CAPÍTULO 5 – A Filha

Harry parou na porta do Caldeirão Furado e suspirou. Aquele dia também não estava sendo dos melhores e ele precisava mudar seu rumo. A fila para ser atendido por Lucy Lathlan estava, como sempre, enorme. Harry estava adiantado para encontrar Rony e ficou bastante surpreso, já que era raro ele estar adiantado para qualquer coisa.

Ele entrou na fila da concorrida moça e esperou pacientemente. Ouviu, sem tanta paciência assim, todos os bruxos na sua frente a cortejarem. Para seu consolo, nenhum parecia obter sucesso.

- Olá, Sr. Potter! Como posso ajudá-lo? – Lucy perguntou enquanto passava um pano rápido sobre a mesa.

- Saindo comigo amanhã. – Harry foi rápido.

- Sr. Potter, por favor, sabe que não sou o seu tipo... Eu estou trabalhando e...

Encarando-a com seu olhar devorador, ele pensou que ela era exatamente o tipo dele. Harry já investia naquela mulher há vários meses e sabia que ela também o desejava.

- Lucy, Lucy, Lucy... Então quer dizer que quer que eu pare?

A garota olhou nos olhos dele e pareceu nervosa. Ela passou a limpar a mesa freneticamente.

- Parar? – ela engoliu em seco. – É... é isso. Eu... quero que você faça isso. Quero dizer, que pare. Isso.

- Por quê? - Harry perguntou, sarcástico.

- Porque eu... estou trabalhando e... tentando me concentrar. E não tenho tempo porque preciso estudar Poções para prestar o exame da minha Graduação e...

- Entendo.

- Entende? – ela pareceu incrédula.

- Sim, perfeitamente.

- Bom, então... é isso. Deseja alguma coisa?

Dessa vez, Harry não demonstrou nada e foi bastante indiferente.

- Ah, claro. Uma cerveja amanteigada, por favor.

Lucy parecia estar em semi-transe. Preparou-lhe a cerveja amanteigada e colocou em uma bandeja, empurrando-a para Harry.

Harry pegou apenas a caneca, empurrando a bandeja de volta. Agradeceu com um olhar, virou-se para procurar uma mesa e começou a contar: "Um, dois, três, quatro,...".

- Harry! – Lucy chamou em uma voz quase desesperada, ofegante.

Harry voltou-se para ela com o sorriso mais largo que ele já dera nos últimos tempos.

- Amanhã às dez?

- Às dez. – Lucy sorriu e balançou a cabeça diversas vezes.

- Te mando uma coruja, combinando tudo. – Harry piscou para ela.

Lucy continuava balançando a cabeça e só parou quando a outra garçonete a cutucou, apontando a fila de clientes, que, a essa altura, estava três vezes maior que o normal.

Todos os bruxos da fila fitavam Harry, admirados e invejosos. Desde que a jovem começara a trabalhar ali, nunca tinha aceitado sair com nenhum cliente. Harry deu um sorriso vitorioso a todos eles e sentiu-se grato por nem tudo em sua vida ir de mal a pior.


Harry sentou-se em uma mesa bem no centro do Caldeirão Furado e tomava sua cerveja amanteigada quando avistou um bruxo ruivo na porta. Ele sorriu longamente para o amigo e Rony, embora parecesse muito cansado, ficou feliz em vê-lo e sentou com ele.

- Harry, eu precisava falar com você... Mas acho que agora já é tarde...

Harry então esqueceu a graciosa garçonete e voltou seus pensamentos para o trabalho.

- Queria me dizer que Hermione seria a nova Ministra, não é?

Rony confirmou com a cabeça e acenou para que lhe trouxessem uma cerveja amanteigada.

- Pois é. Eu tinha muitas esperanças de conseguir o cargo. Sabe, estou um pouco desnorteado... sei que Hermione será uma Ministra brilhante. Minhas chances no Ministério acabaram por aqui.

- Harry, tente não ficar assim. Você é um grande bruxo. E nem mesmo a Hermione é perfeita, pode acreditar...

- O que quer dizer? E, falando nisso, como vocês estão? Ou... não estão? – Harry perguntou, vacilante, depois de beber um gole de cerveja amanteigada.

- Não estamos. Há muito tempo. – Rony disse com indiferença depois de pegar sua cerveja trazida pela outra garçonete.

- Oh. Eu.... lamento.

- Eu não. – Rony tomou um gole da sua cerveja amanteigada.

