Virgínia foi procurar Kat e Honey.
- Vou ter que esquecer o jantar e o cinema. - disse Virgínia. - Estou de serviço por trinta e seis horas.
Kat abanou a cabeça:
- Acabamos de receber as nossas más notícias. Eu estarei de serviço amanhã e a Honey na quarta-feira.
- Não vai ser assim tão ruim. - respondeu Virgínia, mais animada. - Soube que existe um quarto de dormir para quem está de serviço. Vou gostar disto.
Mal sabia que estava completamente enganada.
Um funcionário acompanhava Virgínia ao longo do corredor.
- O doutor Schober me informou que estarei de serviço durante as próximas trinta e seis horas. - disse Virgínia. - Todos os residentes trabalham durante tantas horas?
- Apenas nos primeiros três anos. - garantiu-lhe o funcionário.
"Que ótimo!"
- Mas terá muitas oportunidades para descansar, doutora.
- Terei?
- Aqui. Este é o quarto de quem está de serviço.
- Alomorra!
Abriu a porta e Virgínia entrou. O quarto continha nada mais do que uma maca com um colchão desnivelado, um lavatório rachado e uma mesinha-de-cabeceira onde se encontrava um telefone.
- Pode dormir aqui, nos intervalos das chamadas.
- Obrigada.
As chamadas começaram quando Virgínia se encontrava no banheiro. Mal tinha começado a fazer suas necessidades fisiológicas.
- Doutora Weasley... Corredor Três... Doutora Weasley... Quarto dezoito.
E estava sempre sendo perseguida por enfermeiras.
- Temos um doente com uma costela quebrada...
- O senhor Henegan queixa-se de dores na cabeça, parece ter recebido algum feitiço...
- O doente da ala dois está com dores de cabeça, sua cabeça está inchando e parece que vai explodir. Posso dar a ele poção Desinchus?
À meia-noite, Virgínia tinha acabado de adormecer quando o telefone novamente tocou.
- Apresente-se no Setor de Urgência 1.
Tratava-se de um ferimento causado por facas que não se sabe como, se desgovernaram quando a senhora estava as enfeitiçando para que fizesse o trabalho sozinhas.
Quando Gina acabou de tratá-la, já era uma e meia da manhã. Às duas e quinze foi novamente acordada.
- Doutora Weasley... Sala de Urgências Um. Stat.
Virgínia respondeu, sonolenta:
- Tudo bem. - "O que é que ele disse que significava? Mexe esse cu, filho. Imediatamente."
Fez um esforço para se levantar e percorrer o corredor até à sala de urgências. Tinha dado entrada um doente com a perna quebrada. Este gritava de dores.
- Façam uma radiografia.- ordenou Virgínia. - E dêem-lhe poção para que a dor pare. - Pousou a mão no ombro do doente. - Você vai ficar bom. Procure descansar.
No sistema de alto-falantes, uma metálica voz desincorporada disse:
- Doutora Weasley... Ala Três. Stat.
Virgínia olhou para o doente queixoso, sem vontade de o deixar.
Tornou-se a ouvir a voz:
- Doutora Weasley... Ala Três. Stat.
-Já vou. - murmurou Virgínia. Apressou-se a sair e atravessou o corredor correndo, até à Ala Três. Um doente estava vomitando lesmas e estava engasgado com uma delas.
- Ele não consegue respirar. - disse a enfermeira.
- Façam-lhe uma sucção. Essas lesmas têm que sair de qualquer jeito. - ordenou Virgínia lembrando-se de Rony. Enquanto verificava o doente recuperando a respiração, ouviu novamente o seu nome no sistema de alto-falantes:
- Doutora Weasley... Ala Quatro. Ala Quatro.
Virgínia abanou a cabeça e correu para a Ala Quatro, para um doente que gritava de espasmos abdominais. Gina fez um exame rápido.
- Pode ser uma disfunção intestinal. Façam uma ecografia. - disse Virgínia.
