Lilibeth: Eu e "meu" Draco agradecemos. Comovidos. k k k k k k k k k
Brincadeira a parte, eu amo seus reviews.
Viv: Não só o Draco tem muita coisa a ser trabalhada, mas o Remus também. Espere e verá.
Paula Lirio: Lua Cheia teve um aumento de 45 em relação ao Demarcando Territórios. Ok, não é só o Draco que tem obsessão pela precisão numérica. Que bom que você nem viu o tamanho. :)
Bárbara: Não confie muito no Draco. Nem no Severus. Muito menos no Remus. Até com o Harry é bom manter um olho aberto. rs
Fabi chan: O Draco não tem tido muitos motivos para sorrir, nada que o Remus não dê um jeito, com o tempo. Que bom que você está gostando.
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Parte I – Outono
Tempo de deixar ir.
Capítulo IV – O que o Incomoda
Hogsmeade – 12/12/1998
Harry Potter:
É sábado e Severus veio passar o dia comigo, mas está tudo estranho.
Durante os meses de guerra em que estávamos juntos, escondidos de todos, nós conversávamos sobre tudo. Eu podia falar com ele de um jogo de quadribol, ou de planos para depois da guerra. Ele me falava das coisas que viu nas viagens que costumava fazer durante as férias, ou me aporrinhava por causa das minhas notas em Poções. O silêncio era confortável também. Era bom ficar calado junto com ele. Hoje quase não falamos, e nossos silêncios são desconfortáveis.
Então, nós transamos.
A única coisa que não mudou foi o sexo. Severus é um amante passional e delicioso. Nunca tive outro para comparar, mas não preciso. Ele é perfeito para mim.
Na realidade, o sexo mudou também. Ele me ama com desespero, como se cada vez que me tocasse fosse a última.
Da nossa cama eu olho para ele, em pé à janela. O vulto dele me faz pensar em solidão. Mesmo estando comigo, Severus voltou a estar sozinho. Dói em mim vê-lo tão só. Eu ainda acredito que ele me ame, mas está difícil.
-Severus – eu chamo.
Ele se volta e tenta um meio sorriso:
-Você acordou.
-Vem para cama, está frio.
Ele vem rápido, sôfrego, deixando a capa em que estava enrolado cair pelo caminho. Beija-me, deitando-se sobre mim, busca no meu corpo algo que não sei mais o que é. Ele me excita, mas me assusta também.
-Não, Severus. Precisamos conversar.
Ele se assusta com minha recusa. Olha para mim sem conseguir esconder a dor, o medo. "Medo de quê, meu amado?" Sua expressão é a de quem vai ter o destino consumado naquele momento.
-Algum problema, Harry?
Eu o olho nos olhos, e pergunto:
-O que está incomodando você, meu amor?
Seu medo some diante do tratamento carinhoso. Ele nunca me chama assim, carinhosamente, e também não admite gostar de ser tratado assim, mas eu sei que ele gosta, eu sei que ele precisa ser mimado às vezes.
-Nada, Harry. Não tem nada de errado comigo. – Ele desvia os olhos ao me responder, sabe que entre nós não existe oclumência.
Eu só o olho. Não quero, mas meus olhos se enchem de lágrimas que eu contenho à força.
Severus respira fundo. Há tanta dor nos olhos dele agora. Ele estremece e deita-se, puxando-me para o peito dele. É com o braço cobrindo os olhos que ele finalmente fala:
-Por quê, Harry? Por que você continua comigo? Eu estou destruindo o que nós temos. Você é tão jovem, eu não tenho o direito de manter você preso a mim, em meu inferno particular. – A voz dele está rouca, como se estivesse se forçando a falar, como se estivesse contendo lágrimas com esforço. – Eu quero esfregar na cara do mundo que nós estamos juntos. Mas nós não podemos, nossa hipócrita sociedade só aceita o amor entre dois homens desde que eles não sejam famosos, não estejam tão em evidência quanto nós estamos. Talvez eu mereça realmente sofrer isso, mas você não merece.
Eu me agarro a ele, cubro de beijos seu peito e as partes expostas do seu rosto.
-Não, Harry. Não vai durar. Um dia você vai ver que não dá, um dia você vai me deixar. Eu sei. – Ele descobre os olhos e me encara. Tem os olhos secos e brilhantes. – Eu não posso mais me iludir, eu vou perder você.
