Capítulo 2: Perdidos em Outra Realidade
O domingo amanheceu com tempo bom e claro. Keitarô, como sempre, levantou-se para fazer a faxina geral nos corredores da imensa hospedaria e limpar a área de banho.
As garotas acordaram cedo e puseram os seus afazeres cotidianos em dia. Exceto três delas.
Sarah, Kaolla e Shinobu.
Passado o susto inicial, a saga protagonizada pelas três pequenas aventureiras embalou de vez e elas somente foram dormir de madrugada em frente ao aparelho de videogame.
A avatar (representação virtual) de Kaolla estava indo para o level 2, aprendera várias magias de ataque derrotando vários monstros e já tinha obtido seu primeiro item mágico.
A que representava Sarah não ficava muito atrás, tendo desenvolvido alguns ataques e chutes poderosos. Sua agilidade nas técnicas do estilo de kung-fu da escola Jet Kune Do, aliada à pequena estatura, fazia uma combatente difícil de derrotar.
Apesar de ser mais inexperiente do que as outras, a clériga interpretada pela Shinobu desenvolvera-se durante o treinamento e já sabia fazer algumas magias básicas: cura e proteção. Para sua autodefesa, ela arranjara um cajado.
Elas passaram pela missão tutorial para principiantes e se preparavam para entrar na aventura propriamente dita...
Motoko percebeu a ausência das três e discretamente abriu a porta do quarto da Kaolla.
Ao ver as meninas dormindo, fez um gesto de desaprovação com a cabeça e fechou a porta comentando com si mesma:
- Humpf... Ainda bem que é domingo...
Logo depois do almoço, Keitarô e Naru acertaram o programa.
Com o pretexto de fazer algumas compras, Urashima saiu na frente rumo ao ponto pré-combinado. Isto foi feito de comum acordo com Narusegawa para não atrair comentários na Pensão.
Naru somente concordou em ir com ele desde que ninguém mais ficasse sabendo, para não dar o vexame da primeira vez, quando ambos deram de cara com a Motoko e a Su numa sorveteria.
Narusegawa ficou dentro de seu quarto fazendo a maquilagem e monologando consigo mesma:
- E o Keitarô fez tanto drama para me convidar... Como ele é bobo! Se tivesse pedido diretamente, eu teria aceitado, aliás, hoje não tinha o que fazer mesmo... Já estudei para a prova da semana que vem e os trabalhos estão em dia... - Sorria a jovem diante do espelho.
- Aonde vai, Naru? Entra Kitsune no quarto sem avisar.
- Ki-Kitsune? O que faz no meu quarto?
- Ahá, aprontando para sair? Algum encontro com o senhor gerente, por acaso?
- É que... Não, Não! Não é o que está pensando, Kitsune!
- Ué, e o que tem demais? Uma escapadinha para aliviar o stress não faz mal a ninguém. Aproveitem!
O Keitarô vai ficar muito contente com você por perto... Coitado... Ele está tão carente... - Comenta a jovem de cabelos curtos se aproximando de Naru e afagando os longos cabelos de sua melhor amiga.
- Não tem nada a ver! A gente está saindo apenas como amigos...
- Bem, que seja, mas vou te dar um conselho de amiga, Naru. Mesmo que não role nada, trate-o muito bem. Depois de passar na Toudai, vocês não tem se conversado como antes... Sei que a vida na faculdade não é fácil, mas aproveite este momento...
- O quê você quer dizer com isto, Kitsune? Nós não somos namorados! E não vá pensar que esqueci aquele dia em que peguei você fazendo gracinhas com meu uniforme para aquele bobo...
- Eheheh... Então ainda não conversou com ele sobre "aquilo"? Divirtam-se, meus jovens... Ah, e não esqueçam da camisinha! - Sorri maliciosamente a jovem de cabelos curtos, piscando um de seus olhos para sua amiga.
E tão rapidamente como entrou, Mitsune Konno sai, deixando Naru com suas dúvidas e indagações.
Naru fica com ar preocupado, olhando-se para o espelho:
- Que mania que a Kitsune tem de se intrometer na minha vida... Logo ela pensar que eu e o paspalho do Keitarô estamos namorando ou perto disto... - Naru começa a monologar, estando indecisa quanto ao modelo de roupa a escolher. Enquanto prova vários vestidos, ela continua falando consigo mesma - Bem, está certo que o Keitarô quando está sério e não está pensando "naquilo" é uma gracinha... e ele tem se esforçado... Mas eu não gosto quando ele faz aquelas piadas sem graça ou fica com cara de safado quando a Mutsumi-san desmaia no colo dele ou quando a Shinobu-chan o procura...
Só então Naru repara que está quase uma hora atrasada em relação ao horário combinado.
- Nããão! Tenho que terminar de me aprontar, senão aquele idiota vai ficar plantado na calçada até o sol se pôr...
Assustada com a hora, Naru se põe a remexer o seu guarda-roupa, na tentativa de escolher a melhor combinação, mas perde ainda mais tempo...
Mas Naru não seria a única a sair naquele domingo ensolarado.
Enquanto isto, em seu quarto, Motoko Aoyama se prepara para sair, também com planos de ir ao centro da cidade.
Embora isto fosse muito raro, ela precisava relaxar um pouco, tanto física como mentalmente. O ritmo dos estudos no último ano do colégio estava intenso e ela necessitava de uma pausa.
Ao abrir o seu guarda-roupa - que ganhara mais variedade em relação a dois anos atrás - Motoko ficou indecisa. Normalmente ela somente saía para ir do trajeto da pensão Hinata para a escola e vice-versa. E o uniforme escolar a poupava de fazer escolhas.
Ela quase não fazia compras, já que Shinobu, Naru, o pervertido do Urashima e eventualmente Haruka se incumbiam de tal tarefa.
Ela queria usar algo bem à vontade, mas que não fosse chamativo, sensual ou ousado demais.
Não, não estava a fim de atrair paqueras inconvenientes justo hoje.
Só queria passear e descansar o corpo e a mente.
Ela optou por uma blusa simples, mas confortável, calça jeans de cintura alta e tênis. Embora um pouco relutante, ela tirou suas faixas do peito e colocou um sutiã, já que iria sair de blusa.
Um pouco envergonhada de si mesma, pintou as unhas com um esmalte discreto e passou rapidamente um batom de cor neutra, finalizando com um perfume muito suave.
Ela nunca foi vaidosa e nem sabia ficar muito tempo ao espelho, como a Naru e como a Kitsune. Para falar a verdade, a guerreira de Kyoto somente começou a se preocupar um pouco mais com a aparência pessoal em parte por estar terminando o terceiro ano do colegial e em parte por causa da influência do Urashima - embora publicamente ela jamais iria admitir isto.
Mas o progresso de Motoko já era notável. Ironicamente, o próprio fato de ter perdido o duelo para sua irmã mais velha recentemente deixou-a menos apegada ao passado e menos rígida do que outrora. Já não carregava sua espada Shisui para lá e para cá pelo fato desta ter sido quebrada. A atual, ela usava apenas para os treinos.
Contudo, Motoko ainda sentia um vazio interior que não estava preenchido completamente. Ela precisava conquistar sua felicidade, mas não sabia como. Ela ainda buscava a plenitude de sentir a "corrente da vida" que tanto os anciões de sua vila quanto sua irmã mais velha falavam.
Motoko somente avisou Haruka que estava saindo e foi em direção ao centro, pegando o bondinho. Contudo, ela indagava aonde Keitarô tinha ido, pois não o vira na pensão.
No centro de Tóquio, Motoko passa por algumas lojas de roupas e acessórios femininos e casualmente vê as vitrines, mas desiste de ficar vendo as novidades. Consumismo não era com ela. Indecisa quanto ao local a ir, a guerreira lembra do nome do shopping novo que Kaolla mencionou e decide passar só para dar uma olhadinha.
No shopping Mizuno, solitariamente ela toma um sorvete na praça de alimentação, ignorando os olhares cobiçosos dos rapazes que passavam por lá. Tal assédio a deixava constrangida. Embora a jovem Aoyama não gostasse de freqüentar lanchonetes e similares, o fato era que não havia nenhum restaurante de comida japonesa no recinto. O shopping era marcantemente de influência ocidental. Ela dá uma rápida passada nas vitrines das lojas e até fica contente ao ver crianças brincando na área de lazer do shopping, recordando de sua infância.
Então ela decide ir ao banheiro feminino.
Motoko adentra o WC feminino do shopping, para lavar as mãos e retocar o batom. Ao terminar, ela fecha os olhos, estando diante do espelho do WC e começa a pensar consigo mesma, alheia ao mundo ao redor:
- "Heh... Há dois anos eu não iria sequer por os pés num shopping como este... Vivia somente para os estudos e para aprimorar minha técnica de espada... Até que cruzei o caminho com o Urashima..."
Num relance Motoko relembra com a mente tudo o que aconteceu desde sua vinda à pensão Hinata e deixa escapar um suspiro ao relembrar daquelas batidas fortes do seu coração quando vira aquele que viria a mudar para sempre sua vida:
- "Por que ELE foi entrar em minha vida? Tantas mudanças... Será que para melhor? Se a mudança é positiva, por pressupor a substituição do novo pelo velho e a renovação da Vida como dizem, por que a gente resiste tanto a elas?"
Motoko tenta aprofundar seus pensamentos, literalmente se isolando dos cheiros, cores, sons e impressões do mundo exterior, que se torna abstrato para ela. Buscando as imagens do passado, ela se fixa na figura de como era há vários anos atrás e vai progredindo até chegar naquele visual que adotou quando o pessoal da pensão pressionou-a tornar-se mais feminina.
Motoko nota que aquele penteado antes que achava esquisito, com tranças laterais, até que ficava bem nela. E que não se sentia mais envergonhada em usar roupas modernas, ao estilo ocidental.
A samurai iria continuar a sua busca interior de forma mais intensa se não tivesse sido brutalmente interrompida naquele momento.
Motoko se arrepia ao sentir que não está só. Sente o roçar de um braço em suas costas e um toque delicado de mãos afagando suas tranças.
Com o sangue ruborizando sua face, ela instintivamente se vira - imobilizando seu alvo com um golpe típico de judô, torcendo-o na altura do pulso da mão direita. Motoko dominava a arte de luta desarmada bem como vários estilos de armas adotados pelos seus antepassados. Mesmo sem sua Shisui, ela continuava perigosa. E para a sua surpresa, ela vê que seu alvo era uma garota. E, pior, uma aluna do mesmo colégio que o dela.
