Primavera, Verão, Outono, Inverno...Primavera, Verão...

Autor: Lady RR

DISCLAIMER: Todos os personagens da série "Sir Arthur Conan Doyle's The Lost World" são propriedade de John Landis, Telescene, Coote/Hayes, DirecTV, New Line Television, Space, Action Adventure Network, Goodman/Rosen Productions, e Richmel Productions (perdoem qualquer omissão).

COMMENTS: Esta fic participou do concurso do grupo Casa da Árvore em que tinha como objetivo escrever uma continuação ao ultimo episódio gravado da série The Lost World. A fic tem referências a vários episódios. No final do texto tem as notas, alguns dos nomes são acompanhados por números e quem tiver interesse deve ler as notas, mas isso não é obrigatório, o texto é compreensível sem a leitura das mesmas.

ALERTA: A idéia da fic é que algumas perguntas só sejam respondidas no decorrer da leitura, outras no final. Esse não é exatamente o texto final que entreguei para o concurso, corrigi uns erros de português (espero que todos) e segui algumas das sugestões que me deram, não todas porque sou teimosa e tenho dificuldades de mudar um texto que eu já escrevi, portanto os defeitos do texto continuam sendo culpa minha.

AGRADECIMENTOS: Queria agradecer a turma da Casa da Árvore sempre carinhosa e atenciosa com todos os seus participantes, também tenho que agradecer ao concurso que foi elaborado lá, sem ele este texto não teria nascido, não posso deixar de dizer muito obrigada às meninas que deram sugestões e me animaram a publicar a fic, principalmente Si (Zezé) e Cris Zanini.

AGRADECIMENTOS 2: Obrigada Rafinha, Cris, Nessa, Kakau, Claudia, Aline e Cintia.

Capítulo V: O caçador

A arte de perder não é nenhum mistério;

tantas coisas contém em si o acidente

de perdê-las, que perder não é nada sério.

Perca um pouquinho a cada dia. Aceite, austero,

a chave perdida, a hora gasta bestamente.

A arte de perder não é nenhum mistério.

Depois perca mais rápido, com mais critério:

lugares, nomes, a escala subseqüente

da viagem não feita. Nada disso é sério.

- Mesmo perder você (a voz, o riso etéreo

que eu amo) não muda nada. Pois é evidente

que a arte de perder não chega a ser mistério

por muito que pareça muito sério.

Uma Arte – Elizabeth Bishop

- Hei, estou aqui! A valsa ainda não acabou!

Ele sentiu como se de repente tivesse sido acordado, e percebeu a jovem sorridente em seus braços.

- Estão todos olhando, ou continuamos a dançar ou saímos da pista. Aqui parados é que não podemos ficar – ela falou tranqüilamente e continuava sorrindo.

- Vamos parar então.

- Está bem, mas o que deu em você? – os dois caminhavam para um canto do salão onde tinham algumas pessoas conhecidas.

- Nada, eu só me distraí.

- Se distraiu no meio de um Strauss? – a moça muito simpática, de cabelos pretos volumosos que estavam presos numa trança que caía pelas costas, tinha um sorriso amplo e uma pele branca e delicada.

Ele ofereceu uma cadeira para ela sentar e percebeu que o grupo estava rindo e olhando para os dois interrogativamente, não só eles, mas algumas pessoas em volta.

- Afinal o que deu em vocês de ficarem parados atrapalhando os outros casais? – Um homem, que deveria ter por volta de uns 33, 35 anos questionou-os com um sorriso de pilhéria nos lábios.

- Não pergunte para mim, eu estava apenas seguindo, foi o cavaleiro que se distraiu no meio da dança.

- Foi sua beleza que me desnorteou, Srta Buchanans (8), a senhorita já se deu conta de como está deslumbrante esta noite?

- Você pensa que vai me enganar com este galanteio? Mas fico muito feliz com ele mesmo assim. – ela sorriu e olhou em redor – Vocês acham que eu devo acreditar nele? – todos riam, pois nada era sério para aquele grupo, não naquela noite.

Era uma noite suntuosa, e todas as pessoas importantes, ricas e influentes da cidade estavam naquele salão, seria o baile da estação, e tudo o que tivesse alguma relação com aquela noite seria comentado por semanas.