-Não! Você é meu amor, minha força, meu amigo. Você não vai me perder nunca.
Ele sorri, triste, e agora sou eu quem o beija desesperado. Severus retribui, e tudo o que consigo pensar, enquanto o sinto deitar-se sobre mim, é que agora eu sei que ele não desistiu de nós, ainda. Agora eu sei o que o atormenta.
Por que você me olha
Com esse olhar de loucura
Por que você diz meu nome
Por que você me procura
Se as nossas vidas juntas
Vão ter sempre um triste fim
Se existe um preconceito muito forte
Separando você de mim
Por que esse beijo agora
Por quê, meu amor, este abraço
Um dia você vai embora
Sem sofrer os tormentos que eu passo
De que vale sonhar um minuto
Se a verdade da vida é ruim
Se existe um preconceito muito forte
Separando você de mim.
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País de Gales – 13/12/1998
Remus Lupin:
Com o inverno cada vez mais próximo, Draco está ficando preguiçoso para caminhar comigo. Estranho, sinto falta dele nessas caminhadas. Ele tem sempre tantas perguntas - a maioria delas eu nunca imaginei. Muitas das perguntas que ele faz são sobre aspectos da licantropia que eu nunca tentei explicar para ninguém, nem mesmo para Sirius e James. São coisas que eu sei, mas, ao explicar para Draco, sou obrigado a racionalizar o conhecimento instintivo.
Sinto falta do humor dele, até das reclamações. Ainda é um menino mimado, ainda é um menino ferido.
O vento gelado na nascente despenteia meu cabelo. Um súbito aperto no meu coração me alerta. Tem algo errado; meus pensamentos se voltam para Draco.
Volto quase correndo para casa. Sinto calafrios; tem alguma coisa acontecendo de ruim com Draco.
A cozinha arrumada está vazia, a sala onde ele revela as fotos também. Lembro-me de que ele deve estar lendo no quarto e subo correndo.
Draco tem a edição de hoje do Profeta Diário nas mãos e está deitado, encolhido no chão do corredor, em uma crise de pânico. Tem os olhos fechados e balbucia coisas desconexas. Meu primeiro impulso é pegá-lo no colo, como a criança assustada que nesse momento ele é, mas me lembro da cena no banheiro; não quero piorar tudo.
Eu me ajoelho ao lado dele e, sem tocá-lo, eu o chamo. Ele não reage. É um tormento vê-lo assim. Grande Merlin! Posso sentir o medo e a dor dele, posso ver que ele nem mesmo sabe mais onde está.
-Draco – chamo-o usando um tom mais forte.
Ele se assusta e se encolhe ainda mais. Mas eu já consigo entender parte do que ele resmunga:
-Eu não quero, não faz isso. Me solta por favor...... eu não quero. Isso dói. Não! Não! NÃO!! Sai da minha mente. Alguém me ajude! Eu não quero. Não!
Ele parece estar revivendo algo terrível. O que tenho à minha frente é um garotinho mergulhado em uma dor enorme. A expressão do rosto dele...
Hécate, guia-me!
Sigo meu instinto, sento no chão e tomo-o nos braços. Ele não me repele, mas continua a suplicar que não o machuque, que não o force a fazer algo que não quer. Trago-o para meu colo e o acalento como se fosse um bebê.
-Draco, está tudo bem agora. Isso já passou. Você está seguro agora. – Enquanto falo, eu o abraço forte. Quero apagar a dor dele, tirá-lo do inferno onde ele está. Meu coração sangra de impotência.
Aos poucos, ele vai deixando de resmungar, vai retomando a lucidez. Eu o sinto tremer em meus braços. Ao invés de me empurrar, ele me abraça, tão forte quanto uma criança que, acordada de um pesadelo, abraça um adulto, em busca de proteção.
Eu o abraço de volta e o mantenho assim até que ele se mova um pouco. Draco se acomoda no meu colo e esconde o rosto no meu peito.
-Você pode ver o jornal daqui, Remus? – Sua voz é pouco mais do que um sussurro.
-Posso.
-Vê a matéria da capa?
Eu me ajeito um pouco, sem soltá-lo, e leio o que consigo ver no jornal:
-Alguém está tentando atenuar a pena de um Comensal. – Com o pé, ajeito o jornal e consigo ler o restante. – A mãe de Mulciber.
