Capítulo 3: A Fã.
A pobre Mieko sempre foi uma pessoa carente de afeto. Órfã de pai, ela foi criada em Osaka por uma mãe somente preocupada com a vida profissional e por um padrasto frio e extremamente indiferente. Ela sempre teve dificuldades para fazer amizades com outras garotas na escola e esquivava-se dos garotos - muitos dos quais que a procuravam com segundas intenções, devido à sua beleza.
Embora fosse excelentemente bem nos estudos, ela se achava inútil e irrealizada a nível pessoal. Isto porque os seus pais não valorizavam suficientemente suas conquistas escolares - "você só está fazendo a sua obrigação", diziam - e também trazia um forte espírito de inveja e rivalidade por parte das outras meninas.
No fundo, queria ser uma garota forte, ativa, bem realizada e popular.
Seu primeiro amor foi frustrante, tendo sido quase noiva de uma pessoa dez anos mais velha do que ela e que a abandonou num momento em que precisava muito de ajuda, quando sua mãe morreu. E no segundo amor, ela se relacionou com uma amiga íntima mais velha do que ela, num relacionamento cheio de amarguras, medo e incertezas, acabando por terminar em escândalo na cidade aonde vivia, tendo sido obrigada a mudar para Tóquio a fim de esquecer o passado.
Discriminada pelas suas novas colegas de classe, pelo seu temperamento tímido e difícil, Mieko passou a viver num mundo de fantasia, espelhando todos os seus ideais e frustrações na figura de Motoko Aoyama - que conhecera num dos campeonatos escolares do colégio - criando uma forte imagem idealizada dela. Era de seu conhecimento de que a samurai não tinha namorado e ninguém tinha visto ou ouvido falar que Motoko saía com rapazes.
Naquele domingo, ela tinha visto Motoko entrar no Shopping Mizuno e havia pensado em convidá-la para tomar um sorvete. Antes disto, ela chegara a pensar em propor um encontro reservado com seu objeto de devoção, mas faltava a coragem necessária. Só que ao ver a garota-samurai saindo rapidamente da praça de alimentação, a ansiedade falou mais alto e ela decidira segui-la até o banheiro. Ao ver o rosto de seu ídolo no espelho, ela sentiu um arrepio e ousou tocar nela, para ter certeza de que aquilo era real... Só que deu tudo errado...
Pouco antes de Naru e de Keitarô entrarem na Lan-House, Mieko retorna ao seu apartamento alugado. Era um modelo de três quartos localizado num bairro elegante de Tóquio e certamente seu aluguel mensal devia ser bastante alto para as posses de famílias de classe média. Embora tanto a sua família original como a de seu padrasto tivesse posses mais do que suficientes para assegurar uma existência dourada, era mais do que evidente de que dinheiro não significava felicidade para Mieko.
A jovem joga displicentemente sua bolsa na poltrona da sala de estar e em seguida vai ao seu quarto trocar de roupa. Em seguida, coberta apenas com uma toalha, ela vai tomar banho. Mieko, ao deixar a ducha do chuveiro lavar o seu corpo, não estava mais chorando, mas estava arrasada por dentro. A água quente da ducha certamente podia lavar e purificar o seu belo corpo da sujeira, da poeira e do cansaço, mas não da decepção e do seu sentimento de culpa... Só de lembrar a recusa de sua adorável Motoko-chan, as lágrimas voltaram a escorrer e ela se questionava.
Seria um ser humano normal? Ou seria um monstro, uma aberração da natureza?
Que espécie de pessoa era ela, de desejar tocar e abraçar uma moça como a Motoko, num banheiro de Shopping?... A Aoyama poderia ser linda e seu corpo desejável, mas isto não justificava fazer aquilo num lugar público...
Ainda perturbada, ela deixa a ducha em sua potência máxima fustigar seu corpo, bem mais baixo e franzino do que a menina-samurai, anulando a espuma que cobria sua nudez no momento. Mieko tinha seu próprio padrão de beleza. Embora fosse baixinha e um pouco magra, seu rosto era delicado e harmonioso, realçando um certo aspecto de delicadeza e classe na sua pessoa. As mãos - com dedos finos e delicados - pareciam ser feitas para tocar piano e pintar quadros, coisas, aliás, que ela havia treinado desde a infância. E seus cabelos negros sedosos eram bem cuidados nos melhores salões de beleza.
