Capítulo 3: O diário
Mal a coruja chegou com o pacote, Harry correu para desata-lo de sua pata. Conforme o soltava e abria, seu coração batia desesperado, louco de curiosidade e ao mesmo tempo receio do que poderia encontrar ali. Quando seus olhos encontraram a pequena caixinha dourada sobre o pesado e antigo diário, sentiu como se estivesse voando: leve e alegre.
Edwiges piou alto, chamando a atenção de Harry, que fez sinal para que ela se calasse e, dizendo que a soltaria logo para caçar, colocou-a novamente em sua gaiola. Ele sentou-se na cama, respirou fundo, pegou a caixinha do pomo e deixou-a a seu lado. Pegou o diário e observou atentamente as duas letras douradas que brilhavam vivamente em sua capa, antes de finalmente abri-lo.
Logo na primeira página estava escrita, com a letra de Lílian, uma breve dedicatória: "Para minha querida amiga Maggie, que através desse livro você possa me entender melhor... Lílian"
Harry hesitou por um instante antes de virar a página, afinal o que quer que esteja escrito era extremamente pessoal, e lembrou-se de como era horrível ter alguém em sua mente, ouvindo seus pensamentos e vasculhando suas lembranças. Então releu o que estava escrito na dedicatória e decidiu ler, já que sua mãe havia confiado o diário à amiga para que ela a entendesse melhor, e ele nunca tivera a chance de conhecê-la profundamente. Virou a página.
"31 de julho.
Olá! Se você está lendo isso é porque lhe dei autorização para abrir me diário, ou então isso seria impossível. Incrível o que podemos fazer com mágica, não é? Esse tipo de proteção é extremamente útil, principalmente quando se conhecem pessoas como aquele idiota do Potter...
Eu sou Lílian Evans, tenho catorze anos de idade, e acabo de concluir o quarto ano na escola de magia e bruxaria de Hogwarts. Eu gosto de sorvete de chocolate, suco de abóbora, ler, conversar, andar de bicicleta e, principalmente, gosto de ser uma bruxa. Não gosto de pessoas me irritando, nem provocando; não gosto de legumes, de fazer lição de casa, de chorar.
Sou uma boa aluna, primeira da classe, e só não sou da escola porque Maggie está lá, mas nós somos amigas agora, então isso não tem problema.
Meus pais são os melhores do mundo, apesar de serem trouxas, e minha irmã... Bem, minha irmã não é uma das melhores pessoas que conheço, mas não é tão ruim assim. Ela só tem ciúmes de eu ser uma bruxa e ela não, o que causa muitas brigas aqui em casa. É, estou em casa. Este diário foi a última coisa que comprei em Hogsmeade, mas só comecei a usa-lo hoje, acho que o motivo é não ter ninguém para conversar. Maggie viajou com seus pais para a Nova Zelândia; Violet, Anne, Sofie e Melanie também viajaram; Sirius não está em casa, Remo viajou, Pedro está em casa, mas ele é um chato, minha irmã não fala comigo, meus pais estão trabalhando... Só sobrou escrever ou falar com o imbecil do Potter, coisa que não farei tão cedo.
Nós brigamos no baile. Quem o mandou não me convidar primeiro, me deixar como última opção? Chamei Remo para ir comigo, e ele aceitou. Ele é bem legal, esperto, estudioso, bonitinho... Nos divertimos bastante naquela noite, dançando e comendo, mas eu não sei o que deu em mim, pois só conseguia pensar naquele cabeça-dura do Potter. Não que eu esteja gostando dele, ou algo assim, credo! Eu o via com Violet e ele parecia tão mal, tão triste e quieto... Senti pena dele, mas meu orgulho não me permite ajuda-lo, uma vez que ele me deixou como última opção.
Eu senti falta de Maggie aquela noite. Depois ela me contou que o seu par teve uma reação alérgica com a comida. Pobrezinho... Mas ela parecia tão feliz no fim da festa que acho que ter se livrado dele foi até bom. Disse que conversou com Sirius. Eu queria conversar com Sirius. Ele é muito lindinho, e está sempre saindo com alguma garota... Pena que nunca me chamou para sair... Tudo culpa daquele Potter idiota, que é o melhor amigo dele. Nós conversamos uma vez, entre as aulas de transfiguração e história da magia, mas Tiago chegou e começou a me irritar, como sempre, e Sirius foi falar com outras garotas.
Silver acaba de chegar com uma carta, então Maggie já deve ter chegado. Vou lê-la agora, então continuo escrevendo depois."
