Parte I – Outono
Tempo de deixar ir.
Capítulo I – Fantasmas
Londres – 22/09/1998
Remus Lupin:
Há horas está caindo uma chuva fina, tornando a rua da Londres trouxa ainda mais sombria. Estou sentado em frente à janela aberta, vendo a chuva cair e esperando o sono. Se Molly estivesse aqui, ralharia comigo dizendo que eu estou tentando pegar uma gripe, ou algo pior. Talvez esteja mesmo.
Desvio os olhos da chuva para me fixar nas fotos no console da lareira. Pontas e Lily acenam para mim. Nos olhos brilhantes dela, eu noto preocupação; mesmo na foto ela se preocupa comigo, minha doce amiga.
Harry, Rony e Hermione, na outra foto, agitados, também acenam para mim. Eu sorrio de volta sem muito ânimo. Sempre que vejo essa foto, agradeço a qualquer deus que exista que essas crianças tenham sobrevivido à luta contra Voldemort. Eles estão vivos, mas muitos outros não estão.
Sacudo a cabeça. Não quero pensar nisso agora. Há outro sobrevivente no quarto ao lado que precisa de mim, e eu não sei o que fazer. Eu não sei o que fazer nem mesmo comigo, o que dirá com esse jovem, pouco mais que uma criança.
Volto minha atenção para a foto, tirada na véspera da terceira prova do Torneio Tribruxo. Nessa época Harry ainda sorria assim. Nessa época Voldemort ainda era uma ameaça incorpórea. Nessa época os assassinatos ainda não haviam começado. Nessa época Sirius ainda estava vivo. E meus olhos traidores se voltam para a foto dele. Uma foto tirada no último Natal que ele passou neste mundo.
Sirius não sorri para mim; ele me olha sério, e um pouco triste também. Em minha mente, posso ouvir sua voz: "Aluado, meu velho, o que há com você? Eu quase não o reconheço mais." E é na minha mente que eu respondo de volta: "Nem eu, Almofadinhas."
Parte de mim morreu quando Sirius caiu no Véu da Morte e, por dois longos anos, tenho arrastado essa parte morta da minha alma. Estou tão cansado! Enquanto havia a luta, eu conseguia empurrar para o fundo da mente esse cansaço e essa dor. Agora não posso mais.
Ergo-me e fecho a janela. "Pronto, Molly, não vou mais ficar no frio."
Devo estar enlouquecendo, falo com fotos, com memórias e com quem não está perto de mim, mas mal consigo trocar duas palavras com outros seres humanos.
Ser humano! Depois de tudo, o Ministério ainda me nega esse título. Não! Não vou me entregar à autopiedade. Isso seria a minha morte.
Vagueio pelo quarto. Em cima da escrivaninha, o exemplar do Profeta Diário de dois meses atrás que não me animo a jogar fora.
Na capa, uma foto de Sirius tirada alguns meses antes de ele ser preso, e uma de Peter no julgamento. Toda a história está ali - a traição de Peter, seu tempo como rato, a fuga de Sirius, como Peter ajudou Voldemort a se reerguer, a morte de Sirius.
Ironia. Não posso deixar de pensar que Sirius, mais do que qualquer outro, deve achar irônico: o mesmo jornal que o inocenta traz seu obituário. Traz até uma cópia do seu testamento. A fortuna considerável que ele deixou para ser dividida entre mim e Harry.
A única coisa que não traz é o bilhete que eu já decorei:
"Aluado, eu amo você. Não da forma como você gostaria e merecia ser amado. Sou um perdido na vida, e nunca conheci esse tipo de amor. Sei que você vai se ver tentado a recusar a herança que eu lhe deixo. Não o faça. Em nome da nossa amizade, não o faça. Me magoaria demais. Me perdoe não ter entendido você a tempo. Me perdoe não ter confiado em você. Você sempre foi o melhor de nós, eu devia saber muito bem que nunca nos trairia. Me perdoe por ter traído você, primeiro quando coloquei seu segredo em risco apenas para assustar um desafeto, e depois quando não confiei em você. Me perdoe por não ter amado você da mesma forma como você me ama. Cuide de Harry, e cuide-se. Procure sua felicidade, Remus. Com amor, Sirius."
