Viviane: O Draco só agora está descobrindo o que é importar-se com alguém.

Paula: Eles vão se ligando e só vão perceber o quanto quando for tarde demais.

Momoni: Quando entrar a primavera eu lhe apresento alguns dos fantasmas do Remus. :)

Morti: O Remus é lindo exatamente sem ser bonitinho demais. Beijos para vc tb.

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Parte II – Inverno

Cura da Alma.

Capítulo VII – Formas de Amar

Hogsmeade 03/01/1999

Harry Potter:

O fim da guerra significou o fim de muitas coisas, entre elas o medo de freqüentar lugares públicos. Mesmo assim, ainda mantenho velhos hábitos, como sentar encostado na parede, de frente para a porta. Severus teria um treco se chegasse aqui no Três Vassouras e me visse sentado de costas para porta.

Olho as horas. Ele já está dez minutos atrasado. Eu tinha certeza de que ele se atrasaria. Assim ele evita encontrar Ron e Mione, que saíram cinco minutos mais cedo para evitar encontrar com ele. Entre meu amante e meus amigos, eu fico em dúvida se caio na gargalhada ou se me zango.

A porta do bar se abre, e eu ergo a cabeça na esperança de que seja Severus. Mas é a Chang. Não a vejo desde que ela concluiu a escola. Continua muito bonita, e continua andando num bando de garotas risonhas. Ela já não passou da idade disso?

A rabugice de Severus deve ser contagiosa.

Quando ela me vê, afasta-se das amigas e vem falar comigo. Vamos lá, Harry, deixe a senhora Weasley orgulhosa, seja educado.

-Harry, há quanto tempo! – Ela tem uma voz bonita.

-Cho, como vai? – Ergo-me para cumprimentá-la e estendo a mão o mais cordialmente possível. Ainda me sinto mal com pessoas que só se aproximam porque eu sou famoso.

-Bem, e você? Está aqui sozinho por quê?

-Estou esperando o Professor Snape, e ele já deve estar chegando.

Severus, apareça e me livra dessa logo!

-Cruzes, Harry! O que você tem para tratar com o professor mais seboso de Hogwarts, mesmo depois de ter terminado a escola? – Ela dá um risinho bobo.

Esse é exatamente o tipo de comentário que me irrita.

-Eu e Severus somos muito próximos, Cho. Não gosto que se refiram a ele dessa forma desagradável. – Desculpe-me, senhora Weasley. – Principalmente depois de tudo o que ele fez contra Voldemort.

-Sempre leal aos amigos! – O risinho dela parece realmente estúpido!

Ela se pendura no meu braço com se fosse íntima e me dá um beijinho no rosto no justo instante em que Severus entra no bar. Ele fecha a cara na mesma hora. Minha vontade de rir é quase incontrolável.

-Senhor Potter, acredito que esteja me esperando. – Ele lança um olhar mortal para Chang, que congela no lugar. – Senhorita Chang, não é mesmo?

-Sim, professor – ela gagueja, sem saber o que dizer.

-Severus, vamos de uma vez? Eu estava só esperando você.

Quando saímos do Três Vassouras, a noite está caindo. Severus é mais de vinte centímetros mais alto do que eu, ou seja, quando ele está resolvido a andar rápido, como agora, eu praticamente tenho de correr para alcançá-lo.

Desaparato e, quando ele chega em casa, eu estou esperando-o na entrada.

Abro a porta e faço sinal para que ele entre na minha frente. Mal entro na casa e já vejo a capa negra sumindo no segundo andar. Paro um instante para dizer a Dobby que em hipótese alguma eu e Severus devemos ser interrompidos.

No andar de cima tem nossa suíte, o quarto que Draco usava e dois escritórios. Quando acabo de subir as escadas, escuto o barulho de algo se quebrando no escritório de Severus.

Entro na sala. É um cômodo grande: os dois sofás, com um jogo de mesinhas de centro e de canto, ficam próximos à lareira; a escrivaninha fica junto à janela.

