Capítulo 15 - A vida e a morte são dois lados de uma mesma moeda

Quando Virgínia ouviu as notícias, foi conversar com Mitch Campbell. Ele estava sentado no seu gabinete, descansando.

Tinha as mãos sobre a mesa quando Virgínia entrou, podendo ver como estas tremiam.

Rapidamente, Campbell escondeu as mãos:

- Olá, Virgínia. Como está?

- Bem, Mitch. Quero falar com você.

- Sente-se.

Sentou-se na cadeira em frente:

- Há quanto tempo sofre da doença de Parkinson?

O rosto dele ficou branco:

- O quê?

- É isso, não é? Tem tentado esconder o fato.

Houve um silêncio pesado:

- Eu... eu... sim. Mas eu... não consigo abandonar a medicina. Não consigo mesmo. Isto é toda a minha vida.

Virgínia inclinou-se para a frente e disse com sinceridade:

- Não tem de abandonar a medicina, mas não devia fazer operações.

Subitamente, ele parecia ter envelhecido:

- Eu sei. Ia deixar de operar no ano passado. - E sorrindo afavelmente: - Acredito que agora terei de deixar de operar, não é? Você vai informar o doutor Schober?

- Não - respondeu Virgínia, gentilmente. - O senhor é que vai dizer ao doutor Schober.


Virgínia estava almoçando na cantina quando Tom Chang se juntou a ela.

- Soube o que aconteceu - disse. - Bowman! Incrível. Bom trabalho.

Ela abanou a cabeça:

- Quase que acusei a pessoa errada.

Chang sentou-se e ficou calado.

- Sente-se bem, Tom?

- Quer ouvir o "Sim, estou bem" ou quer saber a verdade?

- Somos amigos. Quero a verdade.

- O meu casamento foi pelo cano abaixo. - De repente, os olhos encheram-se de lágrimas. - Sye foi-se embora. Regressou para a casa dela.

- Lamento, sinceramente.

- Não é culpa dela. Há muito tempo que o casamento tinha terminado. Ela disse que eu estou casado com o hospital e tem razão. Passo toda a minha vida aqui cuidando de estranhos, em vez de estar ao lado das pessoas que me são queridas.

- Ela vai voltar. Vai ver que tudo se vai se solucionar - disse Virgínia, procurando confortá-lo.

- Não. Desta vez, não.

- Já pensaram em ouvir os conselhos de um advogado, ou...

- Ela se recusa.

- Lamento, Tom. Se houver algo que eu... - Ouviu o seu nome a ser chamado.

- Doutora Weasley, quarto quatrocentos e dez...

Virgínia ficou subitamente alarmada:

- Tenho de ir. - disse. Quarto 410. Era o de Sam Bernstein.

Era um dos seus doentes favoritos, um septuagenário simpático que sofria de um inoperável cancro no estômago. Muitos dos doentes do hospital stavam sempre queixando-se, mas Sam Bernstein era uma exceção.

Virgínia admirava a sua coragem e dignidade. A mulher e os dois filhos adultos visitavam-no regularmente e Virgínia simpatizava também com eles.

Estava ligado a sistemas de suporte de vida, com um aviso, NR - Não Ressuscitar - se o coração parar.

Quando Virgínia entrou no quarto, estava uma enfermeira ao lado da cama. Esta levantou a cabeça quando ouviu Virgínia.

- Morreu, doutora. Não comecei os procedimentos de emergência porque... - A voz começou a fugir-lhe.

- Agiu muito bem - disse Virgínia, lentamente. - Obrigada.

- Posso fazer qualquer...

- Não. Eu trato de tudo. - Virgínia permaneceu ao lado da cama e olhou para o corpo daquilo que havia sido um sorridente ser humano com vida, um homem com família e amigos, alguém que tinha passado a vida trabalhando arduamente, cuidando dos que lhe eram queridos. E agora...

Aproximou-se da gaveta onde ele guardava os seus pertences. Havia um relógio barato, um molho de chaves, quinze galeões, a dentadura e uma carta para a mulher. Tudo aquilo recordava a vida de um homem.


Virgínia não conseguia afastar a sensação de depressão que a oprimia.

- Era uma pessoa tão querida. Porquê...?

- Virgínia - interveio Kat -, não pode envolver-se emocionalmente com os seus doentes. Isso vai fazer-lhe mal.

- Eu sei. Tens razão, Kat. É que... tudo acabou tão repentinamente, sabes? Esta manhã ele conversou comigo. Amanhã é o seu funeral.

- Não está pensando em ir, está?

- Não. Seria muito doloroso.


Na manhã seguinte, Kat encontrou-se com Honey no corredor. Esta parecia nervosa.

