Capítulo III – Confidências
Quatre sacudiu a cabeça, sabia que quando Duo estivesse pronto o amigo lhe contaria o que havia causado as marcas em seu corpo e o que estivera fazendo nos últimos dois anos. O jovem Marquês levantou-se e caminhou até a porta.
- Vou deixá-lo preparar-se para o jantar.
- Obrigado. Quero estar apresentável e a altura de seus convidados.
- Você sempre estará acima de qualquer um deles.
Duo se levantou e curvou-se ligeiramente, fazendo uma mesura. Quatre sorriu da brincadeira, mas de repente ficou sério. Notando a mudança no rosto do amigo, Duo imaginou o que preocupava o loiro.
- Não se preocupe, eu não permaneceria em sua casa se achasse que correria algum perigo.
- Tem certeza?
- Absoluta. Seja o anfitrião que seus amigos esperam. E deixe minha segurança em minhas mãos.
- Está bem. Não se atrase.
- Perfeitamente, Marquês.
Quatre sorriu e deixou o quarto. Assim que a porta se fechou, o sorriso no rosto de Duo desapareceu e ele deixou-se cair na cama. Seria uma longa noite. Hell empoleirou-se em sua perna, fazendo Duo levantar o rosto para observar o falcão. Dando dois assobios, o pássaro voltou a janela. Ele se levantou e foi tomar banho, se despindo do restante de suas roupas no caminho.
"Eu devia ir embora, isso sim."
Heero tinha acabado de tomar banho. Seus pensamentos ainda encontravam-se voltados para o Conde WaveWild. Ele já ouvira esse título uma vez, embora não se recordasse onde, e não se lembrava de algum dia ter se encontrado como o Conde, mas sabia que jamais esqueceria alguém com aquele rosto. Seria quase impossível não ver tamanha beleza e graça que emanavam do Conde. Jamais se imaginara pensando em um outro homem dessa forma, pois os escassos relacionamentos que tivera foram com mulheres, todas filhas de condes, duques e outros títulos, e nenhuma delas fôra capaz de despertar em si o mesmo que Duo WaveWild fizera no instante que seus olhares se encontraram.
Ele estava curioso a respeito do rapaz, não havia como negar, mas também havia algo que o incomodava. A atitude de Quatre. Seu amigo havia mudado desde que Duo chegara, tornara-se cauteloso e sempre se virava para Duo cada vez que uma pergunta era dirigida a ele. Fora os olhares de cumplicidade entre os dois. Ao que parecia ambos estavam escondendo alguma coisa; algo em relação ao Conde e ele estava disposto a descobrir o que era.
Duo encontrava-se sentado do lado direito de Quatre e de frente para Heero. Trowa se encontrava sentado ao lado de Heero e não disfarçava seu olhar em direção ao anfitrião. Duo ria internamente, já havia notado os olhares entre os dois e, quando saíra de seu quarto, os vira conversando no corredor, o que causou um imediato rubor nas faces de Quatre. O olhar de Duo voltou-se para o homem a sua frente. O capitão Heero Yuy. Por algum motivo, o olhar frio dele estava fazendo subir sua temperatura corpórea em uma determinada região de seu corpo. A forma como ele o olhava, tão intensamente, como se fosse capaz de descobrir seus mais profundos segredos, era aterrador e estimulante ao mesmo tempo. Nunca pensou que se sentiria assim por alguém, ainda mais por um oficial da marinha real. Pelo menos não depois do que acontecera com ele.
O jantar foi servido e muito apreciado por todos. A conversa fluiu agradavelmente entre todos e Duo conseguiu relaxar na presença de Trowa e Heero. Quatre percebeu que ele parecia relaxado, apesar de saber que deveria estar com a guarda erguida, pois o pirata dentro dele jamais se descuidava em relação a seus inimigos e, tanto Heero, quanto Trowa, representavam o inimigo.
Terminado o jantar, Quatre sugeriu uma partida de xadrez em seu gabinete, mas Duo declinou o convite.
- Obrigado Quatre, mas você sabe que xadrez não é o meu "jogo" favorito. Mas tenho certeza que Heero será um adversário melhor do que eu.
Heero olhou para Duo intrigado com as palavras, não conseguiu interpretar o sentido delas, mas estava certo de que elas diziam mais do que pareciam. Duo curvou-se e retirou-se do gabinete de Quatre deixando-os. Heero acompanhou-o com o olhar e curvou-se também, declinando do convite, pois tinha a intenção de seguir o Conde e descobrir o que ele quisera dizer com tais palavras.
- Quatre, peço que me perdoe, mas também não tomarei parte na partida. Mas Trowa ficará feliz em assumir meu lugar, por certo. Não é, Trowa?
- Claro, se Quatre não se opuser.
- Eu ficaria honrado.
Quatre sorriu e Heero deixou o gabinete atrás de Duo. Procurou-o na sala, mas não o encontrou. Foi até a cozinha e procurou por Rashid, certo de que talvez o empregado soubesse onde o Conde se encontrava.
- Sim senhor Yuy. O Conde se encontra na sala das armas, ele disse que iria treinar um pouco com a espada.
- Obrigado Rashid.
- Quer que eu o leve senhor?
- Não é necessário Rashid eu posso encontrar sozinho.
- Perfeitamente senhor. É a ultima porta no final do corredor.
- Obrigado.
- De nada senhor.
Heero foi até a sala de armas e abriu a porta encontrando o Conde segurando um sabre. Duo virou-se e deu um sorriso se curvando. Sabia que não deveria brincar com o inimigo, mas não conseguiu evitar fazê-lo. O capitão de fragata o instigava, queria conhecê-lo melhor e sentia que o mesmo acontecia com Heero.
- Pensei que jogaria com Quatre.
- Ele e Trowa se mostraram mais do que dispostos a ter a companhia um do outro. E como devemos partir em poucos dias, achei que eles deveriam conversar melhor a sós.
Duo ficou sem ação por alguns momentos, antes de perguntar com a voz baixa.
- Você vai partir logo?
- Ainda não temos uma data certa, mas esta não deve demorar.
- Entendo.
Duo virou-se e olhou para a fragata ancorada no porto. Respirando fundo Duo se virou e com uma mesura perguntou com um sorriso em seus lábios.
- Duelaria comigo capitão?
Heero deu um meio sorriso e caminhou até uma das paredes pegando um sabre semelhante ao que estava nas mãos do Conde. Ele se curvou colocando o sabre à frente do rosto e uma das mãos as costas.
