Capitulo II – Um voo marcante
No dia seguinte, estava tão sonolenta após a seca que apanhei em Historia da Magia que nem percebi de quem era o par de olhos que me seguia depois de sair da sala de aula. Só "acordei" quando senti um puxão no pulso esquerdo que me desviou para uma pequena passagem secreta, junto a uma janela, alheia a todo aquele que estivesse no corredor.
- Quem...? – Mas calei-me, olhei para cima e encontrei o dono do tal par de olhos, que agora reparara, eram cinzentos ou verdes, bem, era difícil dizer. – Então? Não tiveste coragem para aparecer...que fraco. – Eu sabia que estava a abusar, mas que se lixe! Usei a minha melhor expressão de gozo e um sorriso a formar-se no canto dos lábios.
- Não tinha a vassoura comigo, não querias que eu levitasse...? – Ele estava visivelmente irritado. Ainda me agarrava o pulso com força.
- Estás a magoar-me – disse eu baixinho, e fiz questão de afastar-me mas ele largou-me no mesmo momento. – Mesmo que a tivesses, duvido que fosses ter comigo. Não sei qual era a ideia que tinhas em mente quando mandaste o bilhete. Se era irritar-me, parabéns, conseguiste. Estragaste os meus únicos momentos de paz do dia inteiro. Se não tens coragem para falar comigo cara a car...
As próximas palavras foram abafadas por uma suave mão que me tapou os lábios. Eu nem estava a acreditar naquilo. Ele, obrigar-me a calar! A raiva começava a entorpecer-me a vista.
- As mulheres não sabem quando calar a boca... – disse Malfoy. Não sei porquê, não fiz nenhuma objecção àquela mão fria a tocar-me, e o mais estranho é que adorei aquela sensação. – Já devia ter feito isto à muito tempo... – acrescentou ele, com um olhar pensativo.
Lentamente, ele deslocou a mão pela minha face, acariciando os meus cabelos ao de leve.
Como é que ele pode ser tão carinhoso? Pensei.
E chegou-se perto de mim, perto demais, beijou-me, e com a mão que tinha livre, acarinhou-me o braço. O beijo estava a ser tão bom, tão...intenso, que eu senti-me deslumbrada.
De repente, ele afastou-se, deixando uma Ginny tão confusa e surpreendida que se via à distância que queria mais.
- Tenho coragem para isto e para muito mais... – disse ele, atirando-me um olhar gélido. Com isto, saiu porta fora, fiquei ainda mais surpresa e confusa, como se fosse possível!
Na sala comum, depois de jantar, acomodei-me num cadeirão a pesquisar sobre plantas, – afinal sempre precisava delas – para curar borbulhas da adolescência, num livro moderno, que pedi por catálogo.
Colin e Neville não paravam de me chatear para ir jogar qualquer coisa com eles. Nem prestei atenção – nem a eles nem ao livro – estava num estado de ansiedade e preocupação profundos.
Precisava urgentemente de desabafar com alguém. Mas quem? A quem eu poderia dizer "Olha deixei-me ser beijada pelo Malfoy, e estou fortemente atraída por ele."? Não, ninguém iria perceber!
Ninguém sabia que eu estava farta de tudo, do Potter, da escola, da família, de TUDO!
Ninguém iria perceber que eu só queria pela primeira vez na vida ter a minha própria aventura, ser rebelde, meter-me em perigo. Não queria perigo de morte, claro, como foi com o diário de Riddle, mas uma aventura excitante, selvagem. Eu só queria divertir-me. Não interessava com quem!
Enquanto pensava nisto observando as pessoas em meu redor, entra pelo buraco do retrato uma menina baixa, magra e de cabelo muito volumoso. Vinha bastante sorridente, e seguia para o seu dormitório no primeiro andar da torre.
Pensei, Hermione não iria entender os meus desabafos sobre um certo loiro. Mas por outro lado, ela era bastante racional. Com certeza não ia explodir aos gritos comigo, mas iria, de qualquer modo, ficar muito magoada por saber que eu me andava a meter com um Malfoy – o pior inimigo dela e não só.
E se a minha amiga não soubesse de quem se tratava?