Severus está atiçando o fogo, e a mesinha de centro está revirada.

-Severus, o que é isso?

-Sou eu quem pergunta. O que foi aquilo?

-Não acredito que você está com ciúmes de uma bobagem dessas.

-Eu não estou com ciúmes.

Nem seria necessária a nossa incapacidade de mentirmos um para o outro para eu perceber a mentira deslavada dele.

-É difícil, não? Não poder dizer nem um inverdadezinha dessas sem ser descoberto? – Estou achando graça na situação; confesso que gosto da possessividade de Severus.

-Você não entende, não é? Ela é exatamente o tipo de pessoa com quem todos esperam que você se envolva.

-Uma garota boba e superficial? Sou mais seletivo do que isso.

-Você já foi apaixonado por ela.

-Por Merlin, Severus! Eu tinha quinze anos.

-E isso foi outro dia.

Estamos gritando um com o outro por essa bobagem? Eu não acredito! Ele volta ao ponto que o incomoda:

-Mas a questão não é essa, Harry. Ela é exatamente a namorada perfeita do grande herói do mundo bruxo.

-Não, Severus! Isso de novo, não!

-Uma garota, delicada, que ficou do lado certo, mas não participou de nenhum combate. A doce dama, que recebe o herói em seus braços depois da batalha. É esse tipo de relacionamento que as pessoas esperam que você tenha.

-DROGA, SEVERUS! Não é isso que EU quero. Sabe o que eu quero na minha vida? Quero um louco teimoso, que insiste em criar problemas onde não tem, tão ciumento e possessivo quanto eu, com a diferença que não admite isso. – Estou praticamente gritando com ele, que me olha, furioso. – O que eu quero é o idiota que eu amo, o homem capaz de espionar Voldemort, que cuida de mim, que morreria por mim, e por quem eu morreria também.

-Você morreria por metade das pessoas que conhece. - Em um gesto irritado ele joga os objetos que estão sobre o console da lareira no chão e se afasta até a janela.

-Você entendeu muito bem o que quis dizer.

Viro-me e trombo com a mesinha restante. Irritado, eu a empurro. Ela quebra, derrubando o abajur e tudo mais no chão.

Respiro fundo, tentando me acalmar.

-Entenda de uma vez por todas, Severus. Eu não estou nem um pouco preocupado com a opinião dos outros. Principalmente de pessoas como a Chang. – Paro na frente dele, encaro-o já gritando. – Nosso relacionamento só diz respeito a nós dois. E a única pessoa que eu quero é você.

Ele se move rápido. Antes que eu perceba, estou nos braços dele, e sua boca já tomou posse da minha. Em busca de equilíbrio, dou um passo para trás e encosto-me na escrivaninha.

Não penso mais. Quando ele me beija assim, eu perco a capacidade de raciocínio. Levo as mãos à capa dele, enquanto, sem parar de me beijar, ele tenta tirar a minha.

Droga, para que tanto botão? Ele me inclina para trás e, ao apoiar a mão na mesa, toco a lâmina com que ele abre as cartas. Perfeito.

Enfio a lâmina entre dois botões da capa dele e rasgo, de baixo para cima, uma abertura. Ele me solta e olha surpreso para o que estou fazendo. Repito o processo na veste, enquanto ele solta uma risada rouca e me toma a lâmina. Enquanto o livro dos restos da roupa, ele rasga as minhas e me despe também.

Conheço esse olhar predador dele. Com um único gesto, ele joga tudo que está sobre a escrivaninha no chão e me deita nela. Severus praticamente arranca minha roupa de baixo e os sapatos. Ele me solta apenas para se livrar também de suas últimas peças. Eu aproveito para girar o corpo e tatear as gavetas dele. Deixo a gaveta de cima cair e encontro o lubrificante na segunda.