- Por favor, solte-me!... Está... doendo muito!... - Implora uma garota, com cara de choro, sentindo muita dor com a torsão do braço que Motoko lhe aplicava.
- Por que você fez isto? O que quer de mim? - Motoko afrouxa um pouco a força da imobilização, aliviando a dor de sua oponente e nota que ela não faz a menor força para tentar livrar o braço.
- Eu... Sempre te vejo nos treinos de kendô no colégio... Não me reconhece, Motoko-chan? Sou a Mieko do 2o ano! - Responde a jovem que tinha cabelos curtos, usava óculos ovais de aro fino e com o físico mais delicado do que a Motoko.
- Como ousa me tocar deste jeito? Por quê fez isto?
- Eu sempre te admirei desde o dia em que te conheci... - Ela começa a chorar baixinho e entre soluços, declara - Eu te acho muito forte, admirável, muito bonita... Eu queria ser como você! Quero-te! Eu, Eu...
- ???
- Amo você...
Motoko fica por instantes sem saber o que dizer para a jovem que chorava à sua frente.
Por sorte, não tinha ninguém mais no banheiro por perto.
Ela conhecia Mieko apenas de vista, já que eram muitas as tietes e torcedoras da lutadora de kendô na escola. E ela não fazia parte do famigerado trio de meninas que a perseguia onde estivesse indo.
Motoko sempre fora popular e tinha seu fã-clube particular - embora pessoalmente se sentisse irritada com o assédio daquelas meninas fanáticas nos treinos e nos campeonatos que participava. Mas nunca imaginara que alguma delas fosse levar a tietagem mais adiante.
Como ela nunca se interessou seriamente em ter sentimentos amorosos com pessoas de mesmo sexo - pelo menos era o que imaginava - sentiu ser preciso arrancar as ilusões da jovem Mieko pela raiz antes que trouxesse infelicidade para as duas.
- Cada pessoa tem o seu caminho. Alguns caminhos se cruzam na vida, outros se afastam... Não te desejo mal, mas não tenho como atender o seu pedido!
- Mas, eu te amo, Motoko-chan! Por favor, pode me bater, me xingar, até chamar a polícia, mas... mas... Deixe-me beijar você, apenas uma única vez! Eu te imploro...
- O que aconteceu aqui, termina aqui! Vá e nunca mais faça o que fez hoje! Não me procure nunca mais, senão serei obrigada a denunciar seu comportamento aos seus familiares. - Disse Motoko num tom mais calmo, porém firme o suficiente para deixar claro que não queria nada com aquela pobre garota.
Mieko olha para Motoko uma última vez - reprime um soluço - abaixa a cabeça, totalmente ruborizada e sai correndo do WC em lágrimas, sem ao menos fechar a porta. Motoko fica alguns instantes no local, evidentemente aborrecida pelo bizarro incidente. E então ela decide ir embora, indo pelo lado oposto de onde viu a jovem Mieko sair. Com tempo e alguma sorte, este incidente seria página passada, pensava a jovem guerreira samurai.
Ela não sentia ódio daquela fã amalucada, mas jamais havia pensado em se interessar por mulheres, ao mesmo tempo em que evitava qualquer contato mais íntimo com homens - exceto pelo tarado do Urashima, cuja convivência, no seu entender, era forçada pelas circunstâncias.
Enquanto isto, nas galerias do Shopping Mizuno, Mieko corria e chorava, ao mesmo tempo em que sentia uma raiva enorme. Não pela Motoko e por sua atitude severa, mas por si mesma e pelo seu sentimento crescente de inferioridade... Parte dela queria morrer e o pensamento de suicídio passou lhe na cabeça. Mas se morresse, como ficariam seus sonhos? Totalmente transtornada e desorientada, ela saiu do shopping sem olhar para trás.
Naquele momento, Keitarô Urashima estava parado numa praça aonde tinha combinado encontrar-se com Naru. Ele estava entre alegre e ansioso, monologando consigo mesmo:
- Ah, finalmente este ano vou sair junto com a Narusegawa... Que felicidade! Não consigo conter-me de felicidade! Uma tarde de domingo inteira! Dizia o alegre estudante sem ligar para os olhares indiscretos dos transeuntes que o tomavam como ingênuo e bobo.
Seu devaneio termina quando sente um impacto seguido de uma dor incrível. Sem querer, alguém esbarrou fortemente nele e o atirou para a calçada. Keitarô estava totalmente distraído e acabara se chocando com uma assustada Mieko que estava correndo e sem olhar para onde ia.
- Ugh... É você, Narusegawa? Disse ele ainda zonzo, tentando achar os óculos caídos no chão e temendo que o tombo fosse o prenúncio de uma nova maré de azar, lembrando-se do acidente que sofrera há meses atrás na cerimônia de admissão na Universidade de Tóquio.
Ele fica assustado ao ver que no lugar de Naru estava uma linda moça de óculos de aros finos, cabelos negros lisos e compleição franzina caída. Era Mieko. Apesar do tombo, aparentemente ela não estava ferida.
- Oh, não! Por favor, me desculpe... Foi tudo culpa minha. - Diz Keitarô com seu jeito atrapalhado.
- Perdoe-me minha atitude irresponsável! Eu não olhei onde estava indo... - Humildemente se desculpa a garota abaixando a cabeça, sem ter coragem de olhar para o desconhecido jovem.
Keitarô ajuda a garota delicada a se levantar e repara que ela era muito bonita, apesar da fisionomia triste.
- Desculpe-me, mas aconteceu alguma coisa com você? - Keitarô nota os olhos úmidos e as lentes dos óculos molhadas pelas lágrimas.
Envergonhada, a Mieko pede perdão mais uma vez com um aceno de cabeça e foge da vista de Keitarô, não por culpa dele, mas por medo de si mesma. Depois que descobrira - ainda no início da adolescência - suas verdadeiras tendências afetivas, Mieko julgava-se incapaz de se relacionar com um homem e tinha muito receio de se envolver com qualquer um deles.
- Ué, o que deu nela? - Pergunta o jovem estudante sem entender nada.
Keitarô não tem tempo para perguntar mais nada. Em instantes ele percebe um zumzumzum ao redor. Era a Naru que chegava vindo se encontrar com ele. A sua beleza estonteante para os padrões orientais dificilmente deixava de ser notada aonde ia.
- Oi, Keitarô, desculpe-me, mas o bondinho demorou um pouco. - Justifica-se Naru tentando ocultar o verdadeiro motivo do atraso. Além de ter demorado arrumando-se, ela ainda se atrasou ao conversar com Haruka na casa de chá, perdendo o bonde que Motoko havia usado, tendo que esperar o próximo.
- Oi, Narusegawa... - Keitarô fica sem palavras ao notar que Naru estava mais bonita do que nunca. Ela usava uma blusa de manga comprida com um decote para lá de razoável, saia curta e botinas. E ela exalava aroma de um perfume com cheiro suave, mas nítido, como aroma de madeiras exóticas.
- Bem, aonde vamos?
- Estava pensando em ir a uma sorveteria por perto. Depois a gente podia passar no cinema... - Diz laconicamente o jovem.
- Sorveteria tudo bem, mas quero fazer alguma coisa de diferente! Já assisti a quase todos filmes que me interessavam com a Mutsumi durante a semana passada, e os poucos que sobraram são chatos...
- Tudo bem, tudo bem... - Keitarô pensava em outra alternativa de diversão, temendo que o encontro fracassasse por falta de opções.
O jovem casal vai a uma sorveteria que funcionava por perto e Naru resolve experimentar um Sundae de morango com creme enquanto Keitarô escolhe uma banana split. Os dois conversam sobre assuntos da faculdade e amenidades, sem a tensão e brigas de costume.
Os transeuntes e os vizinhos de mesa admiravam a facilidade com que os dois conversavam e riam, arrancando suspiros de inveja de alguns rapazes e até mesmo de moças que passavam por perto.
Se eles soubessem que Keitarô nunca tivera chance de namorar ou paquerar alguma garota antes de conhecer as garotas da pensão Hinata e que a Naru sempre vivia desligada para aventuras, eles ficariam decepcionados.
Desde o primeiro encontro que tiveram, Urashima estava um pouco mais experiente e cauteloso, evitando contrariar os gostos muito exigentes de Narusegawa. E esta procurava demonstrar mais paciência e cordialidade com ele.
Na realidade, Narusegawa tinha visto à distância Keitarô tropeçar com a jovem Mieko e o seu gesto de ajudar a se levantar do tombo, mas interpretou isto como um incidente casual e até achou bonito o fato, se limitando a sorrir.
Ela sabia que a jovem desconhecida não era ameaça para ela e seus planos. E Keitarô não havia se portado de maneira "pervertida" como costumava fazer com as meninas da pensão. Quando não tinha o seu interesse pessoal ameaçado, às vezes Narusegawa podia se dar ao luxo de ser tolerante.
Para sorte do Keitarô e de Naru, o encontro transcorreu excepcionalmente bem, sem os infames acidentes pervertidos de costume. Keitarô não fez coisas imbecis como reparar demais no decote do vestido ou olhar na cor da calcinha dela quando se abaixara para pegar um guardanapo caído. Depois de terminar de saborear o sorvete, Naru e Keitarô vão ao Shopping Mizuno, ironicamente o mesmo onde Motoko estivera há menos de uma hora antes.
Se Mieko não tivesse encontrado Motoko, provavelmente o jovem casal teria se encontrado com a garota samurai num embaraçoso incidente.
Motoko pretendia ficar mais tempo passeando no shopping, mas o encontro inesperado com esta "admiradora" a deixou bastante aborrecida e desmotivada para o resto do dia. Embora ela não tivesse saído com o objetivo de flertar - o que era contra seus rígidos princípios - e sim de distrair-se um pouco, a samurai estava de alguma forma decepcionada com o desfecho de sua pequena viagem. Nesta altura, tinha pegado o bonde que a levaria de volta para o bairro de Hinata.
Naru e Keitarô gastam algum tempo observando as vitrines das lojas, mas era evidente de que a exigente jovem não se interessaria por muito tempo. Ele precisava de uma alternativa para onde levá-la e teria que ser agora.