- Seria um prazer Conde WaveWild.
- Chame-me de Duo, capitão.
- Então me chame de Heero.
- Como quiser.
Os olhos de Duo brilharam e eles começaram o duelo.
Quatre e Trowa estavam jogando a pelo menos uma hora, ambos ao que parecia tinham a mesma habilidade no jogo, tanto que Quatre já havia ganhado duas e Trowa acabava de obter sua segunda vitória.
- Xeque-mate.
- Parabéns Trowa você joga muito bem.
- Você também Quatre joga magnificamente bem.
Quatre sorriu envergonhado, ele sentia-se tão bem na presença do tenente da marinha, mas não tinha certeza se era correspondido. Era a primeira vez que se sentia assim, atraído por outro homem e não tinha ninguém a quem pedir um conselho sabia que poderia perguntar a Duo, mas teria que aturar as brincadeiras dele depois. Então ele mesmo teria que descobrir como o tenente sentia-se em relação a ele, e precisava descobrir logo, pois pelo que havia conversado com Heero alguns minutos antes do jantar, eles logo estariam de partida e não sabia quando teria uma oportunidade de encontrar novamente Trowa.
Trowa observa Quatre beber o vinho com os olhos baixos sem encará-lo, cada vez que seus olhos se encontravam o Marquês ficava vermelho. Um tom adorável em sua opinião, ele já tivera relacionamentos ocasionais com outros homens, mas nenhum deles havia despertado sua admiração em tão pouco tempo. A beleza angelical do Marquês era segundo sua opinião única e vibrante. Ele se pegou a imaginar como seria ver os olhos tão claros nublados pelo prazer, mas não podia correr o risco de desrespeitar o Marquês sem ter a certeza de que Quatre sentia o mesmo. Heero já o ajudara deixando-os sozinhos, mas ele não tinha coragem de avançar como gostaria.
Duo e Heero estavam sentados no chão cansados, haviam lutado por uma hora. Ambos ofegavam e o suor caia por seus rostos. Duo olhou para Heero, os cabelos rebeldes grudados na testa, o casaco há muito tempo jogado a um canto da sala, a camisa meio aberta no peito dando-lhe a visão do tórax. Duo passou a mão pela franja molhada e a língua sobre os lábios secos. Ele notou o olhar de Heero escurecer e sorriu.
- Você luta muito bem Heero.
- Você também Duo. Nunca vi um nobre manejar a espada tão habilmente ou com tanta paixão.
- Obrigado. Eu gosto de colocar paixão em tudo que faço...
Duo fez uma pausa em suas palavras olhando Heero nos olhos, como ele queria tocar aqueles ombros fortes com as mãos, desnudar o corpo magnífico a sua frente, mas ele precisava refrear sua vontade. Não era o pirata quem estava ali, mas o Conde WaveWild e não podia arriscar seu disfarce apenas por que estava interessado no homem a sua frente. Como se nunca tivesse parado de falar Duo completou a frase.
- Principalmente quando luto. A habilidade de um homem com sua espada e o que determinará sua vida ou sua morte.
Heero ficou olhando para Duo. Por que toda a vez que conversava com ele tinha a sensação de que ele queria dizer muito mais do que dizia?. Todas as suas palavras pareciam ter um duplo sentido. Viu o Conde se levantar e recolocar a espada no lugar depois de limpa-la. Heero se levantou e fez o mesmo parando ao lado de Duo. Quando o Conde fez menção de se afastar, Heero o segurou pelo pulso e isso fez Duo reagir imediatamente.
Duo se virou com os olhos escuros, como se convidasse a pessoa a morte por tê-lo tocado. Heero soltou imediatamente o pulso do Conde, não por temer o que o olhar do outro trazia, mas pela surpresa, apenas homens acostumados a uma vida dura e que enfrentavam desafios a todo instante com o risco de perder a vida possuíam esse tipo de olhar. Embora jamais tivesse encontrado nenhum homem com um olhar tão intenso e tão terrível antes. Duo fechou os olhos por um momento e levou o punho a boca o mordendo levemente, isso fez com que a manga da blusa de Duo escorregasse e seu pulso ficasse descoberto. Heero notou a cicatriz no pulso esquerdo e se perguntou o que teria feito tal marca. Duo abaixou a mão ao notar o olhar de Heero sobre seu pulso.
- Desculpe-me. E que você me assustou.
- O que houve com seu pulso?
Duo segurou o pulso por sobre a manga e Heero notou que o olhar dele se perdeu por alguns momentos, depois sua voz saiu baixa e ligeiramente tensa.
- Nada. Um acidente há alguns anos. Acho que vou me retirar agora. Foi um prazer duelar com você Heero.
- O prazer foi meu Conde.
Heero se curvou e Duo fez uma mesura antes de deixar a sala. Heero ficou olhando para a porta por alguns momentos antes de deixar a sala e seguir para seu quarto para se banhar.
"Estranho, que tipo de acidente, marcaria a pele daquele jeito?. Eu já vi cicatrizes iguais a essas antes, mas nunca em um nobre".
Quatro dias depois:
Já haviam se passado aproximadamente quatro dias desde que Duo e Heero haviam lutado na sala das armas, desde então Duo evitava encontra-se a sós com o Capitão da Marinha Real, temia que sua atração pelo oficial colocasse em risco seu disfarce. Não gostaria de reviver o mesmo tormento de dois anos atrás.
Heero notou o distanciamento de Duo e isso o incomodou, pela primeira vez ele sentia vontade de conhecer alguém mais profundamente, mas não sabia o que havia causado o distanciamento do outro e nem como remediá-lo. No momento os dois encontravam-se sozinhos na sala, ambos observavam-se discretamente. Até que Rashid apareceu na sala, seguido por um homem de meia idade, que Duo reconheceu imediatamente.
- Howard o que faz aqui?
- Desculpe Conde WaveWild, mas pediu-me que o avisasse assim que ela chegasse.
Duo levantou-se rapidamente, parando em frente ao senhor segurando os braços deste com força. O olhar havia se modificado tornando-se ansioso. O senhor de cabelos grisalhos olhou para Heero que os observava e Duo seguiu seu olhar. Ele havia se esquecido completamente de Heero ao ver Howard entrar e dizer que ela estava na cidade. Duo sorriu para Heero dirigindo-se envergonhado para ele.
- Perdoe-me Heero. Este é um de meus empregados, ele é quase como um pai para mim. Howard este é o capitão Heero Yuy, ele é um amigo de Quatre.
