CAPÍTULO 2 – A Garçonete do Caldeirão Furado

         - Bom dia, Sr. Potter! Devo chamar um carro do Ministério para apanhá-lo?

         - Sim, Beggy, por favor!

         Beggy, a bruxa que trabalhava na portaria do prédio de Harry, tirou de seu uniforme vermelho uma varinha amarela e a ergueu, pronunciando algumas palavras. Ela sorriu para Harry. Era uma bruxa morena acima de seu peso ideal que formara-se em Hogwarts alguns anos depois dele. Ela era muito prestativa e trabalhava no prédio já há muito tempo, desde quando Harry pode se lembrar. Ela usava um chapéu também vermelho e Harry a achava engraçadíssima. Beggy era outra das responsáveis pela rotina diária de Harry.

         Eram apenas quatro quadras de seu prédio até o serviço, mas ele costumava ir com o carro do Ministério todas as manhãs. Um carro preto, um típico carro trouxa a olhos não mágicos, pareceu ter vindo do final da rua e parou bem em frente a Harry.

         Peggy abriu a porta do carro e piscou para o motorista. Em um gesto gentil, pediu que Harry entrasse.

         - Tenha um bom dia, Sr. Potter! – ela disse com simpatia e em seu tom vigoroso.

         - Até mais, Peggy! – Harry sorriu e entrou no carro, que logo partiu.

         Harry encarava o trânsito londrino. Esticou o braço para falar com o motorista.

         - Roger, aquela parada tradicional no Caldeirão, ok?

         - Claro, Sr. Potter! – o condutor lançou-lhe um sorriso maroto. – Um chazinho antes do serviço, hein?!

         - Isso mesmo, Roger! Para começar bem o dia... – Harry respondeu, vagamente.

         - É, com certeza, um chá é perfeito para um bom dia. Ou deveria dizer que Lucy Lathlan é perfeita para um bom dia? – Roger ironizou, em um riso no canto do lábio.

         Harry riu, suspirou e mexeu na camisa, sentindo calor, como quem diz "UAU!". A garçonete do Caldeirão Furado já era conhecida por todo o pessoal do Ministério por suas graciosas formas. E Harry, assim como muitos outros funcionários, já era conhecido por cortejá-la todas as manhãs.

         O carro parou em frente a um estabelecimento de esquina que os trouxas não percebiam. Em seu letreiro, lia-se "O Caldeirão Furado". Do outro lado da rua, erguia-se um prédio enorme, de uns vinte andares, com corujas entrando e saindo de todas as janelas a todo momento.

         - Até logo, Roger!

         - Até, Sr. Potter! Mande minhas lembranças a Lucy!

         Harry consentiu com a cabeça e saiu do carro, que partiu em seguida. Havia um velho bruxo na calçada vendendo jornais. Harry deu uma moeda a ele e pegou um "Profeta Diário". "Expectativa no anúncio do novo Ministro da Magia agita a Comunidade Mágica", dizia a manchete, que lhe arrancou um largo sorriso. Ele dobrou o jornal, colocou-o dentro do casaco e entrou no bar.

         O Caldeirão Furado estava cheio de bruxos do Ministério. O estabelecimento agora pertencia ao jovem Bob, neto do saudoso Tom. Logo após a morte de Tom, o pai de Bob batalhou para tornar o Caldeirão Furado um lugar melhor freqüentado. O estabelecimento tomou um ar mais jovem e seu principal público passou a ser formado pelos funcionários do Ministério, cuja sede mudara-se para o prédio em frente há muitos anos. Além disso, com a derrocada do partido das trevas, não havia mais bruxos malignos passando a caminho da Travessa do Tranco. As pessoas podiam passar tranqüilas para o Beco Diagonal a compras, a trabalho ou a passeio.

         Tão logo o Ministério se mudara para perto, o Caldeirão Furado adotou uma nova forma de "marketing": contrataram belas atendentes e garçonetes. Dois grupos ficaram insatisfeitos com tal atitude: as bruxas funcionárias do Ministério e os donos do Três Vassouras, em Hogsmeade.

         Harry foi direto ao balcão, onde duas jovens bruxas serviam os clientes em um ritmo de fastfood trouxa. Apesar de uma delas, que acabara de atender um velho bruxo, lhe sorrir, ele entrou na fila mais concorrida.

         Depois de cinco minutos, finalmente chegou a vez dele.

         - Olá, Lucy... como vai? – Harry disse em um sorriso.

         - Muito bem, Sr. Potter. O que deseja? – ela respondeu com profissionalismo.

         Harry a encarou como quem despe alguém com os olhos, pensando "Você".

         - O de sempre. – disse ele, afinal, e se sentou em uma mesinha próxima.

         Quando a bruxa lhe trouxe rapidamente um chá com torradas, Harry continuou seu flerte.

         - E então, Lucy, quando vai deixar de ser orgulhosa e aceitar meu convite para um passeio em Hogsmeade? – ele perguntou, lançando seu olhar sedutor e fazendo a moça corar violentamente.

         - Aqui está, Sr. Potter. – ela entregou-lhe o chá, como se ignorasse a proposta.

         - Me chame de Harry... – ele lhe sorriu e segurou sua mão sobre a mesa, seus olhos verdes brilhando.

         Lucy respirou fundo e esforçou-se para conter um sorriso de satisfação. Eles se encaram por um breve momento, em um jogo de olhares como se ele fosse devorá-la a qualquer instante.