Entrego o frasco para ele, que me puxa para si. Quando vejo, estou sentado na ponta de escrivaninha, enlaçando Severus com as pernas e braços, sentindo-lhe os dedos lubrificados me penetrarem devagar, preparando meu corpo para quando ele me possuir novamente. Nossos lábios se roçam.... ele agora perdeu a pressa e me tortura com a demora.

Um gemido mais alto escapa dos meus lábios e ele sussurra na minha orelha:

-Diz o que você quer, Harry.

-Eu quero você, Severus.

-Quer? – Ele morde meu pescoço. – E como você me quer?

-Quero você dentro de mim. Agora

-Assim? – Ele começa a introduzir o pênis lentamente.

A enlouquecedora pressão inicial sendo substituída pela sensação única de me entregar a ele.

-Assim..... ah Severus.. assim... Mais forte... ah, que bom....

Ele me faz deitar na mesa, e passa minhas pernas pela sua cintura tornando a penetração mais profunda.

Oh, Merlin! Isso é tão bom!

Arqueio o corpo, e gemo alto à medida que o ritmo dele se intensifica. Uma vozinha na minha mente me alerta para o escândalo que eu estou fazendo. Eu a ignoro. Meus gemidos excitam Severus, e ele aumenta ainda mais a velocidade das estocadas.

Sinto a mão dele me masturbando no mesmo ritmo, e então, com uma estocada mais profunda, ele começa a atingir minha próstata.

-Severus, assim .... oh, Merlin.......

Não tenho mais coerência nenhuma. Nem tampouco controle. Nossos corpos estão cobertos de suor, e os gemidos dele se misturam aos meus. Sinto meu corpo pulsar.

Ele chama meu nome com sua voz rouca. Isso é demais para meu controle. Gozo gemendo o nome dele, e Severus me segue segundos depois.

Ainda mantendo minhas pernas em volta do seu quadril, sento-me na mesa e abraço meu amante. Ficamos assim, suados e sem fôlego, ainda trêmulos por causa da intensidade do que compartilhamos.

Ele ergue meu rosto, beija meus lábios de leve, ternamente. Então me pega no colo e me carrega até um dos sofás. Deita-se e me acomoda entre suas pernas, reclinado no seu peito. Usa magia para puxar os restos de nossas capas sobre nós.

-Harry...

-Hum?

-Escandaloso! – No tom de voz dele estão sutilmente presentes orgulho e diversão.

Ergo o rosto e o encaro, sorrindo:

-Descontrolado!

Ele torna a me aninhar no peito dele.

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Severus Snape:

Ficamos abraçados no sofá por um tempo.

Ainda estou meio chocado com o fizemos. Chocado não; surpreso. Deliciado também.

Desde a primeira vez que ficamos juntos, Harry nunca escondeu que realmente me deseja, e eu..... eu sou completamente louco por ele.

A forma como que ele se entrega... É uma entrega física, mas também uma entrega de alma. Ele não tem pudores do que sente. No início ele tinha uma dose de insegurança, mas agora... Quando o deixo tomar as rédeas da situação é que percebo a enorme força da personalidade dele. No entanto, ele se entrega a mim com tanta confiança!

Ele se entrega a mim. Só a mim.

-Severus... – Ele interrompe meu devaneio. A voz mostra certo grau de divertimento.

-O que foi?

-Não faço a menor idéia de onde estão meus óculos e minha varinha.

Convoco os objetos perdidos para ele. Ele conserta os óculos trincados e, quando os coloca no rosto, começa a gargalhar.

-Sev, nós destruímos o escritório!

-Não sobrou muita coisa. Estou surpreso de seu elfo não ter vindo ver se eu não o estava matando.

Ele senta-se a cavaleiro nas minhas pernas, enrolando-se nos retalhos de nossas capas, e me fita, pensativo.

-O que foi, garoto? Está frio aqui.

Ele sorri. Esse sorriso só pode significar que ele vai me meter em algum tipo de confusão.

-Harry, comporte-se! Pense bem no...

