Título
Tudo se repetia. Ele se aproximava, os cabelos prateados balançando. Seus olhos dourados brilhavam. Mais do que o normal... Ele estava chorando! Seus lábios úmidos pelas lágrimas flexionavam-se para dizer algo, mas ela não entendia. Não havia som naquele jardim. Ele estendeu os braços, num pedido desesperado. Ela tentou levantar os seus, para alcançá-lo, mas não conseguia se mover. Então ele parou, olhou-a magoado e ressentido, virou-se e começou a se afastar. Ela tentava gritar, correr atrás dele, mas não conseguia. Tudo escurecia lentamente, até que um barulho agudo a despertou.
Tudo um sonho, outra vez. E ela ensopada de suor. E o despertador tocando loucamente. E ela vazia. Tomou uma ducha rápida e foi trabalhar.
*****~*****~***** Flashback *****~*****~*****
Inuyasha deu o golpe final, e Naraku finalmente caiu. Seus restos, na verdade. Todos estavam sujos e muito feridos, principalmente o hanyou. Kagome arrastou-se com dificuldade até o corpo daquele que um dia fôra seu pior inimigo, e agora não passava de um pedaço inerte de pele com uma mancha em forma de aranha. Enojada, ela tirou os inúmeros fragmentos corrompidos e os purificou. Isso ficava mais fácil a cada batalha. Ela olhou para o lado, e viu Inuyasha sendo amparado por Kikyou. Não queria admitir, mas a intrusa naquela lugar era ela mesma. Kagome não pertencia àquele mundo, e nem sua alma era completamente sua. Com lágrimas nos olhos, ela pegou os fragmentos que estavam em seu bolso, e dirigiu-se até Kikyou:
_ Você quer fazer isto?
_ Não posso _ respondeu a sacerdotisa _ Você é a única que possui a alma de sacerdotisa. Você deve fazê-lo, para que eu possa descansar.
Dizendo isso, Kikyou colocou na mão de Kagome os fragmentos que estavam com ela.
_ Como eu...?
_ Apenas concentre-se.
Inuyasha observava a breve interação entre as duas pessoas que ele mais amava. Cada segundo devia ser guardado em sua memória, pois ele sabia que esses eram os últimos. Lhe doía perder Kikyou, mas era muito pior ver Kagome chorando. Absorto em seus pensamentos, o hanyou não percebeu a presença feminina que se aproximava.
Kikyou viu Kagome apertar todos os fragmentos na mão e fechar os olhos para concentrar-se. A sacerdotisa quase podia sentir o poder que fluía em volta da garota, um poder que um dia ela mesma possuíra. Ela tinha certeza de que um dia a colegial a ultrapassaria, tanto em poder como em amor. Mas isso era um caso à parte. Olhando para trás, Kikyou viu um Inuyasha de olhos cerrados, muito pensativo. E ela sabia exatamente no que ele estava pensando: que aqueles eram os últimos minutos da sacerdotisa na face Terra. Então, ela aproximou-se.
_ Não precisa ficar tão deprimido. O lugar para onde vou é muito melhor do que este mundo.
Surpreso, o hanyou respondeu:
_ Mas ainda assim, você estará longe de mim.
_ A nossa história acabou há muito tempo.
_ Não para mim.
Kikyou suspirou:
_ Você não entende, Inuyasha! O meu tempo passou. Eu cumpri o meu destino, morri protegendo a Jóia de Quatro Almas.
_ Morreu por minha causa!
_ Não, morri por causa desse maldito Naraku!
_ Você nunca quis proteger a jóia! Sempre fez o que era melhor para os outros, mas não pensou na sua felicidade! Nem na minha! Nós poderíamos ter sido muito felizes, Kikyou!
A essa altura, os dois gritavam, e já haviam chamado a atenção de todos. Kagome, com a Jóia já completa nas mãos, tremia levemente, e derrubava lágrimas silenciosas observando aquela cena.
_ É exatamente por isso que ela está aqui! _ a sacerdotisa apontou para Kagome _ Minha alma nasceu para ficar com a sua! Como não conseguiu isso em uma vida, ela reencarnou! É tão difícil entender isso? De qualquer forma, nós ainda estaremos juntos!