- Capitão é um prazer conhece-lo senhor.
Heero curvou a cabeça ao ser cumprimentado pelo senhor, era visível o carinho que Duo sentia pelo senhor idoso e este parecia ter o mesmo carinho pelo Conde. Heero levantou-se de onde se encontrava sentado.
- Vou deixa-los a sós. É um prazer conhece-lo Howard.
- O prazer é meu senhor.
Duo viu Heero se retirar e virou-se para Howard abraçando-o.
- Não precisava ter vindo pessoalmente Howard poderia ter mandado um dos homens ter me avisado.
- Achei melhor vir pessoalmente senhor.
- Obrigado. Aguarde-me, eu irei com você, não posso perder a chance de falar com ela.
- Perfeitamente senhor.
Duo correu para o quarto, pegando algumas coisas, ao sair encontrou-se com Heero. Ele olhou para o capitão por alguns instantes antes de pedir-lhe um favor. Quatre havia saído com Trowa, por isso não poderia se despedir do amigo antes de ir e precisava avisá-lo e pedir-lhe que olhasse Hell durante sua ausência, pois o falcão não parecia aceitar a presença de mais ninguém que não fosse a sua ou a de Quatre.
- Heero eu tenho que me ausentar por algum tempo. Você poderia dizer a Quatre que devo me demorar, mas eu volto antes de partir?. E que cuide de Hell por mim?
- Claro Duo. Espero que possamos nos ver novamente antes de minha partida.
O olhar de Duo entristeceu-se ao ouvir que talvez quando voltasse não encontrasse o capitão novamente, talvez fosse melhor assim, sabia que não conseguiria continuar mentindo sobre sua verdadeira identidade, não que a que estivesse usando fosse totalmente falsa, mas não era quem verdadeiramente era. Antes que pudesse refrear suas palavras se ouviu declarando seu desapontamento quanto a isso.
- Eu ficaria muito triste em não encontra-lo quando voltasse Heero. Mas entenderia.
Heero sorriu o que fez com que o coração de Duo desse um salto em seu peito, diante do sorriso. Era como se uma luz iluminasse o rosto do Capitão deixando-o ainda mais atraente.
- Eu vou tentar permanecer até seu retorno.
- Obrigado.
Duo abaixou a cabeça, envergonhado diante do olhar de Heero e continuou seu caminho até as escadas virando-se uma ultima vez antes de descer, encontrando o olhar de Heero sobre si. Ele sorriu e desceu deixando a casa junto com Howard.
Heero foi para seu aposento pensando nas palavras de Duo. Ele havia ficado contente ao saber que o Conde ficaria triste por não vê-lo novamente, também desejava permanecer mais tempo, mas sabia que logo ele e Trowa deveriam partir. Esperava apenas que pudesse conhecer melhor Duo antes que isso acontecesse.
Quatre ficou preocupado quando chegou e soube que Duo havia saído e não havia dito quando retornaria. Sabia que a estada de Duo se daria apenas até que o mesmo resolvesse tudo pelo qual viera a terra, mas eles ainda tinham um assunto do qual seu amigo estava habilmente se esquivando em falar. Não poderia obrigar Duo a contar suas lembranças, sabia que o que havia acontecido ao amigo há dois anos haviam deixado marcas profundas nele, não apenas físicas, mas também psicológicas e emocionais.
A verdade era que gostaria que Duo ficasse com ele por mais algum tempo, mas sabia o quanto era arriscado para ele permanecer em terra por tanto tempo. E alguma coisa lhe dizia que seu amigo deveria partir logo ou corria o risco de ter sua identidade descoberta.
Uma semana depois
Quatre já estava ficando preocupado com a demora de Duo, o mesmo havia dito que ficaria apenas quinze dias em terra e depois voltaria para o mar e faltavam apenas dois dias para completarem-se os quinze dias. Sabia que o amigo voltaria para pegar Hell, Duo jamais partiria sem o pássaro, mas não conseguia deixar de se preocupar.
A porta do gabinete se abriu e um moreno de olhos verdes entrou. Quatre corou violentamente diante dele, havia dois dias que o tenente o havia beijado e ele não conseguira deixar de pensar nele. Trowa sorriu ao vê-lo enrubescer, ele havia cometido o deslize de beijá-lo no jardim a dois dias atrás e ficara contente ao saber que o jovem Marquês sentia algo por ele.
Ele se aproximou, o beijando suavemente, fazendo com que o loiro fechasse os olhos e ofegasse ligeiramente.
- O que o preocupa meu anjo?
Quatre abriu os olhos sorrindo diante da forma como Trowa o chamava, o tenente lhe dissera que ele parecia um anjo, embora não tenha sido o primeiro, mas a forma como Trowa lhe dissera ele era seu anjo o havia encantado. Era engraçado como o mesmo conseguia ler a preocupação em seus olhos, em tão pouco tempo Trowa aprendera a conhece-lo tão bem quanto Heero ou Duo. Ele gostaria de se abrir com Trowa, mas não podia trair a confiança de Duo nele, ele prefiria morrer a trair a confiança depositada nele.
- Não é nada Trowa... eu apenas gostaria de saber quando o Duo volta.
Trowa olhou para Quatre não sabia como, mas tinha certeza de que ele estava mentindo. Quatre não conseguia mentir. Já havia reparado que havia uma ligação forte entre Duo e Quatre e não teve como negar que chegara a sentir ciúmes dessa ligação dos dois. Eles pareciam esconder alguma coisa, algo relacionado ao Conde. Ele estava a ponto de perguntar-lhe sobre a ligação dos dois quanto Rashid bateu na porta. Trowa se afastou sentando-se na cadeira, enquanto Quatre o mandava entrar.
- Desculpe interrompe-lo senhor, mas há uma pessoa que pede para vê-lo.
- Quem?
- Ele diz ser o capitão Zechs Marquise.
Quatre olhou apreensivo e assustado para Rashid. O que um capitão da marinha real queria com ele?. Trowa notou a apreensão entre o Marquês e o empregado, havia alguma coisa acontecendo naquela casa. Quatre procurou sorrir e olhou para Trowa tentando parecer natural.
- Diga que nós já desceremos Rashid obrigado.
Rashid se curvou retirando-se. Quatre fechou os olhos por alguns instantes tentando se acalmar, ao abrir os olhos encontrou o olhar de Trowa sobre si. Ele sorriu e se levantou.