Só que nada disto a satisfazia.
Ela havia botado na sua própria mente de que o único padrão de beleza aceitável era o de Motoko. Admirava nela a força e habilidade, conjugadas com a altura perfeita, aqueles cabelos negros sedosos, as formas generosas e suas pernas... Em resumo, tudo.
Embora estivesse parcialmente arrasada pelo fato de Motoko ter dito que não a amava e que não desejava mais a sua presença, ela estava por outro lado, estranhamente realizada por ter sido a primeira vez que conversou a sós com ela. Não era o seu primeiro encontro, já que a cumprimentou uma vez quando a espadachim começava a vencer os campeonatos escolares e mesmo em competições regionais. Só que Motoko não lhe dava especial atenção devido ao assédio de dezenas de fãs. A pobre Mieko tinha que enfrentar a concorrência de várias de meninas, começando pelo famoso trio que acompanhava a espadachim aonde quer que ela fosse.
Só que Mieko não temia a concorrência destas tietes "amadoras", por já perceber que Motoko não dava muita moral para elas. Na realidade, a jovem de Osaka invejava o privilégio que as três outras garotas supostamente tinham. A de voltar quase todos os dias para a casa com Motoko-chan.
Uma era uma japonesinha magrinha, chamada Shinobu Maehara. Ela devia ser de outro colégio, mas quase sempre voltava junto com Motoko-chan. Um horror, aquele penteado. Horrível! Como seu ídolo consentia a presença de um traste daquele? Para os padrões refinados de Mieko, Shinobu não lhe inspirava nada, nem a menor sombra de atração física. Ela amava profundamente o belo e ironicamente tanto Motoko como seu último amor - uma jovem universitária mais velha do que ela - eram muito lindas. Já, a Maehara era como uma qualquer, como uma das dezenas de milhares de rostos anônimos que andavam por Tóquio, sem glamour ou algo de notável, sem peito ou bunda. Ela parecia ser também muito chorona, infantil e feiosa para o seu gosto, totalmente diferente de seu ídolo.
A segunda pessoa que Mieko mais detestava era uma outra menina colega da Maehara, com ar debilóide chamada Akiko Taichi. Taichi-chan era esquisitona, e segundo se dizia, vivia se metendo em confusões dentro e fora de aula. No intervalo, seu passatempo consistia em se enfeitar com vários tipos de batons e itens de maquilagens. Sua fama de aluna encrenqueira vinha desde tempos atrás e se não fosse pela ajuda da Maehara nos estudos, ela teria bombado ainda no ano passado.
Mieko suspeitava que Taichi-chan fosse meio lésbica, mas definitivamente lhe repugnava a idéia de se envolver amorosamente com uma criatura tão ignóbil quanto esta menina sardenta com sorriso imbecil. Só de pensar nisto causava náuseas.
A terceira pessoa - e a que Mieko mais detestava - era uma moreninha de cabelo loiro. A tal da Kaolla Su. A "negrinha", como Mieko pensava dela, devia ser alguma estudante de algum país fedorento do Terceiro Mundo que veio parar no Japão... Era demais para alguém de sua sensibilidade e classe ver uma mestiça daquelas trepar nas árvores do pátio do colégio feito uma macaca e andar pelo corredor com aquelas invenções malucas saídas de um cérebro doente - cavalos robotizados, patinetes movidos a energia solar, skates controláveis via rádio e outras coisas similares... Na hora do lanche, Mieko evitava se sentar ao lado da Kaolla, já que o lanche que ela trazia no refeitório para comer era qualquer coisa misturada com banana: Sorvete de banana, creme de banana, banana à milanesa, banana com curry, arroz com banana, etc. Por sua culpa, Mieko começou a sentir aversão por bananas, já que estas recordavam a estrangeira.
Para piorar, Kaolla Su era sua concorrente direta em termos de notas.