Seguro a foto em minhas mãos. Eu queria poder falar mais uma vez com ele, só mais uma vez. A quem eu quero enganar? Sempre vou querer falar com ele mais uma vez.
"Ah, Sirius, eu amo você tanto! Eu me apaixonei ainda na escola, e você, é claro, não notou. Eu tentei sufocar, matar, esquecer esse amor por tanto tempo que a dor parecia já fazer parte de mim. Um dia compreendi. Eu não ia mais conseguir conviver com você sem tê-lo para mim. Eu me afastei para me proteger da dor, mas você não entendeu. Só Lily sabia, sempre soube. Sempre soube também que não era dessa forma que você me amava. Então..... ah meu amor, eu não sei como não enlouqueci quando você foi preso. Durante longos doze anos eu imaginava o quanto você estava sofrendo naquela cela. Eu tentei odiar você pelo que havia feito a James e Lily; não consegui. A mágoa pela sua traição e os poucos relacionamentos que tive não apagaram você do meu coração.
Quando você fugiu, novamente me vi dividido em dois. E quando você teve a chance de se inocentar, eu, amaldiçoado que sou, estraguei tudo. Quanta coisa poderia ser diferente se naquela noite você tivesse ficado livre!
No tempo que passamos juntos na casa dos seus pais, eu via você se desfazendo na minha frente. Às vezes parecia que você não conseguia respirar.
Na noite em que Harry confrontou-nos por causa do que vira na penseira de Severus, eu acabei me confessando a você. Não pretendia, mas as palavras me escaparam. Um beijo. Um único e maravilhoso beijo para eu guardar para o resto da minha vida."
A voz de Sirius ecoa na minha alma, repetindo o que me disse depois de me beijar: "Remus, o que eu mais queria agora era poder amar você desse jeito."
Eu queria gritar de dor, de amor, de entendimento e de inconformismo. Mas minha voz não saiu e me deixei ficar ali, abraçado a Sirius, torturado por um amor que não ia acontecer.
"Sirius, você me apertava tão forte nos braços quando dizia que não podia me amar, meu rosto escondido nos seus cabelos, seu cheiro impregnando minha alma. Nós ficamos assim por uma eternidade, ou por alguns instantes?"
Um barulho no quarto ao lado me tira das minhas memórias, me tira de Sirius, e me traz de volta ao meu dilema atual. O que vou fazer com esse garoto, tão ferido e tão magoado? O que vou fazer comigo mesmo?
Harry e Severus o deixaram em minhas mãos dizendo que sou o único que pode ajudá-lo. "Isso também é uma ironia, Sirius. Você odiaria vê-los juntos? Ninguém aceitou a princípio. Nem eu, nem Hermione, Rony muito menos. Mas eles estão juntos. Harry impôs sua escolha, e Severus arriscou tudo para ficar junto com ele."
Não. Sirius não aceitaria. Pelo menos não sem muita confusão antes.
Eu ainda me lembro quando confrontei Harry, há pouco mais de dois meses: "Há quanto tempo você e Snape estão juntos?" Eu fui o primeiro a perceber. Uma parte de mim compreendia o quanto Severus era bom para Harry. Outra gostaria de matá-lo por ousar se aproximar do filho de James.
Rá! O filho de James me olhou serenamente nos olhos: "Sete meses e cinco dias. Por quê?" Naquele instante eu soube que não haveria nada que fizesse Harry desistir de Severus.
Dumbledore os protegeu da imprensa, e a notícia não foi divulgada. Oficialmente o maior herói do mundo bruxo não dorme com o melhor espião da história, seu ex-professor.
Mas ninguém os protegeu dos que estavam mais próximos. Foi um mês de tempestades. Eles enfrentaram juntos.
Eu não me opus, apesar de não aprovar. Deixei isso claro para Harry.
"Eu devia tê-los apoiado, Sirius. Eu, mais do que qualquer um, não devia ter me omitido, devia ter ficado do lado dele desde o início."
Quem nos deu a lição de que precisávamos foi a pequena Ginny. Quando alguém reclamou do relacionamento dos dois perto dela, ela explodiu: "Quantos bruxos das trevas o Harry vai ter de destruir para que vocês o deixem ser feliz? Quantas vezes o professor Snape vai ter de se colocar entre Harry e a morte para vocês pararem de se meter no que não têm direito? INFERNO!" E as pessoas foram recuperando o juízo, aos poucos.
