Nome
da fic: A carta
Autor: Magalud
Censura: PG-13
Gênero: Drama.
Spoilers: Todos os cinco livros e todos os três filmes. Com modificações.
Alerta: Isto é um AU (Universo Alternativo) Tem gente viva que deveria estar
morta e outras inconsistências, mas eu quis fazer assim. Eu também quis usar
alguns nomes no original, mas me disseram que as pessoas não iam saber de quem
se tratava. Quero registrar aqui meu protesto! O nome do pai do Harry não é
Thiago, o nome da mãe não é Lílian, mas eu tive que usar assim! Buá!
Desafios: número 27. Snape descobre que na verdade Harry Potter é seu filho. O
que ele faz a respeito? Que conseqüências isso traz à sua vida? Ele muda seu
jeito de ser e/ou o tratamento que dispensa ao garoto-que-sobreviveu? ( Lia
Lockhart )
Resumo: Uma carta traz notícias de Snape que fazem Harry Potter duvidar de tudo
sobre sua vida.
Notas: Nunca pensei em escrever uma fic Severitus, gente, mas aí está. Por
isso aconselho a todos que jamais digam: "Dessa água nunca beberei!"
Agradecimentos: Jana, minha beta querida!
Disclaimer: Esses personagens são de JKR, eu não quero nem vou ganhar dinheiro
com eles.
Esta fic faz parte do SnapeFest 2004, uma iniciativa do grupo SnapeFest, e está
arquivada no site e no meu site
A carta
Capítulo 1 – Entrega especialPetúnia Dursley não sabia quem estava tocando a campainha de sua porta na rua dos Alfeneiros número 4, naquela tarde de terça-feira quente e úmida de verão. Mas assim que abriu a porta e olhou para baixo, sentiu as pernas ficarem trêmulas e seu coração bater descompassado. Afinal de contas, não era todo dia que um duende engravatado, de orelhas muito pontudas e com um ar muito oficial, batia à sua porta.
- Harry Potter? – pediu o duende.
Tia Petúnia soltou um gemido e desmaiou. Ao ouvir o barulho, Harry Potter parou de passar a roupa na sala de estar e foi à frente ver o que estava acontecendo. Seus olhos verdes se arregalaram:
- Tia Petúnia!
O duende indagou de novo:
- Harry Potter?
- Sim, mas –
- Carta registrada do Banco Bruxo Gringotts – O pequeno ser entregou uma prancheta nas mãos de Harry – Assine na linha pontilhada, por favor.
Assim que Harry assinou o papel de entrega, ele entregou uma carta volumosa, dizendo:
- Carta registrada para Harry Potter, entregue. Bom dia.
O duende estalou os dedos e desapareceu, provavelmente indo de volta para Gringotts.
Harry enfiou a carta dentro do bolso e correu a acudir sua tia desmaiada. Afinal, não havia mais ninguém ali. Duda estava no quarto, jogando videogame com sua patota, e ele não ouvia nada do que se passava na casa. Tio Válter estava no trabalho, e Harry estava servindo de elfo doméstico para os tios – como fazia todo o verão. E em pleno aniversário. Sim, porque aquele era o dia que ele completava 17 anos. Segundo as leis da Inglaterra, ele já completara a maioridade. No verão seguinte, Harry teria se graduado de Hogwarts, e poderia viver onde ele quisesse, provavelmente com Sirius no largo Grimmauld, na Mansão Black, sede da Ordem da Fênix – onde o padrinho vivia escondido das autoridades do Ministério da Magia.
Harry colocou a cabeça de tia Petúnia no seu colo e deu tapinhas no rosto dela:
- Tia Petúnia! Tia Petúnia, acorde!
- Ah... O quê? O quê? Que houve?
- A senhora desmaiou.
Parece que a memória de Petúnia voltou, porque ela repentinamente gritou, levantando-se quase que de um pulo:
- AAAHHH! Onde ele está? Para onde ele foi?
Harry achou melhor fingir que não sabia de nada:
- Para onde foi quem, tia Petúnia?
- A-aquela... aquela coisa! De orelhas pontudas.... pequeno...! E ele estava procurando por você! – A expressão dela mudou, e ela apontou um dedo muito magro e fino direto no rosto de Harry – Era uma das aberrações da sua gente, eu aposto! Você tinha que estar metido nisso!
Harry continuou se fazendo de desentendido:
- Metido em o quê? Eu não sei do que está falando!
Tia Petúnia apontou o dedo para cima:
- Já para o seu quarto!
- Mas por quê? Eu não fiz nada!
- Porque eu estou mandando!
- Eu ainda não terminei de passar a roupa!
- Deixe que eu me preocupe com isso! Agora suma da minha frente! Vá para o seu quarto e não saia de lá até eu mandar!
Droga, pensou ele, enquanto subia as escadas para seu quarto. Ele estava numa encrenca, com certeza, e as coisas só iriam ficar piores quando tio Válter chegasse em casa.
Aquilo ia ser castigo para uma semana.
Se ele pudesse usar mágica fora da escola, ele teria modificado a memória dela. Só que ele não tinha aprendido como fazer isso ainda – era matéria para o sétimo ano. E ele ainda tinha um mês inteiro antes de voltar a Hogwarts.
Mas uma coisa ele não entendia: por que um duende de Gringotts tinha deixado o banco no Beco Diagonal para entregar uma carta? Não parecia ser coisa de um duende.
Ele enfiou a mão no bolso e tirou a carta – o pergaminho era velho, o que significava que era uma carta antiga. O que poderia ser aquilo?
A carta estava endereçada a ele, e dizia simplesmente: "Harry Potter", numa letra que ele nunca tinha visto, mas era elegante e bonita. Ele a abriu com cuidado e começou a ler, sem ter idéia do que se tratava.
"Meu amado Harry,
Aqui quem escreve é sua mãe Lílian. Se você está lendo essa carta, é porque eu morri antes de você completar 17 anos. Espero que tenhamos tido algum tempo juntos, pelo menos, mas no momento as coisas estão ficando cada vez mais complicadas para Thiago e para mim. Não sei quanto tempo mais conseguiremos fugir de Voldemort. Estamos a ponto de fazer o Feitiço Fidelius para assegurar um pouco mais de tranqüilidade à nossa família, já que você é apenas um bebê.
Mas eu escrevo principalmente para lhe dar uma coisa a qual você tem total direito: a verdade. Se eu e Thiago morrermos, você não terá quem lhe diga isso, e você merece saber de tudo. Ninguém sabe da verdade a seu respeito, Harry. Thiago e eu fomos muito cuidadosos para escondê-la de todos.
A verdade é que Thiago não é seu verdadeiro pai. Provavelmente todos lhe disseram que Thiago o amava muito, e isso é verdade. Eu também sou legalmente casada com ele, mas antes dele, eu era apaixonada por um homem que se tornou um Comensal da Morte. Eu tentei dissuadi-lo de seguir Voldemort, mas ele sofria muita pressão para se unir aos Comensais. Por isso, afastou-se de mim e juntou-se ao Lord das Trevas. Comecei a namorar Thiago uns meses depois, e descobri que estava grávida daquele homem que me abandonara. Eu não podia procurá-lo, não com Voldemort tentando tão desesperadamente nos matar, portanto nunca pude falar com ele e contar a verdade. Jamais fiquei tão apavorada em minha vida, nem quando descobri que era bruxa numa casa cheia de trouxas.
Foi Thiago quem ofereceu a salvação, casando-se comigo e criando você como se fosse seu filho. Assim que você nasceu, nós colocamos diversos feitiços para fazer você ficar muito parecido com Thiago. Aposto como as pessoas dizem o tempo todo para você o quanto você é parecido com Thiago, mas isso é tudo obra de feitiços. A partir desse ano, eles devem começar a perder a força e você deverá ficar gradualmente cada vez mais parecido com seu verdadeiro pai. Não sei se ele estará vivo, pois vivemos em tempos difíceis, meu filho. Mas acho que você deve saber o nome dele. Ele é Severo Snape, um homem a quem amei muito, mas que tinha muitas cicatrizes emocionais. Você agora tem 17 anos, e é um adulto, portanto pode fazer o que quiser. Se quiser procurá-lo, caso ele esteja vivo, lembre-se de que ele escolheu o caminho das Trevas, e provavelmente nunca ouviu falar de você. Não é culpa dele.
Para que você soubesse ao menos sua verdadeira origem, Thiago e eu resolvemos deixar essa carta no banco Gringotts, para ser entregue no dia em que você completar 17 anos. Também resolvemos abrir um cofre para você. O dinheiro é de Thiago, e ele lhe deu de coração. Ele o ama como um verdadeiro pai, e você sempre terá um lugar no coração de Thiago Potter.
Perdoe os atos de uma mãe desesperada, mas tudo que eu fiz foi pensando somente no seu bem-estar. Eu te amo muito, Harry, e faria qualquer coisa por sua felicidade. Espero que sua vida seja cheia de sucessos, mas acima de tudo, espero que você seja muito feliz em qualquer coisa que resolver fazer.