- Puxa, Rony. Achei que gostasse dela. Na verdade, já conversamos sobre isso. Eu achei que você gostava dela no momento em que se conheceram. Foi por isso que...

- Sim, você estava certo. – Rony o interrompeu. – E está. Eu gostava muito dela. Por Merlin, como amei aquela bruxa!

- Então? Vai me dizer que encontrou uma encantadora bruxinha recém formada de dezoito anos? – Harry apontou Lucy com o olhar.

- Não. Bom, para falar a verdade, hoje em dia, já existe alguém. Mas foi só depois de muito tempo...

Harry olhou para o amigo e indicou-lhe que prosseguisse.

- Eu tinha sonhos, Harry. Queria me dar bem no trabalho, é verdade. Mas eu queria mais. Queria uma família feliz, uma casa cheia de bruxinhos correndo para todos os lados. Eu fui criado numa família enorme. Não me sinto bem sozinho. Mas Hermione só queria o trabalho... sempre.

Rony abaixou os olhos, triste, antes de continuar.

- Então, eu a esperei. Eu a esperei por quase quinze anos. Era sempre a promoção que ela estava aguardando, o projeto que ela estava terminando, a viagem de trabalho que não podia esperar. Nunca podia esperar. Mas eu podia... porque eu a amava.

Harry começou a sentir uma pontinha de raiva de Hermione. Como ela podia ter feito Rony sofrer tanto?

- Até o dia em que ela me esclareceu. Não havia mesmo espaço em sua vida para uma família. E, além do mais, tinha ficado muito tarde para ter filhos, segundo ela. Eu ainda tentei salvar nosso casamento mas, quando percebemos, já estávamos muito distantes um do outro. Ela saiu de casa e foi morar em um apart hotel bruxo apertado, ao lado do Ministério Austríaco. Acho que ela não se importou, porque costumava virar a maioria das noites no serviço, de qualquer forma.

O tom de Rony era apenas ligeiramente magoado.

- Ela me escreveu outro dia, contando que viria para a Inglaterra. Perguntou de você. Ela queria que nos encontrássemos, nós três, mas depois acabou ocupada demais de novo. Mesmo assim, gostaria que pudéssemos ser amigos novamente. Foi quando comecei a tentar te encontrar para te avisar.

Harry refletiu sobre o que ouvira. Pensando um pouco, a história de Rony casava exatamente com a impressão que Harry tinha tido de Hermione no primeiro dia de serviço.

- Rony, eu nunca imaginei. Achei que vocês seriam tão felizes. A Mione era a minha melhor amiga, mas eu não vou conseguir perdoá-la por te machucar tanto...

Rony olhou para ele com um rastro de sorriso irônico.

- É melhor você perdoá-la, Harry. Ou ainda não perdoou a si mesmo também?

Harry o encarou interrogativamente.

- O que quer dizer, Rony?

- Você. Você fez a mesma coisa com a minha irmã. – dessa vez o tom de Rony parecia realmente magoado.

- Mas...

- Mas nada. Você também se tornou um viciado em trabalho. Mesmo a Brenda mal te conhece. Quantas e quantas corujas eu recebi... "Oi, mano, como você está? Eu continuo na mesma. Harry ainda não voltou de Londres, faz semanas que ele não escreve e Brenda está doente"...

Harry engoliu em seco.

- Você não pode imaginar minha alegria quando soube que vocês se casariam. Você era o meu melhor amigo e eu confiava absolutamente na felicidade da Gina ao seu lado.

Harry o encarou, sem palavras.

- Minha irmã merecia mais, Harry Potter.

Rony deixou algumas moedas sobre a mesa para pagar sua cerveja e se levantou.

- Rony, espera. Olha, tudo bem... você tem todo o direito. Eu não sei nem o que dizer, apenas que lamento muito por tudo. Devíamos conversar, todos nós, e resolver essas coisas para começarmos de novo. Estamos falando de amizades de mais de 25 anos!

- Estou em Londres. – ele disse, conjurando um pedaço de pergaminho na mão de Harry.

E, com um olhar significativo de "Procure-me", virou-se e saiu pela porta, desaparatando em seguida.

Harry pagou sua cerveja e também saiu, sem olhar para Lucy, que o encarava, esperançosa. Ele atravessou a rua e tomou um carro do Ministério para voltar para casa. Acabara de brigar com o melhor amigo que já tinha tido em sua vida e ainda precisava examinar o material que a Ministra lhe dera para a reunião da manhã seguinte.


