Capítulo 3 – A Separação
Os meus dois diabretes estavam a ir muito bem nos treinos. Gerard adorava a determinação de Saga e a desfaçatez de Kanon. De certa forma, eu sentia que não estava tão sozinha no que respeitava à educação deles. Num lindo dia de Verão, em que os dois tinham ido treinar para as montanhas, decidi descer à cidade, para ver o mercado. Comigo, levava Alcíone, mais três moças de companhia e dois guardas. Shion, tal como o meu pai fizera, velava pela minha integridade. As regras do Santuário não eram das mais rígidas nos relacionamentos, com excepção das meninas de boas famílias e das amazonas. O nosso comportamento devia ser imaculado, não porque o sexo fosse considerado um pecado, mas porque as virgens eram vistas como detentoras de um certo poder oculto. Para mulheres como eu, Shion tinha sempre uma palavra a dizer em relação a um potencial casamento. Para mim, ele não queria menos de um cavaleiro de ouro. Ele via-me como a filha que nunca tivera, e eu estimava-o muito. Essa era a razão de eu levar tanta gente comigo apenas para ir às compras.
Estava muito calor, por isso eu usava um vestido branco comprido, tipicamente grego, debruado a dourado, e uma singela pulseira de prata no braço. O meu cabelo estava parcialmente apanhado em cima para que eu me sentisse mais fresca. Normalmente, quando andava fora do santuário, vestia roupas comuns, a maior parte delas dos melhores estilistas, mas com aquela temperatura alta, nada como simples algodão flutuando à volta do corpo. Sentia-me linda, e as pessoas, vendo uma rapariga com uma escolta tão grande, paravam a olhar para mim, perguntando umas às outras a minha identidade. Embaraçada, inclinei-me para uma das tendas, observando belos colares de ouro feitos pelos artesãos locais. Quando ergui os olhos para ver no espelho como um deles me assentava, vi um rapaz muito belo, que olhava estaticamente para mim. Todo o meu sangue me aflorou ao rosto.
Ele era alto, esbelto, de ombros largos, e particularmente elegante. Usava um pólo de cores claras e calças ligeiramente largas, e caminhava de forma tão confiante como se de um cavaleiro se tratasse. A cara era linda, angulosa, de feições correctas, e belos olhos verde água, quase azuis. Tinha o cabelo pelos ombros, cortado irregularmente, com risco ao lado, cobrindo parcialmente um dos olhos, o que eu achei muito chique, e de um louro tão claro como eu nunca tinha visto. Afoitamente, aproximou-se, e começámos a conversar e a flertar um com o outro. Alcíone, muito esperta, tratou de despachar os dois guardas, mandando-os comprar fruta, e de distrair as três raparigas, que se afastaram aos cochichos e às risadinhas. Eu nunca tinha gostado de ninguém, e aquele rapaz fazia o meu coração bater incrivelmente depressa!
Ele chamava-se Dorian, aliás, Lord Dorian Canavon, e era nada mais nada menos do que o filho único de um dos Duques mais ricos de Inglaterra, com estreitas relações de amizade com a família da minha mãe, e conhecido do Grande Mestre, por possuir uma enorme colecção de artefactos gregos. Para resumir a história, apaixonamo-nos perdidamente. Shion estava a leste; eu enganava a vigilância, com a conivência da criadagem e a bênção da querida Alcíone. No meu coração, eu sabia que nunca ia querer um cavaleiro para marido; preferia um homem que vivesse uma vida normal e estivesse sempre a meu lado. Dorian era tudo o que eu desejava, e queria casar comigo. Eu estaria em muito maus lençóis caso o Grande Mestre sonhasse das minhas escapadelas; ele mandava o Parténon abaixo se soubesse que Medeia de Gemini, a filha de um cavaleiro de ouro, se encontrava com um estranho num quarto do melhor hotel da cidade!
Mas não podia continuar a farsa por muito tempo; um dia, durante um jantar com o Grande Mestre, enjoei terrivelmente e tive de sair a correr, por entre piadinhas dos dourados presentes. Shion foi atrás e perguntou se eu estava grávida. Entre lágrimas, respondi que sim. Ele limitou-se a dizer que eu andava esquisita nos últimos tempos, e que chamaria o responsável imediatamente para reparar a confusão. Se fosse alguém do santuário, podia inclusive ser mandado para a cadeia!