- Vamos?. Talvez ele tenha alguma ordem para você e Heero.
- É possivel.
Deixaram o gabinete e desceram. Heero já se encontrava na sala com o capitão Marquise que se levantou ao ver o jovem Marquês. Quatre sentiu-se mal diante do capitão, ele era belíssimo, mas havia crueldade em seus olhos azuis, e a forma como ele o olhava era estranha e amedrontadora. Procurou sorrir apesar do desconforto, que não passou despercebido a Trowa nem a Heero.
- Marquês Winner.
- Capitão Marquise, é um prazer conhece-lo.
- O prazer é inteiramente meu Marquês.
Zechs mantinha a mão de Quatre entre a sua o que fez o loiro avermelhar ligeiramente, o capitão Marquise não parecia dar mostras de querer soltar a mão de Quatre. Heero olhou para Trowa que parecia disposto a retirar a mão de Quatre da de Marquise e decidiu que era melhor intervir antes que os dois se indispusessem.
- Marquise alguma noticia de minha embarcação?
Zechs soltou a mão de Quatre que soltou um suspiro de alivio, nunca sentira-se tão mal na presença de alguém como na presença desse homem. Ele exalava maldade em seu olhar e parecia ter conhecimento e orgulho no efeito que causava. Zechs sorriu cinicamente antes de voltar-se a Heero, não gostava dele. Achava um desperdício que um navio do gabarito do Wing ficasse nas mãos de um fedelho como Yuy, mas não poderia trata-lo mal. Heero possuía amigos influentes dentro da marinha e era melhor não provocar a ira deles.
- Realmente, disseram-me que Wing estara pronto para zarpar no máximo depois de amanhã Yuy.
- Depois de amanhã...
- Algum problema quanto a isso?
- Não...de forma alguma. É bom saber.
Zechs balançou a cabeça concordando, mas notou que não era bem essa a noticia que Heero esperava, parecia que ele não tinha a intenção de zarpar tão cedo e perguntou-se porque. Ele voltou seu olhar para o Marquês que conversava com o tenente Barton, esse era outro de quem não gostava, apenas pelo fato de ser subordinado de Heero. Percebeu que ele e o Marquês tinham algo e sorriu maliciosamente.
- Na verdade o motivo de minha vinda não foi bem esse. Eu...
Antes que pudesse terminar de falar a porta principal se abriu e Zechs soltou um suspiro aborrecido ao ser interrompido, mas assim que viu a figura que passara pela porta e prestara atenção a voz melodiosa, seu rosto se transformou imediatamente.
- Quatre você por um acaso sabe....
Assim que Duo entrou e viu quem se encontrava na sala seu coração pareceu parar, seu rosto perdeu a cor e ele sentiu uma ligeira tontura, sentiu seu corpo vacilar e talvez tivesse caído se não fosse amparado por Heero. Duo olhou dentro dos olhos azul cobalto que pareciam repletos de preocupação e alegria por vê-lo novamente.
- Você está bem?
- Sim...é que eu vim correndo... e acho que o licor que tomei na taberna era muito forte. Estou bem não se preocupe.
Heero sentiu o corpo de Duo tremer ligeiramente. Ele também sentia seu corpo tremer diante da proximidade de seus corpos. Ele se obrigou a soltá-lo e ganhou um sorriso. Duo procurou controlar-se e voltou-se para Quatre tentando ignorar o olhar do homem que o secava com os olhos.
- Desculpe Quatre não sabia que tinha visitas. Peço que me perdoe.
- Tudo bem Duo. Esse é o Capitão Zechs Marquise...ele veio trazer informações sobre o Wing e tratar de outro assunto, mas você o interrompeu.
- Ah. Então devo me desculpar com o senhor Capitão.
- De forma alguma....
- Que falta de cortesia a minha. Capitão Zechs Marquise esse é o Conde WaveWild. Conde WaveWild, Capitão Zechs Marquise da marinha real.
O capitão Zechs mantinha seus olhos grudados no Conde desde que o mesmo entrara intempestivo na sala, assim que Quatre fez as apresentações, ele se aproximou de Duo como um predador se aproxima de sua caça.
Duo não sabia o que fazer seu pior pesadelo estava ali diante dele o encarando. Heero sentiu imediatamente que o Conde voltou a ficar tenso à medida que Zechs se aproximava, ele não gostava do capitão da fragata Tallgeese, a seu ver ele era o pior tipo de oficial que poderia existir, fazendo-se valer de sua posição, cometia atrocidades terríveis com seus prisioneiros. Zechs estendeu a mão parando tão próximo a Duo que apenas poucos centímetros separavam seus corpos. Duo se obrigou a estender a mão e cumprimenta-lo, sentindo um arrepio de terror transpassar cada célula de seu corpo.
- É um prazer conhece-lo Conde...WaveWild.
Duo deu um meio sorriso e puxou sua mão quando Zechs acariciou o dorso dela com o polegar. Duo sentou-se na cadeira próxima a Heero, enquanto Zechs o acompanhava com o olhar.
Zechs ainda ficou observando-o por um longo tempo, enquanto Duo conversava vagamente com Quatre a cerca de sua demora, ele não conseguia se concentrar, sabendo que era observado pelo Capitão Marquise, ele podia sentir o olhar dele queimando sua pele. Zechs tentava lembrar-se onde vira tamanha beleza, ele tinha uma vaga lembrança da cor exótica dos olhos do Conde, mas não se lembrava direito do rosto, a cor dos cabelos também lhe era familiar, mas não poderia ser quem imaginava.
Ainda assim ele resolveu descobrir se sua intuição era verdadeira, ele tinha certeza de que se o Conde a sua frente fosse realmente quem imaginava, seus atos o trairiam. Aproveitando a pausa na conversa entre o Marquês e o Conde, Zechs decidiu comprovar suas suspeitas. Duo quase pulou ao ouvir Zechs dirigir-se a ele.
- Não nos conhecemos Conde WaveWild?
- Não creio Capitão.
- Verdade? Tenho a sensação de que já nos encontramos Conde, tamanha beleza jamais poderia ser esquecida.
Duo ficou mudo por alguns instantes tentando refrear o impulso de se levantar e deixar a sala. Ele olhou nos olhos do oficial, estreitando os olhos como se procurasse lembrar do oficial.
- Temo que esteja enganado Capitão, certamente eu me lembraria. A beleza de uma pessoa não é a única coisa que a marca na mente de uma pessoa, gestos ou fatos quando marcantes... também se tornam inesquecíveis... mesmo quando se deseja esquecer. E bem... não me lembro do senhor em nenhum deles, portanto é impossível que já nos tenhamos visto.