Harry tentou se concentrar nas bruxas e no que fazer para impedir que elas se juntassem a Draco Malfoy, mas só conseguia pensar na conversa com Rony. Como nos velhos tempos, ele ainda era orgulhoso o bastante para sustentar uma discussão dessas sem sair correndo pedindo desculpas. Rony tinha razão, é claro, e estava magoado. Ele pensava numa forma de fazer com que todos se encontrassem e passassem as coisas a limpo, mas chegou à conclusão de que teria que conversar novamente com Rony primeiro.

Ele pensava em restaurar suas antigas amizades quando abriu a porta de seu apartamento e avistou uma mala no canto da sala. Brenda havia chegado e ele se esquecera completamente.

- Brenda! Brenda, querida, você está aí? Quer comer alguma coisa? Quando você chegou? – a voz de Harry ecoava solitária pelo apartamento.

Ele foi até o quarto de hóspedes e o encontrou todo arrumado, com uma bonita colcha sobre a cama. Harry tanto não conhecia a própria filha que não soube dizer se a menina havia encontrado Rose ou se ela mesma providenciara a decoração. Será que sua filha se preocupava em arrumar o quarto ou era desleixada como ele? Será que ela desenhava coraçõezinhos como Gina quando garota? Será que ela era uma boa aluna? Em que matéria ela se saía melhor? Será que ela jogava quadribol? Quem era Brenda Potter, afinal? Seu pai sabia tanto sobre ela quanto Snape gostava de Sirius.

Ele deu uma olhada no quarto vazio com carinho. Andou por todo o apartamento para se certificar de que a menina não estava lá. Olhou para a mala de Brenda, na sala. "As coisas dela estão todas aqui. Ela não deve demorar.", pensou. Ele decidiu trabalhar um pouco e esperar até mais tarde para se preocupar, caso ela não chegasse.

Harry recostou-se em sua cama e pegou o Profeta Diário. Logo, sairia a notícia de Hermione como Ministra, provavelmente no dia seguinte. "Arabella Figg, a voz feminina no Conselho", dizia uma manchete. "Bruxas acusadas de roubar lotes de poções do amor", dizia a outra. "Katie McRyan, a apanhadora da Inglaterra, bate mais um record", lia-se abaixo. Era tudo que o Profeta Diário tinha para dizer? Só falava de bruxas e seus feitos! Será que vinha sendo assim há algum tempo, como diziam no Ministério, e Harry só reparara agora?

Ele deixou o jornal de lado e, ao abrir um armário, encontrou algo que não examinava há algum tempo. Um pergaminho velho que ele fez questão de guardar.

- Juro solenemente não fazer nada de bom! – disse ele, apontando sua varinha para o Mapa do Maroto.

O Mapa não tinha muita utilidade, pois não conseguia captar os sinais mágicos de tão longe. Mas ele ainda podia imaginar os corredores de Hogwarts por aquele desenho e se lembrar de todas as aventuras que ele, Rony e Hermione haviam passado. Ele estava, novamente, perdido em recordações quando olhou de relance para seu paletó, estirado sobre a cama, com um pacote cor-de-rosa saindo do bolso. Ele tinha trabalho a fazer.

Harry pegou o pacote sem vontade e o colocou na mesa da sala. Ele o abriu e foi retirando os componentes, um a um, com cara de nojo. "Assim, não vai dar certo. Preciso entrar no espírito da coisa.", pensou ele. Ele olhou para a mala de Brenda e hesitou. Por fim, decidiu abri-la. Encontrou uma caixinha quadrada entre as roupas. Curioso, retirou a tampa. Um aroma floral preencheu o ambiente e uma melodia suave acompanhada de uma voz aguda invadiu seus ouvidos. Ele colocou a tampa novamente e tudo cessou.

