Hilde POV

Duo está estranho. Quero dizer, eu sei que ele nunca foi à criatura mais normal da face da Terra e das Colônias, mas mesmo assim ele ainda está estranho. E isso começou há alguns meses. Uns dois meses atrás para ser mais exata, um pouco depois de ele ter voltado do casamento de Heero com Relena. E eu sei que é o casamento deles dois que incomoda Duo. Alguma aconteceu para ele estar assim… estranho. Mas, por mais que eu insista, ele não quer me contar, e eu estou ficando preocupado. Sim, preocupada

Ele anda abatido e pálido, não anda comendo nada mas estranhamente está engordando ao mesmo tempo. Está com um ar melancólico, mas com um brilho diferente a sua volta. Às vezes está cansado demais para trabalhar, o que não é normal vindo dele. As pessoas tendem a achar que Duo é preguiçoso, mas isso é uma mentira. Como ex-morador de rua, órfão e piloto, Duo sempre teve que batalhar mundo para conseguir viver e sobreviver. E ficar parado sem fazer nada, depender dos outros, nunca foi o estilo dele. E trabalhar sempre pareceu lhe renovar as energias. Ele sempre diz que isso o fazia se sentir novo, como se tivesse compensando todas as coisas ruins que tinha feito na guerra. Não o contesto, apenas concordo com ele. Pode ser que eu não o entenda completamente, mas ainda sim o entendo. E esse é mais um motivo para eu ficar preocupada. Tenho medo de que ele esteja ficando doente… tenho medo de que ele esteja se tornando um depressivo.

Como futura enfermeira… minha sociedade no ferro velho é apenas para pagar os meus estudos… posso garantir que ele está doente. E eu já conversei com ele sobre isso, mas o teimoso se recusa a procurar um médico. Diz que é apenas cansaço pelo excesso de trabalho. Mas aí é que está. Ele está sempre abatido demais para trabalhar, então como pode ser cansaço por excesso de trabalho? Isso não é bom, não é nada bom. E eu continuarei a bater na mesma tecla até ele me ouvir.

E eu realmente bati na mesma tecla. Mas um mês se passou e eu só pude ficar de expectadora enquanto via Duo piorar, ou melhorar, com o que quer que seja que ele tenha. E os meus instintos de enfermeira dizem que o que seja que ele tenha, não pode ser nada bom. Porque no último mês, ele passou a comer absurdamente, engordando ainda mais. E pelo que eu sei, Duo não tem tendência a engordar, ou tem? Anda nervoso e explodindo a toa. Sei que ele tem um gênio difícil, mas também pode ser extremamente paciente quando quer. Outras vezes, ele fica pelos cantos silencioso e melancólico. Mas foi nos últimos dias que a coisa ficou pior, pois ele parecia extremamente preocupado com alguma coisa. E foi em uma manhã antes de ir para o trabalho em L2, que eu descobri qual era o grande problema de Duo Maxwell, e devo dizer que às vezes eu preferia não ter ficado sabendo.


Duo POV

Eu queria matar alguém. Melhor, eu queria matar G, mas o filho da mãe já estava morto e por isso eu só poderia ficar na vontade. Depois de G eu queria matar o Heero, mas lembrei que o pobre, assim como eu, não fazia nem idéia do que aquela noite de farra ocasionaria. Eu queria me matar. Porque com certeza isso deveria ser algum castigo. E eu pensei que assistir as mortes das pessoas que eu amava, por causa da minha estupidez, já era castigo o suficiente. Mas não, isso tinha que acontecer na minha vida. E era algo bizarro. Eu estava ficando bizarro. Creio que não estejam entendendo as minhas palavras sem nexo, mas eu vou tentar explicar.

Primeiro de tudo, quando voltei a L2 depois do casamento de Heero, resolvi enterrar bem no fundo do meu ser qualquer sentimento e pensamento que aquela noite com o japonês trouxe. E assim o fiz, e estava indo bem até que coisas estranhas começaram a acontecer comigo… Eu comecei a me sentir estranho. Muito estranho mesmo. Meu corpo parecia estar mudando e eu percebia isso.

No primeiro mês depois do casamento, eu comecei a sentir dores horríveis no abdômen e por causa disso não conseguia ingerir nada sem correr o risco de vomitar. O segundo mês eu me sentia cansado e melancólico. Apto a chorar a qualquer momento por coisa nenhuma. Às vezes sentia um calor estranho subir pelo meu corpo, e às vezes sentia frio. Outras eu ficava irritado. No terceiro mês as dores passaram e de repente eu me tornei um devorador de qualquer porcaria que aparecesse na frente. Eu estava comendo feito um louco, e olha que eu nunca fui de comer muito. Eu sei que adoro porcarias, comidas nada nutritivas, mas mesmo assim para quem já passou fome, saber que vai acordar todas as manhãs com um teto sobre a sua cabeça e com a geladeira cheia de comida, ainda é um fato estranho. Minhas maiores vítimas dessa fome súbita foram os amendoins e potes e mais potes de doce de leite. E acredite, quando você começa a comer doce de leite com amendoim e calda de chocolate, alguma coisa está errada.