Não acho que algum dia Harry, ou Severus, esqueçam isso. Harry perdoou os que ele ama. Severus nos aceita por amor a Harry. "E você, Sirius, teria aceitado Severus por amor a Harry?"
Agora eles me pedem um favor. Desta vez vou fazer o certo. Vou fazer o que eles me pedem, vou cuidar do garoto. "Eu só não sei como, Sirius!"
Um baque surdo no quarto ao lado, seguido de um silêncio anormal, me alerta. Algo está errado.
A porta do quarto dele está trancada por dentro, mas não enfeitiçada, portanto não é obstáculo. Eu bato apenas uma vez antes de entrar sem permissão.
Draco Malfoy está caído no meio do quarto escuro. Quando me aproximo, o cheiro de uísque me atinge; foi preciso duas garrafas de Uísque de Fogo para derrubar o garoto.
Merda! Harry já havia me alertado disso.
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Draco Malfoy:
Eu odeio chuva. Odeio ficar preso neste apartamento trouxa. Odeio ter concordado com o plano escroto do Potter. Odeio a junta médica do São Mungo. Odeio Dumbledore. E odeio não poder escapar desta armadilha.
Chuva sempre me deprimiu. Eu fecho as janelas e as cortinas para não ver e nem ouvir o som da maldita chuva. O quarto está escuro demais, mas eu não vou atrás do lobisomem pedir que me ensine a acender a tal da lâmpada elétrica. Que se dane.
O que eu vou querer com luz? Ver minha cara no espelho? Como se eu já não tivesse sido obrigado a isso pelos desgraçados dos curandeiros. "Mire-se no espelho, senhor Malfoy, e diga-nos o que vê." Bando de imbecis. "Vejo meu rosto, é claro!"
Três meses disso. E tudo isso para quê? Para ter de escolher entre a ala psiquiátrica do São Mungo ou um tutor pelo próximo ano. "O senhor Malfoy encontra-se emocionalmente abalado, carecendo de supervisão constante. Nova avaliação apenas em 01/07/1999." Bosta pura. Eu queria ver aquela velha tonta passar pelo que eu passei. Aí sim, íamos ver quem fica abalado emocionalmente.
Meu estômago dá a familiar contração de repulsa. Não. Eu me recuso a lembrar. Vai ficar no fundo da minha mente. NÃO!
Quando dou por mim, estou prestes a falar alto. Não quero que o lobisomem escute e venha aqui. Não quero perguntas, não quero ninguém mais sabendo da humilhação, da dor.... "NÃO!" A palavra me escapa, e as memórias estão querendo emergir. "É hora de afogar tudo isso, Draco Malfoy!"
Enganar o Snape para trazer as garrafas não foi tão difícil. Parece que havia algum probleminha no paraíso dele e do cretino do Potter. Melhor para mim. Aqui estão elas, são só cinco, vão ter de durar.
O primeiro copo eu bebo de uma tragada só, e desce queimando. Ótimo. Quanto mais rapidamente eu ficar bêbado melhor. Amanhã eu vou estar um caco, mas já estive pior. Muito pior.
Dor. Ódio. Raiva. Tudo isso parece explodir no meu peito agora. Não vou permitir. O conselho piegas de Dumbledore volta à minha mente: "Busque ajuda, Draco. Permita que os que se importam com você o ajudem. Não se destrua assim." Velho cretino. Como se alguém realmente se importasse. Como se eu me importasse.
Merda, já estou no terceiro copo e ainda estou sóbrio. Cruelmente sóbrio.
A única vantagem de morar na mesma casa que o Potter era essa. Eu poderia ir atazaná-lo em vez de tentar atingir o necessário coma alcoólico. Mas por nada nesse mundo eu vou procurar aquele lobisomem patético.
Criatura ridícula e infeliz. Quando o vi, nem acreditei. O mesmo molambento de quando me deu aula. Isso foi há quanto tempo? Minha dificuldade em lembrar que faz mais de quatro anos que aquele patético arremedo de professor me deu aula é um bom sinal. Minha mente começa a divagar, não era sem tempo. Meu estômago se revolta um pouco, mas eu o forço a agüentar. Já agüentou coisa muito pior. A memória disso traz a dor de volta, e eu viro mais um copo, já nem sinto o gosto.