Harry respirou fundo e voltou a abrir a caixa. Juntou todos os itens de volta no pacote e levou-o consigo, dirigindo-se ao banheiro, onde voltou a abri-lo. Examinou, então, o pacote que a Ministra lhe dera com um pouco mais de boa vontade. Ainda assim, algumas coisas ele não conseguia identificar. Outros elementos eram conhecidos, como uma poção do amor, uma poção emagrecedora, um feitiço "Tenha seus cabelos escovados em 5 segundos!", um feitiço corretor de dentes ("Será que se parece com o que Madame Pomfrey usou nos dentes de Hermione depois do incidente com o Malfoy?", pensou ele), um feitiço depilador, um vestido justíssimo, um chapéu violeta ridículo, um Manual da Bruxa Moderna, um Guia de Adivinhação, uma poção polissuco instantânea ("Nossa, basta colocar a essência de quem você quer se transformar. Que prático!", pensou ele, lembrando-se de suas aventuras com essa poção.), e diversos tipos de pinturas mágicas, permanentes e temporárias, para forjar expressões. Havia, também um pequeno vidro que Harry não conhecia e cujo rótulo, maior do que o próprio vidro, dizia: "Está deprimida? Seu marido não gosta de te escutar desabafar? Seus problemas acabaram! Com essa essência, os dois vão sair ganhando! Você vai poder falar a vontade e ele não vai se cansar de escutar, pois a ele vai parecer que você está falando sobre Quadribol o tempo todo. E se você contou algum segredinho, não se preocupe, ele não lembrará de nada depois do primeiro sono."

Todo aquele mundo ainda era totalmente distante para Harry. Contudo, ele resolveu dar uma chance à idéia da Ministra, vestindo a camisa, ou melhor, o vestido dela. Definitivamente, não servia nele. Harry quase o rasgou, tentando fazê-lo passar por suas costas e, quando se aventurou a fechar o zíper, apontando com a varinha, ele o rasgou mesmo. De qualquer forma, embora o vestido fosse pequeníssimo, parecia sobrar pano na altura do peito, enquanto ficava evidente que a peça não fora feita para abrigar nenhuma protuberância no baixo abdome, o que deixou Harry bastante desconfortável.

Harry arriscou o feitiço depilador, mas jogou a embalagem que o envolvia contra a parede quando descobriu a dor que ele causava. Para seu espanto, viu que tinha perdido aproximadamente um quarto dos pêlos da sua perna direita, mesmo tendo interrompido o processo. Harry agitou sua varinha sobre o feitiço escovador de cabelos, mas não ficou surpreso ao descobrir que ele não funcionara nos seus rebeldes fios, que permaneceram despenteados, como sempre.

Ele, então, partiu para as pinturas. Passou no rosto um pó que dizia "Sorriso simpático – sem rugas, marcas de expressão, pé de galinhas e olheiras". Harry sentiu uma coceira muito aguda e, quando olhou no espelho, tinha um sorriso patético estampado no rosto, que não se desfez nem mesmo ante sua cara de desgosto ao contemplá-lo. Além disso, sua pele estava bastante esticada, tirando-lhe, pelo menos dez anos das costas, ou melhor, do rosto.

Harry já estava começando a se preocupar com os contra-feitiços. "Só espero que ela tenha colocado aqui mesmo os feitiços reversos... ou vou ficar um bom tempo sem ir trabalhar!", Harry pensou consigo mesmo. Ele estava com um meio-vestido feminino, uma maquilagem absurda no rosto e assobiava uma canção qualquer enquanto procurava por eles no pacote, quando sentiu uma presença por perto.

- Pa..., quero dizer, Ha-Harry!? – uma bonita garota sardenta de olhos verdes e cabelos pretos presos em uma perfeita trança o encarava incrédula.

- Brenda... não é o que você está pensando... Eu.... eu.... Você me pegou em má hora... num dia ruim.... na verdade....

- Esse é o Mike. – ela disse, esforçando-se ao máximo para ignorar a situação ridícula do pai e apontando um garoto muito alto de cabelos cor de palha e olhos negros como a noite ao lado dela.

Harry estava tão constrangido com seu estado deplorável que nem havia prestado atenção no fato de Brenda estar acompanhada, fato esse que tornava as coisas particularmente piores.

- Mike, esse é meu pai. – disse ela ao garoto.

Mike não fez muito esforço para esconder o riso de deboche, tampouco fez Harry para esconder sua raiva. Entretanto, devido à pintura, ele permanecia com o mesmo sorriso bonachão de antes.

O garoto estendeu a mão, ainda debochando com os olhos, e encarou Harry.

- Michael Zabini, senhor.

Harry dera-se conta de que suas expressões estavam sendo bloqueadas pela pintura, mas apertou os olhos de tal forma que pareciam emanar deles faíscas verdes.

- Você sabe quem eu sou. – ele limitou-se a dizer.

O garoto deu uma rápida olhada à testa de Harry, confirmou com a cabeça e cessou os olhares provocativos.