Sua mãe,
Lílian"
Harry leu e releu a carta mais de cinco vezes, às vezes com lágrimas que escorriam por suas bochechas, às vezes com uma raiva que parecia querer explodir dentro de seu peito. E depois releu mais tantas vezes, sempre experimentando emoções diferentes.
Ele ignorou as corujas que traziam presentes de seus amigos e o tradicional bolo de aniversário de Hagrid. Ele guardou tudo aquilo no buraco escondido pela tábua solta do assoalho de seu quarto.
Ele não tinha o pai que pensava ter e seu verdadeiro pai era a última pessoa que pensava que poderia ser.
Como aquilo poderia ser possível?
Ele olhou para o relógio e viu que estava trancado no seu quarto já fazia mais de três horas. Três horas desde que sua vida tinha mudado de cabeça para baixo
Edwiges voou para dentro do quarto e pousou de maneira gentil no ombro dele, dando-lhe bicadas afeiçoadas na orelha. Harry estava com os olhos vermelhos de tanto chorar e a cabeça doendo de tanto pensar. Os seis anos de Hogwarts lhe passaram pela cabeça. Todas as vezes que Snape o tratara mal, todas as vezes em que ele o tinha humilhado...
Meu pai me odeia.
E como isso tudo tinha sido escondido dele?
Ele tinha tanto que pensar, tanto que pensar...
Pensou em escrever para Rony e contar tudo, mas ele já podia ver a resposta. Rony faria cara de nojo e escreveria: "Ew! O babaca seboso é teu pai? E você vai ficar parecido com ele? Ew!"
Harry arregalou os olhos e foi se olhar no espelho que ficava dentro de seu guarda-roupas. Olhou para seu rosto e não viu nada mudado. Talvez sua mãe estivesse errada... Talvez ele não fosse filho de Snape, afinal... Ele não queria ser filho de Snape!
Quem sabe ele poderia escrever para Hermione. "Harry, você tem que se aproximar dele e esquecer tudo o que aconteceu... Ele é seu pai", diria Hermione, sabendo direitinho que tudo que Harry queria era a maior distância possível entre ele e o Mestre de Poções.
Não, ele não estava nem um pouquinho a fim de escrever para Hermione sobre isso.
Mas ele tinha que contar para alguém! Alguém tinha que falar com ele sobre isso, se não ele iria explodir.
Quem sabe Sirius? Sirius era seu padrinho, ele iria ajudá-lo.
"Desculpe, Harry, mas se o Ranhoso é seu pai, então isso significa que você não é mesmo meu afilhado. Provavelmente Lúcio Malfoy é seu novo padrinho E já que estamos falando disso, poderia devolver aquela Firebolt que eu te dei?"
NÃO!
Como ninguém sabia disso? Como eles conseguiram esconder isso de todo mundo?
Não. Alguém tinha que saber.
Dumbledore. Sim, Dumbledore! Se é que tinha alguém que sabia de tudo o que se passava, era Dumbledore!
Ele se sentou na sua escrivaninha, pegou um pedaço de papel e disse:
- Edwiges, pronta para dar uma voltinha antes do jantar?
Ela abriu as asas ruidosamente e foi para o seu poleiro.
- Então espere um pouco.
Harry começou a escrever.
"Professor Dumbledore,
Acabo de ter uma surpresa no meu aniversário. Meu verdadeiro pai não é Thiago Potter, mas sim Severo Snape. O senhor já sabia disso, não sabia? Por que nunca me contou?
Gostaria de uma resposta o quanto antes, por favor,
Harry Potter"
Harry sabia que era um bilhete danado de curto, mas ele não sabia o que mais poderia escrever sem despejar uma avalanche de insultos contra o diretor de Hogwarts. Dumbledore tinha escondido dele a verdade sobre a profecia que o ligava a Voldemort, e Sirius quase tinha sido morto por causa disso. Desde então, Harry tinha uma mágoa profunda em relação ao velho bruxo.
Ele dobrou o papel e aproximou-se de Edwiges, dizendo:
- Espero uma resposta rápida, Edwiges. Fique puxando a barba dele até ele responder!
A coruja piscou os grandes olhos amarelos e alçou vôo graciosamente, atravessando a janela e rumando para o norte. Harry ficou acompanhando-a e olhando para a tarde que começava a morrer em Little Winghing, sem ter sua mente fixa em nada específico. Ele ainda estava um pouco em choque com tudo que acontecera.
Naquela noite, ele não conseguiu nem comer nem dormir. Primeiro por causa de tudo que estava martelando em sua cabeça. Segundo porque Duda tinha resolvido comemorar seu aniversário usando todos os presentes ao mesmo tempo – inclusive instalando seu terceiro computador. Harry, claro, não tinha nenhum: nem os computadores antigos, nem os PlayStation antigos. Terceiro porque tia Petúnia aparentemente tinha se esquecido de chamá-lo para jantar. Ele terminou comendo o bolo de aniversário que Hagrid lhe mandara.
Passar a noite em claro não era das experiências mais agradáveis do mundo, especialmente com a notícia de que seu verdadeiro pai era um babaca seboso, mal-humorado e sem coração chamado Severo Snape. Harry não conseguiu pregar o olho e para piorar tudo, sentiu sua cicatriz arder.
Hoje não, Voldie. Harry está com muitos problemas, pensou, mas por via das dúvidas resolveu praticar os exercícios de Oclumência que finalmente, depois de um ano, ele tinha conseguido dominar – graças à insistência de Snape. Pensou que aqueles exercícios eram mais necessários do que nunca. Tudo que ele precisava agora era que Voldemort soubesse da sua mudança de paternidade.
Capítulo 2 – A Ordem da FênixO dia mal tinha amanhecido quando ele ouviu um farfalhar de asas na janela. Virou-se, e viu não Edwiges, mas sim Fawkes, todo glorioso e magnífico em suas penas douradas e vermelhas, pousado no parapeito da janela. Bem se via que ele tinha renascido há poucas semanas.
- Fawkes! Vamos, entre! Quer um pouco d'água?
A fênix voou para junto de Harry e ele viu um bilhetinho preso na perna. Mas quando ele foi pegar, a porta se abriu e tia Petúnia disse:
- Pode acordar, ande – ela se deteve ao ver a fênix – Que bicho é esse? Onde está a coruja?
Harry disse:
- Ele só está de passagem.
- Não quero você conversando com seus amigos anormais! – disse ela, com os lábios repuxados – Nós estamos de saída e só devemos voltar de noite. Procure se comportar e não sair do seu quarto.
- Então devo ir ao banheiro agora?
- Insolente! Eu não quero você andando por toda a casa, fazendo bagunça. Eu sei que vou pedir muito de você, mas comporte-se!
E saiu, batendo a porta. Harry não sabia para onde os Dursley estavam indo, mas ouviu com alívio quando eles tomaram seu café, empacotaram o carro e saíram da vista dele. Ele finalmente teve uma chance de abrir o bilhete trazido por Fawkes, que ainda estava no seu quarto.
Era ainda mais curto do o que Haryr tinha enviado.
"Prepare-se. Estamos a caminho", era só o que dizia, na letra característica de Alvo Dumbledore, reconheceu Harry. O conteúdo do bilhete o fez arrumar seu malão e esperar pelo que chegou em apenas alguns minutos: um destacamento da Ordem da Fênix para levá-lo a Largo Grimmauld. Dessa vez eram apenas três bruxos: Tonks, Remo Lupin e Olho-Tonto Moody.
Este último, aliás, não estava nada satisfeito com a missão:
- É muito arriscado, digo eu. Mover o garoto só por causa de um boato. Ou talvez tudo seja imaginação do menino.
Harry se irritou:
- Não é um boato! Eu não estou imaginando nada disso!
- Bom, mas nós vamos saber tudo sobre ele mais tarde, eu suponho. Vamos, garoto, fique quieto para que eu possa aplicar o Feitiço Desilusório.
E lá se foram todos voando, como da primeira vez que Harry foi até o Largo Grimmauld, só que dessa vez em plena luz do dia. Foi difícil se esconder dos trouxas com o sol a pino, mas os quatro finalmente chegaram a seu destino. Harry entrou na casa pé ante pé, mas Tonks informou, sabendo por que ele fazia isso:
- Não precisa se preocupar com a Sra. Black. Moody conseguiu desfazer o feitiço que prendia o quadro dela na parede.
Harry olhou para a parede e viu uma mancha amarelada no lugar onde o grande quadro estava pendurado. Ele não sentia nenhum remorso: a Sra. Black gostava de lançar os piores insultos a todos que entravam na sua casa para tramar contra Voldemort, a quem toda sua família dava apoio – exceto Sirius e Andrômeda, é claro.
Lupin levou as bagagens de Harry para cima, quando Tonks explicava, levando-o para a biblioteca:
- Dumbledore ficou de providenciar a vinda dos Weasley se possível. Por enquanto você e Sirius estão sozinhos na casa.
