Capítulo 3

David

Uma semana depois, David voltou à loja. As meninas, Morgana e Igraine, brincavam com o gato Salem por entre os livros.

"Boa tarde, Sra. Gallup. Alguma novidade?"

Angel tremeu da cabeça aos pés. Não estava preparada para tal visita... se soubesse que ele vinha, teria colocado roupas mais sexy, um perfume mais refinado... não se sentia nada culpada, afinal, Simon já estava longe há tanto tempo sem se comunicar. Além do mais, a religião antiga, do culto à Mãe-terra, dizia que o amor é livre e a energia sexual não deve ser desperdiçada. Ela era adepta da religião antiga. Agora, mais que nunca.

"Boa tarde, Detetive. Infelizmente, continuo sem poder lhe ajudar."

"Que lindas meninas, são suas?"

"Sim... minhas meninas, Morgana e Igraine..."

Assim a conversa seguiu, com David passando a tarde inteira na loja com Angel, que serviu chá e mostrou livros raros e muito antigos. Ele brincou com as meninas, que o adoraram. A intuição de Angel dizia que, muito em breve, deixaria de viver com um muggle, para viver com outro...

Naquele final de semana, Simon voltava da tour. Chegou exausto e diferente. Angel percebeu a relutância de seu marido em continuar a conviver com pessoas que tinham poderes mágicos. Ele não falou nada, mas ela percebeu e decidiu partir. Simon chorou, insistiu para que ficasse, mas no fundo, sabia que assim era melhor. Um dia depois, mudou-se de volta para o antigo apartamento em Camden Town.

Mais duas semana se passaram, e o detetive Friedman voltou à loja.

"Boa tarde, Sra. Gallup."

"Boa tarde, detetive... mas agora pode me chamar Srta Connery." Mostrou a mão sem aliança.

"Oh, sinto muito. Espero que a senhora, erm, você, esteja bem..."

"Sim, estamos bem, as meninas e eu... foi melhor assim..."

No olhar de simpatia daquele homem, Angel viu seu futuro. Estava certa de que ele criaria suas filhas e lhes daria uma educação baseada em princípios tanto muggles quanto bruxos. Em um mês, David Friedman se mudava para o apartamento em Camden Town, juntamente com Angel e as gêmeas. O casamento, uma cerimônia discreta mas bonita, na religião pagã, foi realizado assim que a situação com Simon foi resolvida.

Quando a loja no térreo sob o apartamento em Camden foi desocupada, Angel teve uma idéia. Convidou dois amigos muggles, Clara e Carlos, como sócios, e abriram uma loja de CDs góticos e alternativos, que rapidamente se tornou um hit em Camden, sendo freqüentada por celebridades do mundo da música e do cinema. Quando Ozzy Osbourne um dia entrou na loja, Angel teve que se conter para não se ajoelhar e reverenciar o ídolo. Ozzy is God. Simon também vieram prestigiar... sem ressentimentos.

A idéia de abrir um café anexo à casa veio de Carlos. Kelly, a famosa chef, que se cansara de São Paulo e pretendia se estabelecer em Londres foi convidada para administrar o café. Foi um sucesso... clientes compravam CDs e livros e depois faziam um lanche acompanhado de um delicioso e autentico café, bem forte, coisa rara no Reino Unido.

Quase dois anos haviam se passado, e o casamento de Angel e David era sólido como uma rocha. Ao menos parecia. Simon visitava as meninas regularmente e as levava para sua casa sempre que não estava longe com a banda. David continuava incansável em seu trabalho. Ele era um norte americano, ex-agente do FBI, onde também trabalhara em cooperação com magos. Fora convidado pela Scotland Yard nesses tempos de trevas, por sua grande competência em lidar com magos. Da mesma forma a sua parceira, Agente Emma Hawkins. David havia sido casado com uma bruxa nos USA, e sempre quisera ter um filho mago. Seu filho, no entanto, nasceu sem poderes mágicos, para a tristeza do pai. Agora estabelecido no UK, ele não via seu filho com freqüência, mas ao menos duas vezes ao ano voltava ao USA e lá passava umas duas semanas.

Em um frio dia de dezembro, uma semana antes do Natal, Angel esperava o regresso do marido para o dia seguinte. Ele estava em uma de suas visitas ao filho, nos USA. Todos já haviam ido embora da loja, e Londres estava escura e envolta em névoa... Ao preparar-se para ir embora, Angel ouve um ruído alto, um "crack" vindo do outro lado da loja, onde fica o café. Esse ruído era muito familiar. Virou-se para ver quem havia aparatado. Quase desmaiou, de surpresa e de emoção. Em sua direção, se aproximava uma figura espetacular. Lucius. Pararam frente a frente. Ele segurou sua mão e a beijou. Sempre o gentleman, sempre o sedutor.