-Não. – Ele geme e se esconde ainda mais nos meus braços.
Eu espero. Sei que o que vem por aí é algo terrível. Eu apenas o ajeito melhor e espero.
Ele, na realidade, não me faz esperar muito. A sua voz está tão cheia de dor e medo que sai rouca. Arrancada do fundo da alma. Ele não faz rodeios:
-Lucius me vendeu para ele.
Levo alguns instantes para entender o alcance da loucura que ele me conta.
-Me vendeu por dez dias. Foi nas férias antes do sexto ano. Eu estava dormindo quando Narcissa me acordou, me fez sair do quarto e segui-la do jeito que estava, de pijamas, descalço e sem minha varinha. Ele estava parado na entrada, encostado em um carro. Lucius estava ao lado dele. Eu senti o perigo e tentei me virar e fugir. Eles me paralisaram. Ele me pôs dentro do carro. Ainda pude ouvir a voz de Lucius dizendo: "Dez dias. Traga-o de volta em dez dias. Vivo." – Draco estremece; é como um espasmo de dor. – Vivo. Morto-vivo. Um resto de gente. Uma coisa. Infeliz, vivo. Horrivelmente vivo. Morto-vivo. Vivo, mas morto.
Chego a pensar que sua lucidez o está abandonando, mas não. Ele continua, com a voz repleta de dor:
-Esse monstro gosta de garotinhos, de preferência virgens. Ele diz que gosta de ensinar.
Não! Morgana, não!
-Eu não sei para onde ele me levou. Devia ser alguma masmorra, ou algum porão. Não tinha janelas, só uma desgraçada de uma cama. A primeira coisa que ele fez foi rasgar minha roupa e me deixar nu.
Ele faz uma pausa, e eu o aperto ainda mais forte. Eu não quero ouvir, eu não quero que ele fale, eu não quero que ele tenha passado pelo que sei que ele vai me contar. Mas eu o ouço; a cura dele só virá quando ele disser tudo o que precisa.
Eu espero, e ele volta a falar:
-Ainda sinto as mãos dele percorrendo meu corpo. – Draco estremece de nojo. – Me apalpando, dizendo que seria divertido brincar comigo. Quando ele desfez o feitiço que não deixava eu me mover, tentei resistir. Eu o empurrei. Ele riu. Ele riu porque era isso que ele queria. Eu estava acuado no canto, e ele veio me tocando de novo. Eu não quero! Não! Por favor, não.
Eu o embalo um pouco até a crise passar e ele poder continuar:
-Eu comecei a me debater, a chutar, a socar qualquer coisa que eu acertasse. Então ele me bateu. Muito. Aplicou Cruciatus. Eu não podia me defender. Ele ria e dizia que só estava amaciando a carne. E então..... então ele me violentou. A primeira de muitas vezes. Por dez dias – disse ele com a voz cansada, vazia de qualquer emoção.– Ele ficava furioso porque eu não o desejava, e me batia. Dizia gostar de ver meu sangue, então usava chicote nas minhas costas. Dizia que gostava dos meus gritos, aí usava a maldição para me torturar novamente. Quando eu já não tinha forças para me mover, vinha o pior. Ele me tomava à força.
Draco já não treme, parece um boneco sem vida nos meus braços. Eu quero arrancar a dor dele, quero apagar isso tudo de sua vida, mas tudo o que posso fazer é ficar ali, com ele.
-Eu tentei, Remus. Chorei, supliquei, ameacei. Tentei me matar usando o lençol como forca, mas o desgraçado não deixou. – Olhos vazios, voz vazia. – Ele é especialista na Maldição Imperius. O filho-da-puta usava a maldição em mim para que eu o.... – Draco se interrompe tentando conter a náusea provocada pela lembrança.– Para que eu o chupasse e engolisse tudo. No final, eu conseguia resistir ao Imperius, e ele derramava uísque nos cortes do chicote nas minhas costas, como castigo.