- Harry! – Sirius abriu os braços e um sorriso ao ver o afilhado entrando na biblioteca – Que bom que você veio!
Os dois se abraçaram, e Harry sentiu-se genuinamente feliz em ver Sirius. Ele parecia um pouco mais gordo, os cabelos mais curtos. Estava na cara que ele passara um bom ano desde a Batalha do Departamento dos Mistérios. Harry não tinha engordado coisa alguma, nem crescido. Ele ainda tinha uma carinha de adolescente, apesar de todos os apertos que tinha passado em sua jovem vida.
- É bom ver você também, Sirius.
- Dumbledore está terminando uma reunião da Ordem da Fênix ali e logo vai se juntar a nós para discutirmos essas suas notícias. Por que não escreveu para mim?
Harry sentiu suas faces se avermelhando:
- Eu achei que... não quisesse mais falar comigo.
Sirius parecia preocupado:
- Harry, que bobagem. Se você tem um problema, você pode falar comigo. Você sabe disso, não sabe?
- É, mas... eu sei lá.
- Eu sei, você estava confuso.
Uma voz diferente disse da porta:
- E não era para menos. Qualquer um ficaria confuso diante dessas notícias.
Os dois se viraram e viram o Prof. Dumbledore parado na entrada, enquanto atrás dele algumas pessoas iam em direção à porta, muitas delas pessoas que Harry jamais parecia ter visto. Todos eram bruxos, ele sabia, mas alguns estavam vestidos em roupas de trouxa, talvez para não chamar a atenção.
- Prof. Dumbledore – cumprimentou Harry – O senhor respondeu mesmo rapidamente.
- Não posso negar que você chamou minha atenção com aquele bilhete, Harry. Vamos, sente-se. É ainda bem cedo, quem sabe você gostaria de tomar uma xícara de chá?
- Eu aceito, obrigada.
Tonks, que estava atrás deles, ofereceu-se:
- Eu faço!
E saiu. Sirius fechou a porta e os três sentaram-se nas poltronas antigas de couro que cercavam a biblioteca. Dumbledore disse:
- Agora diga, Harry: como você tropeçou naquela informação extraordinária?
- Minha mãe me deixou uma carta que eu só deveria ler no meu 17º aniversário. Ela contou tudo que aconteceu. Por que ninguém nunca me disse nada? Por que me mentiram nesses anos todos?
Tudo que Dumbledore disse foi:
- Você tem essa carta com você? Será que eu poderia vê-la, por favor?
Harry a tirou de dentro do bolso e entregou-a a Dumbledore. Sirius foi vê-la também, e os dois pareciam admirados.
- É a letra de Lílian, sim – confirmou ele – A carta é autêntica.
- Extraordinário – repetiu Dumbledore, admirado – Vocês conseguiram esconder muitas coisas de mim.
Sirius disse:
- Dessa vez eu não tenho nada a ver com isso. Thiago e Lílian esconderam isso de todos nós.
Sentindo-se negligenciado, Harry quis saber:
- Então vocês não sabiam? Mas como não sabiam de uma coisa dessas?
- Eles simplesmente não contaram para ninguém, Harry – disse Sirius – Provavelmente para proteger você.
- Para me proteger?
Dumbledore explicou:
- Se Voldemort soubesse que o menino da profecia era filho de um de seus Comensais, ele teria pedido sua cabeça numa bandeja de prata. Seu verdadeiro pai teria sido obrigado a arrancar você de Lílian e entregado a Voldemort para ser sacrificado.
Harry indagou:
- Ele faria isso?
- Sim – disse Dumbledore pesadamente – Há algumas coisas sobre Severo que você não sabe. Uma delas é que ele já estava pensando em deixar Voldemort quando os Potter foram mortos. Foi ele que deu o alarme de que Voldemort estava atrás deles. Ele sempre protegeu você, Harry, mesmo quando você ainda era um bebê.
Aquilo não arrefeceu a raiva de Harry, que se sentia traído até o último fio de cabelo:
- Ele nunca gostou de mim! Isso não é verdade, nada disso! Mamãe estava errada! Meu pai é Thiago Potter!
A porta se abriu e Lupin entrou:
- Queria falar comigo, Dumbledore?
- Sim, Remo. Acho que você pode esclarecer muito as coisas, já que aparentemente todos gostavam de me deixar de fora sobre o que estava acontecendo. Eu gostaria que você contasse a Harry a respeito de Lílian.
O ex-professor de DCAT franziu o cenho:
- Mas eu já falei a ele bastante no terceiro ano.
- As coisas mudaram, Remo. Harry quer saber sobre Lílian e Severo.
- Oh – fez Lupin – Oh, bem. Claro que ele um dia ia saber. Mas isso não tem nada a ver, Harry, não houve nenhuma conseqüência desse namoro.
Sirius fez um ruído de gozação e disse:
- Remo, tem uma conseqüência de 17 anos na sua frente que está muito ansioso por informações.
- Do que está falando? O que é que você – interrompeu-se – Oh! Não! Não pode ser verdade!
Dumbledore disse:
- Lílian deixou uma carta explicando tudo.
Lupin ainda estava boquiaberto:
- Mas... e Thiago? Ele era doido por Harry. No primeiro Natal, ele comprou uma vassourinha de brinquedo para você, Harry, e vocês dois ficavam fazendo a vassourinha voar pela casa inteira. Lílian tentava ficar brava com a bagunça que vocês aprontavam, mas quando ela via a carinha que você fazia ao ver a vassourinha voando... – Ele saiu do momento do passado – Está querendo me dizer que Thiago não é... não é...
- Não é meu pai – completou Harry – Isso segundo minha mãe disse nessa carta que eu recebi ontem.
- E seu verdadeiro pai é... Severo? Isso seria... extraordinário.
Dumbledore insistiu:
- Mas não de todo impossível, quero crer?
Lupin ainda estava chocado, mas disse, olhando diretamente para Harry:
- Lílian me ajudou muito num momento de necessidade. Sua mãe tinha o dom de ver o melhor que as pessoas tinham dentro de si, mesmo que elas mesmas não conseguissem ver isso.
- Você já me disse isso – disse Harry.
- E você pensou que eu estivesse falando de mim mesmo, mas o mesmo se aplicou a Severo. Ela não hesitou em dar ao jovem Severo um ombro amigo e muito conforto diante de tudo que Thiago e Sirius o faziam passar. No começo, ele a xingava, mas algo nela o fez amolecer, e eles se tornaram amigos no sexto ano. Essa amizade só se aprofundou, mas Lílian só contou isso para mim. Thiago e Sirius jamais deixariam Severo em paz se soubessem. Então eles namoraram às escondidas. Eu mesmo não posso lhe dizer muita coisa sobre esse tempo, Harry, porque Lílian só me contou fazendo-me prometer que eu jamais diria nada para Sirius ou Thiago, ou eles iriam implicar com Severo. Eu não sei como é hoje em dia, mas naquele tempo, havia muita rivalidade entre as casas, especialmente entre Grifinória e Sonserina – especialmente devido à ascensão de Voldemort.
- E foi isso que os separou – Voldemort?
Lupin assentiu, continuando:
- Lílian sofreu muito quando Severo se juntou a Voldemort. Eu soube que eles terminaram, mas logo Thiago começou a namorá-la. Ela engravidou e eles se casaram, mas eu nunca poderia supor que o filho não era de Thiago. Na verdade, eu me lembro de ter ficado feliz porque Lílian parecia ter esquecido Severo e seguido adiante com sua vida. Você me pareceu uma bênção, Harry, pois assim ela definitivamente deixaria Severo para trás. Sem contar que agora ela era mulher de um de meus melhores amigos, e isso tudo me pareceu um final perfeito.
Harry se virou para Sirius:
- Então você não sabia que eles namoraram?
- Eu só soube mais tarde, Harry – disse Sirius – E eu me lembro de ter ficado furioso com Snape. Quase fui tomar satisfações com ele, mas Thiago me fez desistir, dizendo que não valia a pena. Agora pensando bem, acho que Lílian estava grávida, e Thiago disse que não queria aborrecê-la com coisas que tinham ficado no passado. Mas eu não perdi a oportunidade de enchê-lo de desaforos quando ele me... procurou, muito tempo depois.
- Ele procurou você?
- Para avisar que Voldemort estava atrás de seus pais. Eu disse coisas horríveis para ele.
- Coisas horríveis?
- Eu disse para ele se afastar de Lílian, e que ela agora era mulher de Thiago e tinha um filho para se preocupar. Claro, eu disse outras coisas também – sabendo que ele era um Comensal. Ele também me disse coisas horríveis.
- Snape?
Sirius assentiu:
- Ele xingou sua mãe de... você sabe, de... sangue-ruim.
Harry já tinha visto Snape fazendo isso, quando ele viu a memória na penseira, no quinto ano. Mas outra coisa o preocupava naquele momento:
- Ele... não sabia.
Dumbledore disse:
- Está claro que não sabia, Harry, e eu tenho certeza de que ele não sabe até hoje. Como todos nós. Foi um segredo que Lílian e Thiago levaram com eles.