Antes que eu acabe de falar, ele usa magia para transformar o sofá onde estamos em uma cama larga. O fato de ele me dar um tranco, derrubando-me na cama, não o incomoda. Ainda sentado sobre minhas pernas, ele agita a varinha; travesseiros e cobertas surgem do nada. Ele se inclina até que seus lábios quase toquem os meus, então sussurra, provocante:

-Gosto de ficar assim com você. No meio do caos. - Ele ri e sai de cima de mim, indo deitar-se nos travesseiros. – Vem cá. – Ele estende os braços.

Vou engatinhando por cima dele, até deitar, esmagando-o com meu peso. Harry não reclama, ao contrário, passa uma perna por sobre a minha e puxa uma manta sobre minhas costas antes de me abraçar.

-Está mais quentinho agora, Sev?

-E mais confortável também. – Já desisti de lutar contra esse apelido bobo; pelo menos ele só me chama assim quando estamos sozinhos.

Ele gira o corpo, me desinstalando de cima dele. Ficamos os dois deitados de lado, frente a frente, com as pernas entrelaçadas. Ele quebra a tranqüilidade ao perguntar:

-O que realmente incomodou você hoje à tarde?

-Eu já lhe disse. Ela é exatamente o tipo de namorada que as pessoas imaginam que você deva ter.

-Em algum momento você pensou que eu gostei daquilo?

-Não. Era óbvio que você queria se livrar dela. - Não preciso dizer da dor que senti ao vê-la agarrada ao meu menino daquele jeito. - Eu me irritei com o abuso dela, só isso. Não gosto que toquem no que é meu.

Ele sorri, orgulhoso de si mesmo.

-Sabe o que eu acho, Sev? Que depois da sua saída tempestuosa do Três Vassouras as pessoas vão comentar.

Sinto-me empalidecer. Como não pensei nisso? Harry, no entanto, continua serenamente:

-Acho isso ótimo.

-Harry, quando você pediu a Dumbledore que ajudasse a manter nosso relacionamento longe dos jornais, eu concordei. Era o melhor a ser feito; não era justo que você tivesse de aturar todos os comentários idiotas que viriam daí. Por que isso agora?

-Você acha que eu mantive nossa história longe da boca do povo para me proteger? Severus! – Ele faz uma expressão indignada que me confunde. – Eu só pedi isso a Dumbledore por sua causa. Se a historia tivesse vindo a público na época, você teria sérios problemas. Ou você se esqueceu de que era meu professor quando eu invadi seu quarto e você me levou para cama?

-Claro que não esqueci isso, é claro que eu sei o tamanho dos problemas que eu teria. Mas você também teria problemas.

-Que problemas, Severus? Ser apontado na rua por dormir com outro cara? Sinceramente, é desagradável ser apontado na rua, mas eu tenho orgulho de ser seu amante.

Ele me diz isso assim, como se não fosse nada. Eu tenho orgulho de você também, meu menino tolo e lindo.

Eu o beijo. Tão suave, tão doce, e tão ardente. Mas ele interrompe o beijo e, me acariciando o rosto, continua:

-Passei os sete anos da escola sendo apontado, ora como um herói, ora como um doido. Os dois me aborrecem do mesmo jeito. Claro, ser o herói era mais útil que o doido, mas igualmente sem sentido, no final das contas.

-Harry, entenda uma coisa. No nosso mundo ninguém vê nada de mais em dois homens dormindo juntos, nem duas garotas tampouco. O problema começa quando um dos envolvidos é uma personalidade pública. Hipocrisia, eu sei, mas a maioria dos bruxos não aceita um herói gay. Eles criam expectativas sobre seus heróis, e não gostam de serem frustrados em certos aspectos. Se nosso caso vier a público, eu vou ser visto como o cara que levou o Garoto-Que-Derrotou-Você-Sabe-Quem para minha cama. E vão me achar o máximo por isso. Mas com você será diferente. As pessoas vão ridicularizar você. É injusto, irracional, mas é assim que vai acontecer.