"Angel. Há quanto tempo. Você mudou bastante... está mais bonita, mais atraente."

Espetacular era uma boa palavra para definir a aparição. Seus cabelos louros agora estava longos, lisos até a metade das costas. Sua voz era quente e sensual. Os olhos continuavam os mais azuis que ela jamais vira, o rosto, uma perfeição clássica. Poderia ser uma estátua grega. Os traços eram duros e frios o suficiente para isso. Ele exalava auto confiança, um homem que podia tudo.

"Lucius..." baixando os olhos primeiro, e depois encarando-o com coragem. "Seu bastardo! Porque me deixou daquela maneira". Lágrimas vieram aos seus olhos. Ele segurou seu queixo, olhando profundamente nos olhos da mulher: "As circunstâncias exigiram... você sabe muito bem disso...".

"O que você quer comigo, assim, do nada, após todos esses anos?"

"Matar a saudade..." com um sorriso sarcástico, traçando o contorno do rosto de Angel com os dedos... "Não... na verdade, eu estou aqui para lhe agradecer... por não ter me denunciado quando viu as fotos, ha dois anos atras..."

"Como você sabe de tudo isso?"

"Tenho muitos informantes... mas vamos continuar conversando aqui parados? Sei que você serve um excelente café..."

Foram até o café, onde Angel usou mágica para servi-los, já que estava nervosa demais para fazer um café à maneira muggle... além do mais, Lucius apreciaria mais o método mágico... Ela tremia e estava queimando por dentro... todas as lembranças de seu primeiro amor voltaram à sua mente... e ele estava, hoje em dia, ainda mais fantástico do que no passado...

"Você me poupou alguns milhões de galleons e muitas horas subornando pessoas... se tivesse me denunciado, eu não seria preso, mas estaria um pouco mais pobre... Somente tive medo de que você falasse, pois foi a única pessoa a quem eu não havia contatado e negociado. Não imaginava que você estaria aqui. Além do mais, você era uma das poucas pessoas que me reconheceria naquela foto. Sou grato a você por não me denunciar, mesmo tendo casado com o policial que investiga o caso..."

Angel percebeu as implicações de seu gesto somente agora. Ela estava ainda casada com David, que nunca havia achado os responsáveis pelo crime.

Conversaram um pouco como velhos amigos... Lucius falava de seu filho Draco com muito carinho, mas não com o mesmo tom sobre Narcissa. Quanto aos muggles ele, obviamente, ainda tinha sérias restrições "Que aconteceu com você, Angel... que decidiu se envolver com muggles... dois maridos do mundo muggle... sem magia alguma... Como pôde, uma bruxa de família antiga e puro sangue?"

"Você aconteceu, Lucius... a maneira como me deixou fez com que me sentisse desprezada no mundo mago. E não diga que não há magia em minha vida... Veja Simon, por exemplo... no palco, ele faz com que milhares de pessoas o adorem e entrem em transe com sua música. Isso é magia. De outro tipo, mas magia. O amor de David pelas minhas meninas, sem restrições, mesmo sem ser o pai... isso também é um tipo de magia..."

Lucius olhava com cara de desprezo. Ele estava vestido de maneira casual, camisa branca com babado, calças negras e justas... usava apenas uma capa por cima de tudo, dispensando o casaco, mas carregava uma bengala com uma cabeça de serpente em prata. Exalava um perfume exótico, amadeirado, que estava deixando Angel tonta... de desejo. Ela suava frio.

"Mas você deixou Simon..."

"Sim, não funcionou mais... mas isso também acontece entre magos... Me sinto segura com David. Ele é leal e ama minhas filhas. Tem sido um segundo pai para elas. É um marido excelente e eu o amo..."

"Tenho certeza disso... mas, diga-me, onde ele está agora? Sabe me dizer? Tem tanta certeza assim da lealdade do seu marido?"

"Lucius, o que você está pretendendo? Minar minha confiança em David? Me deixe em paz..."

Terminando seu café, ele pôs-se de pé.

"Como queira, má chérry... Guarde isso. É uma portkey para uma das propriedades da minha família. Se quiser conversar, ela vai funcionar no dia após boxing day, ao meio dia. Te levará ao meu encontro... estarei esperando... sei que você virá..." Entregou a Angel um anel de prata, em forma de duas serpentes entrelaçadas... Com um delicado beijo nos lábios ele se despediu e jogando a capa por cima dos ombros desapareceu em pleno ar.