- Hermione! Hermione! – Gritei por ela, que já estava quase a entrar no dormitório. – Preciso de falar contigo, posso entrar? – Disse eu subindo as escadas de três em três.
- Suponho que seja uma conversa privada, – disse ela olhando para dentro do quarto. – E isto está cheio, vamos dar uma volta?
- Claro! – Disse eu.
Já perto do lago, Hermione virou-se para mim com uma expressão séria e disse:
- Então amiga, o que te atormenta? Pareces bastante preocupada, e segundo ouvi dizer, não andas a prestar atenção nenhuma às aulas.
- Só te digo isto: sexo masculino. – Disse eu com a mesma seriedade.
- E...? – Disse ela franzindo a testa, obviamente à espera de mais pormenores.
- E o quê? Isto não é problemático o suficiente?!
- Depende do ponto de vista, – disse a menina de cabelos volumosos, afastando-os para trás das orelhas. Ficou um pouco corada.
- Depois explicas-me isso. Bem, então é assim, há um rapaz...ele...ele insinuou-se para mim, se é que me entendes. E eu, bem, eu não sei se hei de corresponder, porque estou tão confusa... – suspirei. Que vergonha, se ela soubesse de quem eu estava a falar... – Apesar de o rapaz em questão...err...não ser o mais acertado, eu só quero divertir-me, percebes? Aquela idolatria pelo Harry só me fez mal, agora quero aproveitar o tempo que perdi! Entendes? – Finalmente olhei-a nos olhos, e para meu espanto, ela continuava com a expressão séria e concentrada de há pouco. Graças a Merlin não estava chocada!
- Entendo perfeitamente. – Hermione ás vezes parecia-se muito com o professor Dumbledore, calma e serena. – Só não entendo porque esperas. Talvez ele te transmita alguma insegurança? Bem, se for esse o caso só vejo uma solução: Se é uma aventura que queres... segue em frente!
- Uau, não estava à espera disso, amiga, mas é exactamente o que quero! Obrigada pelo conselho. – Agradeci a sorrir, estava maravilhada. Hermione disse-me tudo aquilo que eu queria ouvir.
- Estarei sempre aqui para quando precisares, – ela retribuiu o sorriso, pegou-me nas mãos e acrescentou, – mas tem cuidado, não te esqueças, o que seria apenas uma brincadeira pode vir a tornar-se em algo muito mais sério.
- Não te preocupes, eu sei cuidar-me. – E seguimos ambas para a Torre Gryffindor, pois aproximava-se a hora de recolher.
No caminho para o sétimo andar quase esbarrámos numa esquina com uma certa pessoa. E quem haveria de ser senão...
- Hey Malfoy! Vê por onde andas! – Reclamou Hermione, apesar de ter sido eu a culpada, como ele fez questão de frisar:
- A culpa foi toda dessa Weasly aluadinha. – Disse ele arrastando a voz e olhando de lado para mim com um misto de curiosidade e desdenho.
Eu também o olhei, mas não respondi, apenas apressei Hermione a continuar o caminho. Não podia deixar que ela percebesse algo!
Passados alguns minutos, quando nos aproximávamos do retrato da Dama Gorda, fui trazida dos meus pensamentos à realidade.
- Ginny? Olá? Estás aí?! – Disse ela agitando uma mão à minha frente. – Acho que já sei a resposta. – Disse entre gargalhadas.
- Hã? Resposta?!
- Eu estava a perguntar-te agora mesmo o que é que aquele imbecil quereria dizer com "aluadinha". Mas já sei a resposta, hein. Andas mesmo no mundo da lua. – E rimos as duas ao entrar na Sala Comum.
Algumas horas mais tarde, quando já estava na minha cama, novamente perdida nos meus pensamentos e a tentar acabar um trabalho para Adivinhação, vejo uma grande sombra irromper pela janela aberta.
Ergui a sobrancelha e observei, curiosa.
De repente apareceu uma cabeça cujo cabelo loiro, liso e brilhante caía-lhe para a face ocultando-a. A cabeça olhava para o lado oposto ao de onde eu estava, que ficava na ponta do Dormitório, logo junto à parede.