Harry terminou de ler sem saber ao certo como se sentia, uma vez que descobriu que quando sua mãe era pequena ela tinha uma queda por seu padrinho. Lembrou-se da cena que presenciou na penseira e como Sirius era bonito, cheio de meninas suspirando e lançando olhares esperançosos em sua direção. Realmente, sua mãe era como uma garota comum de catorze anos de idade, procurando a atenção dos garotos bonitos...
Harry recostou-se melhor na cabeceira da cama e voltou sua atenção para o diário novamente, continuando a ler as memórias de sua mãe.
"2 de agosto
Sinto falta de Maggie. Em sua carta, ela me disse que está hospedada num pequeno vilarejo bruxo no meio de uma floresta. Disse que sente falta de alguém para conversar e começou a fazer o mesmo que eu: escrever em seu diário aquilo que gostaria de falar, para depois se lembrar e me contar tudo o que aconteceu.
Hoje algo terrível aconteceu, há apenas alguns minutos. Eu estava com meus pais na sala, assistindo a um filme, quando escutei o barulho de uma coruja chegando. Corri para meu quarto, certa de que era outra carta de Maggie, cheia de curiosidade para saber o que havia acontecido para receber duas cartas praticamente seguidas. Quando peguei a carta e abri, quase gritei de ódio: acredita que até em férias o Potter não deixa de me encher? Mandou um bilhete que dizia "Estou com saudades. Saia comigo por favor!!!"
Como ele pode ser tão imbecil? Na mesma hora escrevi uma resposta atrás daquele pedaço de pergaminho amassado: Nunca!!! A coruja que o trouxe acabou de sair, então espero que ele receba minha resposta logo e fique chorando o resto de suas férias. Vou voltar para a sala, mamãe está chamando e disse que fez pipoca."
Mais uma vez Harry estava perplexo. Levara três anos para Harry criar coragem e convidar Cho para sair, coisa que seu pai teria feito cinco minutos após conhece-la. Harry admirava sua coragem e empenho para conseguir o que queria, que nesse caso era a atenção de sua mãe.
Petúnia gritou, chamando Harry para o jantar. Apesar de não querer deixar o diário nem por um minuto, seu estômago se revirava, pedindo por comida. Após comer um pouco – já que as dietas de Duda não permitiam que todos se satisfizessem - Harry voltou para seu quarto e sentou-se na cama, pronto para voltar às lembranças de sua mãe, porém seu estômago deu uma pontada e ele percebeu que um prato de salada não fora o suficiente para satisfaze-lo.
Sentou-se no chão e procurou, sob a tábua do soalho solta, por uma caixa de Sapinhos de Chocolate que ele guardara ali ao voltar das férias. Pegou alguns, pois eles tinham de durar o tempo que passasse com os Dursley, e voltou-se para a leitura, enchendo a boca com um sapinho gordo.
"10 de agosto.
Que tédio é ficar em casa, sozinha, enquanto todos os meus amigos estão se divertindo em algum outro lugar... Maggie escreveu-me outra carta. Disse que arrumou um amigo, então não está tão sozinha, mas continua escrevendo tudo o que gostaria de falar comigo. Talvez um dia nós duas possamos trocar os diário e saber tudo o que a outra passou...Mas não acredito que seja neste ano ou no próximo, pois conversamos sobre tudo e não há segredos entre nós. Espero que nunca tenhamos. Às vezes vejo Petúnia e uma amiga conversando, uma contando segredos para a outra, então quando ela se vai Petúnia começa a escrever em seu diário, como uma louca desesperada... Acho que ela não tem uma amiga como Maggie, então prefere confiar seus pensamentos mais íntimos a um pedaço de papel a uma pessoa, que pode argumentar e ajudar.
Ainda falando de minha irmã (pois como não tenho nada para fazer tenho observado-a demais), acho que ela tem um namorado. Ouvi mamãe e ela conversando sobre um garoto outro dia, mas quando me viu, Petúnia fechou a cara e saiu. Depois de algum tempo ela estava toda alegre, sorrindo como idiota e suspirando o tempo todo, vestiu sua calça nova (uma muito bonita, que tem uns bordados nos bolsos) e saiu apressada. Menti para minha mãe, dizendo que iria ao parque, e a segui. Petúnia estava na lanchonete, com um garoto feio, mas parecia tão feliz... Coitada. Ela não é bonita, tem um pescoço enorme e é muito magra, mas poderia ter arrumado um namorado melhor. Aquele parece um porco usando uma peruca loira, todo desajeitado e estranho... Até o Potter me parece melhor que ele...
Foi bom ter posto este feitiço protetor no diário, senão eu estaria morta agora. Petúnia suspeita que eu sei alguma coisa do seu namorado, que era para ser um segredo, e a vi tentando abrir meu diário... Se ela descobrir o que escrevi sobre ele aqui, com certeza me mata."