E então, eu comecei a engordar. Não sei quanto aos meus genes, mas creio que eu não tenho tendência a engordar. Acho que G não permitiria um piloto propenso a engordar sentar no cockpit de um Gundam. Nada contra os gordinhos, mas creio que o doutor maluco iria preferir alguém sempre magro para as missões por causa dessa coisa de leveza e agilidade. Tenho certeza que ele fez de tudo para garantir que eu nunca ganhasse uma grama, por mais que comesse. Porém, agora, eu estou engordando. E diferente de um homem comum, que só engorda a barriga, eu estou ganhando uns pneus e uma barriga que está longe de ser flácida. Até aí as minhas suspeitas já estavam nas alturas. Até que o dia em que eu percebi que realmente havia algo de muito errado comigo, chegou.

Era o quarto mês desde que Heero se casou. E fazia quatro meses que as únicas noticias que eu dava aos outros pilotos era através de e-mails e uns raros telefonemas. E geralmente era com Quatre que eu mais falava. Eu sabia que se eu falasse com Quatre, conseqüentemente Trowa ficaria sabendo, pois estava trabalhando nas Corporações Winner com o loirinho. Wufei estava sempre ocupado nos Preventers e por isso raramente eu o contatava, pois ele sempre estava em missão na Terra ou no espaço. Uma vez ele deu uma parada aqui em L2 e a gente almoçou juntos, mas isso foi há dois meses. E quanto ao Heero, me comunico com ele apenas por e-mails. Sei que jurei enterrar qualquer coisa que aquela noite tenha despertado em mim, mas mesmo assim não me sinto pronto para um encontro cara a cara. Sem contar que eu soube que ele anda bem ocupado como marido da Vice-Ministra da paz. De qualquer modo, era mais um dia de trabalho e eu iria feliz para o ferro velho se não tivesse sentindo o meu estômago embrulhando e a minha comida retornando pelo caminho que havia feito noite passada.

Mais do que depressa eu saltei da cama e corri para o banheiro, mal conseguindo levantar o assento do vaso antes de despejar todo o meu jantar nele.

-Vida porcaria. – murmurei para o nada, recostando na parede fria do meu banheiro e colocando a mão sobre a barriga para ver se conseguia de algum jeito acalmar o meu estômago. E foi aí que eu senti… senti algo se mexer dentro de mim.

Meus olhos se arregalaram e meu coração começou a bater fortemente, quase saindo pela boca, enquanto eu tremia feito vara verde. Isso não poderia ser meu estômago. Até porque, pelo que eu lembro da anatomia humana, meu estômago está um pouco mais para cima. Sentei mais reto, usando a parede como apoio, e com os dedos trêmulos pressionei o meu ventre levemente. Senti uma pontada de dor e novamente uma vibração na minha barriga, que agora estava arredondada por causa dos quilos que eu ganhei. Tinha algo vivo aqui dentro. Ou então era um sério caso de gases.

Levantei, com as pernas bambas, e caminhei até o meu quarto, abrindo o armário e catando aquela caixa de primeiro socorros que eu sempre mantinha em casa, desde a guerra. Senti outro movimento na minha barriga e estava começando a entrar em desespero. "rgãos não se moviam sozinhos, e creio que eles não começariam agora. Muito menos os meus. Pensei na possibilidade de vermes… mas descartei rapidamente… novamente por causa de G. Saúde perfeita, era o mínimo que ele exigiria para ser um piloto.

Outra vibração. E agora de assustado eu estava entrando em estado de pânico. Claro, eu poderia ir correndo para o médico e descobrir o que há de errado, mas o instinto de soldado me dizia que essa não era a melhor solução. E eu nunca deixava o meu instinto de lado. Finalmente achei a porcaria da caixa e fucei nela, achando o que eu queria. Um estetoscópio. Mas para que eu iria querer um estetoscópio? Bem, sinto muito mas no momento eu não sou capaz de comprar um ultra-som, então tento descobrir o que há de errado com o que eu tenho nas mãos.

Meus joelhos quase cederam enquanto eu caminhava até a minha cama e sentava como um peso morto nela, com as mãos trêmulas coloquei os plugs do estetoscópio nas orelhas. Dei uma inspirada profunda de ar para acalmar o meu coração, repetindo para mim mesmo que não era nada. Que com certeza aquela porcaria de mistura de amendoim com calda de chocolate foi o que me fez mal. Depois de minutos tentando meu convencer disso, eu finalmente consegui me acalmar o suficiente para ouvir o que estava acontecendo dentro de mim.

Primeiro verifiquei o meu coração, que já estava no compasso normal novamente. Depois desci um pouco o aparelho e verifiquei a área do estômago. Um ronco vibrou nos meus ouvidos. Nada anormal, eu estava com fome… de novo. Quando estava aproximando do meu ventre, minhas mãos começaram a tremer novamente, pois senti outra vibração. Me acalmei o suficiente para poder colocar o estetoscópio sobre a área "viva", e saber o que estava de errado.

No início nada parecia anormal, até que aconteceu… um pequeno barulho, parecendo um tambor ao longe, alcançou os meus ouvidos. Ele era ritmado, suave, e lembrava muito a batida de um… coração? Será que o meu coração estava batendo tão forte que estava ecoando em minha barriga? Impossível. Eu podia sentir o meu coração na minha caixa torácica e ele estava quase explodindo. Essa batida era mais ritmada e calma… e foi então que eu entrei em desespero e procurei a primeira pessoa que pude pensar… Hilde.