Quando voltou para junto do doente com a perna quebrada, o analgésico já tinha atuado. Mandou que o levassem para a sala de operações e cuidou da perna quebrada. Quando estava terminando, ouviu de novo o seu nome:
- Doutora Weasley, dirija-se à Sala de Urgências Dois. Stat.
- A úlcera gástrica da Ala Quatro está a causar dores...
Às três e meia da manhã:
- Doutora Weasley, o doente do quarto 310 está com uma hemorragia...
Houve um ataque cardíaco numa das alas e Virgínia ouvia, nervosa, a batida cardíaca do doente quando escutou o seu nome ser chamado novamente no sistema de alto-falantes:
- Doutora Weasley... Sala de Urgência Dois. Stat... Doutora Weasley... Sala de Urgências Dois. Stat.
"Não posso entrar em pânico" - pensou Virgínia. - "Devo manter-me calma."
Agora Gina começava a ficar assustada. "Quem era mais importante, o doente que estava examinando ou o próximo doente?" - Fique aqui. - disse futilmente. - Já volto.
Quando Virgínia se dirigia à Sala de Urgências Dois, ouviu de novo o seu nome:
- Doutora Weasley... Sala de Urgências Um. Stat... Doutora Weasley... Sala de Urgências Um. Stat.
"Oh, por Merlin." - pensou Virgínia. Teve a sensação de ter sido acordada no meio de um terrível e interminável pesadelo.
Durante o que sobrou da noite, Virgínia foi acordada para atender um caso de intoxicação alimentar por alguma comida do Hog´s Head, um braço completamente sem ossos, um caso de poção mal aplicada e uma costela quebrada. Quando conseguiu regressar ao quarto dos medi-bruxos de serviço, estava tão exausta que mal conseguia se mexer. Cambaleou até à maca e quando mal fechara os olhos o telefone tocou.
Pegou nele, com os olhos fechados:
- Alô.
Doutora Weasley, estamos à sua espera.
- O quê? - Permaneceu deitada, tentando lembrar-se de onde estava.
- A sua ronda está começando, doutora.
- A minha ronda? - "Esta é uma espécie de brincadeira de mau gosto" - pensou Virgínia. - "É desumano. Não podem obrigar ninguém a trabalhar assim!" - Mas o fato era que estavam à sua espera.
Dez minutos mais tarde, Virgínia estava de novo fazendo a ronda, meio adormecida. Deu um encontrão no doutor Radnor:
- Perdão - murmurou - mas não consegui dormir...
Este lhe deu umas palmadinhas amigáveis no ombro:
- Irá se habituar a isso.
Quando finalmente Virgínia saiu de serviço, dormiu durante quatorze horas seguidas.
A pressão intensa e o ritmo de trabalho provaram ser demais para alguns dos residentes, os quais simplesmente desapareceram do hospital.
"Isso não irá acontecer comigo" - jurou Virgínia.
A pressão era implacável. No final de uma das rendições de Virgínia, após trinta e seis esgotantes horas, estava tão exausta que não fazia idéia de onde se encontrava.
Cambaleou para o elevador (não iria nem conseguir aparatar naquele estado) e permaneceu ali, com a mente entorpecida.
Tom Chang, o irmão de Cho, aproximou-se dela:
- Sente-se bem?
- Estou bem. - murmurou Virgínia.
- Está com um aspecto muito ruim. - observou ele.
- Obrigada. Por que é que agem assim conosco? - perguntou Gina.
Chang deu um risinho:
- A teoria é de que isso nos mantém em contato com os nossos doentes. Se formos para casa e os deixarmos aqui, não sabemos o que se passa com eles enquanto estivermos fora.
- Tem lógica. - concordou.
"Não, não tem nenhuma". - Como é que podemos cuidar deles se estamos dormindo em pé? - Chang tornou a rir.
- Não sou eu que imponho as regras. É assim que todos os hospitais trabalham.
Olhou para Virgínia de perto:
- Vai conseguir chegar a casa?
Virgínia olhou para ele e afirmou arrogantemente:
- Claro que sim.
- Passe bem. - Chang desapareceu pelo corredor abaixo.