- O que é que aconteceu? - perguntou Kat.

- O doutor Schober mandou me chamar. Pediu-me para estar no gabinete dele às duas horas.

- Sabe porquê?

- Julgo que está relacionado com as rondas do outro dia. O doutor Ritter é um monstro.

- Pode ser - disse Kat. - Mas tenho a certeza que tudo irá correr bem.

- Queira Merlin que sim, mas estou com um mau pressentimento.

Chegou ao gabinete de Schober Benjamin às duas horas em ponto, levando na bolsa um pequeno pote de mel.

A recepcionista estava almoçando. A porta do Dr. Schober estava aberta.

- Entre, doutora Taft - convidou.

Honey entrou no gabinete.

- Feche a porta, por favor.

Honey fechou a porta.

- Sente-se.

Honey sentou-se à frente dele. Quase tremia.

Benjamin Schober tinha suportado a situação o máximo que podia. Olhou para ela e pensou: "É como escorraçar um cachorrinho."

Mas o que tem de ser feito, tem de ser feito.

- Lamento informá-la de que tenho uma má notícia para lhe dar - disse.

Uma hora mais tarde, Honey encontrou-se com Kat no solário.

Honey afundou-se numa cadeira próximo dela, sorrindo.

- Já falaste com o doutor Schober? - perguntou Kat.

- Oh, sim. Tivemos uma longa conversa. Sabias que a mulher o deixou em setembro? Foram casados durante quinze anos. Tem dois filhos adultos de um casamento anterior, mas pouco os vê. O pobrezinho está muito solitário.


Era outra vez Ano Novo. Harry não tinha dado sinal de vida, mas Virgínia ainda tinha esperança que ele voltasse.

Para elas, nada na vida tinha sofrido alterações, à exceção da identidade dos doentes.

Quando Virgínia atravessava o parque de estacionamento, lembrou-se de Petter Bowman e do seu Ferrari vermelho.

"Quantas vidas foram destruídas pelo veneno que Petter Bowman vendia?" - pensou.

As drogas eram tão sedutoras. E no final, tão mortais.

Jimmy Ford surgiu com pequeno ramo de flores para Virgínia.

- Para que é isto, Jimmy?

Ele corou:

- Gostaria que ficasse com elas. Sabia que me vou casar?

- Não! Que maravilha. Quem é a sortuda?

- Chama-se Betsy. Trabalha numa loja de vestidos no Beco Diagonal. Vamos ter meia dúzia de filhos. A primeira menina terá o nome de Virgínia. Espero que não se importe.

- Eu me importar? Sinto-me lisonjeada.

Ele ficou embaraçado:

- Já sabe daquela sobre o medi-bruxo que deu duas semanas de vida a um doente? "Não posso pagar-lhe j" disse o homem.

"Está bem, dou-lhe mais duas semanas.

E Jimmy desapareceu.


Virgínia estava preocupada com Tom Chang. Estava sofrendo violentas mudanças de temperamento, desde a euforia à depressão profunda.

Numa manhã, durante uma conversa com Virgínia, disse:

- Já percebeu que se não fôssemos nós, a maioria das pessoas daqui morreriam? Temos o poder de curar o corpo delas e de as

tornar completas de novo. - E na manhã seguinte: - Estamos todos enganando a nós próprios, Virgínia. Os nossos doentes melhorariam mais depressa sem nós. Somos hipócritas ao fingirmos que temos a resposta para todas as perguntas. Bem, não temos.

Virgínia estudou-o por momentos:

- Como está a Sye?

- Falei com ela ontem. Não quer voltar para cá. Vai pedir o divórcio.

Virgínia tocou-lhe no braço:

- Lamento, Tom.

Ele encolheu os ombros:

-Por quê? Não me afeta nada. Agora já não me afeta mais. Encontrarei outra mulher. - Sorriu. - E terei outro filho. Verá.

Havia algo irreal na conversa.

Nessa noite, Virgínia disse a Kat:

- Estou preocupada com Tom Chang. Tem falado com ele ultimamente?

- Sim.

- Pareceu-lhe normal?

- Nenhum homem me parece normal - respondeu Kat.

Virgínia ainda continuava preocupada.

- Vamos convidá-lo para jantar amanhã à noite.

- Está bem.

Na manhã seguinte, quando Virgínia entrou ao serviço no hospital, recebeu a notícia de que um porteiro tinha encontrado o corpo de Tom Chang em casa com os olhos vidrados sentado na cadeira.

Se suicidara com um Avada Kevadra.

N/A: É, Jimmy Ford é uma figura não? Que doido com essas anedotas. E coitado do Chang, eu não queria mas precisava matar ele... Coisas da vida... Bjs e até mais... Não esqueçam dos meus reviewsss