Capítulo 03 – O tio da barba

Chegando na Biblioteca Pública, Luciana ficou esperando com os pais do lado de fora. Haviam chegado uns 20 minutos antes com medo de perder alguma coisa.

Não tardou muito, Aline chegou com os pais e se surpreendeu em ver Luciana ali. Começou a conversar com ela e descobriu que a garota também ia para Hogwarts. Quatro pessoas da mesma escola iam para Hogwarts; era muito mais coincidência do que ela esperava! Contou a Luciana que Cinthia e (Argh!) Douglas também iriam para Hogwarts. Quando Cinthia chegou com os pais e os irmãos também ficou surpresa de ver Luciana ali, mas com uma conversa rápida acabou sabendo da novidade.

Ás 17:00h em ponto uma voz cumprimentou-os. Um velhinho de barbas e cabelos muito longos e vestes compridas e esquisitas apareceu, como num passe de mágica, sem que eles percebessem. Cinthia se lembrou que agora mágica era uma opção válida.

- Olá a todos. Sou Alvo Dumbledore, diretor da escola de magia Hogwarts. Três crianças... está faltando um. Espero que não se incomodem de esperar pelos Berttapeli.

Menos de um minuto depois Douglas chegou nem um pouco constrangido de ter se atrasado. Já seu pai, tentava explicar freneticamente porque não conseguiram chegar no horário.

- Tudo bem – disse Dumbledore. - Não precisa dar explicações. Bem, acho que todos aqui tem suas duvidas, mas vou explicar as que são da curiosidade de todos antes.

"O motivo pelo qual vocês vão estudar em Hogwarts e não na escola bruxa do Brasil é que o Departamento de Magia daqui é um tanto bagunçado. Desculpe Sr. Berttapeli, mas é verdade.

- Tudo bem, eu sei disso.

- Continuando... Como passamos por tempos de guerra a alguns anos, desenvolvemos um tipo de "monitoramento mágico", que funciona até os dias atuais para nos assegurarmos que tudo continua bem. Um rastreamento mais fraco era usado para saber quando os alunos não autorizados usam magia fora da escola, o mesmo tipo que tem aqui. Esse monitoramento mágico aperfeiçoado captou uma forte concentração vindo do Brasil, mais especificamente de vocês quatro e outras duas crianças. Como os outros dois vem de famílias totalmente bruxas não achei necessário que viessem hoje.

"Comunicamos o Ministério daqui e eles concordaram em enviá-los a Hogwarts, onde aprenderão a desenvolver mais suas habilidades mágicas do que se estudassem em Tapiruam.

- Isso explica muitas coisa - disse o Sr Berttapeli.

- Mas como você tem certeza de que somos bruxos? - perguntou Luciana, que estava curiosa para saber mais e mais do mundo bruxo.

- Vocês mesmos podem me dizer - disse Dumbledore. - Nunca aconteceu nada "anormal" quando se sentiram zangados, ou até mesmo perturbados?

- É... Teve uma vez em que só as luzes de casa funcionaram enquanto todo bairro estava com black-out, quando eu tinha uns 5 anos.

- Comigo também acontece uma coisa nas férias! - disse Aline se intrometendo. - Eu fiquei muito irritada com os meus primos porque eles me chamaram de tampinha rechonchuda - Douglas tossiu algo parecido com "verdade" – num jogo de basquete, e olha que eu sou mais velha do que eles. Depois, de todas as cestas que eu tentava fazer, todas eu acertava! Eles ficaram tão bravos... - Aline sorriu ao lembrar a cara de taxo dos primos.

- Viram só - continuou Dumbledore sorrindo. – Tenho certeza que vocês são bruxos, e de primeira eu diria. – Ele deu uma ultima olhada para todos e continuou. - Todos trouxeram as malas? Pois bem, acho que está na hora de partirmos.

- Só mais uma pergunta - disse Douglas – Como nos vamos para Londres? Pó de Flu?

- Não, não. Pó de Flu seria muito desconfortável em uma distância tão grande, e vocês ainda não tem permissão para aparatarem. Vamos de avião. Essas primeiras passagens de ida são por conta da escola, não se preocupem.

Dumbledore chamou um táxi enquanto que os outros iam nos carros da própria família. Assim que chegaram ao aeroporto, Dumbledore disse que o vôo sairia dali a 15 minutos. Nestes 15 minutos todos se despediram das famílias e embarcaram no avião, com uma sensação de surrealismo no ar.

O vôo saiu às 18:00 e ia durar bem umas 8 horas. Dumbledore parecia encantado com os botões do lado das poltronas e perguntava o que cada um fazia a Douglas, que estava sentado ao lado dele na janela. As meninas estavam sentadas nas poltronas da frente, com Luciana no corredor, Cinthia no meio e Aline na janela. Após umas 5 horas de vôo, Luciana já havia pegado no sono enquanto Dumbledore acabara de ir ao banheiro. Douglas não pensou duas vezes em aproveitar a oportunidade.

