Capítulo Quatro: Então, beije-me:

Remo soltou um suspiro antes de subir mais um lance de escadas. Seus pensamentos divagavam lentamente em pontos desconfortáveis. Tais como as poucas mulheres que haviam passado em sua vida e sido dignas de serem lembradas. Poucas, na verdade. E a pequena lista começava com a garota de olhos azuis amedrontados, de fala rouca e lábios finos. Amy lhe fazia lembrar a primavera. Embora Remo não soubesse exatamente porquê. Mas suas lembranças dela eram suficientemente cálidas, como uma ardência sutil. Não havia nada melhor para denominá-la, nada além de sutil. Mas ela havia ido embora. Haviam lhe tirado aquela sutileza personificada muito cedo. Cedo demais, talvez, para que fossem lembranças dolorosas, cheias de saudade. Não havia saudade. Havia, sim, um sorriso nostálgico. E ela havia sido seu primeiro amor, daqueles que ficam marcados para sempre.

A lista não se limitava a Amy, havia outras. Outras cujas lembranças talvez não tenham sido tão sutis, mas ardentes, delicadas ou simplesmente únicas, sem qualquer palavra substancial para classificá-las. Dizem, no entanto, que as que realmente importam, são as primeiras e as últimas. E por isso Remo estava ali, controlando-se mentalmente, para que a última não lhe escapasse tão facilmente. Ele, então, não pretendia deixá-la escapulir por entre os dedos, como fizera tantas outras vezes. Aquilo não ia acontecer de novo.

Então, com o pensamento fixo em Tonks, ele procurou pelo chaveiro em sua camisa, e colocou a chave na porta, com a certeza explícita de que não conseguiria abri-la. Mas conseguiu. E não pôde evitar um sorriso surpreso diante de sua sorte. Por que Tonks não havia trocado a fechadura? Talvez aquilo desse trabalho demais, e ela era uma pessoa altamente relapsa para lembrar-se de que ele possuía ainda sua chave do apartamento de Frankfurt. E ele passou pela sala tão conhecida, chegando ao corredor pouco extenso, alcançando a cozinha, onde havia a única luz acesa.

Tonks estava de costas. Usava um jeans surrado que não passava das canelas e uma blusa azul, um tanto gasta, que parecia engoli-la de tão grande. Estava descalça no mármore frio, enquanto ela pegava uma garrafa de água de dentro da geladeira, que estava terrivelmente vazia. Seus cabelos longos de cor escalafobética estavam presos num rabo-de-cavalo que se desfazia aos poucos. Por alguns míseros instantes, ele desejou que ela não o visse, apenas para que pudesse admirá-la mais um pouco. Mas como sempre acontecia, as pessoas pareciam sentir que estavam sendo observadas. E, quando ela se virou, com uma sombra de surpresa passando por seus olhos cor de caramelo, ele notou a franja espessa rosa-chiclete caindo-lhe nos olhos. E notou também que a blusa era sua.

— Água? — ela perguntou calmamente, num tom que beirava o desinteresse. Embora seus olhos carregassem um nervosismo quase exaustivo.

— Não.

Ela não disse mais nada, nem Remo. Ela guardou a garrafa e enxaguou seu copo guardando-o em seguida. Então finalmente o encarou por alguns breves segundos antes de sentar-se.

— Eu não sabia que você ainda tinha a chave daqui.

— Nem eu. Descobri há pouco tempo — limitou-se a responder.

E, novamente, eles não se importaram com o silêncio.

— Então? — ela disse de repente.

— Então o quê? — Tonks lançou-lhe um olhar irritado e significativo. — Bom, eu não sei.

— São onze horas da noite — afirmou, como que ressaltando o quão obtusa era a situação.

— Eu sei. Algum problema?

— Nenhum — mais uma vez não tiveram o que falar, e o silêncio começou a incomodá-los.