-Eu não ligo.

Merlin, ele pode ser absurdamente teimoso!

-Eu ligo. Não quero ver você sendo machucado.

-Sabe o que me machuca de verdade? Não poder dizer para todo mundo que você é meu. Ter de me esconder com você, como se o que a gente tem fosse errado. Você é a melhor coisa que já me aconteceu, Severus. Eu não quero tornar isso vil, pequeno.

Eu sei como ele se sente. Minha vontade também é gritar para o mundo que nós estamos juntos. Mas eu não posso expô-lo desse jeito. Não, meu doce e impulsivo amante. Quando ele se cansar de mim, e um dia ele vai se cansar, ele precisa estar livre para poder recomeçar. Nesse dia eu vou morrer por dentro, mas não posso arrastá-lo comigo.

Eu o acomodo no meu peito, na posição que ele gosta de dormir. Ele se deixa levar, apesar de ainda estar chateado. Eu acaricio suas costas enquanto ele passa a mão suavemente no meu peito. Aos poucos, eu o sinto relaxar.

Deitados ali, no meio do caos, nós dois estamos de alguma forma em paz; isso é o que temos. Enquanto eu puder abraçá-lo assim, vai estar tudo bem. Meu menino. Meu Harry.

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Hogsmeade 05/01/1999

Remus Lupin:

Já é fim da tarde quando me levanto. Depois da Lua Cheia pude, enfim, tomar uma poção contra o resfriado. Já estou bem. Talvez um pouco tonto ainda. Mas depois de seis dias eu preciso sair um pouco.

Quando abro a porta, dou de cara com Draco entrando no quarto dele.

-Remus! Aconteceu alguma coisa?

-Nada. – Não entendo a razão do susto. – Eu vou ficar um pouco na sala, só isso.

-Não vai, não. Você esteve doente. Vai voltar para cama.

-É claro que não. Eu vou descer.

-Sozinho, não!

Ele desce comigo, me faz deitar no sofá e senta-se na poltrona mais distante. Um instante depois, ele se levanta e senta em outro lugar.

Dez minutos depois ele já sentou em quatro lugares diferentes, andou por toda a sala e trocou a musica duas vezes. A única coisa que ele não fez foi olhar para mim.

Certo. Então eu tomo a iniciativa.

-Draco. – Sento-me no sofá e faço sinal indicando o espaço ao meu lado. – Sente-se aqui.

Ele obedece.

Deve estar se sentindo muito mal, de fato, pois mantém os olhos fixos nas próprias mãos.

Levito a mesinha de centro até o alcance da perna dele, e apoio meus pés nela. Ele continua calado, olhando para as mãos. Isso já ficou ridículo.

Pego as mãos dele.

-Draco, olha para mim.

Ele o faz a contragosto. Eu seguro o rosto dele e peço:

-Diz o que está incomodando você.

-Eu não devia ter falado aquilo com você. Me desculpe, Remus.

-Já lhe disse que está desculpado.

Ele tenta virar o rosto, mas eu não deixo.

-Quem está precisando se perdoar é você mesmo.

-Eu não queria magoar você. Serio, Remus. Eu juro que não queria. Mas à medida que eu fui falando aquilo tudo sobre como eu me sentia, fui ficando com raiva de você por me obrigar. Então eu queria ferir você... Droga, Remus. Você me salva a vida e uma semana depois eu o magôo de propósito. Eu não penso aquilo sobre você e o Black. De verdade. Não penso mesmo.

-É muito bom que não pense assim. Sirius é uma das pessoas mais importantes da minha vida. Ele e eu já nos magoamos muito, mas nos amamos muito também. – Melhor esclarecer isso com ele, de uma vez por todas. – Eu amo Sirius de muitas formas. Amei-o inclusive romanticamente por muitos anos. Ele nunca me amou assim, mas me amou com toda a força da natureza apaixonada dele. Me magoou, me irritou mesmo o seu comentário. Principalmente porque veio de você.

