Capítulo 10
O trem da meia-noite
Não demorou muito para que a noite caísse e a escuridão passasse a dominar o barco. Rony dormira a maior parte do dia, pois estava muito cansado. Quando o relógio no alto da parede indicou cinco para as onze, a mulher entrou no quarto.
- Está na hora.
Luke se levantou e puxou Rony pela camisa.
- Olha, se você ainda não percebeu, eu sei andar.
Ele soltou a camisa bufando e virou-o bruscamente para algemá-lo.
- Vamos – disse Luke, empurrando Rony pelo corredor.
O barco não era muito grande, parecia mais um iate particular. Porém, sua aparência era antiga e enferrujada. Deveria ser um velho barco de pesca.
Rony foi o último a sair do barco, acompanhado de perto por Luke. Dois homens ficaram lá e os outros 6 ou 7 saíram com a mulher. Quando todos se juntaram no porto, eles se dividiram em 3 carros e seguiram para a estação de metrô Piccadilly Circus, uma das mais movimentadas de Londres.
Os três carros estacionaram numa rua mais deserta e a mulher tirou as algemas de Rony ainda dentro do carro.
- Pode fugir se você quiser, nós não vamos matá-lo, o seu pessoal já vai cuidar para te pegar e te levar para Azkaban. Mas não se esqueça que nós estamos com o seu amigo e sua namorada.
- Hermione outra vez? Não acredito...
- Você pensa que somos o que, um bando de iniciantes? Vamos, me dê sua varinha e saia do carro.
Eles seguiram pela movimentada praça e passaram despercebidos, até que desceram as escadas da estação.
- Vocês acham que ele ainda está aí? – perguntou Rony. – Desde de manhã?
- É óbvio. A demora de Stuart só acendeu a curiosidade de Barker – respondeu a mulher. – Era capaz do homem passar um mês plantado aqui.
O grupo parou antes das catracas e fecharam uma roda. A mulher tirou o mapa da bolsa.
- Muito bem, Barker está aqui – ela apontou para o ponto vermelho. – É um banco do lado da grande placa com o nome de estação, aquela que fica na plataforma.
- Qual das plataformas? – perguntou um homem. – Linha Piccadilly ou linha Bakerloo?
- Linha Piccadilly.
- Sentido Cockfosters ou aeroporto de Heathrow?
- Não faço a mínima idéia – a mulher começou a se irritar. – Maldito metrô cheio de linhas e sentidos, esse trouxas não entendem nada de transportes!
Os homens esperaram a chefe se acalmar com os olhos arregalados.
- Senhora – disse o mesmo homem que perguntara antes. – O que vamos fazer, então?
- Vamos nos dividir. Vocês três vão para a plataforma do sentido Cockfosters e os outros vão comigo para a plataforma sentido Heathrow.
Eles seguiram para o caixa e compraram os tickets, caminhando pela estação calmamente. Só pararam quando chegaram à bifurcação onde havia uma placa indicando os dois sentidos, um para a esquerda e outro para a direita.
- Escutem – disse a mulher, olhando para os três que iam para o lado oposto. – Se virem o homem, voltem discretamente para nos avisar. Se ele não estiver lá e não aparecer em 20 minutos, venham para a nossa plataforma. Entendido?
- Sim, senhora – disseram os três juntos, virando-se e entrando na plataforma.
Os outros seguiram para a plataforma da direita, caminhando calmamente. Rony estava atrás de todos eles para não ser o primeiro que Barker enxergaria.
E lá estava ele, Arnold Barker, sentado com uma expressão cansada ao lado da placa que indicava o nome da estação.
A mulher parou ao lado dele e ele se levantou com um pulo.
- Arnold Barker?
- Onde está Stu? – perguntou Barker, desconfiado.
- Mudança de planos – disse ela, apontando a varinha para ele por dentro do casaco. – Mas trouxemos outro amigo seu.
Alguns homens deram um passo para o lado, revelando Rony.