Tonks levantou-se desajeitada, passou por trás da cadeira que Lupin ocupava e começou a procurar alguma coisa no armário. Enquanto ela o fazia, Remo observou atentamente o lugar onde estava. Não era exatamente organizado, porque em cima do fogão, ainda havia algumas panelas, enquanto na pia tinha alguns copos, dois pratos e alguns outros talheres a serem lavados. E na mesa, por sua vez, havia alguns livros, pergaminhos desenrolados e canetas trouxas. Ele não gostava de desorganização, mas não pôde reprimir um sorriso nostálgico ao se lembrar de suas brigas com Tonks sobre a falta de ordem do apartamento.

Ela voltou com um pacote de biscoitos de chocolate, e ofereceu-os a ele enquanto comia um. Ele recusou com um sorriso.

— Bom — a metamorfomaga começou com um sorriso mais animado —, eu acho que te devo desculpas pelo nosso último encontro. — Ela sorriu abertamente. — Você sabe, eu acho que eu não estava muito normal, eu estava meio que deprimida e sem ânimo. Não queria nem sair de casa, mas as meninas insistiram um bocado, e não foi fácil recusar.

— Tudo bem, não se preocupe — respondeu o lobisomem também sorrindo, notando a velha espontaneidade nas palavras de Tonks. — Então, o que anda fazendo por aqui?

— Ah, depois que tudo acabou eu tirei muitas férias, sabe... — ela começou animadamente. — E as que estou passando aqui são apenas mais uma delas. Eu ainda pretendo ir à China, só estava tentando aprender um pouco de chinês antes — Tonks apontou para os livros que tinha sobre a mesa.

— Mas por que você não...

—... usa os bons e velhos feitiços lingüísticos? — abanou a cabeça lentamente — Dá um trabalho desgraçado. É o pior de todos. Então, quando os meus feitiços não fizerem efeito, eu saberia me virar bem. Ou não tão bem.

— Por onde você esteve?

— Em Veneza, como eu te disse aquele dia, n'A Toca. Não se lembra?

— Sim, eu me lembro. Lembro também do comentário sarcástico em seguida.

— Oh, sim, me desculpe. Eu não sei o que estava acontecendo comigo. Você sabe, eu não costumo ser assim. Quero dizer, não sempre. Você conviveu comigo bastante tempo para saber que às vezes eu era suficientemente insuportável.

— Eu sabia quando você estava de mau humor — ele comentou com um sorriso sincero.

— Sabia?

— Sim, porque eram os dias em que Jaudy mais te irritava. Inclusive dos brincos de argola dela você reclamava nesses dias. Era impressionante.

— E como você conseguia...

— Te agüentar? — foi a vez dele completar a frase, enquanto ela sorria em concordância. — Era muito fácil. Bom, na verdade você não consegue chegar ao limite insuportável.

— Sorte sua.

— Lílian era como você às vezes.

— Ela também tinha TPM? — Remo riu.

— Sim, e eu me lembro que nesses dias Tiago passava a maior parte do tempo conosco, na Ordem. Ele se indignava com a capacidade dela de reclamar que ele deixava farelos de pão na mesa quando terminava o café.

— Jaudy também tinha TPM? — Tonks perguntou num tom inocente, seus olhos brilhavam.

— Ela não tinha uma mudança brusca de humor. Ela nunca tinha. Mas havia dias em que ela ficava mais quieta. Nada mais que isso.

— Ah, mas assim é melhor!

— Ou não, porque manter uma relação com uma pessoa constante demais é cansativo. Eu não gosto de monotonia, apesar de parecer o contrário.

— Te garanto que muitos homens trocariam suas mulheres reclamonas por outras de humor constante — ela comentou, enquanto tentava arrumar a bagunça dos livros espalhados pela mesa. — Oh, não...

Tonks soltou um suspiro frustrado quando viu que havia derramado todo o pacote de biscoito de chocolate no chão com o cotovelo. Com um movimento simples da varinha, ela limpou a sujeira e deixou os livros de lado.