Virgínia esperou que o elevador chegasse. Quando finalmente chegou, ali estava ela em pé, dormindo profundamente, encostada na parede:
Dois dias mais tarde, Virgínia tomava o café da manhã com Kat:
- Quer ouvir uma confissão terrível? - perguntou Virgínia que sem esperar resposta de sua amiga, foi falando. - Às vezes, quando me acordam às quatro da manhã para aplicar uma poção a alguém, vou cambaleando pelo corredor abaixo ainda meio dormindo e passo pelos quartos onde todos os doentes estão bem aconchegados e tendo uma boa noite de sono. Minha vontade é abrir todas aquelas portas e gritar "Acordem!"
Kat estendeu-lhe a mão:
-Junte-se ao clube, querida.
Os doentes do St. Mungus eram de todos os feitios, tamanhos, idades e raças. Uns estavam assustados, outros eram corajosos, gentis, arrogantes, exigentes, compreensivos. Enfim, eram bruxos que sofriam.
A maioria dos medi-bruxos eram dedicados aos pacientes. Mas como em qualquer profissão, havia bons medi-bruxos e maus medi-bruxos. Eram jovens e idosos, desajeitados e competentes, atenciosos e desagradáveis. Alguns deles, numa ou em outra altura, assediaram sexualmente Virgínia. Alguns eram sutis, outros rudes, outros exagerados.
- De noite, nunca se sente sozinha? Eu sei que eu sinto. Será que...
- Estas horas nos matam, não concorda? Sabe que descobri o que me dá energia? Uma boa vida sexual. Porque é que nós...?
- A minha mulher foi passar uns dias fora da cidade. Tenho uma cabana próximo de Carmel. Este fim de semana podíamos...
E os doentes, quando tinham chance, também a assediavam sexualmente.
- Então, a senhora é que é a minha medi-bruxa, hein? Sabe o poderia me curar...? Aproxime-se da cama, querida. Quero ver se isso aí é verdadeiro...
Virgínia cerrava os dentes e ignorava-os a todos. "Quando eu e o Harry nos casarmos, isto irá parar."
O simples fato de pensar em Harry a deixava radiante. Iria estar com ele novamente. Em breve.
Uma manhã, antes da ronda, Virgínia e Kat conversavam sobre o assédio sexual de que estavam sendo alvo.
- Grande parte dos medi-bruxos se comporta como perfeitos cavalheiros, mas alguns deles parecem julgar que somos gratificações ligadas à profissão e que estamos aqui para os servir. - disse Kat. - Não há semana em que pelo menos um dos medi-bruxos não me faça convites. "Porque não vem beber alguma coisa em minha casa?" Ou que na sala de operações, quando estou ajudando, o cirurgião esfrega o braço no meu peito. Um tarado me disse: "Sabe, sempre que como frango, prefiro a carne escura."
Virgínia suspirou:
- Julgam que nos lisonjeam nos tratando como objetos sexuais. Antes nos tratassem como medi-bruxas.
- Muitos deles nem sequer nos querem por perto. As mulheres são consideradas inferiores até provarem o contrário, e os homens são considerados superiores até provarem ser os merdas que são.
- É a velha teoria machista. - disse Virgínia. - Se fôssemos mais, poderíamos iniciar uma nova teoria feminina.
Na mesa ao lado estava Arthur Kane e ela ouvia o que ele falava. Era o assunto da bisbilhotice constante do hospital. Tinha a alcunha do "Dr. Você-Sabe-Quem". Para ele, a solução para qualquer problema era operar e a sua taxa de operações era superior à de qualquer outro medi-bruxo do hospital. Também lhe pertencia, obviamente, a maior taxa de mortalidade.
Era careca e baixo, tinha nariz de papagaio e dentes manchados pelo tabaco e bastantes quilos a mais. Incrivelmente, julgava-se desejado pelas mulheres. Gostava de considerar as novas enfermeiras e residentes femininas como "carne nova".
Virgínia Weasley era a mais nova "carne nova". A tinha visto na saleta do andar superior e sentou-se à sua mesa, sem ter sido convidado.