- Você quer ir jogar boliche comigo? - Arrisca Keitarô olhando para o lindo rosto de Naru.
- Ah, deixa para outra vez. Estava pensando em ir até a Lan House jogar um pouquinho aquele jogo de RPG. - Surpreendentemente Narusegawa resolveu experimentar algo diferente, influenciada pela "propaganda" que Kaolla fizera ontem à noite.
- Fala sério, Narusegawa?
- Seu bobo! É claro que falo! Precisamos fazer alguma coisa de diferente, nem que seja só para conhecer. - Diz ela entusiasmada.
Impressionado pela reação da Naru, Keitarô a leva até a Lan-house recém-inaugurada.
O recinto estava cheio, com dezenas de terminais de micros em rede ligados, fornecendo diversão para jogadores fanáticos. A maioria dos freqüentadores era entre 12 a 17 anos, embora tivessem alguns universitários da mesma faixa etária de Naru e Keitarô. Embora grande parte do público alvo fosse de rapazes, haviam algumas garotas com penteados e roupas ousadas experimentando os terminais, proporcionando um clima um tanto futurista.
- Sejam bem vindos. Vocês desejam experimentar o novo jogo Fantasy? Recepciona o atendente da Lan-House - um rapaz com jeito de nerd, com óculos de fundo de garrafa e cabelo espetado como se tivesse levado um choque de 1000 volts.
- É aquele RPG com realidade virtual? É claro que queremos! Diz Naru, entusiasmada, tentando mostrar algum conhecimento.
O atendente leva os dois a um par de terminais lado a lado e ensina como instalar e manejar os capacetes de realidade virtual. Em seguida, ele sai um pouco para buscar os CD-Roms de inicialização, enquanto Naru e Keitarô se acomodam nas poltronas confortáveis.
- Nossa! Isto é que eu chamo de diversão High-Tech... Encanta-se uma entusiasmada Naru ao examinar o capacete, semelhante ao de um astronauta.
- Não sabia que você se interessava por RPG...
- Realmente não, mas a conversa de ontem com a Su me deixou interessada e sempre há uma primeira vez para tudo... Eu te contei que no colégio aonde estudava tinha uma turma que me convidava para jogar AD&D, só que nunca tive tempo para isto... - Responde Naru.
Keitarô colocou o capacete esquisito com lentes e após alguns segundos sentiu-se imerso num mundo virtual. Parecia que sua alma havia se separado do corpo e ele estava dentro da tela do monitor. Naru fez o mesmo.
- Oiê, Keitarô, você está dentro do jogo?
- Ah... Narusegawa! É você? Keitarô se surpreendeu ao enxergar Naru dentro do capacete, mas num ambiente totalmente diferente do terminal da Lan-House.
Era como se estivesse em outra dimensão. Além de Naru, ele não enxergava mais os outros freqüentadores e nem mesmo o atendente.
- Sou eu, seu bobo! Olha, vamos jogar um pouco, só para experimentar. Vamos formar uma dupla. Eu vou ser uma linda guerreira e você, o meu guarda-costas! Diz ela, animada.
- Tudo bem. Só quero que me dê cobertura quando enfrentarmos os monstros.
- Certo. E mais uma coisa... Vamos nos comportar no jogo apenas como parceiros e aliados. Nem pense em tentar me beijar só porque sou sua líder!
- C-certo, Naru...
O atendente da Lan-House volta e instala o jogo, configurando uma partida individual para a dupla Naru e Keitarô. Ele dá as últimas instruções e em seguida a partida começa.
Como que acordando de um longo sono sob o efeito de hipnose, Narusegawa e Urashima começam em salas separadas no que parece ser um quartinho com provador de roupas. Ambos estão na fase de seleção de personagem, aonde tem que escolher suas habilidades e características.
Tendo configurado sua personagem para ter a mesma aparência física que a sua, graças a um sofisticado sistema de captação de imagens, Naru escolhe a classe Fighter e a habilidade em usar artes marciais, com especialização em combate desarmado. Ela própria havia tomado lições de kung-fu com seu mentor Seta há anos atrás e era razoavelmente boa nisto.
Ela estava tentando escolher uma roupa dentre as centenas de combinações que o programa oferecia quando Keitarô grita, de uma sala vizinha:
- Naru, socorro! Onde fica a saída? Keitarô estava desorientado com os comandos e estava andando como uma barata tonta.
Como conseqüência do mexe-mexe frenético de botões, seu personagem ficou mal configurado - ganhando vários pontos de vida e maximizando a resistência - mas no geral sendo fraco, pouco ágil e com a inteligência, o carisma e a percepção apenas medianos. Para piorar, ele não tinha nenhuma habilidade de combate ou perícia com armas.
- E vem perguntar isto para mim? Tente acionar qualquer comando, Keitarô!
- V-vou tentar...
O personagem de Keitarô abre a porta e entra no quartinho onde está a guerreira Naru - ainda nua - como conseqüência de um comando equivocado. Esta reage dando uma porrada no Keitarô virtual, jogando-o para fora da sala.
- AHHHH! O que eu fiz de errado?
O Keitarô virtual tenta-se levantar com um galo na cabeça. Só que o sistema de R.V. fazia com que seu "eu" sentisse o impacto da porrada, como se tivesse desferido pela Naru na vida real.
- Sua anta! Eu não terminei de colocar o vestido! Agora, vire-se para lá e nem ouse olhar, senão vai ter!
Terminada a advertência, Naru começa a examinar as opções do guarda-roupa novamente, em seu estilo indeciso: "Hmmm... este vestido parece ser bom, mas é muito ousado para meu gosto. Ficar de barriga para fora me incomoda... e se eu... espere! Eu não terminei!".
O tempo-limite para a configuração dos personagens termina e Naru fica revoltada ao ver seu ego virtual andar de barriga para fora, usando um traje de batalha que mais parece um biquíni feito de cota de malha.
O ego virtual de Keitarô continua com o mesmo rosto e características dele, apenas com roupas da época e a mesma cara de tonto.
- Naru, onde arranjou esta?... - Os olhos do rapaz se arregalam ao ver as curvas estonteantes de sua parceira.
- Nem comente sobre as propriedades de minha "armadura de batalha" ou eu lasco porrada em você! E pare com este sorriso bobo!
Ambos os personagens saem numa espécie de taverna, que funciona como centro de informações, para encontrar serviços e mini-missões para ganhar experiência, ouvir novidades e recrutar membros para a equipe. A taverna era um barracão de madeira, com um balcão numa das extremidades e várias mesas e cadeiras dispostas no centro e nos cantos. Havia dezenas de pessoas comendo, bebendo, negociando e contando vantagem.
- Nossa, parece uma taverna medieval! - Diz a guerreira Naru.
- Vamos andar um pouco, quem sabe... ops...
Keitarô esbarra num guerreiro mal encarado de dois metros de altura e carregando um machado afiado de duas lâminas chamado Slash. Slash era um guerreiro muito experiente e que havia incrementado seu poder de luta enfrentando vários monstros. E não tinha cara de muitos amigos.
- Ei, tampinha! Está querendo encrenca com Slash, o poderoso? Você terá que lamber minhas botas ou vai se ver comigo...
- Eheh... Desculpa, seu Slash, foi sem querer... Ops... - Keitarô tenta se levantar, mas tropeça novamente e bate de cara na barriga proeminente de Slash.
- Slash não aceita desculpas! Slash acabar com sua raça! - Diz o gigantesco guerreiro levantando Keitarô pelo pescoço apenas com uma das mãos.
- Ehkkkk... Socorro! - Keitarô grita quando o bárbaro Slash estava pronto para lascar uma porrada bem dolorida com o seu punho livre.
- Tire suas mãos imundas de meu amigo, seu troglodita! - Grita uma voz feminina.
Naru intervém e a bela lutadora dá um soco que faz Slash voar longe, esparramando copos, garrafas e moedas sob o balcão da taverna.
Os demais novatos participantes assistem a cena, arrancando elogios e gritos de incentivo.
O jogador de Slash era um tipo individualista e nojento que gostava de bater nos mais fracos, roubando items e ganhando pontos de experiência com isto e ninguém sentiu pena dele quando foi nocauteado pela Naru.
Só por causa deste soco bem dado, a personagem de Naru ganha vários pontos de experiência e mais atributos em seu poder de ataque, como bônus. Isto era facilmente notado, pois o "power-up" era representado pela aparição de uma aura luminosa semelhante aos dos personagens de videogame quando subiam de nível.
- Você está bem, Keitarô? - Naru ajuda Keitarô a se levantar delicadamente do chão. Embora fosse altamente agressiva e brutal com ele, Naru sabia ser protetora com as pessoas de quem gostava.
- Eh... Mais ou menos, puf... puf... Que tal a gente beber alguma coisa para comemorar sua vitória?
- Ei, tio, eu quero dois sucos de laranja! - Grita a Naru para um sujeito que supostamente seria o taverneiro.
Todos os lutadores presentes na taverna caem na risada diante do amadorismo da dupla.
- Ué? E o que tem de errado? - Esbraveja Naru diante da zombaria geral.
- Senhorita, nós somente servimos bebidas alcoólicas no balcão. - Responde o taverneiro, um tipo bigodudo, gordo, mal vestido e com cara de poucos amigos.
- Puxa, mas não dá para fazer uma exceção?
- Não. E ponto final! - Responde o obeso homem grosseiramente.
- E o que tem de bebida, que não seja muito forte? - Pergunta Keitarô ao taverneiro tentando impedir que Naru ficasse novamente irritada.
- Temos cerveja e vinho.
- Bem, aceita um chope, Narusegawa? - Pergunta Keitarô.
- Só se for um pouquinho. Quais são as marcas?
- Nós temos o "Dwarf Red Noise", o "Balrog's Tears" e o "Elven Pilsen".
- Acho que vou querer o "Elven Pilsen". - Responde a Naru.
- Beem... Acho que vou tomar o "Balrog's Tears", garçom. - Escolhe Keitarô, indeciso quanto ao verdadeiro significado dos nomes. Como ele achou que estas "marcas" eram apenas simbólicas, e que a bebida virtual do jogo era somente de mentirinha, decidiu arriscar.