Inuyasha pensou por alguns segundos. Ele queria muito ficar com Kagome, mas ela tinha a alma de Kikyou. A essência era a mesma. Ele não queria que fosse assim, pois nunca teria certeza do seu amor pela garota. Nunca saberia se era um amor verdadeiro ou apenas o resto do sentimento que sua alma ainda nutria pela alma da sacerdotisa. E ele odiava duvidar.
_ Muito bem, acabou o meu tempo. Reflita o quanto precisar, mas nunca se esqueça de que eu estarei te observando. Sempre. Adeus!
Kikyou foi até Kagome e parou de frente para a garota. A colegial se assustou quando ouviu a voz da sacerdotisa, embora esta não mexesse os lábios:
"Vou te devolver agora. Não o deixe me esquecer. E não me odeie, por favor. Adeus!"
Kagome tinha consciência de que ninguém mais havia escutado aquelas palavras além dela. Lentamente, o corpo da sacerdotisa começou a brilhar, e as almas das garotas mortas se libertaram. O espectro translúcido que ainda conservava a forma da mulher de cabelos negros deu um passo à frente. Outro, e outro, até que encostou em Kagome, mas não parou. Aquele poder entrava em seu corpo com a fúria de um incêndio. Todos os ossos da garota pareciam queimar, e ela não sabia se estava gritando ou não. Seus joelhos se dobraram, sua cabeça pesou, e a última coisa que ela escutou foi alguém dizendo o seu nome. Talvez Inuyasha, Sango, Miroku ou Shippou. Ela não tinha idéia, e desmaiou antes de bater no chão.
Inuyasha viu Kagome gritar de dor. Ele estava apático ao que acontecia. Ouviu Sango gritar o nome da menina, depois ela e Miroku correram até a colegial. O monge a levantou nos braços e a exterminadora disse, olhando para ele:
_ Você não precisa vir agora. Estaremos na vila, a senhora Kaede saberá como cuidar de Kagome _ ao ouvir aquele nome, os olhos do hanyou começaram a arder, e ele virou de costas _ Apenas não suma, ok? Ela vai querer falar com você quando acordar. E vocês têm muito o que conversar _ Shippou pulou em seu colo e os quatro se afastaram.
Inuyasha ficou sentado no mesmo lugar, e quando se viu sozinho lágrimas quentes passaram o molhar seu kimono manchado de sangue. Ele ficou assim por horas, até que seus ferimentos melhoraram o suficiente para que ele subisse em uma árvore próxima. Ele adormeceu.
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Sango e Miroku esperavam que a senhora Kaede saísse para lhes dar notícias de Kagome. Sango lutava para segurar as lágrimas, pois não sabia o que fazer agora. Ela vingara a morte de seu antigo grupo e de sua família. Mas seu vilarejo parecia vazio agora, e não lhe agradava voltar para lá. Não lhe agradava deixar as pessoas que ela havia aprendido a confiar. E não lhe agradava deixar Miroku. Ela olhou para o monge, e o surpreendeu fitando-a também.
Miroku, por sua vez, também não sabia para onde ir. Já tinha vingado seus antepassados pela maldição do buraco do vento, e se apaixonara por Sango. Mais do que desejo, sentia pela exterminadora algo que nenhuma mulher jamais havia despertado em seu coração: ele a amava. Ao contrário dela, que pensava exaustivamente sobre sua situação, ele encontrou um meio mais fácil e mais agradável de passar o tempo: ele ficou admirando a mulher que atingira seu coração. E ela era linda, lutava contra suas lágrimas, até que Miroku viu o belo rosto virando em sua direção.
_ Também em dúvida, senhorita Sango?
Como resposta, lágrimas suaves brilharam na face da jovem. Miroku sentiu algo explodir em seu peito, e sentiu que aquela era a hora certa. Levantou-se e pegou a garota pelas mãos, levantando-a também. Olhou no fundo de seus olhos e percebeu que ela corava furiosamente. Então, o monge sorriu, não aquele costumeiro sorriso malicioso, mas uma expressão doce, carregada de carinho. Vendo aquilo, Sango desviou o olhar e começou:
_ Miroku...