Harry abaixou a cabeça. Ele não sabia o que pensar. Dumbledore chegou perto dele e disse:
- Harry, você é livre para fazer o que quiser com essa informação. Você pode escolher ignorá-la, mas eu não acho que isso será justo com um homem que sequer sabe que é seu pai. De qualquer forma, essa informação não sairá dessa sala, você sabe. Mas você tem um pai, e acho que gostará de saber como é ter um, já que você nunca teve.
A raiva cresceu dentro de Harry ao sentir que Dumbledore mais uma vez o manipulava para algo que ele ainda não tinha certeza. Era isso que o bode velho fazia: manipulava as pessoas.
Num impulso, Harry gritou:
- Meu pai me odeia! Em que isso é melhor do que não ter um pai?!
Lupin disse:
- Harry, ele nem sabe que você é filho dele. Não o julgue sem –
A raiva de Harry só aumentou:
- Ele já me julgou! Desde o primeiro dia que colocou os olhos em mim! E ele me odeia!
- Você sabe que isso não é verdade – insistiu Lupin, chegando perto do rapaz – Você precisa dar a ele pelo menos uma chance de conhecer a verdade.
Harry calou-se e abaixou a cabeça, pois as lágrimas ameaçavam saltar de seus olhos. Lupin abaixou a voz e insistiu:
- Ele pode ter rejeitado o Harry que ele pensava ser filho de Thiago, mas ele não rejeitou o Harry filho de Snape. Compreendo que você esteja com medo de uma rejeição que lhe parece provável, mas isso não é muito justo, e eu nunca soube que você fosse uma pessoa injusta, Harry. Ser injusto simplesmente não é grifinório.
Uma mão se colocou no ombro de Harry e Sirius disse:
- Nós estamos do seu lado, Harry. Pode contar conosco.
Uma lágrima caiu de seus olhos e Harry rapidamente a secou. Ele indagou:
- Posso contar a Rony e Hermione?
- O segredo é seu, Harry, você pode contar a quem quiser – disse Dumbledore – Mas tenha em mente uma coisa: se isso parar nos ouvidos de Voldemort, o risco aumenta não só para você, mas também para Severo.
Harry percebeu a importância do que estava acontecendo ali e disse:
- Entendo. Mas eu gostaria de um tempo para pensar nisso.
- Claro. Não há pressa. Severo está numa missão para Ordem, e deve demorar algum tempo. Seria interessante que você usasse esse tempo para pensar.
Aquilo pareceu bastante razoável a Harry, que disse:
- Sim, senhor.
Sirius tentou animá-lo:
- Ei, que tal uma atividade divertida? Quer me ajudar a alimentar Bicuço? Tenho certeza de que ele vai ficar feliz em vê-lo.
Harry sorriu, feliz de estar com seu padrinho.
Sem saber, claro, por quanto tempo Sirius ainda seria seu padrinho.
Capítulo 3 – Primeiro contatoHarry estava arrumando seu quarto na manhã seguinte quando ouviu uma voz conhecida na porta de seu quarto:
- Harry!
- Rony!
- Cara, o que é que você está fazendo?
- Dando um jeito por aqui! Eu vou passar o resto do verão com Sirius!
- Que legal!
- Quanto tempo você pode ficar?
- O resto do verão também. De alguma maneira, Dumbledore convenceu minha mãe que eu viesse sozinho. Gina só chega uma semana antes das aulas começarem. Você sabe, só falta nós dois para nos formarmos em Hogwarts.
- Fred e Jorge deram notícias da loja?
- A Geminialidades Weasley está entrando no seu segundo ano com um ano promissor adiante. Essa é a época do ano que eles têm maior movimento. Sabe que eles estavam querendo colocar uma foto sua na parede da loja?
- Minha? A troco?
- Ora, afinal, você foi praticamente sócio-fundador do investimento. Se não tivesse doado o prêmio do Torneio Tribruxo...
- Eu disse que eles deveriam fazer as pessoas rirem, e é só isso que eu quero. E pode ir esquecendo essa história de retrato na parede.
- Como você conseguiu vir para cá? E os seus tios?
- Eles devem ter recebido um aviso de que eu iria direto para Hogwarts. Minha tia viu um duende de Gringotts e ficou possessa. Foi bom mesmo eu ter saído de lá. Eles iriam ficar cada vez mais nervosos.
- Um duende de Gringotts? Mas eles não deixam o banco. Meu irmão falou que é raro eles terem uma entrega especial para fazer.
- Pois eles fizeram uma entrega desse tipo na minha casa faz dois dias.
- Por quê?
Em pouco tempo, Harry contou tudo a Rony, inclusive a conversa com Sirius, Lupin e Dumbledore na manhã do dia anterior. A reação do amigo ruivo foi previsível:
- Cara, eu é que não queria estar na sua pele. Filho do Snape? Ew!
- E eu vou ficar parecido com ele! Os feitiços que me deixavam parecido com Thiago Potter vão se dissolver.
Os olhos marrons de Rony se arregalaram:
- Não aquele nariz! Você não pode acabar com aquele nariz!
- Eu juro que mudo aquele nariz com mágica – disse Harry – Mas eu ainda tenho minhas dúvidas.
- Você acha que sua mãe pode ter se enganado?
Harry assentiu:
- É que eu sou tão parecido com Thiago, e não é só fisicamente, entende? Sou Apanhador que nem ele... Tenho esse talento para encontrar problemas que nem ele... Meu Patrono é um veado, e ele era um veado como animago. E o Chapéu Seletor me colocou em Grifinória.
- Mas você falou que ele queria te colocar em Sonserina, e você foi quem escolheu Grifinória.
Harry estava muito inseguro quando abaixou a voz e indagou:
- Rony... Você acha que isso é verdade? Será que eu sou filho do Snape?
O ruivo deu de ombros:
- Eu não sei, cara. Você não parece ser filho dele nem em sonho. Quem sabe você faz um daqueles testes que os trouxas fazem, sabe? Panamá? PMA? RNA?
- DNA – corrigiu Harry – É, isso é uma boa idéia, Rony. Mas a mamãe ia saber direito quem é o meu pai, não é? Você leu a carta.
- Ah, Harry, eu não sei. Você não tem nada em comum com Snape. Ela pode ter se enganado.
- É que eu fico pensando...
- O quê?
- Se fosse diferente, se eu tivesse uma outra mãe ao invés de outro pai, eu não seria parente dos Dursley e nunca mais precisaria voltar para Little Winghing.
- É, mas parece que a única certeza que você tem é que você tem sangue dos... dos... como é mesmo o nome de sua mãe?
- Evans. Eles eram trouxas.
- Isso. Você tem sangue Evans – Rony meneou a cabeça – Deixa eu te dizer, Harry, você realmente tem atração por problemas.
- É – suspirou Harry, fazendo uma careta – E isso tudo tem que permanecer secreto, Rony. Pelo que Dumbledore falou, se Voldemort – Rony deu uma estremecida de leve – souber disso, vai pensar que todos seus aniversários chegaram ao mesmo tempo.
- Tudo bem, eu não falo nada. Mas e a Hermione?
- Eu vou falar com ela depois, claro. Não teria como esconder isso dela. Ela ia terminar descobrindo de qualquer jeito!
- É, ela é danada. Mas vamos falar de outra coisa. Soube que As Esquisitonas estão para lançar um CD trouxa!
- Puxa, jura?
- Eu vou ter que ouvir num diskwalk.
- É diskman. Um tocador de CD portátil.
- É isso! Puxa, não é à toa que meu pai adora falar com você. Você sabe de tudo que é coisa trouxa!
Durante as próximas horas, os garotos puseram a se comportar como dois rapazes de 17 anos, rindo e brincando, até que Sirius os chamou para ajudar no jantar. E foi durante o jantar que Sirius disse:
- Ouvi Moody dizer que vai haver uma reunião da Ordem da Fênix essa noite.
Harry disse:
- Tudo bem, Rony e eu vamos lá para cima.
- Snape estará presente.
Harry ficou parado um minuto, sem saber direito como reagir.
- Eu posso pedir que ele fique um pouco mais, depois que a reunião acabar – continuou Sirius, olhando para Rony, que tinha arregalado os olhos – Isto é, se você quiser, Harry.
Agora os dois olhavam para Harry, que sentiu uma tonelada de borboletas se alojando repentinamente em seu estômago – e nada disso tinha a ver com o cozido que Sirius preparara para o jantar.
- Bom, eu... Eu acho que vou querer, sim, Sirius.
- Tem certeza, cara? – disse Rony – Ninguém vai dar bronca em você se não quiser.
- É uma coisa que eu tenho que fazer, Rony. E não adianta eu ficar adiando muito.
Sirius abriu um sorriso:
- Esse é meu garoto. Eu posso ficar com você quando você for falar com ele.
- Não, Sirius, obrigado. Eu... acho que tudo ficará melhor se nós ficarmos sozinhos.
- Olhe, Harry, eu ficarei por perto, se ele começar a dificultar sua vida. Você sabe, daquele jeito dele.