E apesar de eu saber muito bem quem era e o que queria dali, perguntei num sussurro:
- Procuras alguém? – Foi um murmúrio, mas alto o suficiente para ele se assustar e se voltar na minha direcção.
Ele desequilibrou-se e eu receei que ele caísse lá para dentro e com o estrondo acordar as minhas colegas. E receei também pelo facto de eu estar prestes a explodir em gargalhadas devido à cara que ele fez quando me viu, e, elas acordarem de qualquer maneira.
Achei melhor controlar-me e ir rapidamente ajudá-lo a equilibrar-se na vassoura.
- Quase me mataste do coração, idiota! – Enfureceu-se mesmo a falar bastante baixo enquanto eu lhe dei uma mão.
- Se é para me insultares, podes dar meia volta.
- Eu não viria aqui gastar o meu tempo só para te insultar, Weasly. – Disse Malfoy com aquele ar arrogante de superioridade que tanto me irritava. – E como queres que baze se tás a agarrar-me?
- Só estava a ajudar. – Disse eu, com raiva e larguei-o imediatamente.
Olhámo-nos durante um longo momento.
- Preciso de falar contigo. – Dissemos em uníssono.
- Diz tu – continuámos ao mesmo tempo.
E desatámos ás gargalhadas. Mas logo lhe fiz um sinal para nos calarmos apontando para as outras raparigas que dormiam.
Malfoy estava mesmo a rir, e era um riso sincero, espontâneo. Um riso que eu não ouvia há muito.
- A sério, diz tu, o meu assunto pode esperar. – Expliquei-lhe com ar sério.
- Tenho a certeza de que o meu assunto pode esperar muito mais. – Retorquiu ele confiante. – Sobe na minha vassoura que eu levo-te a um lugar onde podemos falar mais à vontade e sem termos de murmurar!
Arregalei os olhos. Ele...hum, estava mesmo a convidar-me para ir a um lugar?! Um lugar onde podíamos falar à vontade? Ele queria ficar sozinho comigo. Errr... eu só queria pedir-lhe aulas extra de Poções.
Céus, ele queria ficar a sós comigo.
O beijo, ai aquele beijo. Daquela vez também estivemos sozinhos, mas agora ele estava a convidar-me.
- Não sei...
Ele sorriu. Como aquele sorriso era sedutor e cativante!
- Vá lá, é aqui perto. Não te vou raptar.
Sorri-lhe como resposta e fui buscar uma capa do uniforme.
Em poucos segundos estava de volta e a subir para a vassoura.
- Agarra-te bem. – Disse ele olhando para trás.
Coloquei os braços à volta da sua cintura, e só pelo tacto deu para perceber como tinha os abdominais bem definidos. E uma das coisas que eu adorava nos rapazes eram abdominais!
Voámos dali muito depressa, numa espiral descendente. Quase toquei com os pés no chão, (pois com a pressa fui descalça), antes dele dirigir a vassoura velozmente para perto do lago. Aí, abrandou, estávamos mesmo por cima da Lula Gigante. Olhei para o meu lado esquerdo e lá estava uma bela Lua Cheia, rodeada de estrelas cintilantes.
Deixei cair a cabeça nas costas dele. Eu sei que ainda não éramos assim tão íntimos! Mas ele é que me tinha levado para aquele sítio lindo. Não esperava que eu fosse ficar ali toda sisuda sem apreciar a paisagem?! E a companhia. E que boa companhia...
- A noite está linda, obrigada por este voo, Malfoy.
- Não agradeças já. – A voz dele veio agradável e feliz. Naquele momento ele parecia outra pessoa.
E outra vez saímos dali tão inesperadamente que me pareceu ter deixado metade do corpo pelo caminho.
- Podes arrancar um pouco mais devagar?! – Gritei-lhe ao ouvido.
- Podes gritar um pouco mais baixo?! – Gritou ele como resposta.
Quando reparei estávamos a ir em direcção à "minha" janela e fiquei sem perceber. Então onde era suposto termos falado?
- Então mas...? – Já estávamos realmente perto da Torre.
4 Metros.
2 Metros.
1m, e travou, virando a vassoura bruscamente para ficar de novo de frente para a noite, e eu continuei confusa.
Ele dirigia-nos em frente, sempre em frente, lentamente.
