Heero POV

Minha cabeça estava latejando… Será que eu me auto-destrui com o Wing de novo? Não lembro das ordens para fazer isso. Na verdade nem lembro da batalha ou da explosão. Ainda estou no chão perto dos destroços? Porque me sinto nu?…

Porra! Eu estou nu. Melhor dizendo, o que eu estou fazendo aqui nu? Na verdade, onde eu estou?

-Hum… - gemido? Relena? Não, não é ela… eu nunca que acordaria nu ao lado dela, sem nenhuma memória da noite anterior. Até porque, ainda não nos casamos. Ou casamos? Só para conferir… não, sem aliança. Então? Que diabos está acontecendo aqui?

Calma Heero, pare e respire. O que você fez ontem antes da sua memória criar uma misteriosa lacuna a partir das onze horas da noite? Eu me aprontei porque os outros pilotos iriam passar na minha casa. Algo relacionado a uma despedida de solteiro. É isso! Quatre e Duo me arrastaram para aquela boate dos infernos, com Trowa e Wufei mancomunados a eles, para uma última noite de solteiros. "timo Yuy, você está indo bem. E depois? Bem, depois eles me disseram para relaxar. Hunf, relaxar. Queria ver eles relaxarem a doze horas de ir para o altar. Lembro de Duo dizendo alguma coisa de deu estar muito tenso e que deveria beber. Aceitei o conselho dele. Que estupidez. Quando foi que eu ouvi os conselhos daquele americano idiota? Agora estou com uma bruta ressaca e sem a mínima noção do que aconteceu.

-Hum… - outro gemido. Estou com medo de me virar e ver quem está ao meu lado. E se eu trouxe alguma mulher que estava aquela noite na boate, comigo? Se Relena descobrir isso, a gente se divorcia antes mesmo de completar um ano de casamento. Virei de costas e deitei reto no chão, sem ainda olhar para a minha companhia. Rodei meus olhos pela sala onde estava para ver se me localizada. Engraçado, essa decoração me parecia familiar. Ao menos isso já era um progresso. Certo, agora o segundo progresso era descobrir quem estava ao meu lado. Pois pelo jeito que eu me sentia, com ressaca, dolorido, cansado, mas ao mesmo tempo satisfeito, isso só poderia significar uma coisa: eu fiz sexo. Argh, perdi a minha virgindade com uma estranha.

Não! Não ria, eu sou virgem, ou ao menos era. Mas claro que até o fim da guerra, até eu começar a namorar Relena, essas coisas de relacionamento e sexo não me passavam pela cabeça. E eu não tenho vergonha de admitir isso, mas eu era uma pedra sem emoções. Mas eu juro que estou tentando mudar, por mim, pelos meus amigos, por Relena. Estamos em paz agora e o mundo não precisa mais dos pilotos Gundam. Estranhamente pensar nisso alivia um peso no meu peito. Eu nunca pensei que odiaria tanto a guerra até que ela terminasse. Eu também nunca pensei que ficaria feliz por ter sobrevivido à guerra. Eu acho que era porque eu tinha medo do depois. Sim, medo. Eu era solitário, minha única companhia era um cientista maluco que tornou parte da minha vida um inferno. Eu achei que se trouxesse paz e sobrevivesse ao mesmo tempo, eu teria uma vida vazia e sozinha. Por isso eu não tinha tanto apreço por minha vida, por isso eu não me importava em morrer pela missão. Isso até que eu conheci os outros pilotos, até que eles começaram a penetrar em minhas barreiras sólidas de soldado e me fazer perceber que eu tinha motivos para sobreviver. E isso era bom.

Agora… parando de divagar sobre a minha vida e meu passado, está na hora de eu criar coragem para saber quem é que está comigo. Fechei os olhos e respirei fundo, virando-me e abrindo novamente os olhos, tudo para me deparar com um par de orbes violetas confusos, que estavam piscando para mim.

-AHHHH! – gritamos ao mesmo tempo, dando um salto e nos sentando, bem longe um do outro. Porém, gritar foi um erro, pois a minha cabeça latejou com o barulho e o movimento.