- Obrigado.
Sirius arrumou para que eles se encontrassem na biblioteca, o mesmo lugar onde Harry se reunira antes com Lupin, Sirius e Dumbledore. Aquele parecia ser o cômodo da casa onde as revelações eram feitas.
- Seu querido padrinho disse que você tinha um assunto importante para falar comigo – disse Snape, olhando para Harry com ar superior – Eu mal imagino o que possa ser.
Harry olhou para ele, as borboletas no estômago todas alvoroçadas ao mesmo tempo. Ele entregou a carta e disse:
- Eu recebi isso há dois dias. Acho que vai preferir ler.
Com ar de quem estava ali a contragosto, Snape pegou a carta, dizendo:
- Duvido muito.
Mas as feições no rosto de Snape foram se modificando à medida que ele lia a carta. As borboletas no estômago de Harry dançavam tresloucadamente, e ele passou a torcer as mãos uma na outra.
Snape terminou de ler a carta, dobrou-a e entregou-a de volta, indagando cuidadosamente – mas sem aparência hostil:
- Isso é alguma brincadeira, Potter?
- Não é brincadeira coisa nenhuma – disse o rapaz, tentando se controlar – Estava guardada durante todos esses anos no banco Gringotts. Um duende veio entregar. Quase matou minha tia de susto.
- Mesmo? – Snape se ergueu e andou pela biblioteca – Alguma chance dessa carta ser forjada?
- Eu acho que não, senhor. Remo Lupin disse que a letra é de minha mãe.
Snape concedeu:
- A letra é mesmo muito parecida. Ainda que ela tenha sido mesmo escrita por sua mãe, nada assegura que as informações estejam corretas. São informações às quais eu nunca... tive acesso.
"Ou seja, em língua de Snape, isso quer dizer que ele não sabia de nada", pensou Harry. Em voz alta, ele disse apenas:
- Eu estive pensando: os trouxas têm um teste chamado exame de DNA que é certo em quase 100% dos –
- Trouxas? – Snape rosnou, com desprezo – Besteira. Nós, bruxos, temos um Feitiço de Paternidade que não deixa dúvidas. Normalmente não há necessidade de se aplicar esse teste, porque um elo como uma gravidez geralmente implica casamento. A sociedade bruxa é extremamente conservadora nesse aspecto. Há também as conseqüências da execução do feitiço.
- "timo! – Harry ficou aliviado – Podemos fazer esse teste de paternidade e –
- Não tão depressa, Potter – interrompeu Snape – Feitiços de Paternidade são realizado por curandeiros de St. Mungos com credenciais do Ministério da Magia. A realização de um feitiço desses é questão pública, por afetar a linhagem de famílias bruxas.
- Oh – fez Harry – E isso sai publicado em algum lugar ou coisa assim?
- No Profeta Diário.
- Não tem jeito de se fazer isso em segredo?
- Não. A exemplo do Veritaserum, o Feitiço da Paternidade também requer uma poção e uma autorização do Ministério da Magia para sua execução. Mas a princípio isso pode ser arranjado. Eu... possuo certos contatos no Ministério. Mas é importante você saber que uma vez executado o feitiço, a decisão é final. Você passa a ser reconhecido como filho para todos os propósitos práticos, mágicos e legais.
- Como assim?
Com um suspiro alto que pareceu muito próximo de estar falando "idiota", Snape explicou como se estivesse em sala de aula:
- Deixe-me explicar devagar, Potter, e quem sabe se você apreende da primeira vez: uma vez executado o feitiço, se o resultado for positivo, você deixa toda e qualquer ligação com seu pai Thiago Potter. Você passa a ser meu herdeiro para todos os propósitos legais. Serei seu guardião e certamente poderei apontar um novo padrinho para você. Além disso, você passa a desfrutar de um elo comigo de tal intensidade que qualquer mágica feita contra mim pode afetá-lo e vice-versa. Claro, não estou falando de uma mera azaração entre adolescentes, mas sim de uma maldição Inominável ou coisa desse calibre.
O menino quis saber:
- E isso acontece com todos os pais e filhos?
- Não, só com aqueles que fizeram o Feitiço da Paternidade. Por isso pense bem antes de sugerir que esse feitiço seja feito, Potter.
- Mas o senhor vai querer fazer o feitiço, não vai? Digo, para ter certeza.
- Potter – disse ele, mais uma vez dirigindo-se a ele como se estivesse explicando uma poção bem complicada –, as repercussões do que você acaba de me dizer vão muito além da mera necessidade de confirmação. Isso pode afetar o equilíbrio das forças da Luz e das Trevas na batalha final contra o Lord das Trevas. Espero que você tenha ao menos se dado conta disso.
- Claro que eu sei que Vold –
- Não diga o nome dele!
Harry se corrigiu:
- Eu sei que Você-Sabe-Quem vai adorar saber disso. Mas fora isso o que mais pode...?
Snape o interrompeu:
- Se você ainda não sabe, eu sugiro que pense nisso com afinco, Potter. Infelizmente, essa conversa deve se encerrar nesse momento. Eu tenho uma missão a cumprir e estou premido pelo tempo.
- Sim, senhor.
- Vou pensar numa solução para o Feitiço da Paternidade – anunciou – Aguarde notícias minhas. Acredito que você vai permanecer com seu padrinho, estou certo?
- Sim, senhor.
- "timo. Procure manter-se seguro.
Snape virou-se, as capas esvoaçando, e deixou a biblioteca. Sirius estava perto da porta e os dois se olharam por alguns segundos. Mas havia alguma coisa diferente. Eles sempre se odiaram, mas naquela hora, havia algo acima do ódio. Sirius estava com medo – medo de perder Harry. Snape não disse coisa alguma e saiu pela porta afora.
Capítulo 4 – Uma noite com os DursleyHarry teve que contar tudo que acontecera a Rony, e aquele ficou uma espécie de assunto implícito entre os dois durante o dia inteiro. Mas no dia seguinte, Harry foi ver Bicuço, e reclamou:
- Estou entediado. Queria poder fazer alguma coisa diferente.
- Snape não voltou mais – lembrou Rony – Bom, mas faz pouco tempo. Foi só ontem.
- É. Sabe que eu estou pensando no que ele disse?
- Harry, você não fala de outra coisa.
- É, mas... Rony, e se ele for mesmo o meu pai?
- Se ele for – Rony deu de ombros –, eu tenho que te pedir desculpas por tê-lo chamado de babaca sebosão.
Harry também deu de ombros:
- Pior é que ele mereceu.
- Será que agora ele vai te tratar melhor?
- Bom, a gente conseguiu conversar na biblioteca. Eu tinha dúvidas se isso seria possível.
- Acho que ele estava em choque.
- É, pode ser – disse Harry – Mas eu preciso pensar numa outra coisa. Vou acabar ficando louco se continuar preso aqui dentro. Já sei: vamos sair! Vamos andar no mundo trouxa. Você quase não conhece.
- Está louco? Sirius não vai deixar.
- Não vamos saber disso se não pedirmos.
Mas ao contrário do que eles imaginaram, Sirius achou uma excelente idéia, mesmo fazendo mil recomendações: eles deveriam sair sem chamar a atenção da vizinhança, tomar muito cuidado com os trouxas e estar com as varinhas sempre à mão, lembrando que eles poderiam usar o Nôitibus Andante.
Harry levou Rony para o West End, em Londres, onde estavam os grandes shopping centers, e eles se divertiram muito, seja em locais para jogos eletrônicos, seja olhando as lojas de discos. Rony, com seu problema de dinheiro, não podia comprar nada, e Harry pagou um lanche no McDonald's para os dois. Os dois estavam se divertindo muito, sem sonhar que estavam sendo vigiados por três adolescentes de índole muito má: Duda Dursley e seus comparsas.
Harry e Rony foram dar uma olhada no segundo shopping center quando Harry ouviu um grito conhecido:
- Harry Potter!
Ele arregalou os olhos verdes para Rony:
- Rony, estou ouvindo coisas! Podia jurar que meu tio estava me chamando!
- Nesse caso, Harry, eu estou ouvindo coisas também – ele apontou para a esquerda – E aquele lá não é seu tio?
Harry se virou para ver os mais de 200 quilos de tio Válter se encaminhando rapidamente na sua direção, as gorduras balançando nervosamente, acompanhado pelo mastodonte do Duda e seus dois amigos.
- Harry Potter, o que você está fazendo aqui, seu moleque?
- Eu poderia fazer a mesma pergunta! O senhor devia estar trabalhando!
- Eu tive que sair do meu trabalho para vir apanhá-lo na rua, onde está vagabundeando, com certeza com um desses marginais com quem você anda!
Rony se indignou:
- Ei! Vê lá quem você chama de marginal!
Mas o tio Válter não tinha terminado:
- Você fugiu da minha casa na calada da noite para ficar zanzando pela cidade, é isso? E o seu padrinho assassino? Afinal, onde ele é que ele se encontra?