- Balaço! Eles te pegaram outra vez?
- Seguimos a mesma pista falsa, Bark.
- Como?
- Smooth trabalha para eles.
Barker ficou chocado por alguns instantes, mas logo sua cara tornou-se púrpura.
- Eu mato aquele desgraçado, ah, se eu mato! Todos esses anos, você sabe o que eu fiz por ele? É um filho da mãe mau agradecido, é isso que ele é! Deixa só ele aparecer na minha...
- É o suficiente, Barker – disse a mulher, aproximando a varinha do peito dele. – Sente-se.
Um pouco relutante, ele se sentou. Rony sentou-se ao lado dele a pedido da mulher.
- Horário – disse ela, olhando para o homem a sua esquerda.
- Faltam menos de cinco minutos, senhora.
- Ótimo. Julian, vá buscar os outros.
O homem que estava mais distante dela acenou com a cabeça e fui para a outra plataforma. Não demorou para que voltasse acompanhado dos outros dois.
- Atenção, senhores passageiros – a voz dominou toda a estação. – Estamos encerrando nossas atividades nas linhas Bakerloo e Piccadilly sentido Cockfosters. Os passageiros da linha Piccadilly sentido aeroporto de Heathrow ainda podem pegar o último trem do dia que chegará à meia-noite.
- Ouviram? – perguntou a mulher, muito sorridente como todos os outros. – Esse é o nosso trem.
- Por que vocês querem pegar o trem da meia-noite? Ninguém viaja nele.
- Por isso mesmo.
Barker engoliu em seco e voltou a encarar o chão. Rony tentou bolar um plano para escapar dali, mas todos seus pensamentos estavam concentrados em Hermione, presa novamente em algum lugar e ele não podia fazer nada quanto a isso.
- Você tem certeza de que está bem? – perguntou Mark, olhando para Mione com ternura.
- Só um pouco cansada.
Os dois estavam sentados na cama de casal do quarto de Hermione assistindo televisão como se fossem um casal. Isso a incomodou de um certo modo.
- Quer alguma coisa? Posso pedir para trazerem.
- Não, obrigada.
- Tudo bem.
Mais alguns minutos de silêncio se passaram, até que Mark levantou muito sorridente.
- Já sei do que você precisa!
- Diga – disse Mione, ainda olhando para a televisão.
- Dar uma volta! Mione, você passou o dia inteiro enfurnada nesse quarto, precisa respirar um pouco.
- Mark, francamente, é quase meia-noite. Londres não é Nova York, as lojas fecham e as pessoas vão para suas casas às 10.
- Pode até ser, mas as coisas mudam se você souber aonde ir.
- Do que você está falando?
- Eu li alguns guias na vinda pra cá. Eles dizem que tem um lugar cheio de teatros onde as pessoas passeiam até altas horas, um lugar cheio de luzes e badalação.
- Piccadilly Circus.
- Esse mesmo! Nós podemos ir para lá!
- Mark, Piccadilly fica a umas 40 quadras daqui.
- Tudo bem, a gente pega o metrô.
- Os trens já pararam de funcionar a essa hora. O único que faz esse caminho é o trem da meia-noite e ninguém o usa.
- Podemos ser os primeiros, então!
- Você é louco.
- E você precisa sair daqui! Vamos, vá se trocar para pegarmos esse trem a tempo.
- Alguém quer um suco? – perguntou Julian, colocando uma moeda na máquina de bebidas ao lado do banco.
- Não, obrigado – responderam todos.
Ele deu de ombros e colocou a moeda, mas nada caiu. Deu umas palmadinhas na máquina, apertou os botões e nada aconteceu. Então ele se afastou e deu um chute na máquina, fazendo o maior estardalhaço e derrubando todas as bebidas.
- Julian! – gritou a mulher. – Nós estamos tentando ser discretos.
- Desculpe – disse ele, muito feliz com todas as bebidas a sua volta. – Não tem ninguém aqui.