Colocando os dedos sobre os lábios dela, ele interrompeu:
_ Eu não quero que você me responda, nem que você minta para mim. Não estou lhe pedindo nem esperando nada. Faça o que tiver vontade, saia correndo se for o caso. Mas me ouça, Sango. Eu vou dizer uma coisa que você pode não acreditar, mas é verdade, e eu não posso mais guardar isso para mim, por mais que eu tenha tentado. Eu te amo, Sango. Eu te amo mais do que a mim mesmo. Eu nunca quis ter um filho com você, não da mesma maneira como eu quis ter um filho das outras. Eu te amo demais para fazer qualquer coisa com você sem a sua aprovação e a sua retribuição.
Muito corado, Miroku largou as mãos da garota, quase certo de ela correria, e virou de costas. Seu último vestígio de coragem havia sido gasto, e ele não tinha mais como olhar para ela. Ele estava com medo.
Mas ele não ouviu ela se afastando. Ele não ouviu o "não" que ele temia. Ele apenas sentiu um par de braços que enlaçava suavemente a sua cintura. E um rosto macio que derrubava lágrimas sobre suas costas. Lentamente, ele se virou, e descobriu um sorriso enorme, totalmente para ele. Sango ainda chorava, mas estava abraçando-o decididamente, e fitando-o com doçura.
_ Eu não quero correr, Miroku. Eu não poderia fazer isso agora. Porque também eu te amo, e não te deixaria aqui, sozinho e sofrendo. Eu acredito em você. Eu quero ficar com você.
Sorrindo, Miroku inclinou o corpo e encostou seus lábios nos dela. Depois a abraçou gentilmente, e não sentiu vontade de descer a mão, pois sabia que ela não fugiria. Ela ficaria com ele, e o dia em que os dois teriam um filho chegaria. Mas pelos motivos certos.
_ Você quer ficar comigo, Sango? Para sempre, eu digo.
Encostando a cabeça no peito do monge, a garota respondeu:
_ Para sempre, meu querido Miroku.
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Kagome acordou e levantou-se sem fazer barulho. Ela não queria falar com ninguém, nem com Inuyasha. No tempo em que ficara inconsciente, ela tivera sonhos estranhos e significativos. Talvez fossem recordações que Kikyou lhe passara junto com os poderes de miko. Talvez fossem reflexos do futuro, ela não tinha idéia. Olhou pela janela, e encontrou Miroku e Sango trocando um beijo apaixonado. Não contendo um pequeno sorriso e algumas lágrimas inexplicáveis, a colegial olhou para o chão e viu Shippou e Kirara dormindo, encostados um no outro, era uma cena muito doce. Então ela decidiu dar uma volta, sozinha, e pensar em tudo o que havia acontecido e em tudo o que aconteceria dali por diante, pois as coisas certamente mudariam radicalmente.
A garota se dirigiu à porta, imaginando que esta certamente estaria trancada, mas ficou muito surpresa quando a mesma abriu facilmente a um mero toque seu.
Kagome caminhou durante algum tempo, até que seus pés a levaram ao último lugar onde ela queria ir: a pequena clareira que fôra cena da pior batalha de que ela já participara. Os restos de Naraku e seus servos ainda impregnavam o ar com o cheiro de seu sangue, e diversas árvores e plantas destruídas pelos simultâneos golpes de espadas coroavam a horda que antes era verde e florida. Grandes áreas de grama haviam sido queimadas pelos ataques de fogo de um dos youkais. Era um cenário devastado e triste. Ela foi até o pedaço de pele que restara de Naraku, e observou-o com uma mistura de nojo e pena. Algo em sua cabeça lhe gritava para correr dali, pular o poço e chorar no colo de sua mãe, mas suas mãos simplesmente tremeram violentamente e foram ao encontro da pele ensangüentada, suspendendo-a no ar e possibilitando à Kagome uma visualização melhor. Ela queria soltar o couro nojento, mas suas não lhe obedeciam, e ela atribuía aquele fato aos últimos vestígios de Kikyou em seu corpo, pois aquele efeito foi diminuindo lentamente, até que a colegial voltou a ter o pleno domínio de suas ações.
Inuyasha estivera adormecido durante algumas horas. Despertou com passos suaves, que apenas a sua sensível audição de youkai lhe permitia ouvir. Ele não estava preparado para dar explicações, então ficou ali, escondido, esperando quem quer que tivesse ido até ali ir embora. Para sua surpresa, quem saiu do meio das árvores foi Kagome. Não a mesma colegial que ele conhecia, sorridente e luminosa, mas uma garota cujos olhos não brilhavam, uma garota apagada e triste. Ele a observou enquanto ela olhava ao redor, friamente. Depois caminhou até os restos de Naraku, olhou por alguns instantes, e fez uma coisa que deixou o hanyou perplexo: levantou a pele com a mancha em forma de aranha. Kagome ficou contemplando aquilo, e em seus olhos apareceu uma expressão que ela não parecia ter percebido: vitória, um ar de vingança cumprida. Então ele percebeu. Aquela não era Kagome, eram os pensamentos da Kikyou que haviam nela, e Inuyasha ficou muito perturbado.