O taverneiro traz dois copos enormes de chope e entrega aos dois novatos. Naru toma o seu copo e acha o Elven Pilsen simplesmente maravilhoso. Era como se tomasse uma cerveja de verdade, só que ela era bem suave, deliciosa, nada amarga e com pouquíssimo teor alcóolico surpreendendo a jovem.
Keitarô se prepara para tomar a sua cerveja, de cor fortemente acentuada, mas no primeiro gole, sente um ardor indescritível na garganta e cospe tudo fora:
- Arghhhhh! Tá ardido! Tá ardido! - Garçom, o que tem nesta cerveja? Reclama Keitarô sentindo os seus olhos saindo das órbitas.
- Você escolheu uma cerveja preferida pelos orcs e pelos bárbaros. É uma bebida feita de ervas aromáticas e reforçada com sangue de javali e pimenta moída. É preciso estômago forte para tomar isto.
- Sangue? Pimenta moída? - Grita incrédulo Keitarô.
- Sim. Não leram o menu da casa?
Naru termina de beber a sua cerveja, elogiando a qualidade da mesma. Keitarô não ousa arriscar pedir mais nada na taverna.
- Bem. Naru, nós vamos embora. Vamos dar uma olhada para ver o que tem lá fora antes de sairmos do jogo.
- Por mim, estou começando a achar interessante a vida de aventureira.
- Esperem! As bebidas não são por conta da casa. Vocês me devem 3 GPs, um pela Elven Pilsen e dois pela Baalor Ale. - Grita o taverneiro, irritado.
- GPs, o que é isto? - Pergunta Keitarô.
- Gold Pieces, moedas de ouro, rapaz. Vocês certamente devem ter... - Olha com ar inquisitor o taverneiro, imaginando coisas.
- Epa! - Keitarô remexe os bolsos e constata que está totalmente duro, sem dinheiro.
Naru também procura ver se tem algum troco na sua escassa roupa, mas não encontra nada.
- Ehhh... Garçom, o senhor aceita pôr na conta? A gente está sem grana e não sabemos aonde arranja estes tais GPs... - Propõe Keitarô com um sorriso amarelo.
- O quê? Seus caloteiros! Guardas! Peguem estes dois malandros!
Em seguida surge meia dúzia de brutamontes bem armados com clavas e porretes - os seguranças da taverna - e põem Keitarô e Naru para correr. Os dois azarados aventureiros fogem e finalmente depistam seus perseguidores num beco.
- A gente devia saber que o nosso dinheiro não serve neste mundo, Naru!
- A culpa é sua! Você devia saber disto, já que jogou mais videogame do que eu!
- Bem, se não me engano, a gente devia ter feito alguma missão para ganhar dinheiro. É deste jeito que podemos comprar equipamento, comida ou bebida num jogo de RPG. - O jovem de óculos tenta relembrar as partidas que jogara.
- Missão, como assim?
- Encontrar um tesouro, derrotar monstros, coisas do tipo...
- E o que temos que fazer agora, Senhor Aventureiro? - Naru começa a dar sinais de impaciência.
- Bem, o problema é que geralmente a maioria das missões para principiantes a gente obtém por meio de informações na taverna, só que acho que enquanto estivermos duros, o taverneiro não irá nos aceitar de volta.
- Ah, isto está começando a ficar complicado pra minha cabeça.
- Espere, Narusegawa. Não é tão difícil assim. É só a gente dar de encontro com algumas criaturas e derrotar elas. Geralmente os inimigos iniciais do jogo são mais fáceis...
- Ah,é? Isto está ficando... AIEHHHH!!!
Naru grita ao ver que ela e Keitarô estão cercados por ladrões no beco. Os fora da lei estão armados com adagas e parecem assustadoramente reais, fazendo movimentos rápidos e malabarismos com as lâminas, no estilo das gangues de gueto, ao mesmo tempo em que bloqueiam a única saída.
O mais adiantado deles tenta acertar Naru, mas ela instintivamente se esquiva, dando um chute nele. O meliante é jogado numa parede e fica sem sentidos, mas os outros bandidos ficam ainda mais furiosos. Avançando como lobos, eles apenas aguardam o melhor momento para romper a guarda da jovem lutadora e crivá-la de facas.
- Keitarô! Faça alguma coisa, sou linda demais para morrer! Naru se joga abraçando no seu parceiro, de forma inesperada.
- Fazer o quê? Se nem tenho um estilingue!... - Desespera-se Keitarô fazendo sua habitual cara de choro, com jatos de lágrimas saindo de seus olhos.
- Bem, então me resta fazer isto! - Diz Naru contrariada ao notar que o abraço do Keitarô estava pressionando demais os seus seios.
- IHHHHKHHHH!
Usando sua força, Naru joga o corpo de Keitarô contra a quadrilha e ele nocauteia os bandidos como se fossem pinos de boliche.
- Ahahah! Até que foi mais fácil do que parecia. Foi muito legal! Foi Dez! - Entusiasma-se Naru ao ver os bandidos que estavam ainda conscientes fugirem deles como ratos.
- Só não agrida os seus parceiros ao lado... Ui! Está muito real... - Levanta-se Keitarô, com a cabeça toda dolorida.
- Qual é, Keitarô, você é mesmo imortal! E ainda mais neste jogo!
Acostumado a toda sorte de porrada e com o incremento dos seus pontos de vida, o personagem de Keitarô agüentava uma quantidade surpreendente de castigo físico que teria feito um homem comum cair inconsciente.
- Vamos aproveitar e fugir daqui enquanto podemos. Este lugar não é seguro!
- Espere, Naru. Olhe, são Moedas de ouro! Devem ser os GPs... - Repara o jovem de óculos ao perceber alguns objetos reluzentes sob o chão imundo.
- Mas... Pegar elas não é um crime? Hesita a jovem ruiva.
- Pense bem... Eles já roubaram de alguém. Não pertencem a eles. Deve ser a nossa deixa.
- Tudo bem. Pegue as moedas e vamos cair fora.
Keitarô revista os corpos dos bandidos e encontra um total de quinze moedas de ouro. É muito pouco para os padrões de um aventureiro iniciante, mas suficiente para pagar a conta no bar. Ele pensa em pegar uma adaga dos bandidos, mas lembra que por enquanto não tem habilidades de combate. Após "depenar" os bandidos inconscientes eles voltam para o bar. Inicialmente, os seguranças não queriam deixá-los entrar, mas a sinceridade dos jovens e o pagamento da dívida resolveram tudo. Satisfeito, o taverneiro liberou o acesso à dupla.
- Bem, parece mesmo com o mundo real... Se você não pagar a conta, nada de bebida! Eheh... Brinca Naru, aliviada com o fim da situação constrangedora.
- É mesmo... Vamos dar uma volta na cidade antes de sairmos daqui. Responde Keitarô.
- Esperem, por favor! Grita uma figura misteriosa. Era um jovem elegante e bem-vestido, com uma estranha jóia flutuante na cabeça. Pelo seu jeito de vestir, deveria ser um mago.
- Hã, o que deseja de nós? - Pergunta Naru, surpresa ao ver o estranho visual de seu interlocutor.
- Eu vi a vitória de vocês contra o bárbaro do Slash e fiquei muito interessado por seus talentos... Meu nome é Finneas, o mago e quero fazer uma proposta lucrativa para ambos.
- Desculpe-me, mas estamos de saída... - Responde Keitarô.
- Não, não! É rapidinho. É um trabalho rápido, sem maiores problemas e que pode render muitos GPs a jovens aventureiros como vocês.
- De que trabalho se trata, Finneas? - Pergunta Naru.
- Estou com um pergaminho mágico que me foi encomendado por um mago chamado Tarsius, que mora num sobrado no fim desta rua. Só que preciso que alguém o entregue para ele, em troca de um anel mágico. Se me fizerem este serviço e entregarem o anel, vocês serão recompensados com 500 GPs!
- 500 GPs, Uau! - Entusiasma-se Keitarô, imaginando tratar-se de uma fortuna.
- Vamos aceitar, Keitarô! Este trabalho não deve ser muito difícil e como a gente iria dar um passeio nesta vila, vamos aproveitar para fazer esta boa ação para este moço. - Fala Naru, impressionada pela beleza física do jovem mago e por sua lábia.
- Tudo bem, Naru... Escute-me, Finneas, se o trabalho é fácil, por que o senhor não entrega o pergaminho você mesmo?
- Bem... Podemos dizer que Tarsius e eu somos conhecidos, mas não amigos íntimos. E infelizmente a mulher dele não vai com a minha cara devido a um mal entendido do passado. Fui proibido de por os pés na casa dele.
- Bem, nós somos novos por aqui mesmo e a gente não tem nada contra ele. Acho que não vai ter problema. - Responde Naru.
Naru e Keitarô pegam o pergaminho para Tarsius, acompanhado de um bilhete escrito contendo instruções por Finneas e vão caminhando pela rua estreita da vila medieval. O bilhete continha um aviso direcionado para personagens magos de não tentar ler o pergaminho antes de entregá-lo a Tarsius, bem como um esboço da rua aonde morava.
- Que barbada, Naru! Mal entramos no pedaço e pegamos a primeira missão. Acho que com 500 GPs a gente dá para fazer a festa aqui...
- Vamos rápido, porque estamos com pressa. Eu só topei fazer esta missão porque quero comprar uma roupa mais decente! Esta que estou usando é muito bárbara para o meu gosto.
- Mas até que você fica bonitinha com esta armadura...
SOC!
- Repita o que você disse, seu tarado! Eu te contratei para ser o meu guarda-costas e não para ficar me cantando!
- Perdão, Narusegawa! Perdão!
A linda guerreira e seu atrapalhado segurança saem da taverna entre olhares curiosos, a fim de cumprir sua primeira e provavelmente única missão. Naru começava a ficar arrependida de ter começado a jogar este game realista demais para ela.
Ela ficava imaginando como que as autoridades deixaram liberar um jogo tão nocivo para adolescentes puras como ela, que permitiam que mocinhas ficassem com a barriga à mostra? Aquilo era uma imoralidade!
Keitarô não havia aproveitado muito o jogo, mas estava atordoado pelo fato das pancadas no mundo virtual serem tão fortes como as reais. E isto porque ela estava ainda no level 1... Ele deveria ter escolhido o modo otimizado de criação de personagem para fazer um mais competitivo, só que sua inexperiência criou um Keitarô virtual à imagem e semelhança do original. Ele queria terminar aquela missão para sair do jogo o mais rápido possível.
