A PAIXÃO DOS EDAIN

Capítulo XI – Nos Laços da Sombra

O CONSELHO DOS GALADHRIM

Algumas das falas de Haldir aqui apresentadas foram adaptadas diretamente
do texto de Tolkien

Já era quase dia quando os Capitães do Senhor Celeborn começaram a deixar a reunião. Haldir era o mais destacado entre eles, mas não o mais velho e honrado, e o Senhor de Lórien ouvira a todos; muitos dos quais não concordavam com a necessidade de dar combate ao mal que crescia além das fronteiras da Floresta, e a renovação da aliança entre elfos e homens, consideradas posições temerárias.

- Pode ser loucura – argumentava Haldir – Mas na verdade o poder do Senhor do Escuro nunca se manifestou tão claramente como na hostilidade que divide todos aqueles que ainda se opõe a ele.

- Você não estava lá para lembrar, meu rapaz, mas desde as batalhas dos tempos antigos que os edain a serviço do Abominável igualavam em número os dentre eles que O combatiam.

- Bravo Haldir, nós lhe cantamos as lendas em que você quer se espelhar agora, mas há muito que elas são apenas isso.

- Não falo de lendas nem de tempos antigos, pois não vivo neles, mas no tempo presente em que os rios que outrora nos defenderam não são mais uma proteção segura. A Sombra avança no Norte e nos rodeia. As montanhas do Oeste estão ficando perigosas; a Leste as terras estão perdidas e cheias de criaturas maléficas.

- Os enfermiços não são confiáveis, inconformados da sina a qual estão presos.

- Nem todos os homens. Não os descendentes de Ëarendill, que são parentes dos elfos afinal.

- Os homens de Númenor! mas exatamente em seu seio floresceu a revolta maior.

- Eu viajei aos reinos dos homens. Há coragem entre eles, e embora muitos aqui possam não gostar do que digo, é em parte sob sua proteção que vivemos agora, mesmo nos domínios da Senhora.

- Suas palavras são imponderadas soldado, e só sua juventude as escusa. Os elfos nunca dependeram dos atani, estavam aqui antes deles.

- Você já usufrui do melhor que a aliança entre elfos e homens poderia trazer, meu rapaz, dedique suas energias à sua fogosa esposa edain, enquanto a tem – arrematou o mais velho dos capitães de Celeborn, para riso geral.

Fora particularmente difícil controlar seu temperamento aquela noite. Os velhos comandantes de outrora pareciam estar unidos no propósito de fazer seu benjamim perder a razão; o orgulho arrogante dos feitos recentes percebido de forma um tanto afrontosa pelos soldados formados em batalhas de outras eras. Mas ao final o Senhor Celeborn levara em consideração suas palavras, incumbindo-o de organizar a força que se fazia necessária.

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O PÁSSARO NEGRO

Haldir encontrou os salões vazios, Mornfinniel certamente já fora para casa com as crianças. Ah sim, ele "dedicaria sua energia" à sua "fogosa esposa edain" antes de partir em cumprimento à sua missão - que atrevimento daquele velho, referir-se assim a Mornfinniel, como se a despeito de tudo ela não fosse sua esposa legítima, digna de tanta deferência quanto as demais senhoras de seus pares; tratando-o como se ainda fosse um moleque sentado em seu joelhos, escutando lendas antigas.

- Mornfinniel se foi, Haldir – a Senhora Galadriel o encontrou deixando o salão.

- Assim supus, Minha Senhora. – Haldir curvou-se, pensando se suas palavras sobre os edain contribuírem para a defesa dos domínios da Senhora já teriam chegado aos ouvidos de Galadriel. Aquela afirmação realmente fora inadequada. – As crianças certamente já deviam estar sonolentas.

- As crianças dormem no palácio, Haldir, ela se foi de Lothlórien.

- O quê, Minha Senhora?

- Cabelos Negros se lembrou, Haldir, sua missão está cumprida.

- O quê está dizendo, Minha Senhora? – um pássaro negro abriu as asas dentro do coração do Elfo.

- Compadeço-me de que a busca empreendida tenha este fim para você, Haldir, mas a partir do momento que se encontraram, não poderia ter sido evitado.

- Ainda não compreendo, Senhora.

- Sim, Haldir, você compreendeu, agora precisa aceitar – os olhos de Galadriel o fitavam do fundo do tempo, tristes mas firmes.

- Como assim Mornfinniel foi embora de Lórien? Para onde? Vou buscá-la!

- Você não a pode mais alcançar agora, dei-lhe o único cavalo que havia nas cocheiras; partiu há muitas horas. E nem ela poderia voltar, é a vez da missão dela agora.

- Que missão, Senhora de Lórien? – o pássaro começara a bicá-lo.

- A missão de resgatar o seu povo – e Galadriel se retirou sem responder mais perguntas.

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A IRA DE HALDIR

Niéle encheu-se de tristeza ao deparar com a destruição reinante no talan de Haldir; móveis e utensílios em pedaços espalhados pelo chão.

- Haldir? – Ela chamou.

- Aqui – a voz do elfo respondeu após um momento. Niéle seguiu-a até o quarto. Haldir recostava-se sentado à cabeceira da cama, imaculadamente arrumada em meio às roupas rasgadas e aos cacos do espelho de Mornfinniel que tomavam o quarto.

- O que há com você, Haldir?

- A edain me passou algum tipo de doença, uma loucura, uma ânsia de descontrole – o elfo respirou fundo – mas agora estou pronto para me curar.

Niéle não escutou verdade na voz de Haldir, apenas amargura.

- Haldir, de um jeito ou de outro vocês estavam fadados a se separar num tempo breve, você sabia disso.

- Aye. Sim, eu sabia disso.

- Haldir, Lothlórien precisa de você agora. O Senhor Celeborn não lhe deu uma incumbência?

- É verdade, finalmente fui incumbido de preparar uma força para combater além de nossas fronteiras, ao lado dos homens, conforme venho insistindo há anos – Haldir sorriu com ironia. – Não é interessante que tenha obtido o consentimento do Senhor no momento em que provo a traição daqueles com quem queria me aliar? A lealdade dos edain é volátil como sua vida; suas juras são como cachos de belas flores de mallorn, nascidas para se desmanchar na brisa. Fui alertado disso e me cobri de opróbrio para reconhecer a verdade das palavras contra as quais me bati.

- Opróbrio, Haldir? Não!– redargüiu Niéle – Mornfinniel partiu com a aprovação da Senhora, e aquilo que advém das decisões da Rainha não é alvo de contestação. Você é o Capitão de Lothlórien, Haldir, respeitado antes da vinda dela, respeitado após sua partida.

Niéle estava certa. A passagem da mulher mortal por sua vida estivera predestinada desde sempre a ser efêmera. Ao contrário do crescimento da sombra, que era constante. Havia trabalho a fazer, e mesmo entre os elfos um sentido de urgência se instalava.

Entregando os filhos mais uma vez aos cuidados da amiga, Haldir dedicou-se às suas incumbências com ardor amargo, e sua dignidade orgulhosa não mais mencionou Mornfinniel.

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FIM DA 1ª PARTE