         Lucy Lathlan era recém formada de Hogwarts e, atualmente, a sensação entre os bruxos solteiros do Ministério. Morena, cabelos compridos, lisos e negros, rosto altivo e um corpo que somente os dourados dezoito anos de uma mulher podem proporcionar. Ela fora aluna da Corvinal, apanhadora do time da casa no Quadribol desde seu terceiro ano. "Ah, as Corvinais! Há algo de especial nelas de alguma forma", Harry lembrou-se de ter pensado quando soube da história. Começou no Caldeirão Furado nas últimas férias de Hogwarts, para ajudar os pais. E, agora que tinha terminado a escola, estava juntando dinheiro para tentar uma Graduação Bruxa. Em Poções, costumava-se dizer.

         Os demais fregueses começaram a reclamar e Lucy teve que dar atenção a eles, desvencilhando-se de Harry. Ele não mexeu em seu chá, mas olhou para a moça mais uma vez. "Ela ainda será minha", ele pensou, ao que se levantava e saía.         Atravessou a rua com o Profeta Diário nas mãos e uma canção da época de sua juventude nos lábios.

         - Olá, Harry! – cumprimentou uma bruxa de vestido roxo.

         - Susan! Belo vestido! – Harry lhe sorriu de volta.

         Harry entrou no hall do grande edifício e as escadas mágicas o levaram até seu escritório, no décimo quarto andar.

         - Dino! – Harry deu um tapa nas costas do amigo.

         - Harry! E aí, preparado para o grande dia?

         Dino Thomas o acompanhou pelo corredor, enquanto conversavam sobre as expectativas de Harry. De todos os seus colegas de Hogwarts, Dino era o que tinha permanecido mais próximo, pelos caminhos estranhos que a vida toma. Como Dino também era solteiro, os dois, às vezes, saiam nos finais de semana para uma cerveja amanteigada ou algo assim. Atualmente, Dino era um gerente subordinado a Harry e estava torcendo muito para que o amigo se tornasse Ministro da Magia, o que, cá entre nós, seria uma promoção na certa para Dino.

         Harry acenou para ele, que virou à direita, seguindo para sua sala. No final do corredor, Harry esbarrou em uma bruxa desastrada que levitava uma pilha de livros acima da cabeça. Ela pediu desculpas, parecendo encabulada, e voltou a equilibrar os livros. Harry sorriu brevemente, mas não se lembrou de tê-la visto antes.

         -  Laura! E o seu regime? Não confie tanto naquele feitiço. Acho que ele não permite tantos abusos... – Harry sorriu para uma bruxa levemente acima de seu peso, que devorava um pote de doces animadamente.

         Ela parou subitamente, limpou a boca e colocou o pote na mesa, dando um sorriso amarelo.

         - Sr. Potter! Arrumei sua mesa esta manhã e deixei lá suas revistas preferidas. Se houver mais alguma coisa que eu possa fazer... – uma bruxa jovem e simpática o abordou.

         - Não, Rachel! Tudo bem! Eu te peço se precisar de qualquer coisa.... – Harry piscou a ela, impedindo-a de falar mais.

         Enquanto ele caminhava em direção a sua sala, uma bruxa toda de vermelho passou apressada por ele, cumprimentando apenas com os olhos. Ele ia dizer "Olá, Srta. Cheer", mas não houve tempo.

         Ele parou diante de uma porta onde, em uma placa dourada, estava grafado: "Harry J. Potter" e, abaixo, "Superintendente e Primeiro Secretário". Em sua mente, ele já enxergava a placa dizendo "Ministro da Magia". Mas não ali, é claro. Seria uma porta imponente, logo no acesso da escada, no vigésimo andar. Seria uma recompensa por todos seus serviços prestados. Seria a oportunidade para ele incentivar o treinamento de aurors e apertar o cerco contra Draco Malfoy e seus comparsas. Seriam realizados os maiores torneios de Quadribol que o Reino Unido já vira durante sua gestão....     

         E Harry entrou em sua sala com esse sorriso bobo, o pensamento longe.

         Foi recepcionado por duas bruxas gordas, que estavam animadíssimas. "Vou me lembrar de trocar as minhas secretárias... Quem sabe por aquela moça que me faz as coisas antes de eu chegar...".

         - E aí, Chefinho? Tudo pronto para a mudança para o vigésimo? – disse uma delas.

         - Sarah e eu já encaixotamos tudo!

         - Ótimo, Sandra! Mas vamos aguardar a confirmação, ok?

         As duas começaram a dançar, desengonçadas. Harry se divertiu muito e lembrou-se da razão pela qual as mantinha. Não havia stress naquele escritório com as duas por perto.

         Harry sentou-se em sua cadeira, pensando que seria a última vez que o faria. Pensando que, no dia seguinte, estaria em uma cadeira maior, em uma mesa maior, em uma sala maior.... quando ouviu a porta abrir.

         - Harry, podemos conversar? Pode vir a minha sala? – Sirius Black tinha um sorriso bonachão, quase piedoso. Ele apoiava-se em uma bengala e a barba lhe cobria grande parte do rosto.

         Harry levantou-se e saiu atrás dele, ouvindo suas secretárias murmurarem "Vai fundo, Chefe!" e "Manda bala!". Harry virou-se e deu um sinal de positivo a elas, mas alguma coisa no olhar de Sirius o preocupava.

N.A.: O motorista Roger é uma citação ao meu companheiro fatecano e colega de trabalho, Rogério Kohata, viciado no jogo Máfia, em que ele dirige um táxi.

A menção do escritório de Harry ser, atualmente, no décimo quarto andar vem de um cara super parecido com Harry Potter com 40 anos que trabalha no 14º. andar do edíficio em que trabalho.