Harry não conseguia parar de rir. Se o namorado de Petúnia parecia um porco, então era certamente tio Valter. Imaginou-se ao lado de sua mãe (se esta ainda fossa viva) rindo da cara de seu tio e primo, e fazendo brincadeiras a respeito de porcos... Seria tão bom se ela estivesse ali, se estivesse viva. O garoto sentia falta de uma família, pois nem mesmo com Sirius teve muitos momentos familiares. Agora ele tinha Maggie, e sabia que com ela estava muito mais próximo de ter uma vida em família, com todas as histórias que ela gostava tanto de contar, suas lembranças, fotos, objetos... Ele queria tanto se divertir novamente, ter alguém por perto, até mesmo para lhe dar algumas broncas quando precisasse.
"15 de agosto
Eu sabia! Hoje Petúnia apresentou o porquinho para a família. Seu nome é Valter Dursley. Disse que estão namorando e que se amam. Credo! Amar aquele porquinho... Como será possível? Como será que ela o ama, ou melhor, como sabe que o ama? Não vejo lógica no amor e nem quero me apaixonar, se for para ficar caída e babando por alguém que se parece com um porquinho. Não estou sendo dura demais. O sujeito é terrível. Mamãe disse que não se pode controlar o coração, e se ela está feliz com seu amor é tudo que importa.
Eu não penso como ela. Eu não sou como ela. Eu sou uma bruxa e ela é uma simples trouxa... Ela não pode controlar seu coração, mas acho que eu posso. Quando tinha sete anos, eu gostava de um menino chamado Jason. Eu dizia que o amava, mas na verdade era porque ele me dava doces sempre que me via. Nunca me apaixonei de verdade. Mesmo agora, quando já estou crescida e pronta para namoros de verdade, não encontro ninguém que me interesse. Sirius é bonito, Remo é esperto, mas eu não os amo. Gosto deles; são meus amigos, mas nada mais que isso.
Essa história de amor é uma grande confusão, que só serve para confundir a cabeça das pessoas e faze-las agir como idiotas...
Harry leu mais alguns pensamentos de sua mãe e pouco a pouco foi caindo num sono irresistível, e acabou dormindo ali mesmo, com o diário apoiado sobre seu peito, vestido e com a luz do quarto acesa.
Harry abriu os olhos vagarosamente e mirou o teto, mas teve uma surpresa: não era o frio teto branco de seu quarto na rua dos Alfeneiros, muito menos o teto de pedras do seu quarto na torre da Grifinória. Era de um amarelo suave e havia um móbile sobre sua cabeça. Um móbile de jogadores de quadribol. Fechou os olhos e sacudiu a cabeça, mas quando os abriu de novo nada havia mudado. Levou suas mãos ao rosto, para esfrega-los, então tomou um susto: suas mãos eram pequenas e macias, como as de um bebê... Mas não era possível, afinal ele já tinha quinze anos de idade. Devia ser um sonho, do qual ele não conseguia acordar... Abriu a boca para gritar o nome de seu tio, então ele viria e Harry acordaria com um grito nervoso de tio Valter, mas ao abrir a boca, tudo que pode ouvir era um murmúrio de bebê...
-Então você já acordou, meu amorzinho?
E Harry viu um rosto sorridente chegando em sua direção. Era uma mulher jovem, com enormes olhos verdes... Olhos idênticos aos dele próprio... Ela sorriu docemente, pegou-o no colo e beijou sua testa.
-Deve estar com fome, não comeu quase nada ontem... Também, seu pai e Sirius ficaram brincando com você de manhã à noite... – Lílian sentou-se numa poltrona posicionada ao fundo do alegre quarto amarelo, lotado de fotos e objetos de quadribol.
"Não pode ser verdade... Eu, eu não sou mais um bebê e minha mãe..." Harry não conseguia pensar claramente no que estava acontecendo, somente sabia que estava sentado, no colo de sua mãe, num quarto que provavelmente era seu. Ficou admirando-a, como nunca houvera feito antes. Seus olhos eram muito parecidos com os dele, mas tinham um brilho alegre, que Harry só vira em seus próprios olhos algumas vezes, quando estava muito feliz. Lílian tinha um rosto rosado, uma pele bonita e macia, e seus cabelos ruivos lhe caíam levemente sobre a fronte.
-Ah, ele já acordou! –Harry virou-se para ver quem entrava no quarto, e surpreendeu-se ao ver seu pai com as vestes de quadribol de Hogwarts e carregando uma vassoura. Ele era muito parecido com Harry (com exceção dos olhos) apesar de ter na ocasião mais de vinte anos.