"Potter, imbecil inútil, você não precisava ficar com ciuminho não. Eu nunca teria nada com o seu amante. NUNCA! Seu idiota possessivo. NADA, OUVIU BEM! NADA! NUNCA! NINGUÉM! Nunca mais...." Oh, não! Gritar com o Potter em pensamento é admissível, chorar não. Eu não preciso de ninguém, eu não quero ninguém. Eu não vou chorar.
Mais derrubo do que bebo o copo seguinte. O uísque molha toda minha roupa. Estou quase lá. "Potter, seu pedaço de merda, Snape foi o único que me ajudou. Por que diabos eu não sei. Na realidade ele não foi o único. Dumbledore, o magnânimo, também me ajudou. Mas quem se importa com a múmia velha? É só isso, seu bosta. Eu sei reconhecer a dívida que tenho com ele e com o velho babão. Mas não. Para o Santo Potter eu ser um fodido na vida é pouco. Ele tinha de me mandar para o exílio. Viver num casebre no meio do nada com um LOBISOMEM!!!" Em minha mente as pessoas já se misturam um pouco, e os sentimentos totalmente. "Snape, por quê? Entre todos no mundo, era você que devia saber que eu não vou suportar viver com esse mestiço. Você é meu tutor; primeiro me deixa com o Potter, e agora me passa para o lobisomem. Quem se importa? Você é que não. Nem eu. Foda-se!"
Eu me sento na poltrona próxima à lareira. Está um calor dos infernos aqui. Levo quase cinco minutos para lembrar o feitiço que apaga o fogo, e mais dez para conseguir executá-lo. Mas eu consigo, na última tentativa que eu faria antes de jogar o uísque no fogo para apagá-lo.
O lobisomem é tão cretino quanto o Potter. Era só o imbecil dizer não. E pronto. Eu não teria de aturá-lo por NOVE MESESLobo idiota, acéfalo, sangue sujo, mestiço de merda.
Bebi uma garrafa inteira. Com alguma dificuldade, abro a segunda. Criatura nojenta! Com o dinheiro que o namorado deixou, a besta podia pelo menos se vestir melhor. Estou definitivamente decadente, vou viver com isso! O copo cai da minha mão, e eu não consigo encontrá-lo no escuro. Dane-se. Bebo diretamente da garrafa.
Atingi o estágio perigoso. Meu cérebro está misturando fatos, imagens de coisas que nunca ocorreram vêm à minha mente. Mas vêm também as imagens de coisas que eu não quero lembrar. A breve visão do rosto de Lucius Malfoy quase me deixa sóbrio, tamanho o ódio que se agita em mim. Com um gole grande de Uísque de Fogo, eu afogo Lucius, minhas memórias e o que me resta de consciência.
Tento ir para a cama. Não demoro a apagar agora. Mal dou dois passos e vejo o chão se aproximando.
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Severus Snape:
Harry tem seus padrões. Ele sempre dorme abraçado a mim - a menos, é claro, que esteja aborrecido comigo, o que é raro, ou tentando me esconder alguma coisa, o que por algum tempo foi comum. Mas normalmente era alguma briga com os amigos dele por causa do nosso relacionamento, quando ele, então, resolvia me proteger. Tolo. Com se a opinião deles me importasse. Às vezes me enfurecia, porque eu via que isso magoava meu tolo amante. Por causa dele, evitei conflitos com os imbecis, e agora, por causa dele novamente, eu os aturo.
"Quanta coisa mais eu sou capaz de fazer por você, Harry?" Ele se agita um pouco no sono, como se minha pergunta mental o perturbasse, e eu o acomodo melhor nos meus braços.
O calor do corpo dele me envolve. Ele dá um leve suspiro ao se acomodar, parece coisa de criança. Ele é pouco mais do que uma criança, e eu sou o resto de um homem.
Se eu tivesse um pingo de decência me afastaria dele. Mas não tenho. Não acho que ele permitiria que eu me afastasse, também. Agarro-me a essa idéia para justificar minha fraqueza. Agarro-me às palavras dele naquela noite de Natal em que ele entrou no meu quarto e fizemos amor pela primeira vez. Agarro-me a qualquer coisa, para continuar com ele.