- Amor, acho melhor eu ir embora. Não é uma boa hora. Te vejo amanhã, ok?

Quando Harry ouviu "Amor", fez uma cara de completo nojo e desaprovação que foi, obviamente, ocultada pela pintura.

- Certo, então. Até amanhã. – respondeu a garota e ficou na ponta dos pés para beijar o namorado.

Aquilo era demais para Harry. Ele virou-se de costas, fingindo procurar por alguma coisa.

- O que é isso? – Brenda estava agora sozinha e segurava a caixinha quadrada que Harry tirara das coisas dela.

- Brenda, você... beijou aquele cara?

- Eu perguntei "O que é isso". – insistiu ela, balançando a caixinha. – Você mexeu nas minhas coisas?

- Ora, eu precisava criar um ambiente feminino e peguei emprestado. – disse Harry, dando-se conta somente agora de que a melodia havia cessado. - Mas, então, quer dizer que agora você sai por aí, beijando caras, foi isso que a sua mãe te ensinou?

- Por que você nunca me ouve? Parece que eu falo com as paredes, você não vive no mesmo mundo que eu! Eu não gosto que mexam nas minhas coisas, entendeu? Eu já sei que minha vida vai ser um inferno enquanto minha mãe estiver fora, mas não quero minhas coisas espalhadas por aí! Eu sei que você nunca me ouve, mas não mexa nas minhas coisas, ok? – Brenda já estava alterada.

- Eu nunca te ouço, Brenda? Quem disse que eu nunca te ouço? Você é minha filha. Eu presto toda a atenção do mundo em você. – disse Harry, exagerando um pouco, ou muito.

- Ah, é?! Quer ver? Qual é o nome do meu namorado, Harry?

- Err... seu namorado.... – Harry tentou, mas o nome do garoto insolente que zombara dele escapara de sua mente. – Newton? – arriscou.

- Está vendo só?! Boa noite, Harry Potter!

- Brenda, espere!

- Ah, e tem mais uma coisa! – a garota se virou novamente. – Você devia ter vergonha de usar esses produtos cretinos para disfarçar seus sentimentos...

Harry ia explicar que era uma espécie de estudo para o Ministério, mas deteve-se. Será que o efeito da pintura passara? Como Brenda descobrira do que se tratava? Ele deu uma rápida olhada no espelho. Mantinha a mesma cara de bobo. Então, olhou interrogativamente para a filha.

- Como você sabe?

- Eu tenho os olhos da minha avó. Ela enxergava além das pessoas.

- Quem te disse isso?

- Tio Rony. Afinal, você não estava lá para me contar, não é mesmo?

- Eu... tenho os olhos da minha mãe... – disse Harry, com cuidado, depois de engolir em seco.

- É, infelizmente esses olhos também são seus. E você chegou a ser capaz de enxergar através das pessoas quando apaziguava sua mente. Isso parece ter se perdido, junto com seu caráter...

- Olha, aqui, Brenda, você não tem.... Como você....

- Você nunca me ouve, da mesma forma que não sabe nada sobre a minha avó, Harry. – ela finalizou, e sumiu corredor adentro, deixando para Harry o barulho da batida da porta.

A cada dia, ele entendia menos e menos a filha. Mas muita coisa tinha o deixado intrigado. Harry queria saber mais sobre a estranha ligação entre ela e sua mãe, assassinada quando ele mesmo ainda era um bebê. Contudo, ele sabia que seria quase impossível arrancar qualquer coisa dela. Ele tinha que se reaproximar dela aos poucos. Se, ao menos, ele conseguisse se lembrar do nome do maldito namoradinho dela, talvez ganhasse um voto de confiança.

"Morrison, Morrissey, Marley, ...", forçava-se a vasculhar sua mente em busca do nome.

Enquanto pensava no nome do rapaz, Harry preparou a banheira com diversos sais de cores e aromas diferentes, de modo que, logo, seu banheiro já o lembrava vagamente do banheiro dos monitores de Hogwarts. Harry reparou que Brenda deixara sua caixinha quadrada sobre a pia. Percebendo que não restara quase nada em seu interior, Harry decidiu usá-la para climatizar ainda mais seu "banho purificador" e, no dia seguinte, comprar outra novinha em folha de presente para a filha, fazendo-lhe uma surpresa. "Alguma bruxa do Ministério deve saber onde se encontram coisas assim", ele pensou. Imediatamente, a melodia suave e o cheiro de flores retornaram e tomaram conta do banheiro, misturando-se aos sais já dispostos anteriormente.