Felizmente, Dorian conseguiu convencer o Grande Mestre de que a nossa relação era séria, e ele, um pouco contrariado, aceitou o casamento.
Mas uma coisa pesava na minha mente. Deixar Saga e Kanon sozinhos! Dorian era obrigado a viver em Londres por causa dos seus negócios.
Shion sabia os meus sentimentos.
- Medeia, por favor. – disse-me ele bondosamente - Sê razoável, e não deixes de viver com medo que os teus irmãos sofram na tua ausência. Eles têm muito mais do que a maioria dos aprendizes. Eu estou aqui, Gerard está aqui; e Alcíone, que sempre cuidou deles, continuará a fazer o mesmo, com a ajuda de Baptiste.
-Mas talvez eu não queira que eles se tornem cavaleiros. Eles já sofreram demasiado. Mestre, deixe-os ir comigo! Estudarão em Eton, o melhor colégio do mundo! Viverão como as outras crianças!
Shion irritou-se.
-E esperas que isso seja uma escolha? Eles nasceram cavaleiros! Se algo não for feito com o cosmos deles, não sei o que pode acontecer! Não é uma questão de querer ou não!
Ele estava coberto de razão. Cavaleiros podem fazer-se, ou podem nascer. Kanon e Saga pertenciam à segunda categoria.
Chorei muito por ter de deixar a minha casa. Mestre Shion, tentando minorar-me a dor, deixou que os dois me acompanhassem a Londres para o casamento. Eles nunca tinham saído da Grécia nem andado de avião – os meus pais não tinham voltado a viajar desde o seu nascimento - e estavam fascinados. Antes de partirmos, eles foram convenientemente instruídos para não falarem sobre o Santuário a ninguém.
O meu sogro ficou encantado comigo, e cobriu os meus irmãos de brinquedos e doces. A cerimónia foi maravilhosa, e claro, Saga e Kanon foram os meninos das alianças.
- Não consigo imaginar os gémeos nessa figura! – riu Hyoga.
Todos se riram ao tentar fazer uma ideia dos poderosos Saga e Kanon num papel tão angélico. Medeia até mostrou fotografias, fazendo Ikki prometer que não roubaria nenhuma para distribuir pelo Santuário.
-Eles saíram-se lindamente, mas era difícil mantê-los caladinhos. A nossa madrinha de casamento, cativada pela beleza deles, veio perguntar-lhes o que queriam ser quando crescessem. Kanon, irreflectido, respondeu logo :cavaleiro! Saga começou a fazer-lhe sinais para que se calasse.
-Ah! Que amoroso! Então o menino quer ser campeão de corridas? Está com sorte, o sogro da vossa irmã investe grandes somas de dinheiro nisso. – O velho Duque, que sabia do Santuário, sorriu aliviado.
- E você, Saga?
-Eu… -Ele hesitou um pouco – desejo tornar-me um grande guerreiro, ou um grande político!
A senhora ficou sem palavras. Eu corei até à raiz dos cabelos. O meu irmão era desconcertante, mesmo naquela idade. Felizmente, o meu sogro anunciou um brinde aos noivos, e os dois fala baratos foram brincar com as outras crianças. Era delicioso vê-los tão alheios a mestres e lutas, saltando e correndo no parque como quaisquer meninos da mesma idade. Mas alguns dias, depois, eles tiveram de regressar à Grécia. Separar-me deles partiu o meu coração, mas os meus irmãos, mesmo tão jovens, tinham uma missão importante a cumprir. Isto deu-me força e esperança. Estava orgulhosa deles.
Neste capítulo, tentei dar um vislumbre de um aspecto do Santuário que para mim nunca ficou claro na história: a vida quotidiana das mulheres. Quais as regras relativamente a namoros?
Achei que seria amoroso imaginar os nossos Gemini como pagenzinhos no casamento da irmã…. Enviem os vossos comentários e sugestões. O que gostariam de ver nesta fic? Que peripécias de infância acham que combinam com Saga e Kanon? Estou ansiosa por saber. Desculpem o capítulo pouco inspirado…é que estou a escrever quando devia estar a estudar para um exame chatíssimo, e tenho mil detalhes na cabeça, no fim da minha estadia aqui na Holanda.