Eu não o esperava. Eu já vinha lutando contra o que sentia por ele há muito tempo, e realmente achei que o havia afastado. Tolice. Conhecia Harry o suficiente para saber que conselhos sensatos nunca surtiram efeito naquela cabeça dura. Mas eu me convenci, tolamente, de que ele só estava curioso a meu respeito. Que o que ele tinha nada mais era do que libido adolescente.
Mesmo lutando contra, eu sabia que tinha entregado meu coração na mão dele. Não é grande coisa, mas é o único que eu tenho.
Naquela noite em especial eu estava vulnerável. Não pelo Natal, mas pelos destroços de famílias que vira naquela semana. Eu queria alguém para abraçar; o mundo estava grande demais, frio demais. Eu queria Harry, desesperadamente.
Ele bateu à minha porta, a bendita capa cobria-o do ombro para baixo. Eu não atendi. Sabia que, se abrisse a porta, não responderia mais por meus atos. Ele insistiu, e ergueu de dentro da capa a outra herança do pai. Marotos desgraçados, ganguezinha de imbecis, que fiz essa droga de Mapa.
Abri a porta ainda tentando me resguardar: "Cai fora daqui, Potter." Ele me ignorou e olhou nos meus olhos. Tirando a capa, ele se aproximou devagar. Os olhos tinham tanta dor que não parecia ser possível que ele sentisse tanto e ainda estivesse vivo. "Me beija, Severus. Eu preciso de você."
Duas almas perdidas que se buscam desesperadas não se agarrariam com tanta paixão. Ele é meu. Só meu. Meu Harry.
Fizemos amor.
Em duas palavras, tanta força e tanta Magia.
Ele ficou abraçado comigo em minha cama por um longo tempo. Deixei-me desfrutar dessa felicidade junto com ele. Em algum momento, caí em mim. Vi a loucura que fizera; por mais que fosse especial, Harry era meu aluno, e eu me envolvera com um aluno. Ele pareceu sentir para onde meus pensamentos me levavam. "Severus, se você se afastar eu vou atrás de você, a menos que me convença de que não me quer. E nós não conseguimos mais mentir um para o outro. Você sabe disso."
De uma forma estranha, nós nos entendemos. Por alguma razão inexplicável ele me ama..... mas eu não sei se o mereço. E, por causa de um feitiço conjunto, nós não podemos mentir um para o outro.
"Eu preciso de você, Harry, como do próprio ar." Ele torna a se agitar em meus braços. "Meu Harry, como gostaria de deixar tudo isso para trás. Meus remorsos, meu inferno pessoal, minha dor estão afetando você."
Tenho mais sangue nas mãos que minha tão proclamada eficiência como espião pode limpar. Tenho a alma completamente envenenada de culpas, ódios, dores. Ele é diferente. Mesmo tendo passado por tudo o que passou, Harry ainda não aprendeu a odiar. Ele aprendeu a se defender; nisso eu ajudei, mas sua alma é limpa.
Vai chegar o dia em que ele vai deixar de me amar. Eu sei. Ele não vai suportar mais o peso da minha alma maculada e vai desejar nunca ter se envolvido comigo. Eu vou destruir o que mais prezo no mundo. É o que sempre faço.
Seu pesadelo interrompe minhas divagações. Ele senta na cama tremendo, e eu o abraço. Quando a crise passa, ele se recosta novamente no meu peito.
-Tudo bem agora, Harry?
-Sim. Era só mais um pesadelo. – Ele está indiferente ao susto. Nunca diz mais do que isso, me exclui de seus pesadelos.
Eu o aconchego nos meus braços.
–Severus... Acha que fizemos o certo para o Malfoy?
Deixar Draco com Lupin é minha última esperança de cura para o garoto.
-Eu espero que sim. – Esperança, palavra tola. – Que outra opção nós tínhamos? Talvez Lupin consiga tocar o que nós não pudemos sequer tentar direito.
-Draco estava furioso com meu plano.
-Draco está furioso com a vida. – Eu me lembro das acusações de Draco antes de ele ir para a casa de Lupin. – Você não estava com ciúmes como ele falou, estava?
Ele me fita, levemente irônico:
-Como ele gritou, você quer dizer. E não, não estava com ciúmes. Você é meu, Severus. Eu sei disso.
Isso é o cúmulo!
-Seu convencido arrogante!
-Diz que não é verdade!
