Um Ataque aos Sentidos
Paladar

Rony estava decidido. Tinha chegado muito longe pra desistir agora. Estava perto, muito perto. Não ia ser derrotado agora. Ele olhou a sua volta para o grupo reunido no quarto de Gina (escolhido por razões de segurança. Era improvável que Harry ou Hermione entrassem ali de repente, Rony pensou). O Time compartilhava o mesmo olhar determinado. Esse era o momento do triunfo e eles não deixariam que passasse tão fácil.

-Certo, nós sabemos que a Missão passa por um problema sério - Rony começou, andando de um lado para outro no quarto. -O feitiço que foi tão eficaz - nessa hora ele balançou a cabeça para Lilá e Parvati, que sorriram e acenaram -Terminou seu efeito. Entretanto, nossos alvos parecem mergulhados em constrangimento agora. Eles não se falam, nem mesmo se olham. Alguém tem uma sugestão de como proceder?

Simas levantou a mão. -Sim, você acha que pode parar de se com essa história de brincar de general e que somos sua tropa? Isso é um pouco assustador.

Rony olhou feio pra ele. -Não. Alguma sugestão útil? - perguntou, olhando para o grupo.

-Eh, sim - Gina disse, levantando. Se Rony queria dirigir a reunião como se eles fossem do exército, quem era ela pra discutir? Não era a coisa mais estranha que já vira. -É um novo feitiço. Afeta o paladar das pessoas.

-Vamos fazer com que eles se lambam? - Dino perguntou, interessado até demais na possibilidade para o gosto de Rony.

Gina também o achou interessado demais. -Hã, não - ela disse olhando para ele. -Já passamos por todos os outros sentidos e me parece que o 'tato' foi o de mais sucesso porque nossos alvos estavam em contato físico. Apesar de achar que seria difícil fazer que os dois alvos se tocassem, hã, oralmente, acredito que possamos fazê-los pensar nisso e se concentrar nessa possibilidade.

Parvati olhou pensativa. -Como podemos fazer isso? Você disse que eles não se beijariam e sabemos que eles não estão nem se olhando. Como vamos fazer para que eles considerem a possibilidade de se beijar?

Gina balançou um pedaço de papel. -Bruxos e bruxas, tenho em minhas mãos um feitiço que afeta o paladar. Aumenta e apura esse sentido a ponto da comida virar uma experiência erótica. Acredito que se os dois alvos forem sujeitados a esse feitiço, eles irão (devido aos desejos inconscientes e por perceber a reação similar à comida) se concentrar um no outro e em particular na boca do outro que, como todos sabem, são componentes necessários para um beijo. Esses pensamentos irão consumi-los até que se entreguem a seus desejos.

Lilá parecia desconfiada. -Está supondo demais. Eles conseguiram passar por outros três feitiços antes que o acertássemos com o toque. O que te faz pensar que eles não vão passar ilesos desse também?

-Ah, mas eles não estavam tentando se apalpar (-Já disse, eles não estavam se apalpando! - Lilá disse. -Shhh! - Parvati silenciou.) antes dos outros três feitiços, não é? - Gina perguntou. -Agora que tentaram, com certeza estão pensando um no outro como mais perto de ser 'o amor da minha vida'; quando se olharem, a vontade beijar vai vir muito maior.

Lilá suspirou. -Não sei. Parece um pouco complicado pra mim. O que acha, Rony? - ela perguntou, virando para ele.

Rony franzia a testa pra sua irmã. -Espere, você disse 'experiência erótica'? E beijar? O que você sabe sobre experiências eróticas e sobre beijos? Alguém tentou isso com você? Aposto que alguém disse alguma coisa. Quem foi? Eu vou matar!

Gina suspirou. Rony era tão idiota.

Mais uma vez, o feitiço funcionou. Se foi porque uma garota que pesquisou e implementou o feitiço ou porque Rony não se envolveu nessa parte do plano, não se sabe. Qualquer que fosse a razão, Harry e Hermione estavam consumindo mais calorias que um dragão.