-Fale mais baixo baka. – eu grunhi. Espera… Baka? Eu só usava essa terminologia com uma pessoa. E estava tão acostumada com ela que às vezes a palavra saía automaticamente da minha boca. Então, isso só poderia significar uma coisa. Focalizei a minha visão e desejei não ter feito isso. Sentado na minha frente, tão confuso quanto eu, estava Duo. Meu melhor amigo… meu melhor amigo que estava nu. Dei outro grunhido, isso não poderia ser nada bom.

-Heero? – qualquer perspectiva de perguntar ao americano o que tinha acontecido foi por água abaixo. O tom com que ele chamou o meu nome indicava que ele estava tão perdido quanto eu.

-Hn. – certo, eu sei que estou tentando mudar, ser mais humano, mas você não transforma carvão em diamante da noite para o dia. Mas juro que estou progredindo.

-O que aconteceu… - ele ficou quieto, o que é um marco para Duo Maxwell, depois olhou para mim, e olhou para si próprio, vendo o estado em que estávamos. Um rubor começou a surgir em suas bochechas, descendo pelo seu pescoço e peito, e os meus olhos apenas se moveram acompanhado a vermelhidão que estava surgindo em seu corpo. Quando eu percebi o que estava fazendo, meu rosto começou a esquentar e eu desviei o meu olhar. Deus era a ressaca, só poderia ser. Eu não estava secando o meu melhor amigo.

-Quantas eu bebi? – resolvi mudar de assunto pois não queria abordar a situação que estava evidente aos nossos olhos. Nós dormimos juntos. E não fazíamos a mínima idéia de como chegamos a esse ponto.

-Acho que tanto quanto eu… você se lembra de alguma coisa?

-Vagamente… - estávamos andando em círculo. E sabíamos que essa situação não poderia ser evitada por muito tempo. Então eu resolvi ser direto. Essa é uma característica minha que ainda não foi mudada. Ser lógico e direto. E alguém tinha que começar. E parecia que esse alguém não seria o Duo. –Escuta… Duo… sabemos o que aconteceu aqui, mesmo que não nos lembremos muito. – ele apenas ficou mais vermelho. Ele ficava uma graça envergonhado… não Heero… esse não é o ponto aqui. Acho que ainda estou um pouco embriagado.

-É… nós… nós… - agora ele parecia extremamente envergonhado e eu arregalei os olhos quando percebi que o problema não era somente o fato de termos tido sexo. Duo também era virgem. Se era assim, o melhor era colocar um ponto final nisso.

-Duo… você é meu amigo, meu melhor amigo… Inferno, você foi o meu primeiro amigo, e eu não quero estragar isso. – ele me olhou com uma certa… esperança nos olhos. Acho que ele tinha medo que isso destruísse a nossa amizade. Bobagem, foi apenas um ato inconseqüente de dois garotos bêbados. Acontece. É algo normal… e Deus sabe que normalidade é uma palavra que não existiu muito em nossas vidas.

-E? – ele me perguntou quando eu fiquei em silêncio por muito tempo, perdido nos meus pensamentos.

-E nada vai mudar. O que aconteceu essa noite foi…

-Um acidente? – enrijeci um pouco. Não queria dizer que foi um acidente, porque acidentes levam a culpa. Dá a idéia de que foi um erro. E não era isso… eu não me arrependia. Quero dizer, okay, eu dormi com um garoto, mas esse garoto era o mesmo que salvou a minha vida inúmeras vezes. E não é como se eu estivesse apaixonado pelo Duo ou coisa e tal. Não acho que isso seja um erro. Quem me visse pensar assim nem me reconheceria. Heero Yuy, o frio soldado sendo tão compreensivo assim. Bem, às vezes nem eu mesmo me entendo.

-Uma brincadeira. – okay, não é uma palavra muito legal para se descrever a coisa, mas é mais leve que acidente. –Não lembro do que aconteceu, mas não me arrependo do que aconteceu. Não estávamos cientes do que fazíamos, mas fizemos. E além do mais isso não vai mudar as nossas vidas. Você ainda é meu amigo, é meu padrinho… - a menção da palavra padrinho pareceu acordar algo nos olhos dele que eu não entendi. Parecia que ele havia se lembrado de algo.