O Capitão Marquise sorriu e curvou a cabeça, ele estava admirado pela astúcia de suas palavras, as mesmas estavam ligeiramente carregadas de raiva e pareciam claramente direcionadas a si. Tinha quase certeza de que o conhecia, o belo rosto lhe trazia lembranças, no entanto não conseguia se lembrar de quando o encontrara. Havia algo em seus olhos que o lembrava um pirata, mas as roupas, os modos e a elegância não eram condizentes com a lembrança que tinha. Ainda assim não conseguia deixar de associar a beleza dos dois.
"É impossível que existam duas pessoas, com a mesma beleza e brilho nos olhos."
- Desculpe-me Conde WaveWild, mas é que sua beleza me é familiar de algum modo.
Duo olhou confuso para o capitão tentando não demonstrar o quanto ele também se lembrava do ultimo encontro dos dois. Sua voz soou alegre e descontraída diferente do que sentia no momento.
- Sinto-me honrado Capitão, mas diga-me quem meu rosto lembra. Espero apenas que não seja uma mulher, pois acredite não possuo os atributos de uma mulher, embora já tenham me confundido com uma.
- Tenho certeza que não Conde, embora eu não ache que eles sejam menos interessantes. Mas a pessoa em questão não chega a vossos pés em beleza ou elegância.
Duo sorriu e desviou seus olhos para Heero que observava a cena com atenção. Estava bastante claro o desconforto do Conde em relação à forma como o Capitão Zechs Marquise se dirigia a ele. Se não bastasse o olhar ligeiramente lascivo, as palavras do oficial deixavam bem claro o que pensava. Zechs observou o Conde e sorriu maliciosamente, antes de se desculpar.
- Perdoe-me Conde pela minha rudeza, não deveria compara-lo a um reles qualquer, se bem que.... eu poderia dizer que se parece com um pirata que encontrei certa vez , senão fosse a elegância em vós tão natural.
Quatre prendeu a respiração e ficou ligeiramente pálido ao ouvir o capitão comparar Duo a um pirata. Trowa notou que o Marquês ficou pálido e olhou para o Conde que permanecia com a expressão inalterada, no entanto quando sorriu seu sorriso lhe pareceu um tanto tenso, diferente da alegria que lhe era habitual. Heero estreitou os olhos diante do comentário de Zechs quanto a piratas, imediatamente as imagens da noite em que ele e Duo duelaram vieram-lhe a mente.
- Estou certo que está se confundindo capitão, e ofende-me ao comparar-me com um bandido qualquer. Creio que não possa ser tal pirata e nem que o mesmo tivesse tanta ousadia para permanecer na presença de três oficiais da marinha real. A menos é claro que tal pirata seja mais audaz e corajoso que a nossa marinha, detestaria pensar que isso seja verdade.
- E não é Conde... somos ainda mais audazes e corajosos que a escoria do mar. Embora o pirata a que me refiro, seja audaz e ousado o suficiente para fazer o que diz Conde.
O olhar de Zechs sobre si o estava incomodando, era claro que ele não acreditara em suas palavras.
"Ele me reconheceu. Eu sei. Levante-se Duo...levante-se e vá para o quarto".
Duo não sabia o que fazer, ele sabia que tinha que levantar e sair o mais rápido possível, mas o medo e as lembranças dolorosas causadas pelo homem a sua frente o impediam de reagir. Ele tinha a ligeira impressão de que estava tremendo e isso não era bom. Heero podia notar que o Conde estava suando e tremendo diante do olhar do capitão Zechs, não podia culpa-lo ele também não estava gostando da forma como o capitão do Tallgeese olhava para Duo, como se ele fosse uma presa e ele estivesse prestes a dar o bote
Era como se o estivesse despindo com os olhos, havia luxúria e cobiça nos olhos do capitão e eles eram direcionados ao Conde. E isso não o agradava de forma alguma. Zechs sorriu levantando-se e aproximando-se mais do Conde quase sussurrando em seu ouvido, mas alto o bastante para que Heero que estava sentado próximo a ele pudesse ouvir. Quatre prendeu a respiração ao ver Zechs levantar-se e caminhar em direção a Duo, falando junto a seu ouvido, seus olhares se encontraram e Duo procurou acalmá-lo com o olhar, embora ele mesmo não se sentisse assim tão calmo.
- Talvez eu deva dizer como era tal pirata, senhor.
- Não me interesso por pirataria capitão.
- Não!? Bem os piratas são a escoria do mar Conde WaveWild, mas existe um que supera todos os outros.
Duo levantou-se bruscamente, embora seus olhos estivessem escurecidos pela raiva procurou manter a voz firme e calma.
- Tenho certeza de que possui historias fascinantes sobre piratas... Capitão, mas como já disse não me interesso por pirataria.
- Não estou certo quanto a isso...
Nesse momento a porta abriu-se e uma voz suave fez com que todos olhassem na direção da entrada, onde uma jovem com longos cabelos loiros encontrava-se acompanhada por um soldado da marinha real.
- Pois tenha certeza Capitão Marquise, de que meu noivo não é um homem dado a pilhar navios, ou viver no mar. Não é meu querido Conde?.
- Perfeitamente minha querida.
Os olhos de Duo brilharam por um instante em reconhecimento e ele sorriu, caminhando até a jovem tomando-lhe a mão do soldado que a acompanhava. A jovem sorriu estendendo a mão para Duo, que a beijou. Ela sorriu e jogou-se nos braços dele sussurrando em seu ouvido.
- É bom vê-lo novamente.
- Obrigado, e eu digo o mesmo.
Ela o soltou virando-se para o primo que beijou-lhe a mão. Quatre ficara feliz pela entrada da prima, não sabia sobre a chegada dela, mas a mesma não poderia ter sido mais do que bem-vinda. Ele não sabia como retirar a atenção do Capitão Marquise sobre Duo sem levantar suspeita, e Duo já se encontrava visivelmente tenso e temia que o amigo fizesse algo que pudesse comprovar as palavras do oficial.
- Dorothy não sabia que vinha. Por que não me avisou? teria mandado busca-la.
- Não era necessário Quatre, o Capitão Zechs fez a bondade de trazer-me em segurança eu desejava fazer uma surpresa e vejo que consegui. Estava apenas aguardando um aviso do Capitão para entrar, mas o mesmo se demorou tanto que resolvi não esperar mais.