O garoto muda a posição em meus braços e, olhando para a parede oposta, conclui, como se estivesse falando do tempo:
-Então ele me levou de volta. Narcissa fechou os cortes aparentes e me levou para Lucius. Ele disse que, se eu contasse a alguém o que aconteceu, ele me faria ter saudades do desgraçado que me estuprara. Eu fingi concordar. Quando as aulas voltaram, procurei Dumbledore, pedi proteção a ele e contei tudo que eu sabia sobre esconderijos, planos, locais, armas, métodos. O velho notou algo errado e chamou a curandeira maluca. Ela consertou o meu corpo; Narcissa tinha feito um trabalho medíocre. O velho contou pro Snape também. Eles sabem por alto o que aconteceu, e para quem Lucius me vendeu. Quando o Snape e o Potter fizeram aquele feitiço e Lucius e Narcissa morreram, eu quase pude gostar do Potter. – Draco ainda consegue fingir uma ironia.
Ele esconde novamente a cabeça no meu peito. É bom que não me olhe agora. Ele não precisa ver as lágrimas que descem no meu rosto. Ele não precisa ver o ódio que me queima o peito surgindo nos meus olhos. Eu quero Mulciber morto. Se ele for solto eu mesmo o mato.
–Eu devia soltar você, Remus. Mas é que, desde que .... desde de que aconteceu isso tudo, eu não consigo tocar outro ser humano. Aqui está tão quentinho.
Ser humano! Ah, Morgana!
Ele não está muito coerente; o cansaço emocional o está afetando.
-Fique à vontade, Draco. – Consigo alguma firmeza na minha voz, enquanto pouso o queixo no alto da cabeça dele. – Não vou a lugar nenhum.
-Você está chorando.
-Estou.
-Eu não consigo chorar. Eu não consigo viver, Remus. Sou só uma coisa que respira, totalmente sujo e estragado pelo nojento para quem Lucius me vendeu. Eu apodreci cedo demais. Eu queria estar morto.
-Não! Não, Draco. Ele é a criatura podre. Você não! Você é muito mais forte do que pensa. Não há culpa ou mancha em você. Não há nada dele em você. – Eu o forço a olhar nos meus olhos; não vou permitir que Draco se destrua assim. – Mulciber é podre, você não. Você está vivo. Aquele filho-da-puta não vai ser solto. Ele nunca mais vai sair de onde está.
Ele me olha surpreso. Eu sei por quê. Draco está vendo a fúria que eu mantenho sob controle dentro de mim.
-Você vai viver, Draco. Ele não vai tirar sua vida. Já lhe roubou coisas demais. Agora acabou.
Ele me olha, surpreso, e então se atira nos meus braços. Eu o abraço e acaricio seus cabelos:
-Eu não vou deixar que ele o destrua, criança.
Hécate, dai-me forças!
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País de Gales – 17/12/1998
Draco Malfoy:
Sinto-me estranho depois de ter contado tudo para Remus.
Às vezes eu o vigio pelo canto dos olhos tentando pegar algum indício de repulsa, de condenação. Mas não. É o mesmo Remus de sempre. Sólido, confiável. Doido o suficiente para ir andar nesse vento frio. Que coisa!
Quando ele chega, eu enfio uma caneca de chá quente nas suas mãos geladas. Claro que o idiota esqueceu de pôr luvas.
-Você está tentando morrer de hipotermia?
Ele ri! A risada meio rouca que o deixa com olhos de criança. Lobo louco.
-Draco, assim você fica parecendo a Molly.
O quê?!
-Você quer me ofender, Remus?
Ele ri de novo:
-Ela também cruza os braços para ralhar comigo.
Ralhar. Remus tem umas expressões engraçadas.
-Agora eu virei uma velha ralhadeira. - Eu adoro o riso dele. – Vá pegar suas cartas, lobo maluco, que eu tenho fotos a revelar.
Ele pega as cartas e vai para o escritório. Quando termino de revelar as fotos, vou procurá-lo. Ele está sentado, relendo uma das cartas. Percebo na mesma hora. Tem algo magoando Remus.
-O que foi?
Ele sorri para mim, um sorriso triste, e me estende a carta - na realidade um bilhete.
"Remus,
encontrei essas fotos entre as coisas de Sirius que estavam no quarto dele. Ele havia escondido num fundo falso. Acredito que você e as queira.
Um abraço,
Arthur W."
Ele me mostra o maço de fotos. A grande maioria são fotos antigas, da época dele na escola. Todas são fotos dele com Black. Parece que o outro estava montando um álbum, ou algo assim.
Olho para Remus. Ele está olhando o Sirius da foto no console da lareira, anormalmente quieto hoje.
-Você sente muita falta dele.