-Se Hermione continuar assim, vai ficar sem curva nenhuma - Gina sussurrou para Lilá durante o almoço. As duas observavam a dupla, espantadas com a quantidade de comida que cada um engolia. Céus, a escola inteira olhava os dois. Nem Dumbledore conseguia esconder o espanto. Pães, salsichas e purê, peixe – tudo sumiu.

-Se Harry continuar assim, não vai haver vassouras no mundo que o agüente - Lilá murmurou. -Vai ser um belo apanhador. Não vai nem conseguir pular pra pegar o pomo. Quanto tempo esse feitiço vai durar?

-Só um dia, graças a Merlin - Gina respondeu. -Quanto tempo pode se levar pra comer carne e torta de rim?

Essa era uma excelente pergunta, pois Harry e Hermione não estavam apenas comendo uma enorme quantidade de comida. Eles... Saboreavam, exatamente como o feitiço pretendia. A cada garfada, os olhos de Harry se fechavam, num prazer mal contido; cada pedaço da carne trazia um gemido de Hermione. Era muito engraçado, mas também incrivelmente desconfortável. Todos tinham direito a uma preferência sexual, é claro, mas quem é queria ver isso (mesmo sendo induzido artificialmente) em pleno Salão Principal?

E pior (ou melhor, dependendo do ponto de vista) era a atenção que eles davam um ao outro. Como Gina previu, apesar do terror e constrangimento por causa do feitiço anterior, um assistia com interesse ao outro saboreando a comida, o prazer óbvio de um, aumentando o deleite do outro. Eles olhavam um a boca do outro, adorando esse simples ato.

Era, pra dizer a verdade, um pouco assustador.

-Pra dizer a verdade, isso é um pouco assustador - Rony sussurrou para Gina. -Isso é mais uma obsessão por comida do que 'vamos nos beijar até cansar'. Quando eles vão deixar as maravilhas da cozinha dos elfos-domésticos de lado e começar a se beijar?

-Eu não sei! - Gina murmurou. -Eles não podem comer o tempo todo, e estão olhando pra boca do outro. Alguma hora vão perceber, né?

As palavras de Gina virarão uma previsão quando os dois novos glutões de repente pararam de comer e se olharam intensamente. A respiração estava rápida e curta e Harry engoliu seco enquanto olhava o rosto corado de Hermione.

Hermione levantou rapidamente, olhando pra qualquer lugar menos pra Harry. -Desculpe, tenho... tenho que ir. Preciso ir pra biblioteca. Vejo vocês na aula. - Ela saiu quase correndo pela porta enquanto os olhos de Harry a perseguiam e depois ele voltou triste para sua comida. Empurrou seu prato e fez um barulho de nojo.

O resto dia foi meio deprimente para o Time, enquanto o "casal que não admitia que se amava" se arrependia de seu comportamento e se recusava a falar ou mesmo olhar para o outro. Rony estava perdendo a esperança de completar a Missão quando suas duas vítimas eram tão teimosas.

Felizmente, o destino decidiu sorrir para ele.

Harry, na frente de todos no Salão comunal, convidou Hermione a se juntar a ele numa caminhada lá fora. Estava uma bela noite, com lua cheia e brisa morna. Hermione hesitou só um segundo antes de concordar. Os dois passaram pelo buraco do retrato mantendo uma distância entre eles, mas claramente se concentrando apenas um no outro.

Se tivessem prestado atenção a sua volta, teriam ouvido um enorme grito de felicidade enquanto o retrato se fechava. Rony imediatamente levantou e silenciou todos.

-Bruxos e bruxas, esse é nosso momento de triunfo. Só pode haver um motivo para um jovem casal tão desesperadamente apaixonado dar uma caminhada, sozinhos sob a luz da lua. Nosso Plano está chegando ao fim. E por Merlin, todos vamos presenciar! Gina, Simas, Dino, Parvati e Lilá, vão comigo. Vamos!

Outro grito seguiu enquanto Nossos Heróis marchavam pela porta.

-Ah, boa sorte! - a Mulher Gorda falou para eles, acenando com um lencinho. -Os jovens crescem tão depressa - ela fungou, secando os olhos.