- Perdoe-me milady, pelo esquecimento, acabei me distraindo e fui descortês para com milady, não se deve deixar uma dama esperando.
Zechs curvou-se beijando a mão de Dorothy sem desviar os olhos de Duo. Que evitava a todo custo demonstrar seu desconforto. Dorothy notou o olhar do capitão e se aproximou de Duo segurando em seu braço.
- Se me permitem, vou roubar o Conde para mim. Não nos vemos há muito tempo e temos muito o que falar.
- Perfeitamente querida. Senhores, se me dão licença?.
Duo acompanhou Dorothy, que o puxava da sala; sabia que o que estava fazendo era errado. Uma dama jamais puxaria um cavalheiro dessa forma, mas a forma como o outro homem o olhava estava tornando-se insuportável a seu ver. Duo beijou Dorothy nos rosto pouco depois de saírem das vistas de todos.
- Então o que me conta de novo pequenina?.
- Eu não sou mais uma menina, então não me chame assim.
O bico formado pela jovem o fez sorriu um pouco. Estava feliz pela forma como Dorothy o havia salvo, nunca poderia pagar por ajuda tão oportuna.
Algumas horas mais tarde:
Como Duo não retornou para o jantar dizendo-se indisposto e ficando em seu quarto Quatre resolveu ir vê-lo, bateu na porta do quarto, precisava conversar o quanto antes com o amigo sobre o Capitão Zechs Marquise. Sabia que eles se conheciam e tinha quase a certeza de que as marcas causadas na alma e no corpo do amigo deviam-se ao capitão da marinha real. Duo ouviu a leve batida na porta, tinha certeza de que se tratava de Quatre, sabia que o amigo assim que se livrasse de Zechs iria até seu quarto perguntar-lhe acêrca do capitão. Mas pelo adiantado da hora não imaginou que ele ainda viesse. Caminhou até a porta, mas somente a abriu após confirmar a presença de Quatre do outro lado da porta.
- Quem é?
- Sou eu Quatre.
Quatre ouviu a voz receosa de Duo soar do outro lado da porta, assim como o ouviu destrancar a mesma. Desde que Duo chegara nunca o vira trancar a porta, mesmo tendo Heero e Trowa hospedados na casa, mas agora descobrira que o amigo o fizera, receoso de que alguém pudesse invadir-lhe o quarto.
"Ele o teme tanto assim?".
Duo afastou-se ligeiramente para que Quatre entrasse e, depois fechou a porta, não sem antes olhar do lado de fora verificando se ninguém encontrava-se no corredor. Ouviu a voz suave de seu amigo e olhou para ele triste.
- Está tudo bem Duo, ele não ficou hospedado aqui. Embora ele tenha se oferecido para ficar, disse que não dispunha de outros quartos na casa.
- Ele acreditou?
- Não... sabe que sou péssimo mentiroso. Mas Rashid foi mais convincente do que eu. Disse que havia apenas três quartos sobrando e dois deles eram impossíveis de se ocupar no momento, e como Dorothy ficaria conosco o quarto restante seria ocupado por ela.
- Desculpe-me por faze-lo mentir dessa forma.
- Não foi nada Duo, eu notei que você não... desejava encontra-lo, mas o que houve entre vocês? Ele... foi a causa de seus.... ferimentos?.
- Sim... foi... foi ele.
- Quer me contar o que houve?
- Eu... eu...
Lembrar do homem que o ferira tão profundamente o fez sentir-se mal, seu corpo começou a tremer apenas ao lembrar da dor e humilhação que sofrera há dois anos, e cada vez que fechava os olhos parecia que as revivia como se estivessem acontecendo naquele momento. Duo sentiu a repulsa e nojo crescerem em seu estômago; correu para o banheiro, despejando todo o seu nojo e asco dentro da tina.
Quatre correu até o amigo pegando uma toalha e molhando-a, colocando-a atrás do pescoço de Duo. Sentiu seu amigo soluçar e quando o mesmo levantou a cabeça pôde ver os olhos marejados pelas lágrimas. Duo limpou a boca e voltou para o quarto, sentando-se na janela e olhando para o porto, isso o fazia sentir-se melhor e no momento era disso que precisava para contar ao amigo tudo o que lhe acontecera há dois anos atrás.
Quatre sentou-se na cama aguardando pacientemente Duo começar a falar, sabia que ele precisava de um tempo para se preparar antes de começar. Quatre ouviu a voz de Dorothy na porta e olhou para Duo que balançou a cabeça concordando em abrir a porta. O jovem Marquês levantou-se, caminhando até a porta e abriu-a. Dorothy ficou surpresa ao ver o primo no quarto de Duo, esperava que o belo pirata estivesse sozinho no quarto, mas isso não a impediu de entrar e jogar-se nos braços do pirata que a abraçou.
Quatre olhou para a prima, que literalmente agarrou-se a Duo. Ela virou a cabeça para o primo, sorrindo e depois para o jovem pirata. Ele continuava belo como se lembrava quando criança, não ele estava ainda mais belo, a trança estava mais comprida e o corpo havia se desenvolvido magnificamente, podia sentir os músculos firmes contra seu corpo, e lentamente acariciou as costas nuas do pirata.
Duo sentiu as mãos de Dorothy acariciar suas costas e imediatamente segurou os braços da garota afastando-a de si. Apesar de segurar os braços dela com um pouco de rudeza seu olhar era carinhoso e sua voz soou brincalhona.
- Dorothy minha cara, você por acaso pretende tirar minha honra na frente de seu primo?
O rosto de Dorothy ficou vermelho imediatamente e ela sentiu a pressão da mão de Duo em seus braços diminuir, ela olhou diretamente nos olhos do pirata que mantinha o mesmo olhar carinhoso de quando ela era uma criança. Envergonhada ela abaixou a cabeça e sussurrou um pedido de desculpas, sabia que não havia se comportado como uma dama, ao agarra-se a um homem semi-despido.
- Desculpe-me.
- Hei!
Duo levantou a cabeça da jovem levemente com uma das mãos. Olhando dentro dos olhos claros, inclinou-se sobre ela a beijando suavemente nos lábios, enquanto estreitava o abraço em sua cintura. Quatre olhou surpreso para a cena a sua frente, sem saber o que dizer, sabia que sua prima nutria uma paixão pelo pirata, mas jamais imaginou que o mesmo fosse beijá-la.
