DUAS REALIDADES

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Duas Realidades
Episódio XII – O Que Importa É O Presente

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_O que?! Como é possível? Hermione em 1980? Mas como ela poderia se ela está aqui, quase morta neste hospital?!


Snape estava chocado, e parecia querer desesperar-se, mas não conseguia distinguir se sentia assim porque achava aquilo um absurdo ou se porque sua louca tese fora confirmada. Blossom apenas o olhava divertido, afinal, ele não poderia exigir muito de alguém que tem uma notícia como essa que, a primeira vista, é totalmente estapafúrdia.


_Realmente, a bela menina também está aqui. Ao cair no abismo, ela sofreu uma dobra temporal, que a permite viver duas realidades, embora uma dessas realidades seja apenas o reflexo da verdadeira.


_E qual seria a verdadeira?


_A verdadeira é onde está a mente física ou espírito. No caso, em 1980. A bela menina que aqui está é apenas um invólucro, um meio condutor da alma, mas extremamente necessário para esse mundo.


_Hunf! Eu sempre me considerei um homem frio e calculista e, no entanto... não consigo compreender muito bem o que o senhor está dizendo. Como alguém pode estar ao mesmo tempo em dois lugares?


_Filho, deixe a compreensão disso para depois. Há algo muito vital a ser feito. Eu preciso trazer a menina de volta o quanto antes e preciso que você me diga se ela está vivendo no seu passado agora?


_Tudo bem. Vou jogar esse jogo. Desconsiderando todas as opiniões a respeito da sanidade mental... sim, ela está vivendo meu passado agora. Eu ainda acho que é tudo uma loucura e mesmo esse meu suposto passado é uma incógnita para mim, mas... é isso em que acredito... desde antes isso tudo acontecer.


_Então essa parte está explicada. Você realmente me conhece, pois, de certa forma, faço parte do seu passado, embora você não faça parte do meu, não neste momento.


_Como isso pode ser possível?


_Eu irei até onde ela está, para trazê-la de volta. Lamento tirá-la de você, meu jovem. Suponho que ela tenha sido de vital importância na sua vida, mas... vocês terão a sua própria época juntos, no tempo devido.


_Como o senhor irá? Como conseguirá recriar a mesma situação que a arremessou 21 atrás no tempo, se o senhor acabou de dizer que não sabe como isso aconteceu? E será que... ela não poderia permanecer comigo? Se o senhor diz ainda não ter vivido esse momento, isso pode ainda ser alterado, não?


_Realmente, não sei o exato motivo que a fez cair no Abismo. Suponho que seja algum capricho do meu Superior... quanto ir até ela, não preciso criar condições para isso, basta apenas que ela esteja no exato lugar onde sofreu a dobra temporal. E, definitivamente não, meu caro. Cada qual no seu tempo. É a regra.


_Parece que cada vez entendo menos, Sr Blossom... como o senhor conseguiria ir até ela? Não conheço nenhum meio mágico que transporte as pessoas num longo período de tempo como esse, é praticamente impossível.


_Digamos que eu tenho passe livre, garoto. Bem, tenho que ir. O tempo corre contra ela.


Blossom já dava as costas à Snape, dando-lhe um tchauzinho. Snape tentou impedi-lo, segurando-o pelo ombro. Ele parecia ainda mais confuso. Parecia com medo de crer numa nova realidade, de coisas ainda mais absurdas e incompreensíveis, que ainda estavam acima da magia. Foram com olhos cheios de confusão e suplica que Blossom se enterneceu.


_Quem é o senhor afinal? Se é um bruxo tão poderoso, como jamais foi ouvido falar do senhor?


_Filho, eu não sou um bruxo... nem sequer sou um ser humano. Sou o que meu Superior chama de Regente. E minha função é reger pelo tempo deste mundo. Por isso posso me locomover pelo tempo, mas não pelo espaço. Eu trarei a sua bela menina de volta e vocês viverão a sua própria época juntos, se assim o quiserem. É uma promessa e não uma profecia. Mas ela precisa voltar ao ponto de partida para que eu possa trazê-la de volta.


Com essa incrível afirmativa, Blossom deixou um largo sorriso para Snape, que estava muito atônito, tentando assimilar o que acabava de ouvir. Ficou observando o homem franzino e curvado desaparecer pela vegetação do jardim bem cuidado do hospital. Como Clara havia lhe dito: há muito entre o Céu e a Terra do que sonha nossa vã filosofia... E, certamente, isso tudo estava acima do Céu e da Terra, inconcebível para nossas filosofias, nossas ciências.



*



Severus estava sentado numa cadeira lendo um livro, ao lado da janela, quando Hermione finalmente acorda. Sentia-se um pouco tonta e a costas doloridas por ter dormido naquele sofá desconfortável. Após sentar-se e passar as mãos sobre o rosto afim de espantar qualquer resquício do sono, é que percebe que Severus está sentado próximo de si e lhe dirigia um leve sorriso, mas muito convidativo.


_Oh.. desculpe por ter dormido assim, de repente, mas é que... – Hermione olhava seu relógio de pulso e quase caiu do sofá com a hora. _ por Merlin! São quase cinco horas! Como eu consegui dormir tanto?!