A jovem japonesa era ligeiramente superior na língua japonesa, matemática e história. E levava nítida vantagem em Artes Aplicadas e Canto. Só que a estrangeira conseguia tirar notas melhores em ciência, química e biologia, além de ganhar de longe da Mieko em Educação Física, matéria que nunca foi forte da jovem de óculos. A "negrinha hindu" há havia tentado fazer amizade com a jovem de cabelos negros - bobona e alegrona como era, na opinião de Mieko - mas a garota de classe alta a evitava deliberadamente, usando todo tipo de justificativa disfarçada de boa educação. No fundo, ela queria que a "negrinha" voltasse para o mundinho de m**** aonde veio e lá ficasse para sempre.
Mieko não sentia ciúmes, mas inveja pelo fato de Maehara, Taichi e Su terem um privilégio que ela não tinha, o de poder acompanhar seu ídolo e modelo no caminho de volta do colégio. Mieko já pensou em investigar aonde Motoko morava, mas esta tática era muito vulgar para alguém de sua classe. Só sabia que o bairro aonde ela ia ficava bem longe de onde morava. Foi um verdadeiro achado para ela encontrá-la nesta tarde de domingo.
Terminado o banho, Mieko enxuga o seu corpo macio e em seguida vai até o seu quarto. A sua cama era um modelo de casal, com lençóis caros e com vários bichinhos de pelúcia, todos caros. Ainda nua, ela se deixa deitar de forma lenta e lasciva e abraça um de seus bichinhos. Quem dera se fosse a Motoko...Em seus devaneios, ela começa a pensar em seu amor e deixando a imaginação ir mais longe...
- Motoko, meu amor... Ela suspira, entregue a seus sonhos.
Mieko começa a respirar mais fundo e deixa-se excitar pelas suas mãos delicadas. Ondas de prazer percorrem seu corpo e sua respiração torna-se entrecortada. Os minutos tornam se segundos e ela deixa sua imaginação ganhar formas ousadas e sensuais, somente pensando no corpo da sua Motoko-chan.Mas depois de um certo tempo, ela interrompe sua transa mental. Mieko estava começando a se cansar daquilo, queria algo mais concreto e não abstrato. Ela queria sentir o hálito quente de Motoko, a maciez de sua pele, o gosto de suas lágrimas, a textura de sua saliva... Queria se sentir amada, desejada, idolatrada. Um pouco envergonhada pelos seus desejos inconfessáveis, ela termina de se vestir e coloca um roupão. Em seguida, penteia os cabelos e deixa-os secar, cuidando em seguida de seu rosto, pescoço, mãos e pele.
Já devidamente limpa, Mieko vai à cozinha beber um pouco de água e aproveita para degustar uma fatia fina de uma torta de morango que comprara na véspera. Por sorte não tinha tendência de engordar. Em seguida, a jovem vai para outro quarto do apartamento, transformado num misto de escritório e sala de estudo. Ela liga o seu computador pessoal, um PC de último tipo, de fazer inveja ao mais nerd dos hackers. Mieko abre uma caixa de um software e em seguida insere um DVD-Rom no leitor ótico. Tratava-se do jogo Fantasy, que havia comprado justamente na estréia.
Só que diferentemente da versão comprada pela Kaolla e Sarah, a sua versão de jogo era customizada, com um editor online de fases e configurador de personagens e Non-Player Characters, os NPCs, que custava uns 20 dólares americanos a mais. Ela adorava RPGs, só que não se conformava por justamente naquele dia ter encontrado com a maluca da Kaolla na fila de fãs fanáticos que desejavam ser os primeiros a terem o comentado jogo.
Em outro arquivo do computador de Mieko se localizava seu maior tesouro. Dezenas de fotos digitalizadas de Motoko-chan tiradas nos últimos meses em segredo, algumas delas ampliadas e devidamente tratadas, mas sem retoques do Photoshop. Para se assegurar de que seu tesouro jamais seria perdido, ela mandou fazer vários back-ups dos arquivos e colocou-os em CD-RWs diferentes, para recuperá-los em caso de pane. Mieko era quase tão boa quanto Kaolla em termos de manejo de softwares, embora não tivesse sua genialidade. Só que ao contrário da sua colega de escola, ela adorava simuladores de romances, conhecendo todas suas estratégias e manhas.