- Ele está vindo me apanhar! – mentiu Harry – E vai trazer sua varinha assassina!
- Pois eu estou achando que isso tudo é invenção de sua cabeça! – disse tio Válter, apontando um dedo gordo para a cara do rapaz – Acho que você viu o nome daquele foragido na televisão e achou que seria divertido me enganar! Você não tem padrinho coisa nenhuma! Está mentindo para mim!
Rony tomou as dores:
- Você é quem está mentindo!
Harry disse:
- Rony, é melhor você deixar eu cuidar disso.
- Você não é um mentiroso, Harry!
Tio Válter disse, agarrando com força o braço de Harry:
- Pois você vai voltar para casa comigo agora mesmo!
- Ei! Me larga!
- Você não pode fazer isso com ele!
- Não se meta nisso, seu marginal de cabelo esquisito!
Foi quando uma voz diferente se meteu na conversa:
- O que está acontecendo aqui?
Era um guarda. Rony arregalou os olhos: ele nunca tinha visto um. Já tio Válter disse, sentindo-se superior:
- Boa tarde, seu guarda! Eu estou aqui tentando cuidar do meu sobrinho, sabe. O menino tem mania de roubar em lojas, e eu o proibi de sair, mas ele escapuliu de mim.
Harry ficou indignado:
- O quê?! Isso é uma mentira gorda!
O guarda disse:
- Respeito com o seu tio, garoto! E vê se obedece a ele.
Rony disse:
- Seu foplicial, poflicial, er… senhor, não vê que isso é uma mentira?
- Eu conheço garotos assim – disse o guarda – São comuns aqui no West End. Não se meta em assuntos de família. Pode levá-lo, senhor.
Tio Válter exibiu um sorriso triunfante:
- Obrigado, seu guarda!
Duda e seus dois comparsas estavam soltando lágrimas de tanto que riam. Harry sentiu que a coisa estava muito feia para o seu lado. Antes que tio Válter o impedisse, ele passou sua varinha para Rony e disse:
- Pegue o ônibus roxo e avise Sirius!
- Harry!
Mas era tarde demais. Com tio Válter de um lado e Duda do outro, Harry foi carregado para fora do shopping, e Rony rapidamente escapou para pegar o Nôitibus assim que pudesse, ainda espantado com o que acabara de acontecer.
Com alguma dificuldade e muitas sacudidas mais tarde, ele desceu do Nôitibus quando já era noite e entrou no Largo Grimmauld o mais rápido que pôde. Ele ouviu um diálogo ríspido vindo da sala onde a Ordem da Fênix costumava se reunir:
- Será que nada entra nessa sua cabeça densa, Black? O menino está em perigo!
- Que bobagem, Snape! Ele logo estará de volta. E ele não estava sozinho: estava com Rony. Os dois estavam entediados!
- Você é ainda mais irresponsável do que eu imaginava! Espere até Dumbledore saber disso!
Rony entrou gritando, espavorido:
- Sirius! Sirius! Depressa! É o Harry!
Os gritos atraíram Sirius, que não estava sozinho. Com ele, ambos saindo da biblioteca, estava Snape, com uma das maiores carrancas que Rony já tinha visto.
Ao ver Snape, Rony até perdeu o rebolado. O Mestre de Poções estreitou os olhos:
- Desembuche, Weasley! Onde está Potter?
- Aí é que está, Professor! Harry foi levado! – e Rony contou tudo que tinha acontecido no shopping center, até com o guarda.
Os olhos de Snape soltavam um brilho positivamente feroz ao dizer, sarcasticamente:
- Bravo, Black! Não apenas você conseguiu perder seu precioso afilhado, mas também terá que resgatá-lo da casa dos tios. Teria sido ainda mais interessante se ele tivesse sido levado por uma força-tarefa de Comensais!
Rony disse, apavorado:
- Eles vão trancar o Harry, eu sei que vão! A cara do tio dele era tão ruim quanto a – ele ia dizer "do Snape", mas conseguiu se controlar a tempo – da minha mãe quando Fred e Jorge aprontam para valer!
Sirius parecia aflito:
- Eu preciso fazer alguma coisa! Mas não posso ir! Eu não posso me arriscar a sair, Snape!
- Ah, claro – disse Snape, ainda mais sarcástico – Você poderia ser capturado e voltar para Azkaban, e isso seria uma perda irreparável. Não se preocupe, Black, eu não estava contando que você fosse fazer o resgate. Diga-me, Weasley: sabe onde moram os tios de seu amigo Potter?
Rony deu o endereço e Snape aparatou até o local. Teve sorte que era de noite, e ninguém viu um homem maduro aparecer na porta da garagem dos Dursley com um estalido alto de mágica. Snape arrumou suas capas e foi até a porta da frente. Uma mulher magra atendeu:
- Sim?
Numa voz baixa e ameaçadora, ele anunciou:
- Eu vim buscar Potter.
Tia Petúnia ficou branca e deu dois passos para trás:
- Você... você é um deles! Não! Válter! Aaaahhh!
Ela recuou, espavorida, andando de costas até chegar à escada. Snape entrou na casa e indagou, já de varinha em riste:
- Eu só vou perguntar uma vez: onde está Harry Potter?
Tio Valter apareceu no alto da escada e indagou:
- Quem é você?
Snape apontou a varinha para ele e disse:
- Não gosto de me repetir. Vim buscar Harry Potter.
- Seu... seu… anormal! – Petúnia já estava atrás do seu volumoso marido, e Duda estava tentando ver o que se passava – Saia da minha casa!
Snape ameaçou subir a escada:
- Não sem o que eu vim buscar. Diga-me... onde... está Potter.
Um raio saiu da varinha e estourou o quadro de Duda ao lado da família encurralada. Os três gritaram de susto e o foi o menino que apontou um dedo gordo, dizendo:
- Embaixo da escada. Ele está no armário embaixo da escada.
- Duda!
- Mostre-me.
Trêmulo, o garoto volumoso como o pai desceu a escada, sempre sob a mira de uma varinha, e mostrou onde ficava a porta.
- Está trancado. Meu pai tem a chave.
- Isso não será necessário – garantiu Snape – Alohomorra!
Por um minuto, Snape não teve certeza do que estava vendo, além de um ambiente escuro, empoeirado e insalubre. Firmando os olhos, ele viu nesse ambiente um garoto de 17 anos, aparentemente desacordado, enrodilhado para caber numa cama em que mal caberia um menino de 10 anos. Harry. Ele respirava com dificuldade, seu braço estava num ângulo todo errado e sua perna parecia solta.
- Potter – chamou Snape – Potter!
Sem resposta.
Uma raiva negra e devastadora foi subindo pelas estranhas do Mestre de Poções. Na sua voz mais devastadora, ele perguntou aos Dursley:
- O que há com ele?
Tio Válter ficou vermelho e estufou o peito, dizendo:
- Nada!
Snape apontou a varinha com determinação contra ele, insistindo:
- O que vocês fizeram com ele?
- Ele só caiu da escada – disse tio Válter – É um idiota desajeitado!
A raiva subiu mais ainda e Snape se dedicou a retirar o rapaz de dentro do armário com cuidado, sem acordá-lo. Harry pareceu sentir um mínimo de dor. Snape conjurou uma maca e pousou Harry suavemente nela. Os Dursley se apavoraram ao ver mágica em ação, e Snape sentiu que isso podia ser uma vantagem. Ele apontou a varinha diretamente contra o garoto balofo:
- Você! Venha aqui.
Tia Petúnia gritou:
- Deixe meu Dudinha em paz!
A varinha de Snape mudou de alvo e um raio atingiu Tia Petúnia. Imediatamente os dois outros olharam para ela e viram quando ela simplesmente parou de se mexer, apenas os olhos continuavam indo de um lado para o outro, rapidamente. Havia pavor nos olhos dela.
- Petúnia!
- Mamãe...!
Snape se virou para Duda e ameaçou, numa voz baixa:
- Prefere receber o mesmo tratamento ou vai me contar o que realmente aconteceu?
Apavorado, chorando, o menino respondeu:
- H-Harry estava no q-quarto, de c-castigo. Mas aí a coruja dele chegou fazendo barulho, e papai se irritou muito. Tirou Harry do quarto e disse que ia trancá-lo no armário. Harry protestou e papai deu um chute nele, e ele rolou pela escada abaixo. Ele chegou lá no chão embaixo e chegou a se levantar, mas ele estava tonto e meio verde. Aí ele vomitou um pouco no chão, e... e... bom, papai ficou muito bravo por causa da sujeira.
Snape quis confirmar:
- Ah, ele ficou bravo?
Os dois Dursley estremeceram de pavor. Petúnia, se pudesse, teria feito o mesmo, mas piscou apavorada.
Duda terminou rapidamente:
- Depois papai trancou Harry no armário.
Snape ressaltou:
- Potter aparentemente tem uma perna quebrada e um braço com uma severa luxação. Ele não poderia ter andando até dentro do armário – Duda tremeu ainda mais – Então, pergunto, como ele chegou até o armário? Diga!