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O domingo amanheceu com tempo bom e claro. Keitarô, como sempre, levantou-se para fazer a faxina geral nos corredores da imensa hospedaria e limpar a área de banho.
As garotas acordaram cedo e puseram os seus afazeres cotidianos em dia. Exceto três delas.
Sarah, Kaolla e Shinobu.
Passado o susto inicial, a saga protagonizada pelas três pequenas aventureiras embalou de vez e elas somente foram dormir de madrugada em frente ao aparelho de videogame.
A avatar (representação virtual) de Kaolla estava indo para o level 2, aprendera várias magias de ataque derrotando vários monstros e já tinha obtido seu primeiro item mágico.
A que representava Sarah não ficava muito atrás, tendo desenvolvido alguns ataques e chutes poderosos. Sua agilidade nas técnicas do estilo de kung-fu da escola Jet Kune Do, aliada à pequena estatura, fazia uma combatente difícil de derrotar.
Apesar de ser mais inexperiente do que as outras, a clériga interpretada pela Shinobu desenvolvera-se durante o treinamento e já sabia fazer algumas magias básicas: cura e proteção. Para sua autodefesa, ela arranjara um cajado.
Elas passaram pela missão tutorial para principiantes e se preparavam para entrar na aventura propriamente dita...
Motoko percebeu a ausência das três e discretamente abriu a porta do quarto da Kaolla.
Ao ver as meninas dormindo, fez um gesto de desaprovação com a cabeça e fechou a porta comentando com si mesma:
- Humpf... Ainda bem que é domingo...
Logo depois do almoço, Keitarô e Naru acertaram o programa.
Com o pretexto de fazer algumas compras, Urashima saiu na frente rumo ao ponto pré-combinado. Isto foi feito de comum acordo com Narusegawa para não atrair comentários na Pensão.
Naru somente concordou em ir com ele desde que ninguém mais ficasse sabendo, para não dar o vexame da primeira vez, quando ambos deram de cara com a Motoko e a Su numa sorveteria.
Narusegawa ficou dentro de seu quarto fazendo a maquilagem e monologando consigo mesma:
- E o Keitarô fez tanto drama para me convidar... Como ele é bobo! Se tivesse pedido diretamente, eu teria aceitado, aliás, hoje não tinha o que fazer mesmo... Já estudei para a prova da semana que vem e os trabalhos estão em dia... - Sorria a jovem diante do espelho.
- Aonde vai, Naru? Entra Kitsune no quarto sem avisar.
- Ki-Kitsune? O que faz no meu quarto?
- Ahá, aprontando para sair? Algum encontro com o senhor gerente, por acaso?
- É que... Não, Não! Não é o que está pensando, Kitsune!
- Ué, e o que tem demais? Uma escapadinha para aliviar o stress não faz mal a ninguém. Aproveitem!
O Keitarô vai ficar muito contente com você por perto... Coitado... Ele está tão carente... - Comenta a jovem de cabelos curtos se aproximando de Naru e afagando os longos cabelos de sua melhor amiga.
- Não tem nada a ver! A gente está saindo apenas como amigos...
- Bem, que seja, mas vou te dar um conselho de amiga, Naru. Mesmo que não role nada, trate-o muito bem. Depois de passar na Toudai, vocês não tem se conversado como antes... Sei que a vida na faculdade não é fácil, mas aproveite este momento...
- O quê você quer dizer com isto, Kitsune? Nós não somos namorados! E não vá pensar que esqueci aquele dia em que peguei você fazendo gracinhas com meu uniforme para aquele bobo...
- Eheheh... Então ainda não conversou com ele sobre "aquilo"? Divirtam-se, meus jovens... Ah, e não esqueçam da camisinha! - Sorri maliciosamente a jovem de cabelos curtos, piscando um de seus olhos para sua amiga.
E tão rapidamente como entrou, Mitsune Konno sai, deixando Naru com suas dúvidas e indagações.
Naru fica com ar preocupado, olhando-se para o espelho:
- Que mania que a Kitsune tem de se intrometer na minha vida... Logo ela pensar que eu e o paspalho do Keitarô estamos namorando ou perto disto... - Naru começa a monologar, estando indecisa quanto ao modelo de roupa a escolher. Enquanto prova vários vestidos, ela continua falando consigo mesma - Bem, está certo que o Keitarô quando está sério e não está pensando "naquilo" é uma gracinha... e ele tem se esforçado... Mas eu não gosto quando ele faz aquelas piadas sem graça ou fica com cara de safado quando a Mutsumi-san desmaia no colo dele ou quando a Shinobu-chan o procura...
Só então Naru repara que está quase uma hora atrasada em relação ao horário combinado.
- Nããão! Tenho que terminar de me aprontar, senão aquele idiota vai ficar plantado na calçada até o sol se pôr...
Assustada com a hora, Naru se põe a remexer o seu guarda-roupa, na tentativa de escolher a melhor combinação, mas perde ainda mais tempo...
Mas Naru não seria a única a sair naquele domingo ensolarado.
Enquanto isto, em seu quarto, Motoko Aoyama se prepara para sair, também com planos de ir ao centro da cidade.
Embora isto fosse muito raro, ela precisava relaxar um pouco, tanto física como mentalmente. O ritmo dos estudos no último ano do colégio estava intenso e ela necessitava de uma pausa.
Ao abrir o seu guarda-roupa - que ganhara mais variedade em relação a dois anos atrás - Motoko ficou indecisa. Normalmente ela somente saía para ir do trajeto da pensão Hinata para a escola e vice-versa. E o uniforme escolar a poupava de fazer escolhas.
Ela quase não fazia compras, já que Shinobu, Naru, o pervertido do Urashima e eventualmente Haruka se incumbiam de tal tarefa.
Ela queria usar algo bem à vontade, mas que não fosse chamativo, sensual ou ousado demais.
Não, não estava a fim de atrair paqueras inconvenientes justo hoje.
Só queria passear e descansar o corpo e a mente.
Ela optou por uma blusa simples, mas confortável, calça jeans de cintura alta e tênis. Embora um pouco relutante, ela tirou suas faixas do peito e colocou um sutiã, já que iria sair de blusa.
Um pouco envergonhada de si mesma, pintou as unhas com um esmalte discreto e passou rapidamente um batom de cor neutra, finalizando com um perfume muito suave.
Ela nunca foi vaidosa e nem sabia ficar muito tempo ao espelho, como a Naru e como a Kitsune. Para falar a verdade, a guerreira de Kyoto somente começou a se preocupar um pouco mais com a aparência pessoal em parte por estar terminando o terceiro ano do colegial e em parte por causa da influência do Urashima - embora publicamente ela jamais iria admitir isto.
Mas o progresso de Motoko já era notável. Ironicamente, o próprio fato de ter perdido o duelo para sua irmã mais velha recentemente deixou-a menos apegada ao passado e menos rígida do que outrora. Já não carregava sua espada Shisui para lá e para cá pelo fato desta ter sido quebrada. A atual, ela usava apenas para os treinos.
Contudo, Motoko ainda sentia um vazio interior que não estava preenchido completamente. Ela precisava conquistar sua felicidade, mas não sabia como. Ela ainda buscava a plenitude de sentir a "corrente da vida" que tanto os anciões de sua vila quanto sua irmã mais velha falavam.
Motoko somente avisou Haruka que estava saindo e foi em direção ao centro, pegando o bondinho. Contudo, ela indagava aonde Keitarô tinha ido, pois não o vira na pensão.
No centro de Tóquio, Motoko passa por algumas lojas de roupas e acessórios femininos e casualmente vê as vitrines, mas desiste de ficar vendo as novidades. Consumismo não era com ela. Indecisa quanto ao local a ir, a guerreira lembra do nome do shopping novo que Kaolla mencionou e decide passar só para dar uma olhadinha.
No shopping Mizuno, solitariamente ela toma um sorvete na praça de alimentação, ignorando os olhares cobiçosos dos rapazes que passavam por lá. Tal assédio a deixava constrangida. Embora a jovem Aoyama não gostasse de freqüentar lanchonetes e similares, o fato era que não havia nenhum restaurante de comida japonesa no recinto. O shopping era marcantemente de influência ocidental. Ela dá uma rápida passada nas vitrines das lojas e até fica contente ao ver crianças brincando na área de lazer do shopping, recordando de sua infância.
Então ela decide ir ao banheiro feminino.
Motoko adentra o WC feminino do shopping, para lavar as mãos e retocar o batom. Ao terminar, ela fecha os olhos, estando diante do espelho do WC e começa a pensar consigo mesma, alheia ao mundo ao redor:
- "Heh... Há dois anos eu não iria sequer por os pés num shopping como este... Vivia somente para os estudos e para aprimorar minha técnica de espada... Até que cruzei o caminho com o Urashima..."
Num relance Motoko relembra com a mente tudo o que aconteceu desde sua vinda à pensão Hinata e deixa escapar um suspiro ao relembrar daquelas batidas fortes do seu coração quando vira aquele que viria a mudar para sempre sua vida:
- "Por que ELE foi entrar em minha vida? Tantas mudanças... Será que para melhor? Se a mudança é positiva, por pressupor a substituição do novo pelo velho e a renovação da Vida como dizem, por que a gente resiste tanto a elas?"
Motoko tenta aprofundar seus pensamentos, literalmente se isolando dos cheiros, cores, sons e impressões do mundo exterior, que se torna abstrato para ela. Buscando as imagens do passado, ela se fixa na figura de como era há vários anos atrás e vai progredindo até chegar naquele visual que adotou quando o pessoal da pensão pressionou-a tornar-se mais feminina.
Motoko nota que aquele penteado antes que achava esquisito, com tranças laterais, até que ficava bem nela. E que não se sentia mais envergonhada em usar roupas modernas, ao estilo ocidental.
A samurai iria continuar a sua busca interior de forma mais intensa se não tivesse sido brutalmente interrompida naquele momento.
Motoko se arrepia ao sentir que não está só. Sente o roçar de um braço em suas costas e um toque delicado de mãos afagando suas tranças.
Com o sangue ruborizando sua face, ela instintivamente se vira - imobilizando seu alvo com um golpe típico de judô, torcendo-o na altura do pulso da mão direita. Motoko dominava a arte de luta desarmada bem como vários estilos de armas adotados pelos seus antepassados. Mesmo sem sua Shisui, ela continuava perigosa. E para a sua surpresa, ela vê que seu alvo era uma garota. E, pior, uma aluna do mesmo colégio que o dela.