Estranhamente, ela preferia jogar com papéis masculinos neste tipo de jogo, especialmente daqueles rapazes com traços andróginos e delicados. Só eventualmente pegava personagens mulheres quando tinha a chance de desenvolver relacionamentos no mínimo exóticos - no caso de software hentai. Nada de paquerar rapazes.
Ela se interessou pelo Fantasy não somente pelo fato de ser um RPG, mas também pelo motivo de seu sofisticado sistema de AI permitir que a história e o enredo do jogo fosse mudando à medida que os personagens tomassem suas decisões ao longo da trama. Também era possível se relacionar virtualmente com os personagens jogadores que encontrasse, variando do ódio mais irreconciliável à paixão mais arrebatadora. Como estaria lidando com seres humanos e não com personagens controlados pelo computador, a variedade de respostas e reações era infinita, o que tornava o jogo instigante e desafiador. E comentava-se que o equipamento de Realidade Virtual era tão sofisticado que podia reproduzir sensações táteis específicas, como o beijo, a carícia e o abraço, além de outras sensações mais prazeirosas. Com o desbloqueio dos códigos de ética que regiam as regras do jogo e o aumento do nível de interação, podia-se ir mais além, fazendo o jogo se tornar uma versão realista do The Sims com toques de RPG estratégico.
- Motoko... Um dia nos encontraremos... Com este pensamento, a jovem Mieko coloca o seu capacete de RV e inicializa o jogo.
Diferentemente de Kaolla, ela não jogava para se divertir, mas para vencer. Mieko tinha vários guias de estratégia de diferentes programas e estava familiarizada com as melhores configurações de classe e combos de diferentes jogos. Ela tinha preferência por personagens que podiam ser aparentemente fracos, mas com grande potencial de poder e crescimento no jogo. Não gostava muito de personagens lutadores, preferindo magos, clérigos, sorcerers e afins.
Havia um boato nas revistas especializadas de que no game Fantasy, combinando-se determinadas classes no decorrer do desenvolvimento do personagem, podia-se desbloquear classes exclusivas com poderes inéditos. E seria isto que ela pretendia fazer.
Notas do autor da Fic:
Este capítulo aborda a personalidade de Mieko, a estranha fã da Motoko-chan que surgiu no capítulo dois, e que vai ter um papel relevante na trama. Futura deste fic
O Conteúdo do capítulo 3 tem um trecho ligeiramente lime e algumas insinuações de racismo. Quaisquer termos injuriosos dirigidos à Kaolla Su, Shinobu e Taichi-chan nesta parte são opiniões pessoais da Mieko e não as do autor.
Quanto ao character design da Mieko, eu a imagino (uma pena não ser bom desenhista) como uma garota de estatura um pouco maior do que a Kaolla, com corpo bastante delicado. O seu traço físico lembra muito a Fuu Hô-ôji (Anne) do Rayearth, só que com os cabelos de cor negra e não tão ondulados. Embora costume usar muito o uniforme do colégio feminino aonde estuda - o mesmo da Motoko - em outras ocasiões ela prefere usar uma combinação de blazer com saia curta e sapatos.
Embora seja rica e de família influente, Mieko é bem diferente do estereótipo da patricinha rica de colégio dos animes. Devido ao seu temperamento retraído e difícil de agradar, ela não tem aquela legião de puxa-sacos em sua classe, embora sua beleza seja notada pelos rapazes. Mieko aparenta ser um bocado distante e fria com quem não conhece direito e evita de se abrir com as outras.
A nível psicológico, sua personalidade é praticamente o oposto da Kaolla. O que a jovem estrangeira tem de extroversão, energia e alegria, Mieko possui uma personalidade bastante retraída, apagada e contraditória.
Só que está longe de ser uma bonequinha passiva. Ela guarda muitos sentimentos dentro dela e se pudesse exteriorizar tudo o que sente, seu temperamento seria pior do que a Naru Narusegawa.