Duo se afastou ligeiramente, olhando para a jovem que mantinha os olhos fechados e os lábios entreabertos. Sabia o que Dorothy sentia por ele, ela havia se tornado uma jovem belíssima, uma verdadeira dama, mas não poderia enganá-la.
- Obrigado por me ajudar Dorothy, mas....
Dorothy colocou os dedos sobre os lábios de Duo o silenciando, sabia que o pirata não sentia nada além de carinho, mas ela não desejava ouvir isso dos lábios que tinham acabado de beija-la. Ela deu um sorriu triste e afastou-se do pirata caminhando até a porta e dando um beijo de boa noite em seu primo antes de sair. Duo sorriu e voltou sua atenção para Quatre que ainda não entendia direito o que havia acontecido.
- Acho que íamos ter uma conversa não é?.
Quatre balançou a cabeça e sentou-se novamente. Duo sentou-se ao seu lado na cama, tomando fôlego para começar.
- Por onde eu deveria começar, há tanta coisa... a dizer... e... nenhuma delas é fácil para mim.
Duo sentiu a mão de Quatre sobre a sua e sorriu a segurando, deitou-se fechando os olhos e pela primeira vez em dois anos obrigou-se a lembrar do que lhe acontecera. A voz de Duo saiu baixa e carregada pela dor o que não passou despercebido a Quatre.
- Talvez eu deva começar dizendo quando conheci o Capitão Zechs Marquise.
Duo fechara os olhos tentando encontrar forças para falar. Ele podia sentir a mão de Quatre apertar a sua passando calma e lhe dizendo que ele estava ali, a seu lado, para o que precisasse.
Heero estava saindo de seu quarto para tomar um pouco de ar na rua, o jantar havia sido estranho. A presença do Capitão Zechs havia sem dúvida abalado Duo, pois o mesmo não apareceu, permanecendo no quarto durante todo o tempo, ele ficara contente ao vê-lo novamente, mas a presença de Zechs havia tornado o clima tenso entre todos. Ele se viu tentado a descobrir o porquê de Zechs insistir tanto sobre piratas com Duo.
Seus pensamentos foram cortados ao ver a jovem que chegara, e dizia-se ser noiva do Conde deixando o quarto do mesmo, imediatamente algo pareceu comprimir seu peito e uma sensação de perda o incomodou. Ele esperou que a jovem se afastasse e entrasse em seu aposento, antes de seguir seu caminho em direção a rua, ele viu a claridade da porta que se encontrava entreaberta, e ouviu as vozes do Marquês e do Conde, imediatamente uma sensação de calma invadiu seu peito ao saber que a jovem não estivera sozinho no quarto. E ele decidiu continuar seu caminho.
- Estávamos nos afastando da África, quando ouvimos dizer que a marinha estava atrás de nós, não que isso fosse uma novidade, mas o fato é que alguns piratas atacaram uma embarcação da marinha matando todos os tripulantes e eles hastearam a minha bandeira. Conseqüentemente eu acabei levando a culpa.
Dois anos atrás em algum lugar perto da África
- Bando de ..... se eu os pegar juro que mato a todos.
- Isso vai nos trazer problemas Capitão.
- Eu sei Wu-Fei não precisa dizer isso para mim. Uma coisa é pilhar e destruir embarcações comerciais, outra totalmente diferente é matar oficiais da marinha real e destruir sua embarcação. Maldição!
Shinigami socou a mesa em sua cabina, eles precisavam se afastar por um tempo, antes que encontrassem uma embarcação da marinha real, o problema é que eles tinham que buscar mantimentos em terra na costa Espanhola e sabia que a marinha de lá deveria estar de prontidão. Não poderiam evitar ir a terra, precisavam de determinadas coisas que encontrariam apenas lá. Era uma decisão difícil, mas ela tinha que ser tomada, poderiam não resistir até chegar ao próximo porto.
- Diga aos homens que se preparem iremos para a Espanha.
Wu-Fei olhou para o capitão, não achava uma boa idéia arriscarem-se, indo para o porto na Espanha certamente eram aguardados por lá, eles poderiam se dirigir a outro porto, conseguiriam chegar em outro porto se racionassem a comida. O capitão olhou para o marinheiro sabia o que o mesmo estava pensando, mas era arriscado demais, não tanto quanto ir até o porto da Espanha a verdade era que não queria ter sua vida controlada. Ele era o Shinigami e como tal ia aonde queria, independente do perigo a sua volta.
- Eu sei Wu-Fei, mas você me conhece não é?.
Com um meio sorriso Wu-Fei sacudiu a cabeça.
- Sim capitão eu avisarei aos homens.
O capitão balançou a cabeça e voltou a olhar os mapas, alguma coisa lhe dizia para não seguir para a Espanha, mas decidiu ignorar. Sabia se cuidar, pelo menos era o que achava.
Eles chegaram no porto a noite, o capitão deixou ordens para que abastecessem o navio o mais rápido possível e que ninguém se afastasse do navio além do necessário, pois ao menor sinal de perigo deveriam zarpar imediatamente independente de quem estivesse em terra e isso o incluía. O navio estava quase totalmente abastecido e nenhum sinal da marinha e isso era estranho. Shinigami mantinha seus olhos atentos aos movimentos no cais, quando os notou, eles estavam ali a espreita observando-os e aproximando-se. Ele correu pegando uma espada e dando ordens de que se preparassem para zarpar ou lutar. Ele assobiou fazendo com que Hell se aproximasse pousando em seu braço.
- Você sabe o que fazer garoto.
O capitão assobiou três vezes fazendo o pássaro alçar vôo e depois mergulhar soltando um pio longo e alto à medida que mergulhava, esse era o sinal de que todos deveriam voltar a embarcação imediatamente. Os homens começaram a correr para o Deathscythe, quando ouviram os gritos dos homens da marinha que decidiram impedir que fugissem. Em poucos minutos o cais ficou repleto de homens lutando, eles estavam em desvantagem, pois os homens da marinha eram muitos.
Shinigami correu pelo convés descendo as escadas e mirando um dos canhões contra o porto e disparando, ele sorriu diante do estrago e ordenou que todos se apresassem.
- Andem seus molengas.
O tenente da marinha olhava para o estrago no porto, apenas um louco teria disparado contra seus próprios homens para consegui escapar.
- Andem todos.