- Estou admirando-a faz tempo. Na verdade, desde que entrou aqui.
Virgínia levantou a cabeça, espantada:
- Como?
- Sou o doutor Kane. Os meus amigos me chamam de Arthur. - A voz soou maliciosa.
Virgínia pensou em quantos amigos ele poderia ter.
- Como se tem adaptado ao hospital?
A pergunta apanhou Virgínia desprevenida:
- Eu... Bem, acredito eu.
Ele inclinou-se para a frente:
- Este é um hospital grande. É fácil nos perdemos aqui. Percebe o que quero dizer?
Virgínia respondeu cautelosamente:
- Não entendi muito bem.
- Você é demasiadamente bonita para ser apenas mais um rosto no meio da multidão. Se quiser dirigir-se a qualquer lugar, irá precisar que alguém a ajude. Alguém que conheça os caminhos.
A conversa estava tornando-se cada vez mais desagradável.
- E o senhor gostaria de me ajudar.
- Correto. - Mostrou os dentes manchados pelo tabaco.
- Mas por que não falamos disso ao jantar?
- Nada tenho para falar, doutor Kane. - respondeu Virgínia. - Não estou interessada em subir desse jeito.
Arthur Kane, com uma expressão maléfica no rosto, ficou vendo Virgínia se levantar e ir embora. Aquilo não iria ficar assim. Ninguém em sã consciência até hoje tinha recusado Arthur Kane e não seria uma residentizinha qualquer que iria acabar com a sua fama dentro daquele hospital.
Os residentes do primeiro ano de poções aliada à cirurgia encontravam-se em regime de rotação por dois meses, alternando entre obstetrícia, ortopedia, urologia e cirurgia.
Virgínia aprendeu que era perigoso entrar num hospital como residente durante o verão devido a doença grave, uma vez que muitos dos medi-bruxos internos se encontravam de férias e os doentes ficavam à mercê dos jovens e inexperientes residentes.
Quase todos os cirurgiões gostavam de ouvir música na sala de operações. Um dos medi-bruxos foi apelidado de As Esquisitas e outro de Axl Rose, um cantor trouxa, devido aos respectivos gostos musicais.
Por algum motivo, as operações pareciam causar sempre fome a todos. Falavam constantemente de comida. Um cirurgião podia estar no meio da remoção de uma vesícula biliar gangrenada de um doente e dizer:
- Ontem jantei muito bem no Bardelli's. A melhor comida italiana de todo mundo bruxo.
- Você já experimentou os bolos de caranguejo do Cypress Club?
- Se gosta de um bom bife, experimenta o Três Vassouras, em Hogsmeade.
Quando não falavam de comida, os medi-bruxos discutiam Quadribol ou qualquer coisa ligada à ele.
- Você viu o jogo de Chuddley Cannons ontem? Aquilo sim que é time...
E lá agora, saía um apêndice rebentado.
Às três da manhã, quando Virgínia dormia no quarto dos medi-bruxos de serviço, foi acordada pelo telefone.
Uma voz grossa disse:
- Doutora Weasley... Ala dois. Quarto quatrocentos e dezenove... um ataque cardíaco. Terá de se apressar! - A linha caiu.
Virgínia sentou-se na borda da cama, lutando contra o sono e a vontade de continuar na cama. Procurou se erguer. "Tenho que me apressar!"
Foi para o corredor, mas não havia tempo para esperar pelo elevador. Subiu apressadamente as escadas e atravessou a correr o corredor do ala dois até ao quarto 419, o coração quase saindo pela boca. Abriu a porta e ali ficou, olhando.
Aquele era o necrotério do hospital.
N/A: Oie, mais uma vez... Estou aqui colocando os capítulos em html para postá-los no Bem, como vocês podem ver, eu já postei... Hahahaha q coisa tosca... Bem, gostaria de pedir que lessem e criticassem mesmo, boa ou ruim não importa, o que importa é a opinião de vocês... Bjus e até mais!!! PS.: Quem será que mandou a Gina para o necrotério??? Eu tenho uma idéia... E obrigada por todos os reviews.