— Às vezes eu acho que herdei essa característica de minha mãe. Mas eu acredito que ela não conseguia ser tão atrapalhada quanto eu!

— Eu também acho que isso não é possível — eles riram.

— Vamos lá, Remo, era para você discordar!

— Tudo bem, me desculpe o lapso — Remo sorriu. — Posso te fazer uma pergunta?

— Outra? Vamos lá.

— Por que você desapareceu? Não deu notícias, não voltou...?

— Dumbledore — ela disse simplesmente. Depois continuou: — Ele não queria que ninguém soubesse, mas eu fui me infiltrar numa base militar de Voldemort na Espanha. Eu queria falar para você, te dar explicações, mas eu não podia...

— E depois? — Remo perguntou.

— Depois de quê?

— Depois que você chegou da Espanha.

— Ah, você já estava namorando Jaudy, não havia qualquer sentido em te procurar — ela respondeu.

— Mas nós começamos a namorar só uns dois meses após Voldemort ter sido destruído. Você não ficou lá esse tempo todo, ficou?

— Não — ela confessor coma testa franzida. — Mas eu cheguei aqui logo em Agosto e, veja bem, tudo acabou perto de dezembro, mais ou menos, não é?

— Sim, Voldemort foi destruído perto do Natal — ele confirmou.

— Bom, eu cheguei aqui no final de agosto, e eu vi você e Jaudy se beijando — Tonks deu de ombros.

— Viu? Como assim "viu"? — Remo indagou.

— Eu cheguei de viagem e entrei silenciosamente aqui para te fazer uma surpresa. E, no quarto, lá estavam vocês dois, agarrados. Alguma coisa de errado nisso? — ela perguntou, sua voz assumindo um leve tom de impaciência.

— Foi logo que ela chegou... — Remo começou após alguns instantes, pensativo. — Ela veio me visitar, me disse que você já devia ter voltado há muito tempo, pelo menos antes dela.

— Mentira.

— Então, nós nos beijamos — ele respondeu, inexpressivo. — Ou ela me beijou — Remo completou para si mesmo, Tonks escutou vagamente.

— Eu não me importo — Tonks disse repentinamente.

— Não...?

— Não. Sabe o que realmente importa?

— O quê? — Remo perguntou, observando enquanto Tonks levantava-se de sua cadeira, e sentava-se ao seu lado.

— Que você está aqui. Agora. Isso é tudo o que importa.

Então, dizendo isso, ela levou o dedo indicador aos olhos de Remo, fechando-os delicadamente, antes que seus lábios se pressionassem contra os dele, e ela pudesse sentir o sabor delicioso de sua boca. Ela sentiu toda a sensação elétrica que percorria seu corpo quando eles se tocavam. Sentiu que o amava.

E que poderia ver estrelas novamente.

[FIM]

N/A: Eu gostaria de agradecer a todas as pessoas que deixaram uma review pra mim.Eu não canso de falar isso, mas é sempre um ótimo incentivo a continuar. Ahh, e brigadão tbm a Luize, a Ani, mais uma vez!

Às pessoas fofas que deixaram reviews no 3º cap:

Susana Snape (Amou o final tb? =))) ), Maira Granger (Esse capítulo vc não pode falar que ficou muito deprê, né?), Níniel (que bom que vc gostou! Eu nunca vi um fanart u.u, mas valeu tá?), Amanda (pronto, nem torturei muito, viu? =) Espero que tenha valido a pena!), Liége Jorgens (R/T é lindo mesmo!), Cla-Lupin-Black (Ahh, brigada, linda! Mas eu ainda espero escrever uma pouco melhor!) e minha miga Luize (Te amo, amore!)

Bom, até a próxima fic, né? Não tenho nada em mente pra escrever, mas não demora a vir uma idéia. .

Becitos!