- Por favor, solte-me!... Está... doendo muito!... - Implora uma garota, com cara de choro, sentindo muita dor com a torsão do braço que Motoko lhe aplicava.
- Por que você fez isto? O que quer de mim? - Motoko afrouxa um pouco a força da imobilização, aliviando a dor de sua oponente e nota que ela não faz a menor força para tentar livrar o braço.
- Eu... Sempre te vejo nos treinos de kendô no colégio... Não me reconhece, Motoko-chan? Sou a Mieko do 2o ano! - Responde a jovem que tinha cabelos curtos, usava óculos ovais de aro fino e com o físico mais delicado do que a Motoko.
- Como ousa me tocar deste jeito? Por quê fez isto?
- Eu sempre te admirei desde o dia em que te conheci... - Ela começa a chorar baixinho e entre soluços, declara - Eu te acho muito forte, admirável, muito bonita... Eu queria ser como você! Quero-te! Eu, Eu...
- ???
- Amo você...
Motoko fica por instantes sem saber o que dizer para a jovem que chorava à sua frente.
Por sorte, não tinha ninguém mais no banheiro por perto.
Ela conhecia Mieko apenas de vista, já que eram muitas as tietes e torcedoras da lutadora de kendô na escola. E ela não fazia parte do famigerado trio de meninas que a perseguia onde estivesse indo.
Motoko sempre fora popular e tinha seu fã-clube particular - embora pessoalmente se sentisse irritada com o assédio daquelas meninas fanáticas nos treinos e nos campeonatos que participava. Mas nunca imaginara que alguma delas fosse levar a tietagem mais adiante.
Como ela nunca se interessou seriamente em ter sentimentos amorosos com pessoas de mesmo sexo - pelo menos era o que imaginava - sentiu ser preciso arrancar as ilusões da jovem Mieko pela raiz antes que trouxesse infelicidade para as duas.
- Cada pessoa tem o seu caminho. Alguns caminhos se cruzam na vida, outros se afastam... Não te desejo mal, mas não tenho como atender o seu pedido!
- Mas, eu te amo, Motoko-chan! Por favor, pode me bater, me xingar, até chamar a polícia, mas... mas... Deixe-me beijar você, apenas uma única vez! Eu te imploro...
- O que aconteceu aqui, termina aqui! Vá e nunca mais faça o que fez hoje! Não me procure nunca mais, senão serei obrigada a denunciar seu comportamento aos seus familiares. - Disse Motoko num tom mais calmo, porém firme o suficiente para deixar claro que não queria nada com aquela pobre garota.
Mieko olha para Motoko uma última vez - reprime um soluço - abaixa a cabeça, totalmente ruborizada e sai correndo do WC em lágrimas, sem ao menos fechar a porta. Motoko fica alguns instantes no local, evidentemente aborrecida pelo bizarro incidente. E então ela decide ir embora, indo pelo lado oposto de onde viu a jovem Mieko sair. Com tempo e alguma sorte, este incidente seria página passada, pensava a jovem guerreira samurai.
Ela não sentia ódio daquela fã amalucada, mas jamais havia pensado em se interessar por mulheres, ao mesmo tempo em que evitava qualquer contato mais íntimo com homens - exceto pelo tarado do Urashima, cuja convivência, no seu entender, era forçada pelas circunstâncias.
Enquanto isto, nas galerias do Shopping Mizuno, Mieko corria e chorava, ao mesmo tempo em que sentia uma raiva enorme. Não pela Motoko e por sua atitude severa, mas por si mesma e pelo seu sentimento crescente de inferioridade... Parte dela queria morrer e o pensamento de suicídio passou lhe na cabeça. Mas se morresse, como ficariam seus sonhos? Totalmente transtornada e desorientada, ela saiu do shopping sem olhar para trás.
Naquele momento, Keitarô Urashima estava parado numa praça aonde tinha combinado encontrar-se com Naru. Ele estava entre alegre e ansioso, monologando consigo mesmo:
- Ah, finalmente este ano vou sair junto com a Narusegawa... Que felicidade! Não consigo conter-me de felicidade! Uma tarde de domingo inteira! Dizia o alegre estudante sem ligar para os olhares indiscretos dos transeuntes que o tomavam como ingênuo e bobo.
Seu devaneio termina quando sente um impacto seguido de uma dor incrível. Sem querer, alguém esbarrou fortemente nele e o atirou para a calçada. Keitarô estava totalmente distraído e acabara se chocando com uma assustada Mieko que estava correndo e sem olhar para onde ia.
- Ugh... É você, Narusegawa? Disse ele ainda zonzo, tentando achar os óculos caídos no chão e temendo que o tombo fosse o prenúncio de uma nova maré de azar, lembrando-se do acidente que sofrera há meses atrás na cerimônia de admissão na Universidade de Tóquio.
Ele fica assustado ao ver que no lugar de Naru estava uma linda moça de óculos de aros finos, cabelos negros lisos e compleição franzina caída. Era Mieko. Apesar do tombo, aparentemente ela não estava ferida.
- Oh, não! Por favor, me desculpe... Foi tudo culpa minha. - Diz Keitarô com seu jeito atrapalhado.
- Perdoe-me minha atitude irresponsável! Eu não olhei onde estava indo... - Humildemente se desculpa a garota abaixando a cabeça, sem ter coragem de olhar para o desconhecido jovem.
Keitarô ajuda a garota delicada a se levantar e repara que ela era muito bonita, apesar da fisionomia triste.
- Desculpe-me, mas aconteceu alguma coisa com você? - Keitarô nota os olhos úmidos e as lentes dos óculos molhadas pelas lágrimas.
Envergonhada, a Mieko pede perdão mais uma vez com um aceno de cabeça e foge da vista de Keitarô, não por culpa dele, mas por medo de si mesma. Depois que descobrira - ainda no início da adolescência - suas verdadeiras tendências afetivas, Mieko julgava-se incapaz de se relacionar com um homem e tinha muito receio de se envolver com qualquer um deles.
- Ué, o que deu nela? - Pergunta o jovem estudante sem entender nada.
Keitarô não tem tempo para perguntar mais nada. Em instantes ele percebe um zumzumzum ao redor. Era a Naru que chegava vindo se encontrar com ele. A sua beleza estonteante para os padrões orientais dificilmente deixava de ser notada aonde ia.
- Oi, Keitarô, desculpe-me, mas o bondinho demorou um pouco. - Justifica-se Naru tentando ocultar o verdadeiro motivo do atraso. Além de ter demorado arrumando-se, ela ainda se atrasou ao conversar com Haruka na casa de chá, perdendo o bonde que Motoko havia usado, tendo que esperar o próximo.
- Oi, Narusegawa... - Keitarô fica sem palavras ao notar que Naru estava mais bonita do que nunca. Ela usava uma blusa de manga comprida com um decote para lá de razoável, saia curta e botinas. E ela exalava aroma de um perfume com cheiro suave, mas nítido, como aroma de madeiras exóticas.
- Bem, aonde vamos?
- Estava pensando em ir a uma sorveteria por perto. Depois a gente podia passar no cinema... - Diz laconicamente o jovem.
- Sorveteria tudo bem, mas quero fazer alguma coisa de diferente! Já assisti a quase todos filmes que me interessavam com a Mutsumi durante a semana passada, e os poucos que sobraram são chatos...
- Tudo bem, tudo bem... - Keitarô pensava em outra alternativa de diversão, temendo que o encontro fracassasse por falta de opções.
O jovem casal vai a uma sorveteria que funcionava por perto e Naru resolve experimentar um Sundae de morango com creme enquanto Keitarô escolhe uma banana split. Os dois conversam sobre assuntos da faculdade e amenidades, sem a tensão e brigas de costume.
Os transeuntes e os vizinhos de mesa admiravam a facilidade com que os dois conversavam e riam, arrancando suspiros de inveja de alguns rapazes e até mesmo de moças que passavam por perto.
Se eles soubessem que Keitarô nunca tivera chance de namorar ou paquerar alguma garota antes de conhecer as garotas da pensão Hinata e que a Naru sempre vivia desligada para aventuras, eles ficariam decepcionados.
Desde o primeiro encontro que tiveram, Urashima estava um pouco mais experiente e cauteloso, evitando contrariar os gostos muito exigentes de Narusegawa. E esta procurava demonstrar mais paciência e cordialidade com ele.
Na realidade, Narusegawa tinha visto à distância Keitarô tropeçar com a jovem Mieko e o seu gesto de ajudar a se levantar do tombo, mas interpretou isto como um incidente casual e até achou bonito o fato, se limitando a sorrir.
Ela sabia que a jovem desconhecida não era ameaça para ela e seus planos. E Keitarô não havia se portado de maneira "pervertida" como costumava fazer com as meninas da pensão. Quando não tinha o seu interesse pessoal ameaçado, às vezes Narusegawa podia se dar ao luxo de ser tolerante.
Para sorte do Keitarô e de Naru, o encontro transcorreu excepcionalmente bem, sem os infames acidentes pervertidos de costume. Keitarô não fez coisas imbecis como reparar demais no decote do vestido ou olhar na cor da calcinha dela quando se abaixara para pegar um guardanapo caído. Depois de terminar de saborear o sorvete, Naru e Keitarô vão ao Shopping Mizuno, ironicamente o mesmo onde Motoko estivera há menos de uma hora antes.
Se Mieko não tivesse encontrado Motoko, provavelmente o jovem casal teria se encontrado com a garota samurai num embaraçoso incidente.
Motoko pretendia ficar mais tempo passeando no shopping, mas o encontro inesperado com esta "admiradora" a deixou bastante aborrecida e desmotivada para o resto do dia. Embora ela não tivesse saído com o objetivo de flertar - o que era contra seus rígidos princípios - e sim de distrair-se um pouco, a samurai estava de alguma forma decepcionada com o desfecho de sua pequena viagem. Nesta altura, tinha pegado o bonde que a levaria de volta para o bairro de Hinata.
Naru e Keitarô gastam algum tempo observando as vitrines das lojas, mas era evidente de que a exigente jovem não se interessaria por muito tempo. Ele precisava de uma alternativa para onde levá-la e teria que ser agora.