- Ei, Aline!

- Que é, Tosco? - disse ela mau humorada virando-se para trás.

- Eu sei que dia é hoje.

- Uau! A maior descoberta científica do século! Parabéns! - respondeu ela sarcástica. Não estava em clima para brigar, mas não ia deixar Douglas provocá-la sem levar o troco.

- Você sabe do que eu estou falando - disse Douglas com um sorriso maldoso. - Hoje é seu Aniversário.

- E o que tem isso de mais? Você também tem onze anos, embora mentalmente você seja mais burro que uma criança de cinco.

- Que agressiva... só queria te desejar um feliz aniversário. E te dar um presentinho.

Ele abriu a bagagem de mão e entregou a Aline uma caixa com um bonito embrulho e um laço bastante arrumado. Olhou desconfiada para a caixa e depois para Douglas, que estava com uma cara muito inocente para parecer fingimento. Chacoalhou a caixa, ainda desconfiada, perto da orelha. Olhou para Cinthia pedindo um conselho, mas esta deu de ombros e continuou a ler o livro que levara para a viagem.

Abriu a caixa e viu uma boneca de pano comum. Pegou a boneca de dentro da caixa... nada de estranho. Apertou a barriga da boneca para ver se era macia e instantaneamente a cabeça explodiu, deixando a cara de Aline toda suja. Quando ela falou, cada sílaba tremia de raiva.

- Seu... Tosco... idiota! Espere só até o Dumbledore voltar!

- Ah! O tio da barba ainda demora.

- O que esta acontecendo? - Dumbledore perguntou calmamente.

Antes que Aline pudesse falar qualquer coisa, Douglas fez a cara mais inocente que poderia fazer e respondeu ao diretor. – Apenas um pequeno trote de aniversário, diretor. Uma simples e inocente brincadeira.

Dumbledore olhou-o severamente por detrás dos oclinhos de meia lua e não piscou, para o desconforto de Douglas. – Eu devo pedir que o Sr. não apronte mais estas brincadeiras, pelo menos no avião. Quando eu estava voltando percebi que três dos passageiros acordaram assustados. É verdade que o avião esta bastante vazio, mas não é educado atrapalhar as pessoas que estão aqui. – Ele falava baixo e calmo, mas com tal autoridade que Douglas abaixou a cabeça. - Além disso, nem todos tem o mesmo senso de humor, veja bem, e muitos não gostam de receber trotes como esse.

Aline mostrava um olhar de triunfo por trás de toda aquela sujeira que a boneca explosiva causara, e um ligeiro sorriso se estampara em seu rosto ao ver que Douglas não conseguia achar uma resposta. Dumbledore olhou para ela e dirigiu-lhe a palavra:

- Acho que você gostaria de se lavar, não? Venha, eu lhe mostro onde estão os banheiros.

Cinthia viu que Luciana havia acordado também com a explosão da boneca, mas continuara a ler o livro. Na verdade, ela prestou atenção em cada palavra do diretor e quando ouviu a voz dele dizer um pouco mais distante "aliás, feliz aniversário" , deixou o livro de lado e virou-se para trás.

- Toma essa, Tosco!

Ele só olhou feio e voltou a olhar pela janela, muito mau humorado. Cinthia também o achava um completo idiota, embora não chegasse ao nível de inimizade dele com Aline. Luciana também viu a cena, e quando Cinthia sentou-se novamente, as duas bateram as mão num 'toca aqui': adoravam ver alguém metido a esperto ficar com acara de taxo.

Dumbledore voltou logo em seguida e sentou-se ao lado de Douglas sem dizer nada. E o garoto também não estava em clima para conversar. Quando Aline voltou, passou de cabeça erguida como sempre fazia quando "ganhava" de Douglas ou o via se dando mal. Agora era pelos dois motivos.

- Como está o livro? - perguntou sentando-se entre Cinthia e a janela.

- Bom - respondeu ela bocejando -, mas é melhor parar. Tô morrendo de sono.

Logo todos estavam dormindo, menos Dumbledore. Pelos seus cálculos, seriam 5:00 da madrugada em Londres quando chegassem, e teria que manter-se acordado. Não queria perder o desembarque, além de não estar sentindo-se cansado o suficiente para dormir.

Acordou as quatro crianças antes de chegarem a Londres, para que pudessem ter uma vista da cidade antes do pouso.

Enquanto pegavam as bagagens, Luciana notou que as poucas pessoas que passavam por ali mal reparavam em Dumbledore, embora este estivesse usando vestes bruxas estupidamente espalhafatosas, na sua opinião.