-Já acordou? –E Sirius adentrou o quarto. Ainda era jovem, usava seus belos cabelos negros longos e soltos, e sorria docemente para o garoto, seus olhos cinzentos brilhando...
-Ah não, vocês dois. –Lílian fechou a cara para o marido e o amigo- Nem pensem em entrar aqui com essas roupas sujas de quadribol... Não sei por que você ainda insiste nisso, Tiago... Suas chances de entrar para algum time profissional são tantas quanto as de encontrar um feijãozinho sabor pomo de ouro...
Então eu ainda tenho chances. –Tiago riu de sua brincadeira- Não acredito que você não vai me deixar pegar meu filho no colo só porque estou meio enlameado.
-Meio?-Sirius sorriu, dando um tapa nas costas do amigo- Meu caro, você parece que saiu de um chiqueiro... Vá se trocar enquanto eu brinco com o nosso campeão.
-Harry sorriu para os dois e Sirius veio e pegou-o no colo, enquanto Tiago saiu para mudar de roupa. Lílian levantou-se, irritada, e pegando Harry dos braços do padrinho disse:
-Como é que você consegue fazer ele obedecer? Eu falo algo, ele faz uma piada... Ainda não sei por que me casei com ele...
-Vocês se amam, Li. Por isso ele faz essas coisas... Na verdade, ele sempre fez isso... E é por isso que você gosta dele, e não de mim, ou Remo, ou Pedro...
-Ah Sirius... Como eu queria me divertir como ele se diverte assim, com qualquer coisa... Mas os tempos não ajudam. Essa guerra, o medo. E agora que devemos ficar em casa com Harry eu me sinto tão inútil diante das batalhas...
-Você tem a maior missão de todas –Disse Sirius, segurando a mão de Lílian e afagando a cabeça do pequeno Harry- que é cuidar deste garoto que pode ser nossa salvação. Você ouviu Dumbledore, por isso devem ficar aqui, protegidos... E breve o nosso campeão fará um ano! Será que já está na hora de darmos a ele sua primeira varinha de brinquedo?
Lílian virou os olhos e começou a conversar com Sirius sobre fazer uma festa para Harry, mas este não estava mais os ouvindo. "Eles não sabem o que vai acontecer... Se eu pudesse ao menos contar para eles, para que fugissem... Quem sabe eu não teria meus pais comigo no presente, eles não teriam morrido..." Ele então, tentou dizer algo, mas tudo que saiu foram reclamações de bebê. E sua mãe se voltou para ele.
-Ah você está com fome, não é meu amorzinho? A mamãe vai preparar uma mamadeira para você...Não? Não é fome? O que é então, querido?
-Se você ao menos tivesse sido boa em adivinhações nós poderíamos saber o que ele quer. –Tiago voltara, usando uma roupa diferente e pegou Harry no colo- Não é mesmo Sirius?
-Não vou me meter. Não fiz aulas de adivinhação.
-Faça me o favor, Tiago... Você também freqüentou as aulas, deveria saber que não aprendemos a adivinhar pessoas...
-Eu era bom em adivinhação. Sempre tive uma imaginação criativa. Deixe me ver o que o apanhador do papai quer –Tiago olhou para os olhos de Harry, que estava triste ao saber que aquelas pessoas tão boas estariam mortas em breve.- Hum, isso é novo nele. Nunca o vi assim, tão tristonho, mas sei o que quer. Quer ver o papai mostrar como se apanha um pomo de ouro.
-Pare com essa besteira. Ele está com sono. Acho que não dormiu o suficiente. Diga tchau para o papai e o titio Sirius, querido. Vamos para a caminha agora.
Harry queria gritar, queria avisa-los que o perigo se aproximava e que não deviam estar lá, sozinhos... Queria avisar que Pedro era um traidor, mas que Sirius não devia ir atrás dele sozinho ou acabaria em Azkaban...Mas ele era só um bebê colocado para dormir em seu berço, e fechou os olhos, lutando contra as lágrimas que vinham contra sua vontade.
Harry abriu os olhos e lá estava o teto pálido de seu quarto na rua dos Alfeneiros. Sentou-se na cama e viu o diário, que estava em seu colo, cair no chão. Sentiu que seu rosto doía, e percebeu que havia adormecido com os óculos, e seu rosto estava todo marcado da cabeceira da cama, onde estava encostado. "Foi um sonho. Um sonho muito real, mas mesmo assim, um sonho..." Edwiges piava desesperada e o garoto a deixou sair, então se arrumou para dormir novamente, pois sabia que ainda havia algumas horas até o amanhecer.