- Papai –
- Duda!
- ... chutou ele para dentro. Com força.
Num acesso de raiva, Snape apontou a varinha para o garoto e ele começou a se erguer no ar. Com os braços abertos, apavorado, ele começou a gritar e a tentar se agarrar em qualquer coisa perto, mas foi flutuando lentamente até o teto, onde ficou parado, chorando.
Snape disse, sarcástico:
- Reze para que nenhuma corrente de ar o leve para fora. Não sei aonde iria parar.
Duda teve suas memórias modificadas, então ele não podia se lembrar do que tinha acontecido há três anos com sua tia Guida, ou saberia que ele estava bem parecido com ela – exceto que ele não estava inflado. Harry tinha provocado o acidente com tia Guida no terceiro ano, quando ela tinha insultado os pais de Harry. Tia Guida ela tinha saído voando pela janela e só tinha sido encontrada ao sul de Sheffield, segundo Harry soubera mais tarde.
Quando Duda pareceu se estabilizar no teto da sala, Snape apontou sua varinha para tio Válter e os olhos pretos do Mestre de Poções brilharam sinistramente:
- E agora? Que devo fazer a você para ensiná-lo a nunca mais bater numa criança sob seus cuidados?
Agora o tio Válter não estava mais vermelho e furioso. Ele estava branco, suando, tremendo e choramingando:
- Por favor, senhor... Não me mate...
- Isso seria bom demais para você – rosnou Snape – Mas talvez se seus padrões morais fossem elevados, você poderia refletir com outros olhos sobre o que acaba de fazer com seu sobrinho.
Um toque de varinha, um feitiço, e lá se foi o tio Válter para o teto. Só que ele tinha uma diferença em relação a Duda: seu centro de gravidade tinha sido trocado. Com isso, ele estava de pé no teto – mas de cabeça para baixo, incapaz de se desvirar.
- AHH! – fez tio Válter – Tire-me daqui! Ponha-me no chão!
- Silencio! – enunciou Snape, e nenhum outro som saiu de tio Válter, embora ele abrisse a boca e tentasse gritar – Agora sim, sem barulho, você poderá meditar sobre aquilo que conversamos.
Tia Petúnia também não podia emitir qualquer som, mas os olhos estavam voltados para cima, acompanhando o marido e filho perambulando pelo teto. Só se ouviam os choramingos de Duda.
- Fiquem todos gratos – garantiu Snape – que eu não os transformei em sapos ou algo assim. Não que não merecessem, mas não sei se Potter aprovaria essa atitude. Mas é só ele me pedir que eu volto aqui e termino o serviço. Agora, se me derem licença, foi uma noite adorável, mas tenho mais o que fazer. Boa-noite.
E sem nem olhar para trás, desparatou, levando consigo a maca de Harry, o jovem ainda desacordado.
Capítulo 5 – Nas masmorrasVozes distantes pareciam se aproximar dele.
- ... acho que é só isso, Severo. Qualquer coisa que precisar, pode me chamar na lareira.
- Não creio que seja necessário, Madame Pomfrey – era a voz de Snape – Acredito que estarei bem.
- Foi bom que ele tenha dormido a noite toda. Lembre-se, ele ainda precisa de dois dias inteiros de cama. Repouso absoluto. E uma semana antes que ele se aventure numa vassoura, para dar tempo aos ossos se reconstituírem.
- Entendido.
- Agora devo ir. Boa-sorte, Severo.
- Agradeço sua ajuda, Madame.
Ruídos de portas e passos, e Harry sentiu dificuldade em abrir os olhos. A cabeça ainda girava um pouco, e ele sentiu uma pontada de dor nas costas quando se mexeu, tentando se sentar na cama, gemendo.
- Não foi um movimento nada inteligente.
Harry abriu os olhos finalmente e se viu num aposento com as paredes de pedra. Obviamente ele estava em Hogwarts, numa ampla cama de dosséis, num quarto bem maior do que seu alojamento na Torre de Grifinória. Snape o encarava, com um frasco de poção na mão.
- Antes de qualquer coisa, tome isso – ele pegou outro na mesinha de cabeceira – E mais esse.
Harry obedeceu, gemendo um pouco de dor, e sentindo o gosto pronunciado de ervas. Ele fez uma careta depois do segundo vidrinho:
- Que houve?
- Tive que removê-lo dos cuidados amorosos dos seus tios na noite passada. Você está dormindo desde então.
- Oh – Harry ficou vermelho – Desculpe, professor.
- Por que está pedindo desculpas?
- Pelo trabalho que estou dando. Mas acho que o senhor exagerou. Eu teria ficado bom em alguns dias.
Snape deu um suspiro aborrecido:
- Dificilmente, por isso eu o trouxe a Hogwarts e não de volta para a casa de seu querido padrinho. Duas costelas trincadas, perna e braço fraturados e hemorragia interna não desaparecem em alguns dias, Sr. Potter.
Harry disse, ainda mais vermelho:
- Eu... caí da escada.
- Potter, você foi empurrado da escada – pronunciou Snape bem devagar – Por que está tentando defender seus agressores?
- Eu... eu... – Harry estava extremamente embaraçado – Eu sempre tinha que dizer que a culpa era minha se eu me machucava.
- Você não é Longbottom. Aliás, nem Longbottom seria tão desastrado.
- Como assim?
- Madame Pomfrey fez um exame cuidadoso de seus ferimentos e descobriu outros mais antigos, que não foram tratados. Ficou claro que o "carinho" de seus tios vem de longa data.
Harry não podia ficar ainda mais vermelho, mas ele conseguiu. E se sentia um fracassado.
Snape sentou-se na cama e disse, numa voz macia e agradável, uma que Harry nunca tinha ouvido:
- O que você está sentindo é muito comum em lares onde as crianças são espancadas – Harry olhou para ele alarmado; ele nunca tinha se sentindo "espancado" – Acredite, eu já vi isso acontecer com muitos dos meus sonserinos. Parece que não é comum em famílias grifinórias, ou McGonagall teria visto os sinais em vocês. Se bem que, como sempre, Potter, você é um caso totalmente à parte. Como ficariam os poderes de Hogwarts se fosse descoberto que o Menino-Que-Sobreviveu e salvador do mundo bruxo era espancado na casa de seus parentes trouxas?
- Olhe – tentou dizer Harry –, não é nada disso. De vez em quando meu tio gosta de me dar um tapa ou dois, o filho dele também. Nada de mais. Mas dessa vez eu sei que foi diferente. Ele estava possesso e eu tentei me defender. Só que precisei tirar Edwiges a tempo – aí ele me pegou desprevenido.
- Na verdade, ele pegou a nós dois desprevenidos – confessou Snape – Se eu tivesse tido tempo, teria dado a todos eles uma lição mais... duradoura.
Harry arregalou os olhos:
- O que fez? Eles… estão vivos, não estão?
- Contra meus melhores instintos, eles estão vivos. Não fiz nada de permanente ou devastador contra eles. Achei que você não aprovaria.
- Obrigado.
- Mudando de assunto, Madame Pomfrey me deixou encarregado de sua recuperação. Ela está com sua irmã em Gales. Você não deverá deixar essa cama por dois dias, e deve se manter longe de encrencas durante uma semana para dar tempo a seus ossos de se recuperarem. Seu adorável padrinho mandou suas coisas para cá e você deverá ficar em Hogwarts pelo resto do período de férias.
E com Snape. Mas que alegria, pensou Harry desanimadamente. Depois ele lembrou que pelo menos não teria que voltar aos Dursley.
Snape foi direto ao ponto:
- Já que você ficará nas masmorras, as regras de convivência devem ser simples. Quando estiver melhor, poderá ocupar-se com o que bem entender e fazer seus deveres de verão, mas quero-o de volta a esses aposentos na hora do jantar. As proteções já estão programadas para reconhecer você. Exijo limpeza e arrumação suficientes para a convivência não ser um fardo para nenhum dos envolvidos. Você pode receber seus amigos, desde que me avise com antecedência para que eu possa dar uma senha temporária a eles e retirar-me por um tempo razoável evitando a presença deles. Você concorda com essas regras, ou tem algo que queira acrescentar?
Harry ficou abismado:
- Eu... posso discordar?
Snape deu outro suspiro aborrecido:
- Isso não é a sala de aula, Potter. Eu espero que você consiga se comportar de acordo com as normas básicas de convivência e civilidade.
- Sim, senhor.
- Um lembrete: sua saúde é prioridade, e eu tenho autoridade para interferir em qualquer circunstância que eu julgue estar ameaçando sua recuperação. Não espere que eu aja como Black, concordando em saídas irresponsáveis pelo mundo trouxa apenas porque você estava entediado. Espero que isso esteja bem claro.
- Sim, Prof. Snape.
- No momento, acho melhor você comer alguma coisa, Potter, e depois descansar. Você deverá tomar suas poções no horário. Isso o deixará praticamente dormindo esses dois dias, mas você precisa desse sono para se recuperar dos danos internos.
Harry de repente sentiu que aquele bando de regras mais parecia um regime militar.