Ele confirma com a cabeça. Eu me sento sobre a escrivaninha, bem perto dele, e Remus faz uma coisa inesperada. Deita a cabeça no meu colo. Eu não sei o que fazer! Acabo pousando as mãos nos cabelos dele; gosto do toque.
-E o que mais está pegando, Remus?
-Eu não sei. Às vezes parece tudo tão cinza. Tão vazio. Tão sem rumo.
Ele ergue a cabeça.
Não! Volte aqui!
-Você ainda o ama?
Não que isso me importe, claro.
-Sim, amo. Amor não acaba, Draco. Só muda de forma. – Ele sorri para o Sirius da foto, que sorri de volta. – Eu preciso deixar essa mudança acontecer.
Ótimo! Então deixe!
Olho para aquele monte de fotos. Eu gosto de fotografar, Remus gosta de ter fotos à sua volta.
-Já sei que você vai comprar mais molduras e espalhar mais fotos pelo escritório e pelo quarto. Como você consegue dormir com tanta gente olhando?
Ele já está rindo de novo.
Eu sou fantástico!
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Hogwarts – 17/12/1998
Severus Snape:
São mais de onze horas e eu deveria estar me preparando para deitar, e não aqui, olhando para o Pó de Flu.
Amanhã cedo eu tenho aula dupla com a Sonserina e a Grifinória, turma do quinto ano. Vai ser um inferno! Última aula antes das férias de Natal, os monstrinhos estarão a mil. Mais uma razão para eu largar logo esse bendito Pó.
Estou cansado. Hoje descobri na Lufa-Lufa o herdeiro da incompetência do Longbottom: metade da turma teve de ir à enfermaria. Depois Albus resolveu reunir os Diretores de Casa; três longas horas de discussões. Eu devia guardar esse saquinho de Pó de Flu, esquecer minha vontade de ver Harry, e ir dormir. Teremos todo o sábado para nós dois.
Ele ainda não descobriu que eu sou uma péssima escolha para ele, e continua comigo. Mesmo depois de tudo que eu lhe disse dias atrás. Garoto tolo. Adorável tolo. Meu tolo.
Estou divagando; é mais um sinal de que eu deveria estar me deitando, e não me arrumando para sair.
Droga, abotoadura quebrada. Sei muito bem quem a quebrou, sempre apressado em me despir.
Na caixa onde guardo as abotoaduras, encontro o pingente em forma de Pomo de Ouro. Faz tanto tempo. Não, na realidade faz menos de dois anos. Mas foi em outra vida, outro mundo.
O ano letivo mal tinha começado quando Albus me chamou. Eu teria de trabalhar com Harry, teria de ensiná-lo a fazer uma das mais complexas poções que existe, e só ele poderia fazê-la. O Lord das Trevas abrira uma brecha em sua própria armadura ao usar o sangue de Harry para voltar. A falha era que só o garoto poderia fazer a poção para ela funcionar. Poções nunca foi o ponto forte de Harry.
É difícil imaginar qual de nós dois estava mais chocado com a idéia de trabalharmos juntos. O fiasco com as aulas de oclumência não me saía da cabeça.
Meses infernais. Ele perdera todo o respeito. Em sala de aula eu ainda o controlava, mas, enquanto trabalhávamos, ele parecia se divertir em me provocar. O pior é que eu gostava. Adorava aquelas brigas tolas. Fui tão cego.
Um dia eu notei o cordão. Um fio fino de ouro com uma miniatura de pomo de ouro. Foi no final de fevereiro. Eu sei por que meu primeiro pensamento foi que alguma das muitas fãs ardorosas, que só ele não percebia ter aos montes, devia ter-lhe dado no dia dos namorados. Odiei o cordão. Odiei o hábito que ele tinha de levar o cordão até o queixo e ficar brincando com o pingente.
Eu devia ter notado! Mas eu não queria perceber.
Ele percebeu que o hábito me irritava, então descobriu mil outras formas de brincar com o cordão, até mesmo durante as aulas. Tolo. Um feitiço simples, murmurado quando ele estava de costas, e me bastou recolher o cordão no chão. Eu realmente ia jogá-lo fora, mas acabei guardando-o. Mais um sintoma que ignorei.
Eu o vi procurar o cordão, e me diverti muito com isso. Foi divertido até eu descobrir quem lhe dera o presente. Hermione Granger. Não era uma fã qualquer. Eu a vi como uma rival. Tolice minha.
