eu devia mesmo perdoá-lo? Já não sabia a resposta.

Havia cansado da inconstância, da frivolidade, da irritação e não tinha certeza de que estaria preparada para arcar com mais uma dessas crises conjugais se elas resolvessem vir me assombrar mais uma vez. Perdoar é muito difícil, porque as pessoas simplesmente não conseguem esquecer. Chame-me de rancorosa, se quiserem. Não me importo. Tinha motivos o suficiente para isso. Deveria perdoar alguém que me fez sofrer tanto? Ele merecia? Valia a pena? Não sei.

- Por não estar aqui esse tempo todo.

Odiava Inuyasha por ser capaz de me ferir daquela maneira. Odiava-o por ser capaz de sentir minhas fraquezas e usar elas contra mim em seus momentos de irracionalidade. Odiava o fato de amá-lo tanto que não era possível sentir tanto ódio. Soube que não poderia ficar sem ele desde a primeira vez que o vi e essa certeza havia se transformado numa sentimento tão poderoso que beirava a dor.

Ninguém nunca havia me dito que o amor podia ser daquela maneira, tão desgastante. Se eu soubesse, talvez teria pensado duas vezes antes de abraçá-lo com o vigor e paixão com que abracei.

- Diga-me você: eu deveria perdoá-lo? – repeti, arqueando uma sobrancelha.

- Eu amo você, Kagome – confessou Inuyasha, a voz rouca, os olhos dourados fixos em mim. – A verdade é que eu não sei viver sem você. Partir foi um erro, mas não pude ficar. Saber que você teria um bebê mudou tudo. Você sabe como sempre me senti a respeito de ser um hanyou. E você sabe que um filho meu será como eu. Sofrerá os mesmos preconceitos que eu. Não quero apagar todas as escolhas erradas que eu fiz. Só... Eu amo você. E eu... Eu vou aprender a amar o bebê.

Sua confissão me surpreendeu. Inuyasha não fazia o tipo que compartilhava seus pensamentos. Normalmente, eu precisava ler o que se passava em sua mente, o que não era tão complicado, uma vez que você o conhecesse bem. Mas nunca vi aqueles sentimentos vindo. Nunca pensei que ele encarasse a questão da minha gravidez daquela maneira.

De qualquer modo, não era como se sua reação mudasse alguma coisa. Eu estava grávida e isso era um fato. Já não havia nada que ele pudesse fazer, além de aceitar. Nós lidaríamos com os problemas conforme eles aparecessem. Era assim que nós havíamos vivido durante todos aqueles anos: no presente.

- Talvez, mas o amor que você diz sentir por mim aparentemente não foi o bastante para fazê-lo ficar, já que você não pensou duas vezes antes de ir embora.

Senti que já não poderia evitar as lágrimas. De repente, deixei toda a fúria desaparecer, dando espaço à dor. Senti-me terrivelmente triste.

Inuyasha parou, surpreso, encarou minhas faces chorosas e logo me abraçou, beijando o topo da minha cabeça. Não havia perdão para o que fizera comigo, mas eu o amava e precisava dele perto de mim. Seria hipócrita da minha parte negar que estava feliz com sua volta, a despeito de tudo.

Respirei fundo ao sentir o espalmar das suas mãos ásperas sobre minha cintura, puxando meu corpo para junto do seu.

Antes que pudesse impedir, os lábios dele já cobriam os meus com urgência e necessidade, pouco dispostos a aceitar qualquer negativa, ansiosos para demonstrar com gestos o que ele não podia expressar com palavras. E, como sempre acontecia, eu senti que não seria capaz de resistir àquela tentação. A atração que havia entre nós era elétrica, magnetizadora, forte como um tsunami, e era isso que nos tornava tão bons.

A virilidade agressiva de Inuyasha fazia que eu perdesse o contato com a realidade. Sempre me deixava dominar.

Ao notar minha falta de resistência, a pressão esmagadora da sua boca logo se tornou menos violenta e mais sensualmente persuasiva.

Depois de tanto tempo de privação, eu estava tonta demais para resistir à sua língua exploradora. Embora ainda alimentasse alguma raiva, parte minha tampouco queria.

- Abra os olhos – eu o ouvi murmurar, empregando a mesma voz persuasiva que usava quando fazia amor comigo. Nem sequer sabia como havia ido parar sobre nossa cama. – Quero que veja que sou eu quem está fazendo amor com você, Kagome.

- Pelo jeito como você fala, dá a entender que muitos têm esse tipo de prazer – resmunguei, arfando ao sentir seus os lábios deslizarem lentamente pelo meu pescoço, enquanto suas mãos experientes desatavam o laço do meu abrindo o roupão.

- Não, meu bem – a voz dele parecia mais possuída por sentimento de propriedade do que por carinho, a mão se insinuando sobre uma das minhas pernas, subindo por toda a extensão da panturrilha e coxa. – Você é minha e de mais ninguém.

Dizer que Inuyasha era o melhor pai do mundo seria uma mentira, mas ele passou a lidar bem com a ideia da gravidez conforme minha barriga crescia. Mostrou-se excessivamente cuidadoso ao pegar Mori pela primeira vez, sem pronunciar uma palavra sequer, os olhos brilhantes. Logo ela se tornou seu maior tesouro.

Com o tempo, os dois passaram a fazer tudo juntos, desde tomar banho até sair para brincar com ursos na floresta. Seus planos estapafúrdios geralmente me colocavam de cabelos em pé, mas raramente me sentia tentada a impedi-los. Não era capaz de resistir ao olhar pidão daquela menina, não quando ela mexia as orelhinhas caninas com sua falsa expressão de pura tristeza. Imagino que as mães deveriam ser imunes a esse tipo de magia. Mas você também não seria, se sua filha tivesse um par de orelhas tão meigas.

FIM