- Entendo, senhor.
- Voltarei já com seu almoço.
Foi Dobby quem trouxe o almoço, e o elfo parecia querer fazer de tudo para ajudar Harry em sua convalescença – da maneira de Dobby, claro. Enquanto Harry comia, Dobby ficou ali, tentando ajudar. Harry comeu o almoço mais depressa que pôde.
Ele esperava Snape vir com uma poção, mas em lugar disso quem apareceu depois do almoço foi o Prof. Dumbledore.
- Trago boas notícias, Harry. – O velho parecia entusiasmado. – Tivemos muito sucesso, muito sucesso mesmo.
- Prof. Dumbledore, eu lamento todo o trabalho que estou dando, eu –
- Esqueça isso, Harry, meu rapaz. Escute: pelo que o Prof. Snape me disse, você gostaria muito de fazer o Feitiço da Paternidade, é verdade?
Harry sentiu-se meio constrangido:
- Bom, senhor, só o que eu gostaria era de uma confirmação sem dúvidas de quem é meu pai. Mas isso parece estar dando muito trabalho, então eu acho que podemos simplesmente deixar tudo como está e –
- Bobagem, meu rapaz, bobagem! – Dumbledore tinha os olhos brilhando – Procurar uma maneira de efetuar o feitiço foi uma grande vantagem para a Ordem da Fênix. Graças a você, conseguimos recrutar um excelente curandeiro de St. Mungo's, credenciado no Ministério da Magia.
- Mas Prof. Dumbledore, isso não vai tornar tudo público?
- Não necessariamente, de acordo com esse curandeiro. O nome dele é Seymour Hafflehub. Ele sabe que você está de repouso, e virá aqui amanhã de manhã para efetuar o Feitiço. Fomos muito fortuitos. Hoje ele fará uma verificação semestral de varinha e isso nos dará seis meses para encontrar uma solução.
- Desculpe, mas eu não entendi.
- Os curandeiros credenciados têm suas varinhas verificadas uma vez a cada seis meses, usando o Priori Incatatem. Assim, se aparecer algum feitiço que não foi reportado, ele é descoberto e passa a fazer parte dos registros. Mas a verificação semestral de Seymour será hoje, então ele ficará...
Harry raciocinou, entusiasmado:
- Ele vai ficar seis meses sem ninguém verificar sua varinha e ninguém vai descobrir o Feitiço da Paternidade durante seis meses! É brilhante, senhor!
- Não, Harry, não é brilhante, mas é o máximo que pudemos arranjar. É satisfatório para você?
- O feitiço é mesmo garantido? Não há possibilidade de erro?
- Não há erros para esse feitiço. Você conhecerá, sem dúvida alguma, quem são seus verdadeiros pais. Está preparado para isso?
Harry suspirou, depois assentiu, determinado:
- Sim, senhor. Eu preciso muito saber.
- Está bem – disse Dumbledore – Amanhã de manhã você saberá. Mas quero que você se lembre de uma coisa, Harry, seja qual for o resultado desse feitiço: o Prof. Snape sempre salvou sua vida, e foi ele quem o resgatou da casa de seus tios. Mesmo que ele não seja seu pai, ele sempre zelou por seu bem-estar, além do chamado do dever. Procure se lembrar disso.
Aquilo fez Harry sentir uma pontada de culpa.
- Sim, Prof. Dumbledore.
- Bom garoto. Agora tome sua poção e procure relaxar. Madame Pomfrey espera uma coruja dizendo que você está descansando bastante.
Ele não tinha saído quando Snape voltou, trazendo um vidrinho com uma poção roxa. Harry já sabia o que era aquilo: Poção Sem Sonhos. Ele tomou o vidro inteiro e em questão de minutos estava adormecido.
Harry não tinha noção das horas quando Snape o acordou. O menino fez a higiene matinal e pensava em trocar de roupa quando o Mestre de Poções lhe deu um roupão e disse:
- O curador Hafflehub está se dirigindo para cá. Tire a camisa do pijama e use isso.
Harry não entendeu direito, mas obedeceu. Ele mal tinha se enfiado debaixo das cobertas quando alguém bateu à porta dos aposentos de Snape. Eram Dumbledore e o curador Hafflehub, que chegou com uma maletinha muito parecido com a de um médico. Harry ficou olhando e notou que as semelhanças paravam aí.
Seymour Hafflehub parecia ser tão velho quando o Sr. Olivaras, e os cabelos brancos apareciam por debaixo do pontudo chapéu de feiticeiro que ele usava, preto de veludo, combinando com as vestes negras, que apreciam grandes demais para ele. O grande nariz parecia pendurado no meio do rosto, e os olhos castanhos encararam Harry, com bolsas arroxeadas que iam até o meio das bochechas.
- Ah, mas esse já está bem grandinho para um Feitiço da Paternidade. Agora entendo todo o sigilo.
- Não, Seymour – disse Dumbledore – Acredito que você vai entender rapidamente a necessidade de sigilo quando você conhecer o menino em questão. Por isso todo o sigilo, por isso tivemos que inventar uma desculpa para ninguém descobrir que você esteve em Hogwarts.
- Está bem, está bem, Dumbledore – disse o velhinho, que parecia ser bem-humorado – Vamos ver então o que há com esse rapazinho.
Ele se sentou na cama, sorriu para Harry e disse:
- Ora, ora, em geral eu costumo atender bruxinhos em fraldinhas para esse serviço. Acho que você está bem grandinho para usar fraldas. Que bom! Pelo menos o cheiro vai ser melhor!
Algumas pessoas costumavam achar Dumbledore um pouco senil, e meio amalucado por causa da idade. Para Harry, essas pessoas obviamente não conheciam Seymour Hafflehub. Ele arregalou os olhos.
O curandeiro indagou:
- Você está em jejum, meu rapaz?
- Sim, senhor.
- "timo. Comida pode exigir várias leituras ao longe de várias horas. Assim a gente resolve esse assunto de uma só vez – ele continuou sorrindo para Harry e então seu olhar se desviou do rosto de Harry para a testa. E o seu sorriso caiu.
- Por Merlin... – ele disse, de olhos arregalados – Ele não é... é?
Dumbledore confirmou:
- Sim, Seymour, esse é Harry Potter.
- Mas... Eu não entendo, Dumbledore. Pode haver alguma dúvida sobre quem são os pais desse menino?
- Novas notícias nos deixaram dúvidas sobre a paternidade de Harry, Seymour. Por isso você entende a necessidade de sigilo?
- Sim... sim... claro! Mas é extraordinário! – O Sr. Hafflehub se voltou para Harry mais uma vez – Não se preocupe, rapaz, chegaremos ao fundo disso. Por favor, queira deitar-se.
Harry não esperava por aquilo. Ele esperava ter que cortar um fio de cabelo, dar uma gota de sangue ou um pouco de saliva, mas não deitar-se. O Sr. Hafflehub se ergueu da cama e chegou perto dele, buscando a maletinha:
- Afaste as cobertas e abra o seu roupão, por favor. Isso mesmo.
Sem nem dar tempo a Harry de respirar, o velhinho tirou sua varinha da maleta e enfiou no umbigo de Harry – não com força, mas deu um susto danado no rapaz.
- Ui!
- Ah, todos eles fazem isso – riu-se o Sr. Hafflehub – Isso não vai doer nada.
Ele diz isso porque não é o umbigo dele, disse Harry para si mesmo. Snape se mexeu desconfortavelmente, e Harry tinha até esquecido que ele estava no quarto.
- Eclaro paternum!
Harry olhou para a varinha enfiada no umbigo e viu que da ponta dela saiu uma luz prateada, uma luz forte o suficiente para percorrer o interior de seu corpo e ser observada por todos, uma luz muito brilhante que ia iluminando seu sangue, seus órgãos internos, alguns ossos, percorrendo todo o corpo dele, dando-lhe uma sensação agradável de calor interno como ele jamais tinha experimentado na vida. Era uma coisa tão boa que Harry sorriu.
- Ah, todos eles gostam – disse Haffleburn, também com uma risada – Os bebezinhos costumavam dar aquelas gargalhadinhas de bebê, que gracinha.
A luzinha percorreu todo o corpo de Harry e voltou para o umbigo, deixando a ponta da varinha iluminada. O Sr. Haffleburn retirou a varinha de dentro do umbigo de Harry e apontou-a para cima, enunciando:
- Eclaro pater!
Sempre brilhando num tom prateado, a luz começou a se movimentar rapidamente em círculos e logo ele viu um rosto conhecido – o rosto de sua falecida mãe e, escrito na mesma letra da carta, o nome dela apareceu em prateado. Lílian Potter.
Harry sorriu e o rosto de sua mãe lhe sorriu de volta, sumindo em seguida.
Depois a luzinha voltou a fazer círculos no ar, girando rapidamente, rapidamente até formar um rosto que Harry também conhecia – e muito bem.
Mesmo se não conhecesse, a letrinha miúda e apertada escreveu o nome de seu pai.
Severo Snape.