O regimento de Hogwarts, 1º batalhão da Grifinória firmemente fez seu caminho para fora da escola. Eles pararam um momento, discutindo onde o casal poderia ter ido. O campo de quadribol foi escolhido como lugar mais provável e eles rapidamente partiram nessa direção. A sorte novamente lhes sorriu, enquanto espionavam Harry e Hermione andando pelas grades e passando pela cerca, dentro do campo. O campo de quadribol tinha vários esconderijos, então a unidade escolheu um com uma boa linha de visão e lá se entrincheiraram.

E depois, como uma boa unidade do exército, esperaram que algo acontecesse. E esperaram. E esperaram.

-Por que eles não fazem nada? - Lilá perguntou. -Eles estão apenas se olhando!

-Queria que eles tivessem se lambido no Salão Principal - Dino disse.

Parvati olhou para ele com uma cara de nojo. -Não há palavras pra descrever o quanto você me assusta.

-O que foi? Só estou dizendo que umas lambidas colocariam um tempero nisso tudo.

-Mantenha suas perversões pra você.

-Não há nada de errado com...

-Lamber em público não faz parte do contrato social! - Parvati gritou.

-Quietos! - Gina falou. -Estão querendo que eles escutem a gente?

-Contrato social? Isso filosofia trouxa! O que você sabe de filosofia trouxa ou do contrato social? - Dino perguntou abismado.

-Sei muitas coisas, e lamber não está incluído!

-Você está se limitando, sua puritana - Dino disse, ofendendo.

-Pervertido da lambida! - Parvati sibilou.

-Quietos! - Rony ameaçou. -Não vou deixar que dois bestas que não sabem ficar de boca fechada estraguem esse momento! Se vocês dois estivessem prestando atenção, veriam que o plano está dando frutos!

-Dando frutos? Quando começou a usar expressões dessas? - Simas perguntou, se divertindo. -Você passou tempo demais com Hermione.

-Se você acha que eu não vou te matar nesse momento, está muito enganado - Rony disse calmamente. -Prestem atenção e calem a boca!

Harry e Hermione abandonaram a estratégia de ficar se olhando em algum momento e agora estavam mais próximos. Hermione dizia algo para Harry e parecia enfatizar bastante o assunto, mas mesmo assim falava tão baixo que ninguém ouvia o que ela dizia. Do nada, Harry levantou um dedo e colocou sobre os lábios dela. Ele roçou seu polegar no lábio inferior dela. Hermione levantou a mão, segurou a dele e gentilmente pressionou seus lábios contra os dedos dele, antes de largá-la.

Eles se olharam nesse momento, e mesmo distante, Rony podia ver as emoções brilhando nos olhos. Seus olhos foram fechando lentamente e eles se aproximaram. Mais perto e mais perto... Eles inclinaram um pouco a cabeça... Mais perto... Um raio de luz da lua era tudo que os separava... Mais perto... Um fio de cabelo de distância...

O batalhão se inclinou para frente e todos prenderam a respiração.

Harry e Hermione se afastaram rapidamente e respiraram fundo. Os dois balançaram a cabeça, como pra se livrar de alguma coisa e se olharam de novo, a confusão e dor claramente em suas expressões. Hermione balançou mais uma vez, com força, virou e saiu do rapidamente do campo. Harry olhou pra ela por um instante, seu rosto agora sem expressão, antes de virar para o outro lado e sair também.

O grupo ficou num silêncio pasmado antes que todos levantassem a voz num coro de descrença e confusão.

-Não, não, não! - Simas disse. -Que aconteceu? Por que não se beijaram?

-Não acredito! - Parvati lamentou. -Estavam tão perto!

Gina estava perplexa. -Não era pra ser assim. Era pra eles terem se beijado!

Dino parecia prestes a bater em algo. -Eu vou matá-los. Eles são praticamente o casal do milênio e não conseguem admitir o que sentem e se beijar!

Lilá olhou para Rony, que estava estranhamente quieto. Ela colocou uma mão no ombro dele. -Você está bem?

Rony olhou triste pra o lugar que Harry e Hermione ocupavam a poucos instantes e suspirou fundo.

-Preciso de uma bebida.