E-Mail de Contato:
Calerom
myamauchi1969@yahoo.com.br
A pobre Mieko sempre foi uma pessoa carente de afeto. Órfã de pai, ela foi criada em Osaka por uma mãe somente preocupada com a vida profissional e por um padrasto frio e extremamente indiferente. Ela sempre teve dificuldades para fazer amizades com outras garotas na escola e esquivava-se dos garotos - muitos dos quais que a procuravam com segundas intenções, devido à sua beleza.
Embora fosse excelentemente bem nos estudos, ela se achava inútil e irrealizada a nível pessoal. Isto porque os seus pais não valorizavam suficientemente suas conquistas escolares - "você só está fazendo a sua obrigação", diziam - e também trazia um forte espírito de inveja e rivalidade por parte das outras meninas.
No fundo, queria ser uma garota forte, ativa, bem realizada e popular.
Seu primeiro amor foi frustrante, tendo sido quase noiva de uma pessoa dez anos mais velha do que ela e que a abandonou num momento em que precisava muito de ajuda, quando sua mãe morreu. E no segundo amor, ela se relacionou com uma amiga íntima mais velha do que ela, num relacionamento cheio de amarguras, medo e incertezas, acabando por terminar em escândalo na cidade aonde vivia, tendo sido obrigada a mudar para Tóquio a fim de esquecer o passado.
Discriminada pelas suas novas colegas de classe, pelo seu temperamento tímido e difícil, Mieko passou a viver num mundo de fantasia, espelhando todos os seus ideais e frustrações na figura de Motoko Aoyama - que conhecera num dos campeonatos escolares do colégio - criando uma forte imagem idealizada dela. Era de seu conhecimento de que a samurai não tinha namorado e ninguém tinha visto ou ouvido falar que Motoko saía com rapazes.
Naquele domingo, ela tinha visto Motoko entrar no Shopping Mizuno e havia pensado em convidá-la para tomar um sorvete. Antes disto, ela chegara a pensar em propor um encontro reservado com seu objeto de devoção, mas faltava a coragem necessária. Só que ao ver a garota-samurai saindo rapidamente da praça de alimentação, a ansiedade falou mais alto e ela decidira segui-la até o banheiro. Ao ver o rosto de seu ídolo no espelho, ela sentiu um arrepio e ousou tocar nela, para ter certeza de que aquilo era real... Só que deu tudo errado...
Pouco antes de Naru e de Keitarô entrarem na Lan-House, Mieko retorna ao seu apartamento alugado. Era um modelo de três quartos localizado num bairro elegante de Tóquio e certamente seu aluguel mensal devia ser bastante alto para as posses de famílias de classe média. Embora tanto a sua família original como a de seu padrasto tivesse posses mais do que suficientes para assegurar uma existência dourada, era mais do que evidente de que dinheiro não significava felicidade para Mieko.
A jovem joga displicentemente sua bolsa na poltrona da sala de estar e em seguida vai ao seu quarto trocar de roupa. Em seguida, coberta apenas com uma toalha, ela vai tomar banho. Mieko, ao deixar a ducha do chuveiro lavar o seu corpo, não estava mais chorando, mas estava arrasada por dentro. A água quente da ducha certamente podia lavar e purificar o seu belo corpo da sujeira, da poeira e do cansaço, mas não da decepção e do seu sentimento de culpa... Só de lembrar a recusa de sua adorável Motoko-chan, as lágrimas voltaram a escorrer e ela se questionava.
Seria um ser humano normal? Ou seria um monstro, uma aberração da natureza?
Que espécie de pessoa era ela, de desejar tocar e abraçar uma moça como a Motoko, num banheiro de Shopping?... A Aoyama poderia ser linda e seu corpo desejável, mas isto não justificava fazer aquilo num lugar público...
Ainda perturbada, ela deixa a ducha em sua potência máxima fustigar seu corpo, bem mais baixo e franzino do que a menina-samurai, anulando a espuma que cobria sua nudez no momento. Mieko tinha seu próprio padrão de beleza. Embora fosse baixinha e um pouco magra, seu rosto era delicado e harmonioso, realçando um certo aspecto de delicadeza e classe na sua pessoa. As mãos - com dedos finos e delicados - pareciam ser feitas para tocar piano e pintar quadros, coisas, aliás, que ela havia treinado desde a infância. E seus cabelos negros sedosos eram bem cuidados nos melhores salões de beleza.