_Boa pergunta! Suponho que você encontrou uma nova tangente pra se livrar de mais uma conversa séria entre nós. Mas isso não importa...


O rapaz deixava o livro sobre a mesa e ia até a menina, ajoelhando-se em frente a ela para manter a mesma altura dos olhos. Espalmou sua mão sobre a testa de Hermione, que estava muito surpresa com a reação dele. Havia decidido que levaria o que sentia adiante e pra começar, precisava tratá-la melhor. Sua mão ainda deslizou pela face da garota, afastando os cachos que caiam sobre o ombro. Hermione estava tão estupefata que sequer conseguia se esquivar. Era como se tivesse se hipnotizado pelo toque e os olhos negros e profundos de Severus.


_Como está se sentido? Se você tiver mais algum mal-estar, levarei imediatamente para o hospital, ouviu?


_Er.. estou bem, muito mesmo! Acho que o sono me revitalizou... e, me desculpe! Esse sofá é horrível! Coitado de você, dormindo aqui por minha causa!


Severus levantava-se, puxando Hermione pela mão, para que ela se levantasse também. Ela parecia muito melhor, suas faces coradas novamente e os olhos cor de mel muito brilhantes devido a ter acabado de acordar. A vontade que tinha naquele momento era consumar aqueles sentimentos que estavam lhe queimando no peito, estavam próximos o suficiente para isso. Estava plenamente consciente do quanto a desejava e de que não queria mais oprimir esse desejo e sentimentos, mas não queria tomar nenhuma iniciativa sem antes ter a certeza absoluta de que ela talvez quisesse o mesmo. Não queria nada forçado, nem persuadido. Até então ela não havia demonstrado nenhum interesse, embora tivesse falado algo a respeito... mas ele queria ter certeza, queria com seu pleno consentimento.


_Você precisa se alimentar, Hermione. O seu almoço está esperando há horas, mas o mantive aquecido com magia.


_A-aconteceu alguma coisa, Severus? – Hermione ainda estava surpresa com o súbito comportamento carinhoso do rapaz. Será que seu mal-estar amoleceu seu coração?


_Aconteceu.. você teve um mal súbito que poderia tê-la matado. Eu senti como você ficou fria. Eu tive medo... posso ser um cara estranho, que mantém atividades obscuras, mas não quero o seu mal. Não me arrisquei trazendo-a para cá, cuidando de você para vê-la sofrer.


_E por que o fez, Severus? Por que se arriscar por alguém que você nunca viu? Você me encontrou abatida no Beco Diagonal, sabe que fui atacada por um comensal, não sabe? Eu não estava totalmente inconsciente, sei que estava com alguém... por que se arriscou a me salvar?


Severus estava sério e tenso, encarando Hermione. Sua expressão era indecifrável, mas ela finalmente queria abrir o jogo? Talvez finalmente iria saber quem ela realmente era e o quanto sabia de si...


_Talvez porque não me perdoaria se deixasse você morrer... tenho certeza de jamais tê-la visto em minha vida, até aquele dia, mas algo parecia sussurrar em meus ouvidos, que dizia para ampará-la. Eu não sei absolutamente nada sobre você além do que você própria disse e ainda assim não sei até onde vai a sinceridade disso... mas gostaria de saber o quanto sabe sobre mim.


_Não se preocupe, em linhas gerais eu não menti para você... estou ocultando, sim, algumas coisas... mas estou disposta a responder as perguntas que me fizer. Quanto a você... eu o conheço mais do que imagina e quase nada ao mesmo tempo.. esquisito, não? Você, definitivamente, é muito diferente do Severus Snape que eu conhecia.


_E essa diferença é melhor ou pior... ou simplesmente diferente?


Severus, ainda segurando a mão da menina, abaixava sua cabeça, beijando levemente a testa de Hermione, escorregando lentamente seus lábios pela face da menina. Hermione estava estática de tensão. Seu lado coerente e ponderado ordenava que ela se esquivasse, que impedisse que aquilo continuasse. Mas esse lado estava com sua voz debilitada. O desejo de que aquilo continuasse gritava mais alto. Ela realmente queria viver esse momento e não queria nem supor um pensamento a respeito da conseqüência que isso poderia ter no futuro, afinal, seu futuro com Prof Snape não poderia ser ainda pior do que fora de fato em sua própria época. Respondeu ao jovem Snape numa voz fraca, quase sussurrada.


_Certamente... muito melhor...