- Você quer ir jogar boliche comigo? - Arrisca Keitarô olhando para o lindo rosto de Naru.
- Ah, deixa para outra vez. Estava pensando em ir até a Lan House jogar um pouquinho aquele jogo de RPG. - Surpreendentemente Narusegawa resolveu experimentar algo diferente, influenciada pela "propaganda" que Kaolla fizera ontem à noite.
- Fala sério, Narusegawa?
- Seu bobo! É claro que falo! Precisamos fazer alguma coisa de diferente, nem que seja só para conhecer. - Diz ela entusiasmada.
Impressionado pela reação da Naru, Keitarô a leva até a Lan-house recém-inaugurada.
O recinto estava cheio, com dezenas de terminais de micros em rede ligados, fornecendo diversão para jogadores fanáticos. A maioria dos freqüentadores era entre 12 a 17 anos, embora tivessem alguns universitários da mesma faixa etária de Naru e Keitarô. Embora grande parte do público alvo fosse de rapazes, haviam algumas garotas com penteados e roupas ousadas experimentando os terminais, proporcionando um clima um tanto futurista.
- Sejam bem vindos. Vocês desejam experimentar o novo jogo Fantasy? Recepciona o atendente da Lan-House - um rapaz com jeito de nerd, com óculos de fundo de garrafa e cabelo espetado como se tivesse levado um choque de 1000 volts.
- É aquele RPG com realidade virtual? É claro que queremos! Diz Naru, entusiasmada, tentando mostrar algum conhecimento.
O atendente leva os dois a um par de terminais lado a lado e ensina como instalar e manejar os capacetes de realidade virtual. Em seguida, ele sai um pouco para buscar os CD-Roms de inicialização, enquanto Naru e Keitarô se acomodam nas poltronas confortáveis.
- Nossa! Isto é que eu chamo de diversão High-Tech... Encanta-se uma entusiasmada Naru ao examinar o capacete, semelhante ao de um astronauta.
- Não sabia que você se interessava por RPG...
- Realmente não, mas a conversa de ontem com a Su me deixou interessada e sempre há uma primeira vez para tudo... Eu te contei que no colégio aonde estudava tinha uma turma que me convidava para jogar AD&D, só que nunca tive tempo para isto... - Responde Naru.
Keitarô colocou o capacete esquisito com lentes e após alguns segundos sentiu-se imerso num mundo virtual. Parecia que sua alma havia se separado do corpo e ele estava dentro da tela do monitor. Naru fez o mesmo.
- Oiê, Keitarô, você está dentro do jogo?
- Ah... Narusegawa! É você? Keitarô se surpreendeu ao enxergar Naru dentro do capacete, mas num ambiente totalmente diferente do terminal da Lan-House.
Era como se estivesse em outra dimensão. Além de Naru, ele não enxergava mais os outros freqüentadores e nem mesmo o atendente.
- Sou eu, seu bobo! Olha, vamos jogar um pouco, só para experimentar. Vamos formar uma dupla. Eu vou ser uma linda guerreira e você, o meu guarda-costas! Diz ela, animada.
- Tudo bem. Só quero que me dê cobertura quando enfrentarmos os monstros.
- Certo. E mais uma coisa... Vamos nos comportar no jogo apenas como parceiros e aliados. Nem pense em tentar me beijar só porque sou sua líder!
- C-certo, Naru...
O atendente da Lan-House volta e instala o jogo, configurando uma partida individual para a dupla Naru e Keitarô. Ele dá as últimas instruções e em seguida a partida começa.
Como que acordando de um longo sono sob o efeito de hipnose, Narusegawa e Urashima começam em salas separadas no que parece ser um quartinho com provador de roupas. Ambos estão na fase de seleção de personagem, aonde tem que escolher suas habilidades e características.
Tendo configurado sua personagem para ter a mesma aparência física que a sua, graças a um sofisticado sistema de captação de imagens, Naru escolhe a classe Fighter e a habilidade em usar artes marciais, com especialização em combate desarmado. Ela própria havia tomado lições de kung-fu com seu mentor Seta há anos atrás e era razoavelmente boa nisto.
Ela estava tentando escolher uma roupa dentre as centenas de combinações que o programa oferecia quando Keitarô grita, de uma sala vizinha:
- Naru, socorro! Onde fica a saída? Keitarô estava desorientado com os comandos e estava andando como uma barata tonta.
Como conseqüência do mexe-mexe frenético de botões, seu personagem ficou mal configurado - ganhando vários pontos de vida e maximizando a resistência - mas no geral sendo fraco, pouco ágil e com a inteligência, o carisma e a percepção apenas medianos. Para piorar, ele não tinha nenhuma habilidade de combate ou perícia com armas.
- E vem perguntar isto para mim? Tente acionar qualquer comando, Keitarô!
- V-vou tentar...
O personagem de Keitarô abre a porta e entra no quartinho onde está a guerreira Naru - ainda nua - como conseqüência de um comando equivocado. Esta reage dando uma porrada no Keitarô virtual, jogando-o para fora da sala.
- AHHHH! O que eu fiz de errado?
O Keitarô virtual tenta-se levantar com um galo na cabeça. Só que o sistema de R.V. fazia com que seu "eu" sentisse o impacto da porrada, como se tivesse desferido pela Naru na vida real.
- Sua anta! Eu não terminei de colocar o vestido! Agora, vire-se para lá e nem ouse olhar, senão vai ter!
Terminada a advertência, Naru começa a examinar as opções do guarda-roupa novamente, em seu estilo indeciso: "Hmmm... este vestido parece ser bom, mas é muito ousado para meu gosto. Ficar de barriga para fora me incomoda... e se eu... espere! Eu não terminei!".
O tempo-limite para a configuração dos personagens termina e Naru fica revoltada ao ver seu ego virtual andar de barriga para fora, usando um traje de batalha que mais parece um biquíni feito de cota de malha.
O ego virtual de Keitarô continua com o mesmo rosto e características dele, apenas com roupas da época e a mesma cara de tonto.
- Naru, onde arranjou esta?... - Os olhos do rapaz se arregalam ao ver as curvas estonteantes de sua parceira.
- Nem comente sobre as propriedades de minha "armadura de batalha" ou eu lasco porrada em você! E pare com este sorriso bobo!
Ambos os personagens saem numa espécie de taverna, que funciona como centro de informações, para encontrar serviços e mini-missões para ganhar experiência, ouvir novidades e recrutar membros para a equipe. A taverna era um barracão de madeira, com um balcão numa das extremidades e várias mesas e cadeiras dispostas no centro e nos cantos. Havia dezenas de pessoas comendo, bebendo, negociando e contando vantagem.
- Nossa, parece uma taverna medieval! - Diz a guerreira Naru.
- Vamos andar um pouco, quem sabe... ops...
Keitarô esbarra num guerreiro mal encarado de dois metros de altura e carregando um machado afiado de duas lâminas chamado Slash. Slash era um guerreiro muito experiente e que havia incrementado seu poder de luta enfrentando vários monstros. E não tinha cara de muitos amigos.
- Ei, tampinha! Está querendo encrenca com Slash, o poderoso? Você terá que lamber minhas botas ou vai se ver comigo...
- Eheh... Desculpa, seu Slash, foi sem querer... Ops... - Keitarô tenta se levantar, mas tropeça novamente e bate de cara na barriga proeminente de Slash.
- Slash não aceita desculpas! Slash acabar com sua raça! - Diz o gigantesco guerreiro levantando Keitarô pelo pescoço apenas com uma das mãos.
- Ehkkkk... Socorro! - Keitarô grita quando o bárbaro Slash estava pronto para lascar uma porrada bem dolorida com o seu punho livre.
- Tire suas mãos imundas de meu amigo, seu troglodita! - Grita uma voz feminina.
Naru intervém e a bela lutadora dá um soco que faz Slash voar longe, esparramando copos, garrafas e moedas sob o balcão da taverna.
Os demais novatos participantes assistem a cena, arrancando elogios e gritos de incentivo.
O jogador de Slash era um tipo individualista e nojento que gostava de bater nos mais fracos, roubando items e ganhando pontos de experiência com isto e ninguém sentiu pena dele quando foi nocauteado pela Naru.
Só por causa deste soco bem dado, a personagem de Naru ganha vários pontos de experiência e mais atributos em seu poder de ataque, como bônus. Isto era facilmente notado, pois o "power-up" era representado pela aparição de uma aura luminosa semelhante aos dos personagens de videogame quando subiam de nível.
- Você está bem, Keitarô? - Naru ajuda Keitarô a se levantar delicadamente do chão. Embora fosse altamente agressiva e brutal com ele, Naru sabia ser protetora com as pessoas de quem gostava.
- Eh... Mais ou menos, puf... puf... Que tal a gente beber alguma coisa para comemorar sua vitória?
- Ei, tio, eu quero dois sucos de laranja! - Grita a Naru para um sujeito que supostamente seria o taverneiro.
Todos os lutadores presentes na taverna caem na risada diante do amadorismo da dupla.
- Ué? E o que tem de errado? - Esbraveja Naru diante da zombaria geral.
- Senhorita, nós somente servimos bebidas alcoólicas no balcão. - Responde o taverneiro, um tipo bigodudo, gordo, mal vestido e com cara de poucos amigos.
- Puxa, mas não dá para fazer uma exceção?
- Não. E ponto final! - Responde o obeso homem grosseiramente.
- E o que tem de bebida, que não seja muito forte? - Pergunta Keitarô ao taverneiro tentando impedir que Naru ficasse novamente irritada.
- Temos cerveja e vinho.
- Bem, aceita um chope, Narusegawa? - Pergunta Keitarô.
- Só se for um pouquinho. Quais são as marcas?
- Nós temos o "Dwarf Red Noise", o "Balrog's Tears" e o "Elven Pilsen".
- Acho que vou querer o "Elven Pilsen". - Responde a Naru.
- Beem... Acho que vou tomar o "Balrog's Tears", garçom. - Escolhe Keitarô, indeciso quanto ao verdadeiro significado dos nomes. Como ele achou que estas "marcas" eram apenas simbólicas, e que a bebida virtual do jogo era somente de mentirinha, decidiu arriscar.
O taverneiro traz dois copos enormes de chope e entrega aos dois novatos. Naru toma o seu copo e acha o Elven Pilsen simplesmente maravilhoso. Era como se tomasse uma cerveja de verdade, só que ela era bem suave, deliciosa, nada amarga e com pouquíssimo teor alcóolico surpreendendo a jovem.