Mas logo aquele olhar sumiu. Ela parecia ter recuperado a consciência, pois jogou longe o pedaço de pele e, olhando ainda perplexa e enojada para o sangue em suas mãos, afastou-se de costas, lentamente e passo a passo, até bater com as costas em uma árvore. Caindo devagar, Kagome colocou a cabeça entre os joelhos e chorou amargamente, sendo observada pelo meio-youkai.
Inuyasha estava vendo Kagome chorar, e tinha vontade de fazer o mesmo, pois ele sabia que ela estava assustada e não fazia nada. Então ele juntou toda a sua coragem e foi falar com ela. Iria dizer tudo, ser sincero, como ela sempre fôra com ele. Era muito provável que ele a magoasse, e o hanyou tinha consciência disso, mas era melhor agora do que mais tarde. Respirando fundo, o meio-youkai pulou da árvore e se aproximou de Kagome. Antes que ela entendesse o que estava acontecendo, ele tomou-lhe as mãos e limpou o sangue asqueroso com seu próprio kimono.
Kagome levantou os olhos, vermelhos e inchados. Inuyasha a olhava preocupado e receoso, mas ela logo mudou de assunto:
_ Você está bem?
_ E você, está?
Ela não insistiu.
_ Inuyasha... Eu não sei o que fazer... Eu estou com muito medo. Eu não sei mais quem eu sou.
_ Kagome, eu... _ ele respirou fundo. Os dois sussurravam _ Você sempre me pediu para ser sincero. Eu vou ser mais sincero agora do que eu já fui em toda a minha vida, mas isso vai ser muito difícil.
_ Por favor, me deixe falar primeiro _ ele confirmou com a cabeça _ Eu não posso mais ficar aqui. Eu não consigo olhar para você sem saber se o que eu sinto é verdade, ou se tudo não passa de um reflexo da minha outra encarnação. Antes, eu não tinha dúvidas, mas depois que a Kikyou começou a me ensinar, eu já não sei se esse sentimento é meu ou dela. Eu não quero me iludir, eu não quero nos machucar. Então eu vou embora.
Inuyasha compreendia perfeitamente o que ela queria dizer. Ele mesmo sentia aquilo. Então ele concordou:
_ Era isso o que eu ia te dizer. Eu não sei se quando eu olho para você, eu estou vendo a Kagome ou a Kikyou. Na verdade, eu nunca soube, mas antes, pelo menos, o seu sorriso afastava as minhas dúvidas. Só que depois que ela apareceu, você deixou de sorrir. Você ficou igual a ela, e eu já não tenho certeza de nada. Enquanto nós não soubermos o que há realmente entre nós, receio que não poderemos ficar juntos.
Quando acabou, a voz do hanyou tremia e seus olhos estavam cheios de lágrimas. Num impulso, ele passou seus braços em volta da cintura de Kagome, que chorava, trazendo-a para perto. Seu sentimento talvez não fosse verdadeiro, mas era avassalador. Voltando ao controle, ele pensou em interromper aquele contato doce, mas ao sentir que era retribuído por dois braços delicados envoltos em seu pescoço, o meio-youkai simplesmente deixou-se ficar. Eles permaneceram assim, abraçados, até que, como se tivessem combinados, se soltaram e se afastaram. Kagome voltou para o vilarejo, e Inuyasha subiu na árvore novamente.
*****~*****~***** Fim do Flashback *****~*****~*****
Continua...
Uhhhh... Grandes revelações... Por enquanto é isso aí, pessoal, espero que vocês gostem... Esse é o maior capítulo do fic, os outros são todos menores...
Bom, eu já terminei esse fic, só falta o epílogo, por isso vocês podem ter certeza de que ele vai ganhar um capítulo por semana. São cinco partes, e mais o epílogo.
Obrigado a todos q deixaram um review.
Bjões da Queen!!!