- É, mas vai ter em breve se pensarem que somos vândalos.
- Olhem – disse o homem que estava perto da linha do trem.
Todos olharam para onde ele apontava e viram a luz do trem se aproximando. O vento fez com que suas roupas balançassem.
- É agora – disse a mulher.
- Por que tínhamos que embarcar no primeiro vagão? – perguntou Mione, esparramada numa cadeira.
- Mione, à essas horas é perigoso sentar lá atrás.
- À essas horas é perigoso fazer qualquer coisa, Mark.
- Vamos lá, seja mais esportiva. Quer visitar a cabine?
- O que? Não, obrigada, eu não tenho mais 7 anos.
- Tudo bem, eu vou sozinho.
Mark foi até o fim do corredor e entrou na cabine do condutor.
O trem sequer chegou à plataforma. Ele parou a alguns metros dela, ainda no túnel. Julian fez menção de pular nos trilhos, mas a mulher o segurou.
- Cuidado. Não queremos mortes desnecessárias por aqui.
Ela lançou um feitiço nos trilhos e pulou.
- Está tudo bem, a corrente elétrica cessou. Venham.
Um por um, eles foram pulando pra dentro do grande buraco e seguiram até o trem. As portas já estavam abertas e eles entraram no primeiro vagão. Hermione levantou-se e ficou assustada ao vê-los.
- Quem são vocês? – perguntou quando os homens passaram por ela.
- Hermione – disse a mulher, entrando no trem pouco depois. – Vejo que tudo deu certo.
- Beth? – exclamou Mione. Não podia acreditar que sua secretária estava envolvida com seja lá quem fossem aqueles homens.
- A própria – ela puxou Mione do banco e amarrou suas mãos.
- Rony? Barker? – disse ela, cada vez mais assustada.
- Não se preocupe, tudo vai ficar bem – disse Rony, um tanto aliviado em vê-la sã e salva.
Julian algemou Rony e um outro homem fez o mesmo com Barker. A mulher jogou-os nos bancos ao lado de Mione e seguiu para a cabine.
- Fechem as portas – ordenou.
As portas do trem se fecharam e os três ficaram sozinhos no vagão.
- O que está acontecendo? – perguntou Mione, desviando o olhar de Rony.
- O que você acha? – disse Rony. – São eles outra vez.
- Não pode ser. Beth é minha secretária, não é da organização dos aurores expulsos pelo Ministério.
- Ela deve ser uma das agentes corruptas dos Estados Unidos – disse Barker. – Se ela veio até aqui, é porque eles devem ter um plano. E se eles têm um plano, o outro agente corrupto também veio. Hoje todos eles se reuniram para fazer algo ao lado dos homens de Hogan.
- Barker – disse Rony, muito sério. – Eles querem te matar hoje.
- Me matar? – disse Barker, disfarçando a surpresa. – Por que eles me matariam?
- Porque você sabe demais sobre a organização deles. E tem mais: eles vão me incriminar pela sua morte.
- Como vão fazer isso?
- Não sei.
Rony se mexeu na cadeira e sua algema se abriu. Ele colocou as mãos para frente e Barker e Mione o olharam com surpresa.
- Esse Julian é muito burro – disse Rony, levandando-se.
- Esse Julian é um dos nossos – sussurrou Barker, dando uma piscadela para Rony.
Quando Rony foi até Mione para cortar a corda que amarrava seu pulso, Barker se levantou.
- Fuja, Balaço. Por favor, fuja.
- Não vou deixar vocês aqui.
- Você não entende. Julian está aqui, ele pode salvar a garota, mas eu já estou condenado à morte e não há nada que se possa fazer quanto a isso. Vá e poupe-se, você tem muito talento e ainda tem muito pela frente, não merece passar o resto dos seus dias em Azkaban.
- Barker – disse Rony, decidido. – Eu jamais abandonaria meus colegas.
Ele cortou a corda de Mione e foi para a porta do trem. Nesse momento, Julian entrou no vagão.