Keitarô se prepara para tomar a sua cerveja, de cor fortemente acentuada, mas no primeiro gole, sente um ardor indescritível na garganta e cospe tudo fora:
- Arghhhhh! Tá ardido! Tá ardido! - Garçom, o que tem nesta cerveja? Reclama Keitarô sentindo os seus olhos saindo das órbitas.
- Você escolheu uma cerveja preferida pelos orcs e pelos bárbaros. É uma bebida feita de ervas aromáticas e reforçada com sangue de javali e pimenta moída. É preciso estômago forte para tomar isto.
- Sangue? Pimenta moída? - Grita incrédulo Keitarô.
- Sim. Não leram o menu da casa?
Naru termina de beber a sua cerveja, elogiando a qualidade da mesma. Keitarô não ousa arriscar pedir mais nada na taverna.
- Bem. Naru, nós vamos embora. Vamos dar uma olhada para ver o que tem lá fora antes de sairmos do jogo.
- Por mim, estou começando a achar interessante a vida de aventureira.
- Esperem! As bebidas não são por conta da casa. Vocês me devem 3 GPs, um pela Elven Pilsen e dois pela Baalor Ale. - Grita o taverneiro, irritado.
- GPs, o que é isto? - Pergunta Keitarô.
- Gold Pieces, moedas de ouro, rapaz. Vocês certamente devem ter... - Olha com ar inquisitor o taverneiro, imaginando coisas.
- Epa! - Keitarô remexe os bolsos e constata que está totalmente duro, sem dinheiro.
Naru também procura ver se tem algum troco na sua escassa roupa, mas não encontra nada.
- Ehhh... Garçom, o senhor aceita pôr na conta? A gente está sem grana e não sabemos aonde arranja estes tais GPs... - Propõe Keitarô com um sorriso amarelo.
- O quê? Seus caloteiros! Guardas! Peguem estes dois malandros!
Em seguida surge meia dúzia de brutamontes bem armados com clavas e porretes - os seguranças da taverna - e põem Keitarô e Naru para correr. Os dois azarados aventureiros fogem e finalmente depistam seus perseguidores num beco.
- A gente devia saber que o nosso dinheiro não serve neste mundo, Naru!
- A culpa é sua! Você devia saber disto, já que jogou mais videogame do que eu!
- Bem, se não me engano, a gente devia ter feito alguma missão para ganhar dinheiro. É deste jeito que podemos comprar equipamento, comida ou bebida num jogo de RPG. - O jovem de óculos tenta relembrar as partidas que jogara.
- Missão, como assim?
- Encontrar um tesouro, derrotar monstros, coisas do tipo...
- E o que temos que fazer agora, Senhor Aventureiro? - Naru começa a dar sinais de impaciência.
- Bem, o problema é que geralmente a maioria das missões para principiantes a gente obtém por meio de informações na taverna, só que acho que enquanto estivermos duros, o taverneiro não irá nos aceitar de volta.
- Ah, isto está começando a ficar complicado pra minha cabeça.
- Espere, Narusegawa. Não é tão difícil assim. É só a gente dar de encontro com algumas criaturas e derrotar elas. Geralmente os inimigos iniciais do jogo são mais fáceis...
- Ah,é? Isto está ficando... AIEHHHH!!!
Naru grita ao ver que ela e Keitarô estão cercados por ladrões no beco. Os fora da lei estão armados com adagas e parecem assustadoramente reais, fazendo movimentos rápidos e malabarismos com as lâminas, no estilo das gangues de gueto, ao mesmo tempo em que bloqueiam a única saída.
O mais adiantado deles tenta acertar Naru, mas ela instintivamente se esquiva, dando um chute nele. O meliante é jogado numa parede e fica sem sentidos, mas os outros bandidos ficam ainda mais furiosos. Avançando como lobos, eles apenas aguardam o melhor momento para romper a guarda da jovem lutadora e crivá-la de facas.
- Keitarô! Faça alguma coisa, sou linda demais para morrer! Naru se joga abraçando no seu parceiro, de forma inesperada.
- Fazer o quê? Se nem tenho um estilingue!... - Desespera-se Keitarô fazendo sua habitual cara de choro, com jatos de lágrimas saindo de seus olhos.
- Bem, então me resta fazer isto! - Diz Naru contrariada ao notar que o abraço do Keitarô estava pressionando demais os seus seios.
- IHHHHKHHHH!
Usando sua força, Naru joga o corpo de Keitarô contra a quadrilha e ele nocauteia os bandidos como se fossem pinos de boliche.
- Ahahah! Até que foi mais fácil do que parecia. Foi muito legal! Foi Dez! - Entusiasma-se Naru ao ver os bandidos que estavam ainda conscientes fugirem deles como ratos.
- Só não agrida os seus parceiros ao lado... Ui! Está muito real... - Levanta-se Keitarô, com a cabeça toda dolorida.
- Qual é, Keitarô, você é mesmo imortal! E ainda mais neste jogo!
Acostumado a toda sorte de porrada e com o incremento dos seus pontos de vida, o personagem de Keitarô agüentava uma quantidade surpreendente de castigo físico que teria feito um homem comum cair inconsciente.
- Vamos aproveitar e fugir daqui enquanto podemos. Este lugar não é seguro!
- Espere, Naru. Olhe, são Moedas de ouro! Devem ser os GPs... - Repara o jovem de óculos ao perceber alguns objetos reluzentes sob o chão imundo.
- Mas... Pegar elas não é um crime? Hesita a jovem ruiva.
- Pense bem... Eles já roubaram de alguém. Não pertencem a eles. Deve ser a nossa deixa.
- Tudo bem. Pegue as moedas e vamos cair fora.
Keitarô revista os corpos dos bandidos e encontra um total de quinze moedas de ouro. É muito pouco para os padrões de um aventureiro iniciante, mas suficiente para pagar a conta no bar. Ele pensa em pegar uma adaga dos bandidos, mas lembra que por enquanto não tem habilidades de combate. Após "depenar" os bandidos inconscientes eles voltam para o bar. Inicialmente, os seguranças não queriam deixá-los entrar, mas a sinceridade dos jovens e o pagamento da dívida resolveram tudo. Satisfeito, o taverneiro liberou o acesso à dupla.
- Bem, parece mesmo com o mundo real... Se você não pagar a conta, nada de bebida! Eheh... Brinca Naru, aliviada com o fim da situação constrangedora.
- É mesmo... Vamos dar uma volta na cidade antes de sairmos daqui. Responde Keitarô.
- Esperem, por favor! Grita uma figura misteriosa. Era um jovem elegante e bem-vestido, com uma estranha jóia flutuante na cabeça. Pelo seu jeito de vestir, deveria ser um mago.
- Hã, o que deseja de nós? - Pergunta Naru, surpresa ao ver o estranho visual de seu interlocutor.
- Eu vi a vitória de vocês contra o bárbaro do Slash e fiquei muito interessado por seus talentos... Meu nome é Finneas, o mago e quero fazer uma proposta lucrativa para ambos.
- Desculpe-me, mas estamos de saída... - Responde Keitarô.
- Não, não! É rapidinho. É um trabalho rápido, sem maiores problemas e que pode render muitos GPs a jovens aventureiros como vocês.
- De que trabalho se trata, Finneas? - Pergunta Naru.
- Estou com um pergaminho mágico que me foi encomendado por um mago chamado Tarsius, que mora num sobrado no fim desta rua. Só que preciso que alguém o entregue para ele, em troca de um anel mágico. Se me fizerem este serviço e entregarem o anel, vocês serão recompensados com 500 GPs!
- 500 GPs, Uau! - Entusiasma-se Keitarô, imaginando tratar-se de uma fortuna.
- Vamos aceitar, Keitarô! Este trabalho não deve ser muito difícil e como a gente iria dar um passeio nesta vila, vamos aproveitar para fazer esta boa ação para este moço. - Fala Naru, impressionada pela beleza física do jovem mago e por sua lábia.
- Tudo bem, Naru... Escute-me, Finneas, se o trabalho é fácil, por que o senhor não entrega o pergaminho você mesmo?
- Bem... Podemos dizer que Tarsius e eu somos conhecidos, mas não amigos íntimos. E infelizmente a mulher dele não vai com a minha cara devido a um mal entendido do passado. Fui proibido de por os pés na casa dele.
- Bem, nós somos novos por aqui mesmo e a gente não tem nada contra ele. Acho que não vai ter problema. - Responde Naru.
Naru e Keitarô pegam o pergaminho para Tarsius, acompanhado de um bilhete escrito contendo instruções por Finneas e vão caminhando pela rua estreita da vila medieval. O bilhete continha um aviso direcionado para personagens magos de não tentar ler o pergaminho antes de entregá-lo a Tarsius, bem como um esboço da rua aonde morava.
- Que barbada, Naru! Mal entramos no pedaço e pegamos a primeira missão. Acho que com 500 GPs a gente dá para fazer a festa aqui...
- Vamos rápido, porque estamos com pressa. Eu só topei fazer esta missão porque quero comprar uma roupa mais decente! Esta que estou usando é muito bárbara para o meu gosto.
- Mas até que você fica bonitinha com esta armadura...
SOC!
- Repita o que você disse, seu tarado! Eu te contratei para ser o meu guarda-costas e não para ficar me cantando!
- Perdão, Narusegawa! Perdão!
A linda guerreira e seu atrapalhado segurança saem da taverna entre olhares curiosos, a fim de cumprir sua primeira e provavelmente única missão. Naru começava a ficar arrependida de ter começado a jogar este game realista demais para ela.
Ela ficava imaginando como que as autoridades deixaram liberar um jogo tão nocivo para adolescentes puras como ela, que permitiam que mocinhas ficassem com a barriga à mostra? Aquilo era uma imoralidade!
Keitarô não havia aproveitado muito o jogo, mas estava atordoado pelo fato das pancadas no mundo virtual serem tão fortes como as reais. E isto porque ela estava ainda no level 1... Ele deveria ter escolhido o modo otimizado de criação de personagem para fazer um mais competitivo, só que sua inexperiência criou um Keitarô virtual à imagem e semelhança do original. Ele queria terminar aquela missão para sair do jogo o mais rápido possível.
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