- Diretor, como é que nenhuma destas pessoas repara... no senhor? Quer dizer, já havia reparado em Curitiba o fato de ninguém achar estranho uma pessoa estar usando vestes bruxas.

- Existem muitos meio pelos quais se pode passar despercebido no meio de multidões, e isso é algo que vocês podem acabar aprendendo em Hogwarts. Veja bem, no momento estou usando um feitiço mais ou menos complicado, mas também se pode usar poções ou até uma capa de invisibilidade. – O diretor viu que Douglas pegava a sua bagagem, a ultima que faltava continuou. – Mas vocês vão ter muito tempo para aprenderem tudo isso, e mais alguma outra coisa que talvez venha a ser útil.

Os cinco saíram do aeroporto e se encaminharam para uma parte deserta da rua que passava em frente deste. Dumbledore levantou a varinha e, no instante seguinte, um enorme ônibus roxo berrante, de três andares, parou na rua com os pneus cantando. Letras douradas no pára-brisa informavam: O Nôitibus Andante.

As quatro crianças olharam abobadas para o veículo, vendo que para o diretor parecia normal o fato de ônibus gigantes e chamativos aparecerem do nada. Pareceram sair do transe inicial quando um condutor de uniforme roxo abriu a porta do nôitibus para fazer a apresentação inicial.

- Bem vindos ao Nôitibus Andante, o transporte de emergência para bruxos e bruxas perdidos. Basta esticar a mão da varinha, subir a bordo e podemos leva-lo aonde quiser. Meu nome é Deméter Shumpike, Dimie, e serei seu condutor esta...

Seu olhar se deteve em Dumbledore, e pareceu que não iria passar dele.

- A ...Al... Alvo... Alvo Dumbledore? Não posso acreditar!

- É melhor você acreditar – disse o diretor -, ou ficaremos aqui plantados feito vegetais a noite toda.

- Ah, claro. Deixa que eu ajudo com as bagagens de vocês.

Eles subiram a bordo ajudados por Dimie. O susto não diminuiu nem um pouco quando viram camas no lugar de bancos. Dumbledore ficou com uma cama logo atrás do motorista e os quatro logo atrás dele.

- Quanto é para ir ate o Caldeirão Furado? - perguntou o diretor a Dimie.

- Não estamos muito longe, então são cinco sicles. Mas por oito vocês ganham um chocolate quente e por nove uma bolsa de água quente e uma escova de dentes da cor que você quiser.

Dumbledore pagou ao condutor e o motorista arrancou violentamente. Dimie deu aos cinco os chocolates quentes e as quatro crianças olharam para Dumbledore perguntando com os olhos "o que diabos era esse ônibus".

O diretor simplesmente disse: – Vocês ouviram, é um meio de transporte para bruxos e bruxas.

Aquilo com certeza não esclareceu a dúvida dos garotos, mas se contentaram em tentar entender. Quando o Nôitibus parou na frente do Caldeirão Furado, Dimie deu as escovas de dentes (Dumbledore peculiarmente escolheu uma verde ácido com pintas roxo-berrante).

Ao entrarem no bar-hospedaria um bruxo os atendeu prontamente. Ele parecia bastante agitado com a chegada de Dumbledore, mas não tão eufórico ou incrédulo como Dimie.

- Senhor Diretor! Como foi a viagem? Acabei de receber a sua coruja, me acordou agora pouco. Então estes são os novos alunos estrangeiros?

- Olá, Tom. Sim, estes são Douglas Berttapeli, Luciana Teixeira, Aline Quadros e Cinthia Christino. Você já arrumou os quartos?

- Sim, sim. Me acompanhem.

Eles subiram dois lances de escadas e Tom mostrou os quartos em que ficariam. As meninas guardaram as malas no quarto 22, e Douglas no 21, logo em frente ao delas. Dumbledore se despediu deles ali mesmo no corredor.

- Como vocês provavelmente vão querer dormir até mais tarde, eu volto depois do almoço, ás 13:30. Durmam bem. - E desaparatou na hora.

Douglas já vira o pai fazer aquilo antes e não se surpreendeu nem um pouco, entrando no quarto e fechando a porta com força. As garotas ficaram de queixo caído, mas o barulho da porta se fechando despertou Aline, que gritou para que ele pudesse ouvi-la:

- Boa noite para você também, grosso! - quando falou novamente foi num tom um pouco mais brando. - Vamos dormir, vamos. Nunca consigo dormir direito em aviões.

Mas quando foi que a história já registrou que três garotas, com tanto para falarem umas às outras, fossem dormir tão logo se achassem sozinhas? Neste caso não foi diferente. Como tinham tirado cochilos no avião, conversaram durante todo o começo daquela manhã, até aproximar-se das oito horas. Tombaram nas camas já beirando o sono e tiveram sonhos curtos mas tranqüilos.