Ele apenas sorriu de contentamento, afastando-se um pouco da menina para encarar aqueles olhos cor de mel que tanto o encantavam. Levou a mão à testa de Hermione, para mais uma vez afastar aqueles cachos chatos que teimavam em ocultar partes daquele rosto tão bonito. Passou seu braço pelos ombros e outro pela cintura da menina, abraçando-a fortemente contra seu corpo, se inebriando com aquele perfume de lírios que emanava dela, respirando profundamente como se quisesse encher seus pulmões com aquele perfume. Hermione, ainda um pouco assustada e relutante, tenta corresponder àquele abraço tão terno e caloroso, envolvendo seus braços em torno do corpo dele, escondendo o rosto sobre o peito de Severus, sentindo o perfume amadeirado, quase uma seiva, lhe confortando e acalmando. Pouco importava qualquer coisa neste momento. Não interessava se estava vivendo o passado do Prof Snape e menos ainda importava a conseqüência deste ato no futuro. Tudo que mais importava era aquele presente que ali estava vivendo com aquele rapaz que tinha ainda muito pouco do que seu futuro Eu teria. Tentou evitar a todo o custo a idéia de que sua presença ali poderia tê-lo transformado naquele tirano injusto... não poderia ter sido ela, poderia?


_Lírios... você é um anjo, não é? Apareceu assim quase do nada... bagunçando minha vida desta forma...


_E o que isso quer dizer...?


Severus afasta um pouco Hermione de si, para poder encará-la, espalmando sua mão sobre o rosto da menina, levantando seu rosto até que seus olhos se encontrassem. Sua expressão era séria, mas seu olhar era livre de qualquer sarcasmo ou desconfiança, o que lhe era muito típico. Muito pelo contrario, havia muita ternura e carinho.


_Quer dizer que você, a sua presença, vai contra todos os ideais que eu acreditava serem os certos a seguir. O que você é, tem me mostrado a estupidez que eu venho cometendo em nome desse ideal absurdo...


O rapaz faz um breve pausa e aproxima seus lábios dos de Hermione, quase tocando-os.


_...e justamente alguém como você me fez despertar sentimentos que jamais imaginei possuir, como se algo em mim voltasse a viver... e não quero que isso pare...


Seu sussurro foi falhando até ser interrompido pelo esboço de um beijo, tocando seus lábios levemente nos de Hermione, que estava totalmente entregue a este momento. Um beijo tímido e sem pressa, onde tudo que queria era experimentar o calor e textura daqueles lábios. Envolveu a menina ainda mais num abraço aconchegante, aprofundando o beijo que se tornava mais apaixonado. Se o tempo era o principal regente de tudo, certamente para ambos esse mesmo tempo havia parado, de tão entregues estavam um ao outro. Nem tempo e nem espaço pareciam mais existir, até esse momento precioso ser quebrado abruptamente por uma dor repentina e aguda.


_AAARGH!! MALDIÇÃO! Por que isso justo agora??!


Severus se afasta de Hermione quase num salto, curvando-se para frente a fim de amenizar a dor que lhe queimava o braço esquerdo. Tentando em vão disfarçar o que acabava de acontecer, afastava-se de Hermione, dando-lhe as costas e indo para um outro canto da sala.


Hermione, a princípio, sentiu-se atordoada, até se dar conta do porque Severus se esquivou daquela forma tão abrupta. Seus olhos marejaram ao ver o desespero do rapaz, que segurava o braço esquerdo como se houvesse ali um grave ferimento. Sabia do que se tratava aquela dor e, se possível, iria impedi-lo de obedecer aquele maldito chamado. Ela parecia sentir a confusão de pensamentos e sentimentos que vinha dele. Conseguia perceber a batalha interior que ele travava consigo mesmo. Ela aproximou-se dele em dois passos, tentando abraçá-lo, mas ele reagiu mais rápido, a pegando pelo braço e a encostando na parede. Seus olhos negros pareciam ofuscados e toda a ternura de outrora havia desaparecido, dando lugar a um misto de tristeza e ódio.


_Severus! Não aceite isso! Lute contra isso, por favor! Isso só o machuca, não permita qu...


_Cale-se e me escute! John deverá mandar um coruja no início da noite. Quero que envie um recado a ele, mandando que ele venha buscá-la! Não quero você por aqui quando eu voltar, entendeu Hermione?!


_Mas, Severus, eu...


_VOCÊ FARÁ O QUE ESTOU MANDANDO!! Não quero encontrá-la aqui quando eu voltar! Fique com John até que eu vá buscá-la e resolveremos isso depois!


Severus se afastava de Hermione, ainda olhando-a nos olhos. Ela estava assustada e não conteve as lágrimas que escorriam por seu rosto. O rapaz a olhava com muita amargura. Ele queria que isso nunca mais acontecesse, mas essa era a sua única realidade, a qual havia escolhido para si.


_Obrigado, Hermione... e me desculpe...


O jovem Snape, com a manga da camisa erguida, aperta a mão firmemente sobre a marca negra em seu braço, desaparatando logo em seguida. Hermione deixa-se escorregar na parede onde ainda estava encostada, até cair no chão, onde abraçava fortemente as próprias pernas. Suas lágrimas caiam em abundância e um turbilhão de sentimentos e incertezas lhe queimavam o peito. Era a dor de ver, pela primeira vez em sua vida, aquele homem tão forte e seguro de si sendo subjugado. Aqueles olhos que se tornariam, algum dia tão gélidos e obscuros, demonstrando todo o temor e angústia que iam dentro dele. Aquele momento tão sublime ser interrompido por aquela maldita força monstruosa!


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Fim do Capítulo XII - continua...
By Snake Eye's - 2004
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