-Harry! – Eu raramente fico sem palavras. – Sua presunção me choca, garoto.
-Negue, se puder. E diz também que não sabe a quem eu pertenço.
-Harry.... – Sinto meu corpo começar a reagir, e minha voz soa rouca.
Ele se deita por cima de mim:
-Eu sou todo seu, Severus. Você sabe.
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Harry Potter:
Sonhei com Sirius caindo no Véu da Morte. Talvez por ter visto Remus tão abatido eu tenha voltado a esse pesadelo especificamente. Já o tive várias vezes, mas nos últimos tempos isso havia ficado mais raro.
Na realidade, esse pesadelo tem de disputar espaço com o de Voldemort voltando mais uma vez, e com o sonho em que Severus morre quando se atira na minha frente para me salvar. Tento rir disso, e só digo a Severus que foi um pesadelo bobo. Ele está tão tenso. pro estranho que pareça, mais agora que a guerra acabou do que durante todo aquele inferno. Sinto-o distanciando-se de mim, não sei o que fazer.
No meu sexto ano em Hogwarts, fomos obrigados a trabalharmos junto. Eu odiei isso. Ele também. Algumas vezes ele parecia prestes a pular no meu pescoço e me matar pessoalmente. Estranho como essas brigas agora são uma memória doce.
Com a profecia, a morte de Sirius me fazendo sentir que entre mim e o mundo existia uma cortina de dor, irritar Severus era a única coisa que me fazia sentir o sangue correr.
Hermione um dia me perguntou se eu era masoquista. "Não, eu não sou. Não gosto da dor, eu a suporto apenas quando é necessário."
No final do ano letivo, depois dos exames, nós dois ficamos sozinhos na sala dele. É claro que ele procurava defeitos irrelevantes no que eu havia feito. Dia ruim para ele me irritar tanto, eu já estava suficientemente infeliz de ter de voltar para a casa dos meus tios no dia seguinte.
"Você é um incompetente, Potter." Ele falou baixo e venenoso, os olhos parecendo adagas. "Não sou. Você é que é um miserável, vingativo, mesquinho, arrogante e ridículo." Eu nunca retrucara daquele jeito. Ele se levantou rápido, sacamos as varinhas juntos. "Fora daqui, Potter. Fora daqui, ou não respondo por mim." Eu já não respondia mais por mim. "Acha que eu tenho medo de você? Não seja ridículo!" Severus saiu de trás da escrivaninha e me pegou pelo braço "Devia ter, garoto patético."
Eu me virei para ele; eu pretendia lhe dizer mais alguma coisa, precisava continuar brigando. Mas ele me beijou, com raiva, chegando a machucar um pouco minha boca. Durou pouco, os lábios dele foram perdendo a fúria. Quando senti a língua dele dentro da minha boca, já não havia raiva. Eu me lembro de ter-me agarrado a ele, beijando-o com tanta intensidade quanto ele me beijava. Acho que foi o gemido que me escapou dos lábios que nos trouxe de volta à realidade.
Severus segurou meu rosto entre as mãos, nossas respirações voltando ao normal. Eu só o olhava, meu cérebro totalmente paralisado. Severus tinha os olhos fechados e uma expressão estranha no rosto. Quando me encarou, sua expressão era inusitadamente suave. "Vá, Harry. Vá agora." A voz dele era doce, e eu obedeci. Quando a porta se fechou às minhas costas, comecei a correr. Corri como um louco até me refugiar no alto da Torre da Grifinória. Em meu peito, a euforia e o susto.
Tive as férias para pensar nisso e tive isso para me ocupar nas férias. Quando voltei, eu já sabia o que eu queria. Mas levei algum tempo para começar a entender esse homem tão complexo que eu amo. Às vezes ele duvida disso.
Depois do meu pesadelo, nós fizemos amor. Ele me conduz com habilidade única, até que gozamos juntos. Eu o sinto saindo de dentro de mim, sem me soltar.
-Eu amo você, Severus.
Ele me abraça em silêncio.
"Meu amor, não vá embora. Eu o sinto afastando-se de mim. Não vá. Não me deixe sozinho no frio, com minhas culpas, meus medos, meus erros. Severus, você é minha força. Não me deixe agora. Eu sei que você ainda me quer. Eu sei que você me ama."