- Rápido – disse ele, apontando para os bancos. – Eles estão vindo. Peguem isso.
Ele deu uma varinha para Mione e fez os três se sentarem. Quando estava voltando para a cabine, os outros entraram no vagão.
- Tudo certo? – perguntou Beth, olhando para os três.
- Sim, senhora – disse Julian, postando-se atrás dos outros.
- Ótimo. Paul, Christian, amarrem Barker. Os outros levem esses dois para a plataforma e você – ela apontou para Julian. – Vá cuidar da porta da estação. Faça com que pareça um arrombamento.
Quando todos estavam na plataforma, Christian e Paul saíram do trem carregando Barker, completamente amarrado com cordas desde as pernas até os ombros.
- Coloquem-no aqui.
Ela apontou para os trilhos e os homens jogaram Barker no buraco da plataforma. Beth acenou para a cabine e o trem começou a se afastar, voltando pelo lugar que viera.
- Muito bom. Agora vão até a sala da segurança e peguem as fitas que contenham imagens comprometedoras para nós. Não se preocupem com o vigia, ele está dormindo e não vai acordar muito cedo.
Enquanto ela dizia essas palavras, Rony deu uma leve cotovelada em Mione e os dois se olharam. Ele acenou com a cabeça em direção a Beth e os outros homens, depois para a varinha escondida nas vestes dela. Ela concordou e abaixou a cabeça.
- Não tenha medo, Mione – sussurrou ele. – Vai dar tudo certo.
- Eu sei – disse ela. – É o que você sempre diz.
De repente, o trem começou a andar. Rony sentiu seu coração parar por alguns segundos, mas ele bateu cada vez mais forte quando o vento e a luz inundaram a plataforma. Ele virou-se para Mione e deu uma cotovelada mais forte.
Tudo aconteceu muito rápido. Enquanto Rony dava um soco no homem que estava atrás deles, Mione sacou a varinha e lançou um feitiço em Beth, que caiu no chão. Os outros avançaram para cima deles e Rony foi para cima deles.
- Pare o trem! – gritou para Mione enquanto lutava com três homens ao mesmo tempo.
Mione apontou a varinha para o trem, mas foi derrubada por alguém. Era Christian, um dos homens que tinham ido à segurança.
Rony olhou para o trem que estava cada vez mais perto, ele iria cruzar a plataforma a qualquer momento. Então ele pulou no trilhos e, numa fração de segundos depois, o trem passou.
- NÃO! – gritou Mione, chutando Christian.
Ela correu até a borda da plataforma e se jogou no chão desesperada. Foi então que viu uma mão segurando a borda da plataforma. Depois surgiu um corpo todo sujo e uma vasta cabeleira ruiva. Rony ergueu-se e jogou Barker para cima da plataforma, sentando-se no chão pouco depois.
- Vocês estão vivos! – exclamou Mione, lançando um feitiço para as cordas de Barker se soltarem.
Ela se jogou em cima de Rony e o abraçou com toda força, mas soltou-o logo depois. Ele levantou e ergueu o amigo, sentando-o no banco. Mione lançou um feitiço nos dois que acabaram de chegar e parou ao ver que o trem voltava a plataforma. As portas se abriram e um homem surgiu.
- Mark!?
- Mionezinha, meu amor, não é o que você está pensando – disse ele, ao ver que Mione segurava uma varinha.
Ela apontou a varinha para ele e se aproximou.
- Mark, por que você fez isso?
- Eu só queria te proteger, Mionezinha, só fiz isso para que você voltasse para casa sã e salva!
- O que?
- É, eu precisei matar aquele idiota do Norton para você voltar, querida, mas você continuou aí e então eu precisei vir!
Mione paralisou naquele momento. Então Mark matara Norton. A única coisa que ela sentiu foi um crescente ódio dominar seu corpo e sua mente. Então apontou sua varinha novamente para ele e exclamou em alto e bom som:
- Seu filho da mãe desgraçado!