-Merda! – Duo levantou-se tão rápido que eu nem tive tempo de registrar o que aconteceu. –Vamos nos atrasar Heero. – e ele me puxou e me pôs de pé, com um grande sorriso no rosto. Um sorriso genuíno, o que era raro. Sim, eu sei que Duo sempre foi o mais alegre dentro do nosso grupo, mas eu também sei que parte da alegria dele era apenas uma máscara para esconder o Shinigami. E só um bom observador perceberia isso.

-Atrasar? – eu ainda estava meio zonzo.

-Seu casamento Heero! Você tem que estar na igreja em uma hora! – e ele foi me empurrando em direção ao banheiro.

Quarenta minutos depois estávamos na caminhonete de Duo, nos dirigindo para a igreja. Sorte a minha que a gente tinha decidido que padrinho e noivo iriam juntos para a igreja, senão eu teria que ir correndo para casa para poder me trocar. Ainda bem que as minhas roupas já estavam no apartamento de Duo. Ele iria me ajudar a me aprontar, pois entendia mais de roupa do que eu. Afinal, no passado eu nunca tive um guarda roupa muito variado. E ainda não teria, se não fosse Relena insistir que regata e spandex não era uma roupa apropriada para ficar se usando a toda hora e em todas as ocasiões. Eu acho prático, melhor do que esse smoking e essa gravata me apertando o pescoço.

-Pare com isso Heero. – Duo estapeou a minha mão para longe do colarinho. Um dos motivos de eu sempre ter detestado me esconder naqueles internatos durante a guerra era por causa dos uniformes. Eu odeio gravatas. E essa será a última vez que eu uso uma. –Foi um custo prender isso em você, não estrague o meu trabalho agora. – ele riu, enquanto estacionava o carro na frente da igreja. Ficou olhando para ela por um longo tempo em silêncio, o que era estranho. Foi quando outro clique veio a minha mente. Igreja. Há quanto tempo Duo não entra em uma igreja desde o massacre da Igreja Maxwell? Será que isso trazia boas ou más lembranças para ele?

-Duo? O que foi? – ele piscou e voltou-se para mim com um largo sorriso. Bem, acho que não era bem as lembranças que incomodavam Duo, mas sim outra coisa.

-Eu tenho que lhe dizer uma coisa Heero. – a seriedade dele era tanta que eu fiquei assustado.

-O quê?

-Confesso que eu fiquei preocupado com você amigo, quando a guerra terminou. Achei que você ficaria… perdido.

-E eu fiquei. – tive que dar um pequeno sorriso. –Mas… então eu lembrei que eu tinha vocês, vocês me ajudariam a viver em um mundo de paz.

-E pode ter certeza de que faríamos isso. – ele sorriu de volta, outro sorriso genuíno. –Por isso eu quero dizer que eu estou orgulhoso de você Heero. E espero, de coração, que você seja feliz. – já ouvi muitos discursos na minha vida. Discursos de guerra, discursos políticos, discursos de paz. Alguns bem passionais, outros frios e impessoais. Os discursos de Relena sempre eram passionais, eu gostava deles, mas nenhum me tocou tão fundo como esse. Eram palavras simples, mas ao mesmo tempo com grande significado. Claro que eu não me debulhei em lágrimas e coisa e tal. Esse não era eu. Mas eu senti… coisa que estava sendo nova para mim. Eu senti as palavras dele aquecerem um coração que muitos pensavam, que eu achava, que não existia.

-Obrigado Duo. – o puxei para um rápido abraço, ainda não acostumado com todo esse contato humano, e depois saímos do carro.

-Vamos fazer o que viemos fazer. – ele falou divertido e entramos na igreja. Eu estava nervoso, mais do que estive no dia em que a Operação Meteoro começou. A única diferença era que esse era um nervosismo bom… se é que existe isso. Era uma nova etapa na minha vida, algo que eu tinha escolhido e não sido imposto a mim por um doutor maluco e rebelde. E eu gostava disso. Gostava mesmo.