Ainda procurando algum contra-feitiço, Harry voltou a mexer no pacote de Hermione. Distraidamente, abriu a essência com rótulo maior que o vidro, enquanto refletia sobre a personalidade das bruxas. "Bruxas, bruxas, é tão difícil entendê-las. Será que eu não as ouço? O que elas querem?", pensava. Alternando esses pensamentos, nomes começaram a surgir em sua mente. "Matt, Michael....".

- Michael!! É isso! Mike!

Harry finalmente se lembrara! Ele mal podia esperar para contar a Brenda. Seria sua chance de reaproximação. Ele correu para a porta do banheiro, gritando.

- Brenda! O nome dele é Michael!

Estava tão afoito que derrubou a poção emagrecedora na pia. Tudo aconteceu muito rápido. Um vapor azulado subiu em frente ao espelho e fagulhas azuis estouraram violentamente. Harry tentou proteger os olhos e apoiou-se na pia, mas notou que ela ficava mais e mais fina e deu dois passos para trás. O espelho também começou a "emagrecer", até o ponto em que se partiu em milhares de pedacinhos, fazendo-os voarem perigosamente pelo banheiro. O estouro do espelho fez o vidro de essência aberto tombar e derramar seu conteúdo no chão.

Harry foi jogado para trás pela explosão doméstica. A chuva dos vidros magros provocou-lhe diversos pequenos cortes, principalmente nos braços, que ele erguia para proteger o rosto. O meio-vestido justo que ele estava usando mostrou prejudicar muito sua mobilidade e ele não foi capaz de se equilibrar apropriadamente quando recebeu o impacto do estouro, caindo de costas ao lado da banheira.

Como outra conseqüência da explosão do espelho, o Chapéu violeta foi jogado na banheira, cujas águas já estavam inquietas pela grande mistura de substâncias presentes. A instabilidade era tamanha que, quando o Chapéu atingiu violentamente a banheira, ela jogou metade de suas águas para fora, bem em cima de Harry.

A água tinha todos os cheiros, cores e sabores imagináveis ao mesmo tempo e, principalmente, estava muito, muito quente. Com o golpe da água, Harry sentiu um calor muito intenso invadir-lhe até mesmo o cérebro, enxergou uma fumaça cor de rosa espalhando-se pelo banheiro, e teve a impressão de se ver envolto em uma grande bolha magenta. Depois, não viu mais nada.


N. A.: Gostaria de pedir desculpas pela imensa demora nesse capítulo. Eu adoro escrever essa fic, mas tempo é algo realmente complicado para mim. Muito obrigada a todas as pessoas que me escreveram com seus elogios, críticas e apoio em geral. Para aqueles que ainda não desistiram de ler essa história, o capítulo ficou relativamente grande na minha opinião (considerando o espaço de tempo e os fatos narrados). Para os que gostarem, isto é, se houver alguém, deixem que seja uma espécie de remissão. Parte disso aconteceu porque a conversa com Rony acabou sendo mais profunda e mais abrangente do que eu inicialmente tinha imaginado. De qualquer forma, considero positivo, pois ele é uma personagem muito importante para o Harry e não é justo deixá-lo jogado como um boneco sem sentimentos, ainda que ele seja um mero coadjuvante nessa história. Além disso, acho que é útil para contar mais sobre o passado de forma não cansativa e obter outra visão dos fatos. Falando em outra visão dos fatos, esse é o tópico principal do próximo capitulo, como aqueles que assistiram ao filme devem imaginar. Ele deve se chamar "Todas as bruxas de Londres" e eu vou me esforçar (como sempre) para terminá-lo o quanto antes.

Apenas uma correção:

Em uma N.A. do capítulo 2, eu disse que o seguinte:"(...) A menção do escritório de Harry ser, atualmente, no décimo quarto andar vem de um cara super parecido com Harry Potter com 40 anos que trabalha no 14º. andar do edifício em que trabalho."

Pois bem, ironias do destino à parte, eu fui trabalhar no 14º andar, no departamento desse cara a quem me referi acima. Cometi uma grande injustiça: o moço, na verdade, tem 29 anos (apesar de parecer 40 mesmo). Descobri que ele é um excelente profissional e uma pessoa de ouro, como raros na minha área em geral, aliás.