Ele tenta novamente desviar o olhar. E novamente eu o impeço.

-Entenda, Draco, quanto mais próxima a pessoa, mais ela tem o poder de nos ferir. Mas, também, é maior o poder de nos fazer feliz com a existência dela na nossa vida. Você pode dizer que isso é tipicamente grifinório.

Ele ensaia um sorriso. E eu continuo:

-Eu não estou com raiva de você. Na realidade, entendo seu espírito de revide. Quando dói, a natureza humana pede que a gente reaja de alguma forma para aliviar a dor. Eu queria socar você naquela hora. Saí de perto para não agredi-lo.

-Você não me agrediu, eu é que agredi.

-Tenho trinta e nove anos, quase quarenta. Fui mordido aos nove anos de idade. Desde essa época eu me treino para manter o controle. Você nunca foi estimulado a se conter. Seus exemplos, tanto negativos quanto positivos, lhe ensinaram exatamente o contrário. Severus é um grande homem, mas, fora de suas missões como espião, ele não é um exemplo de autocontrole.

-Principalmente se o Potter estiver envolvido. – Ele ri, ainda um tanto tenso.

-Principalmente. Odiando ou amando, Severus sempre se descontrola quando Harry está no meio da história.

Ele reclina para trás e apóia os pés ao lado do meu com um suspiro. Eu tento fazê-lo entender o que eu quero dizer:

-Draco, tudo bem você odiar aquelas pessoas. Não deixe o ódio controlar você, só lhe peço isso.

Ele sorri torto e me olha.

-Eu me sinto estranho, desde que vim para cá. Fora de mim. Até feliz, em alguns momentos. Mas também mais sentimental, mais bobo.

-Ser feliz não diminui a dor que você sentiu nas mãos de Mulciber. Permita-se viver.

Olhando Draco sentado ali eu me lembro que minha mãe costumava dizer que às vezes tudo o que precisamos é do toque de outra pessoa para nós recordarmos de que também somos humanos. Eu passo o braço por sobre os ombros de Draco, e trago a cabeça dele para o meu peito. Não sei se procuro confortá-lo ou se busco lembrar-me da minha própria humanidade, tantas vezes questionada, tantas vezes quase perdida.

Ficamos assim, olhando o fogo por um longo instante. Mas eu ainda preciso tirar um assunto do caminho:

-Você me acha uma aberração, Draco?

-Não!

-E outro lobisomem?

Ele hesita. Não quer mentir para mim. De alguma forma, isso é reconfortante. Eu insisto:

-Então outros lobisomens são aberrações para você?

-Remus, o que eu sei é que você não é. Até vir para cá era, porque ... bom, porque você não era importante. Mas eu conheço você. Você não é um monstro.

-Se eu não sou, Draco, por que os outros seriam?

-Eu não sei. É tudo confuso. Eu pergunto a você coisas sobre sua licantropia e não sei se você quer falar sobre isso. Nas noites de Lua Cheia, eu fico no meu quarto, me sentindo impotente, inútil. Você tem razão. Se você não é, por que os outros seriam? Mas os outros não são você. Eu às vezes o chamo de Lobo brincando, mas nem sei se isso ofende ou não. É tão frustrante não poder deter sua transformação. Eu não sei o que você sente a respeito disso tudo. Eu não sei o que você sente durante as transformações. Não os efeitos físicos. Mas como você se sente. Eu não sei o que você teme. – Ele faz uma pausa depois de despejar tudo quase em um único fôlego. – Em poucos meses, você se tornou a pessoa mais próxima que jamais tive. A mais importante também. Umas das duas únicas em quem eu confio quase totalmente. A única pessoa com quem eu consigo conversar de verdade. Mas sempre vai existir uma área importante da sua vida da qual eu vou estar excluído. Para sempre. Ninguém sabe realmente como conviver com um lobisomem.