Só que nada disto a satisfazia.
Ela havia botado na sua própria mente de que o único padrão de beleza aceitável era o de Motoko. Admirava nela a força e habilidade, conjugadas com a altura perfeita, aqueles cabelos negros sedosos, as formas generosas e suas pernas... Em resumo, tudo.
Embora estivesse parcialmente arrasada pelo fato de Motoko ter dito que não a amava e que não desejava mais a sua presença, ela estava por outro lado, estranhamente realizada por ter sido a primeira vez que conversou a sós com ela. Não era o seu primeiro encontro, já que a cumprimentou uma vez quando a espadachim começava a vencer os campeonatos escolares e mesmo em competições regionais. Só que Motoko não lhe dava especial atenção devido ao assédio de dezenas de fãs. A pobre Mieko tinha que enfrentar a concorrência de várias de meninas, começando pelo famoso trio que acompanhava a espadachim aonde quer que ela fosse.
Só que Mieko não temia a concorrência destas tietes "amadoras", por já perceber que Motoko não dava muita moral para elas. Na realidade, a jovem de Osaka invejava o privilégio que as três outras garotas supostamente tinham. A de voltar quase todos os dias para a casa com Motoko-chan.
Uma era uma japonesinha magrinha, chamada Shinobu Maehara. Ela devia ser de outro colégio, mas quase sempre voltava junto com Motoko-chan. Um horror, aquele penteado. Horrível! Como seu ídolo consentia a presença de um traste daquele? Para os padrões refinados de Mieko, Shinobu não lhe inspirava nada, nem a menor sombra de atração física. Ela amava profundamente o belo e ironicamente tanto Motoko como seu último amor - uma jovem universitária mais velha do que ela - eram muito lindas. Já, a Maehara era como uma qualquer, como uma das dezenas de milhares de rostos anônimos que andavam por Tóquio, sem glamour ou algo de notável, sem peito ou bunda. Ela parecia ser também muito chorona, infantil e feiosa para o seu gosto, totalmente diferente de seu ídolo.
A segunda pessoa que Mieko mais detestava era uma outra menina colega da Maehara, com ar debilóide chamada Akiko Taichi. Taichi-chan era esquisitona, e segundo se dizia, vivia se metendo em confusões dentro e fora de aula. No intervalo, seu passatempo consistia em se enfeitar com vários tipos de batons e itens de maquilagens. Sua fama de aluna encrenqueira vinha desde tempos atrás e se não fosse pela ajuda da Maehara nos estudos, ela teria bombado ainda no ano passado.
Mieko suspeitava que Taichi-chan fosse meio lésbica, mas definitivamente lhe repugnava a idéia de se envolver amorosamente com uma criatura tão ignóbil quanto esta menina sardenta com sorriso imbecil. Só de pensar nisto causava náuseas.
A terceira pessoa - e a que Mieko mais detestava - era uma moreninha de cabelo loiro. A tal da Kaolla Su. A "negrinha", como Mieko pensava dela, devia ser alguma estudante de algum país fedorento do Terceiro Mundo que veio parar no Japão... Era demais para alguém de sua sensibilidade e classe ver uma mestiça daquelas trepar nas árvores do pátio do colégio feito uma macaca e andar pelo corredor com aquelas invenções malucas saídas de um cérebro doente - cavalos robotizados, patinetes movidos a energia solar, skates controláveis via rádio e outras coisas similares... Na hora do lanche, Mieko evitava se sentar ao lado da Kaolla, já que o lanche que ela trazia no refeitório para comer era qualquer coisa misturada com banana: Sorvete de banana, creme de banana, banana à milanesa, banana com curry, arroz com banana, etc. Por sua culpa, Mieko começou a sentir aversão por bananas, já que estas recordavam a estrangeira.
Para piorar, Kaolla Su era sua concorrente direta em termos de notas.