No instante em que o pensamento me ocorreu, tive de admitir. Eu queria Harry para mim. Era mais que só desejo, era uma dor insuportável imaginá-lo com outra pessoa. Mas algo totalmente inadmissível. Eu não podia permitir que ninguém percebesse. Nunca iria acontecer. Ele, com certeza, não queria. E mesmo que, por algum milagre, quisesse..... Não. Totalmente impossível.
Ele continuou a provocar discussões; a maldita da poção não saía certo de jeito nenhum, e eu enlouquecia de desejo. A pior maldição que o pai dele poderia ter me lançado. Querer tanto alguém, tantas vezes proibido.
Eu tinha que tomar um cuidado redobrado. Albus estava lhe ensinando legimancia, e o pivete estava ficando bom nisso. Seria minha morte se ele visse em minha mente o quanto eu o queria.
No final, foi isso que nos salvou. Depois dos exames, Lucius comandou um ataque a Hogsmeade. Ele usou Magia Negra para proteger a si próprio e ao grupo de Comensais - dessa vez até Narcissa o acompanhava. O contra feitiço requeria conhecimento de legimancia e oclumencia. Eu tentei sozinho, duas vezes, e falhei. Era preciso mais força.
Então senti a mão dele no meu ombro. Fizemos juntos o bendito feitiço. Grope, o irmão de Hagrid, defendeu a Granger de um ataque logo depois. Saldo: seis comensais mortos, os Malfoys entre eles. Ótimo. Efeito colateral: eu não posso mentir para Harry, nem ele para mim sem que o outro perceba que existe uma mentira.
Ele era pouco mais que um menino. Está se tornando um homem rápido demais. Depois do meu desabafo no sábado passado, ele resolveu cuidar de mim. Faz questão de me ver todos os dias. Só hoje, por causa da maldita reunião, eu não fui dormir lá. Então, por qual praga do inferno eu estou agora todo arrumado olhando de novo para a lareira? Harry deve estar dormindo, o treinamento na academia de aurores não é fácil, ele deve estar cansado. Arrumei-me todo sem razão. Vou dormir.
Jogo o Pó de Flu na lareira.
-Casa do Harry.
As defesas mágicas me reconhecem e me deixam passar sem alarde. Subo as escadas sem barulho; quero acordá-lo com beijos. A porta do quarto está entreaberta. Quando levo a mão à maçaneta, ouço o primeiro gemido. Por um segundo, o ciúme me cega e paralisa meu cérebro. Ouço Harry gemer de novo e percebo que ele geme de dor.
Harry!
Invado o quarto de varinha em punho, disposto a matar o que quer que o esteja machucando.
Ele está sozinho, e revira-se na cama preso a um pesadelo. Eu o sacudo com força, mas ele não acorda.
-Harry, acorda! Harry, sou eu, Severus. Acorda, garoto.
Salazar! Os pesadelos dele nunca são assim. São freqüentes, quase toda noite, na realidade, mas ele acorda sozinho, não é essa agonia!
-Harry! Por amor à Magia, Harry! ACORDA!
Ele abre os olhos e demora um pouco a me reconhecer. Então me abraça, ainda assustado.
-Severus. Você está vivo. Ah, meu amor! Você esta vivo, você está aqui comigo.
Deito-me, puxando-o para meus braços.
-Está tudo bem agora, Harry. Eu estou aqui.
Eu estou aqui. No meu lugar. Nada disso importa ao resto do mundo
Eu o espero acalmar-se. Ele tenta disfarçar, mas sei que o sonho o abalou.
-O que houve, Harry?
-Foi um Número Um.
Harry numerou os pesadelos mais comuns. Número Um é uma lembrança do dia em que ele derrotou o Lord das Trevas. Mais precisamente, o Número Um é quando eu fiquei entre ele a varinha do Lord. Em seus pesadelos, ele me vê morrer de formas variadas.
-Eu estou aqui, Harry. – Beijo seus cabelos, meu doce menino. – O que houve de diferente, para você ficar assim?
Ele olha para mim e cora um pouco:
-Nada. É que, quando você não está, os pesadelos são piores.
Minha presença espanta os sonhos ruins dele? Salazar!
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Os versos na primeira parte são da música Preconceito, de Fernando Lobo e Antônio Maria, gravada pelo Cazuza no CD Burguesia.