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Draco Malfoy:

Ele ficou só me olhando enquanto eu falava como um maníaco descontrolado. Então sorriu. Sorriu como se tivesse ganho o maior presente do mundo. Como se, depois de dias sem beber, eu lhe desse água. O sorriso dele me fez sentir diferente. Poderoso de uma forma estranha.

-Na primeira Lua eu achei que você ia embora. Por que ficou?

Os olhos dele brilham ao me fazer essa pergunta.

-Porque eu não tinha para onde ir. Depois eu passei a gostar de estar aqui.

-Eu também gosto que você esteja aqui. – Remus se levanta e me puxa. – Venha, eu quero lhe mostrar uma coisa.

Ele me arrasta para o escritório. Na foto, Sirius a princípio me olha feio, como todos os outros, mas ele e a senhora Potter sorriem logo depois. O Potter pai ainda me analisa um tempo antes de relaxar. Eles amam Remus. Todos os três.

-Isso é um livro que estou tentando escrever. Nele eu conto histórias de diversos lobisomens. Tristes, na maioria. Mas tem as românticas, as engraçadas, as inusitadas. Isso é fácil, as histórias são maravilhosas por si mesmas. Durante as histórias eu vou desmentindo conceitos errôneos sobre minha gente. É mais difícil, mas encontrei o jeito. No entanto, eu sentia que faltava algo. Todo esse tempo eu estava tentando descobrir o que era. E você acabou de me mostrar. Ninguém sabe realmente como conviver com um lobisomem.– Ele sorri para mim, feliz como uma criança. – Ninguém sabe como quem convive com um lobisomem se sente. Nem o lobisomem.

Eu devia saber que esse tempo todo trancado no escritório era para ajudar alguém. Típico.

Ver o entusiasmo com que ele passa a me contar parte das histórias é estimulante. Ele me faz rir às gargalhadas com o episódio do lobisomem que se trancou em um zoológico trouxa e voltou à forma humana nu, em uma jaula vazia . Do rolo que foi para ele convencer o guarda de que não era louco. Ele me comove quando me fala da mãe que abandona a casa para que o preconceito não recaia sobre os filhos. Eu me sinto pequeno nessa hora. Então ele muda de assunto. Me conta as confusões dele e dos amigos em Hogwarts. A história completa do dia em que quase mordeu o Snape. Ele olha para a foto de Sirius, que faz sua melhor cara de arrependido. Não acredito nela nem por um segundo.

Quando dou por mim, estou dando palpites. Falando sobre como me sinto diante das histórias. Nós dois esquecemos de comer, empolgados com esse trabalho conjunto.

Já é mais de meia noite quando vamos juntos para a cozinha preparar alguma coisa.

Não é de todo mau isso, esse laço que se forma entre nós dois. Não o entendo. Eu nunca perdoaria alguém que fizesse comigo o que eu fiz a ele, mas fico feliz que ele possa perdoar.

É estranho como Remus às vezes me faz sentir uma criança, e outras vezes me faz sentir como se eu fosse muito mais velho do que ele. Como agora, quando planeja uma longa caminhada amanhã.

-Ficou doido? Você acaba de se levantar da cama e quer sair para tomar mais friagem? Não vai mesmo.

-Claro que vou.

Não existe pessoa mais teimosa do que esse.... esse... esse lobo empacado. Ele não vai de jeito nenhum.

-Remus, tem hora que parece que você não pensa. Não vai e pronto.

Ele ri, sem me levar a sério. Droga!

Antes que eu continue a discussão, ele me desarma de vez:

-Draco, quer trabalhar comigo no livro? Sabe, me ajudando a escrever sua visão da convivência com um lobisomem.

-Quero. – Nem preciso pensar.

Só mais tarde, já deitado na cama, eu me dou conta de uma coisa. Lucius provavelmente está berrando de raiva no inferno. Um Malfoy vai defender os lobisomens.