A jovem japonesa era ligeiramente superior na língua japonesa, matemática e história. E levava nítida vantagem em Artes Aplicadas e Canto. Só que a estrangeira conseguia tirar notas melhores em ciência, química e biologia, além de ganhar de longe da Mieko em Educação Física, matéria que nunca foi forte da jovem de óculos. A "negrinha hindu" há havia tentado fazer amizade com a jovem de cabelos negros - bobona e alegrona como era, na opinião de Mieko - mas a garota de classe alta a evitava deliberadamente, usando todo tipo de justificativa disfarçada de boa educação. No fundo, ela queria que a "negrinha" voltasse para o mundinho de m**** aonde veio e lá ficasse para sempre.
Mieko não sentia ciúmes, mas inveja pelo fato de Maehara, Taichi e Su terem um privilégio que ela não tinha, o de poder acompanhar seu ídolo e modelo no caminho de volta do colégio. Mieko já pensou em investigar aonde Motoko morava, mas esta tática era muito vulgar para alguém de sua classe. Só sabia que o bairro aonde ela ia ficava bem longe de onde morava. Foi um verdadeiro achado para ela encontrá-la nesta tarde de domingo.
Terminado o banho, Mieko enxuga o seu corpo macio e em seguida vai até o seu quarto. A sua cama era um modelo de casal, com lençóis caros e com vários bichinhos de pelúcia, todos caros. Ainda nua, ela se deixa deitar de forma lenta e lasciva e abraça um de seus bichinhos. Quem dera se fosse a Motoko...Em seus devaneios, ela começa a pensar em seu amor e deixando a imaginação ir mais longe...
- Motoko, meu amor... Ela suspira, entregue a seus sonhos.
Mieko começa a respirar mais fundo e deixa-se excitar pelas suas mãos delicadas. Ondas de prazer percorrem seu corpo e sua respiração torna-se entrecortada. Os minutos tornam se segundos e ela deixa sua imaginação ganhar formas ousadas e sensuais, somente pensando no corpo da sua Motoko-chan.Mas depois de um certo tempo, ela interrompe sua transa mental. Mieko estava começando a se cansar daquilo, queria algo mais concreto e não abstrato. Ela queria sentir o hálito quente de Motoko, a maciez de sua pele, o gosto de suas lágrimas, a textura de sua saliva... Queria se sentir amada, desejada, idolatrada. Um pouco envergonhada pelos seus desejos inconfessáveis, ela termina de se vestir e coloca um roupão. Em seguida, penteia os cabelos e deixa-os secar, cuidando em seguida de seu rosto, pescoço, mãos e pele.
Já devidamente limpa, Mieko vai à cozinha beber um pouco de água e aproveita para degustar uma fatia fina de uma torta de morango que comprara na véspera. Por sorte não tinha tendência de engordar. Em seguida, a jovem vai para outro quarto do apartamento, transformado num misto de escritório e sala de estudo. Ela liga o seu computador pessoal, um PC de último tipo, de fazer inveja ao mais nerd dos hackers. Mieko abre uma caixa de um software e em seguida insere um DVD-Rom no leitor ótico. Tratava-se do jogo Fantasy, que havia comprado justamente na estréia.
Só que diferentemente da versão comprada pela Kaolla e Sarah, a sua versão de jogo era customizada, com um editor online de fases e configurador de personagens e Non-Player Characters, os NPCs, que custava uns 20 dólares americanos a mais. Ela adorava RPGs, só que não se conformava por justamente naquele dia ter encontrado com a maluca da Kaolla na fila de fãs fanáticos que desejavam ser os primeiros a terem o comentado jogo.
Em outro arquivo do computador de Mieko se localizava seu maior tesouro. Dezenas de fotos digitalizadas de Motoko-chan tiradas nos últimos meses em segredo, algumas delas ampliadas e devidamente tratadas, mas sem retoques do Photoshop. Para se assegurar de que seu tesouro jamais seria perdido, ela mandou fazer vários back-ups dos arquivos e colocou-os em CD-RWs diferentes, para recuperá-los em caso de pane. Mieko era quase tão boa quanto Kaolla em termos de manejo de softwares, embora não tivesse sua genialidade. Só que ao contrário da sua colega de escola, ela adorava simuladores de romances, conhecendo todas suas estratégias e manhas.