Shinigami sorriu diante da surpresa do oficial, eles conseguiriam escapar. Seus homens sabiam o quanto ele era louco para ter feito o que fez, mas o quanto também era cuidadoso para não ferir ninguém de sua própria tripulação. Ele viu Wu-Fei lutando com dois homens quando um soldado apontou uma arma disparando-a contra este, que caiu, pegou uma das cordas do mastro de Mezena e deslizou por ela descendo do navio. Ele pôde ouvir a voz de Fernandes chamando-o.
- Capitão!
- Vão agora.
O capitão lutou contra os homens que haviam cercado Wu-Fei e que o agrediam no momento, ele os derrubou, matando alguns deles e ferindo outros. Olhou para o chinês e sorriu, virou-se avistando John junto com os outros, sabia que eles não os deixariam para trás, ele conhecia sua tripulação e sabia que poderia contar com ela em qualquer situação.
- Você está bem amigo?
- Porque capitão?
Shinigami sorriu e passou-o a John para que o mesmo o ajudasse a chegar ao navio que já estava a uma certa distância. Eles não conseguiriam escapar a menos que ele fizesse outra loucura, ele apontou sua pistola para os barris de pólvora no cais, se explodisse o restante do cais seus homens ficariam do outro lado do cais e estariam livres, mas ele não escaparia. Olhando para seus homens mais uma vez.
- Você faria o mesmo por mim. Vão! É uma ordem! É a mim que eles querem, Wu-Fei... o Deathscythe agora é seu.
- Capitão.
- Agora!
Shinigami disparou nos barris e o restante do cais foi pelos ares, ele viu seus homens olhando-o através das chamas e ouviu as palavras de Wu-Fei, ele sorriu balançando a cabeça antes de se ver cercado pelo que havia restado dos homens da marinha, ser golpeado na nuca e cair na inconsciência.
Quatre não podia acreditar que Duo havia explodido o cais do porto de Nerias na Espanha para que seus homens escapassem, ele havia lido sobre a explosão que foi atribuída a um descuido dos homens que trabalhavam no porto, nunca teria imaginado que Duo havia sido o responsável pela destruição do porto. Ele estava próximo a Espanha e tivera que mudar seu curso por conta disso.
- Os homens da marinha no cais seguiam as ordens dele e eu fui preso. Sabia que morreria na forca. Wu-Fei havia dito que viria me buscar eu apenas precisava resistir. E foi isso que me manteve vivo. Quando o capitão Zechs chegou na manhã seguinte eu já havia sido surrado, chicoteado, queimado e todos os piores tipos de tortura que você pode imaginar, mas nenhuma delas foi tão terrível quanto o que ele fez comigo.
- Como ele não o reconheceu hoje?
- Quando ele chegou na manhã seguinte meu rosto estava inchado e machucado de tanto apanhar do tenente, não haveria como ele me reconhecer agora, tirando a cor de meus olhos e os cabelos não há nada que me associe ao Shinigami de dois anos atrás. Foi horrível Quatre em teria preferido enfrentar mil vezes aquele mesmo Demoague a ter que ...
Ao ouvir Duo contar o que havia acontecido com ele durante os três dias em que ficara preso, Quatre se encheu de dor e começou a chorar libertando as lágrimas que mantivera presa ao começar a ouvir o relato de Duo. Como alguém podia ser tão maldoso?, que tipo de homem se fazia valer de sua farda para infligir terror e dor nos outros?. Duo chorava, soluçando a medida que contava e relembrava tudo o que tentara esquecer nos últimos dois anos e que voltara no instante em que se viu frente a frente com o Capitão Zechs Marquise da marinha real. Quatre não sabia o que dizer para aliviar o sofrimento de Duo, imaginar quanto o outro teve que se controlar para não demonstrar o terror das lembranças. Ele se jogou nos braços do amigo compartilhando sua dor. Enquanto o ouvia falar.
- Ele quebrou minhas mãos e minhas pernas para que eu não pudesse fugir ou reagir. Ele me suspendeu em correntes, rasgou minhas roupas e com ela minha dignidade....
- Duo...
- Ele me... me... violentou Quatre..., ele....
- Não por favor... não continue Duo.... Perdoe-me por fazê-lo lembrar disso. Se eu soubesse, ele jamais teria saído vivo de minha casa..
- Quando Wu-Fei chegou.... eu estava semi-morto... sabia... que ele voltaria no dia seguinte... ele havia dito que o faria, e tudo que eu pedia era para morrer antes que ele voltasse....
Duo chorava como há muito tempo não fazia. Ele se encolheu nos braços do amigo como se buscasse refugio para seus demônios, ao fechar os olhos podia ouvir os risos de escárnio de Zechs, o mesmo lhe dizendo o que faria com ele. Podia ouvir seu grito ao ser violado tão brutamente, podia sentir a ardência de suas lágrimas em seus ferimentos, podia sentir sua alma sangrando exigindo vingança.
Ele levara quase um ano até conseguir a mesma mobilidade nas pernas e mãos de antes, mas seu coração e sua alma jamais foram o mesmo. Ele acabara por se tornar frio e até mesmo cruel às vezes, mas os poucos dias que ficara com o amigo haviam resgatado o que ainda restara de sua alma e de seus sonhos. Quatre viu que o amigo soluçava levemente, esgotado pelas lágrimas. Ajeitou Duo na cama e levantou-se para pegar um lençol, quando viu um vulto junto a porta e caminhou até ela, mas não encontrando ninguém.
"Eu deveria ter verificado se Dorothy tinha fechado a porta. Quem poderia estar ouvindo nossa conversa?"
Ele olhou para o amigo que se agarrara ao travesseiro e que ainda tinha lágrimas a cair dos olhos. Infelizmente não era mais seguro sua permanecia ali, sabia que Zechs não descansaria até descobrir a verdade. E sabia que não conseguiria fingir na frente de um homem tão cruel.
"Acho que você deve partir amanhã meu amigo."
Quatre fechou a porta e encaminhou-se para a cama deitando-se ao lado de Duo o abraçando, puxou o lençol cobrindo a ambos, não o deixaria sozinho durante a noite, ficaria com ele. Tentaria ajudá-lo e protegê-lo da mesma forma que ele fizera com ele um dia.
Continua...
Agradecimentos a todos que acompanham essa fic e aos comentários enviados.
Até que enfim mais um capitulo esse é dedicado a sis Misao, eu sei sis que não teve muita pele a mostra, mas eu prometo melhorar. Sei que o capitulo ta meio tosco, mas é que eu ando meio sem animo para escrever essa fic.
Ainda assim eu aguardo comentários ok.