Estranhamente, ela preferia jogar com papéis masculinos neste tipo de jogo, especialmente daqueles rapazes com traços andróginos e delicados. Só eventualmente pegava personagens mulheres quando tinha a chance de desenvolver relacionamentos no mínimo exóticos - no caso de software hentai. Nada de paquerar rapazes.
Ela se interessou pelo Fantasy não somente pelo fato de ser um RPG, mas também pelo motivo de seu sofisticado sistema de AI permitir que a história e o enredo do jogo fosse mudando à medida que os personagens tomassem suas decisões ao longo da trama. Também era possível se relacionar virtualmente com os personagens jogadores que encontrasse, variando do ódio mais irreconciliável à paixão mais arrebatadora. Como estaria lidando com seres humanos e não com personagens controlados pelo computador, a variedade de respostas e reações era infinita, o que tornava o jogo instigante e desafiador. E comentava-se que o equipamento de Realidade Virtual era tão sofisticado que podia reproduzir sensações táteis específicas, como o beijo, a carícia e o abraço, além de outras sensações mais prazeirosas. Com o desbloqueio dos códigos de ética que regiam as regras do jogo e o aumento do nível de interação, podia-se ir mais além, fazendo o jogo se tornar uma versão realista do The Sims com toques de RPG estratégico.
- Motoko... Um dia nos encontraremos... Com este pensamento, a jovem Mieko coloca o seu capacete de RV e inicializa o jogo.
Diferentemente de Kaolla, ela não jogava para se divertir, mas para vencer. Mieko tinha vários guias de estratégia de diferentes programas e estava familiarizada com as melhores configurações de classe e combos de diferentes jogos. Ela tinha preferência por personagens que podiam ser aparentemente fracos, mas com grande potencial de poder e crescimento no jogo. Não gostava muito de personagens lutadores, preferindo magos, clérigos, sorcerers e afins.
Havia um boato nas revistas especializadas de que no game Fantasy, combinando-se determinadas classes no decorrer do desenvolvimento do personagem, podia-se desbloquear classes exclusivas com poderes inéditos. E seria isto que ela pretendia fazer.
Notas do autor da Fic:
Este capítulo aborda a personalidade de Mieko, a estranha fã da Motoko-chan que surgiu no capítulo dois, e que vai ter um papel relevante na trama. Futura deste fic
O Conteúdo do capítulo 3 tem um trecho ligeiramente lime e algumas insinuações de racismo. Quaisquer termos injuriosos dirigidos à Kaolla Su, Shinobu e Taichi-chan nesta parte são opiniões pessoais da Mieko e não as do autor.
Quanto ao character design da Mieko, eu a imagino (uma pena não ser bom desenhista) como uma garota de estatura um pouco maior do que a Kaolla, com corpo bastante delicado. O seu traço físico lembra muito a Fuu Hô-ôji (Anne) do Rayearth, só que com os cabelos de cor negra e não tão ondulados. Embora costume usar muito o uniforme do colégio feminino aonde estuda - o mesmo da Motoko - em outras ocasiões ela prefere usar uma combinação de blazer com saia curta e sapatos.
Embora seja rica e de família influente, Mieko é bem diferente do estereótipo da patricinha rica de colégio dos animes. Devido ao seu temperamento retraído e difícil de agradar, ela não tem aquela legião de puxa-sacos em sua classe, embora sua beleza seja notada pelos rapazes. Mieko aparenta ser um bocado distante e fria com quem não conhece direito e evita de se abrir com as outras.
A nível psicológico, sua personalidade é praticamente o oposto da Kaolla. O que a jovem estrangeira tem de extroversão, energia e alegria, Mieko possui uma personalidade bastante retraída, apagada e contraditória.
Só que está longe de ser uma bonequinha passiva. Ela guarda muitos sentimentos dentro dela e se pudesse exteriorizar tudo o que sente, seu temperamento seria pior do que a Naru Narusegawa.
E-Mail de Contato:
Calerom
myamauchi1969@yahoo.com.br