O palacete que estava sendo oferecido o baile, pertencia aos Buddenbrook (9) e eles eram os anfitriões, tudo estava impecável, a decoração, os músicos, a bebida, e principalmente os convidados. E aquele grupo em especial era um dos mais impecáveis, ele era formado por homens e mulheres advindos das mais importantes famílias da Inglaterra, eram todos solteiros e se planejavam várias uniões entre eles, afinal os casamentos sempre ocorriam entre essas famílias mesmo.

Alguns dos homens do grupo eram heróis de guerra, e entre eles também estavam uns dois que estavam começando uma carreira política que prometia ser bem sucedida, além daqueles que iriam continuar os negócios da família, o grupo era fechado na sua parte masculina por dois dos mais requisitados solteirões de todo o Reino Unido, Lorde John Richard Roxton e Sir Laurence Darrell (10). As moças também eram conhecidas, por sua beleza e claro sua riqueza, além de serem filhas de pessoas influentes no governo.

- Eu dou minha palavra que ele diz a verdade, a senhorita está realmente de fazer um homem tirar os pés do chão. – o rapaz disse isso dando um enorme suspiro e olhando discaradamente para a moça. A gargalhada foi geral.

- Então já que o senhor confirma as palavras do nosso amigo vou acreditar. Desculpas aceitas, mas ainda quero dançar, quem pode me acompanhar.

Algumas das moças lançaram um olhar de repreensão à moça, afinal por mais que elas pudessem se sentir à vontade com aqueles homens, se oferecer para dançar era um pouco demais. Ela não se importou e logo estava em pé caminhando para a pista de dança acompanhada de um dos rapazes, outros seguiram seu exemplo, e assim Roxton teve a chance de pedir licença dando a desculpa de que precisava cumprimentar uma pessoa que havia chegado. Ele se virou e andou em direção a uma sala contígua que dava para o jardim, mas antes de alcançar a porta de acesso foi interpelado por seu amigo Laurence.

Fazia meses que os dois andavam juntos sempre que possível, eles se conheceram durante a infância, as propriedades das suas famílias ficavam na mesma região, mas nunca ficaram próximos, foi após se tornarem adultos que se formou uma amizade, tinham muitas coisas e interesses em comum, tinham terras na mesma região, haviam herdado seus títulos, adoravam caçar, cavalgar e principalmente mulheres.

Laurence era oito anos mais velho, mas mantinha uma agilidade impressionante e por ser alto e magro ele não aparentava a idade, sendo louro não tinha nenhum cabelo grisalho, pelo menos nenhum que se pudesse notar, era extremamente simpático, brincalhão, discreto quando precisava e era um homem do mundo, havia conhecido quase todas as partes do globo terrestre, além da Europa, conhecia a Índia e como Roxton já havia caçado em diversas regiões da África, era muito bem educado e sensível aos sentimentos do amigo e apesar de sempre falarem de caçadas ele nunca falava da África, pois sabia da grande tragédia que ocasionou a morte de William, irmão do amigo.

Os dois se davam muito bem e andaram compartilhando pequenas confidências, e uma recente estada na Escócia criou um companheirismo entre os dois que só as viagens podem proporcionar, como não eram mais garotos normalmente conversavam abertamente, não sendo necessário manter a distância polida que é formalmente exigida entre as pessoas pela rigorosa educação britânica, herança da era vitoriana.

- Onde pensa que vai?

- Ah, é você, vou tomar um ar.

- Você não pensou por um momento que eu acreditei naquela história?

- Que história? – Roxton franziu a testa num sinal de que nem tinha idéia do que o amigo estava falando.

- Você às vezes me preocupa, meu amigo. Como assim que história? Aquela de ficar paralisado no meio do salão por causa da beleza de nossa amiga. – ele falava com um sorriso nos lábios - Como um homem com uma mulher como aquela nos braços pode se distrair daquela forma? - vendo que não obtinha nenhuma resposta, continuou – sua sorte é que o jovem Castorp (11) também não acreditou na sua desculpa, se tivesse acreditado você teria problemas, afinal todos sabemos que ele pedirá a mão da moça dentro de poucas semanas, é só o tempo das duas famílias terminarem de se acertar.

- Ele não é um tolo e não iria se aborrecer com uma bobagem destas.

- Esta é sua sorte, se fosse qualquer outro rapaz um mal estar estaria criado e por nada.....mas não é isso que me preocupa.

- Logo vi que você não iria se ocupar com uma tolice destas. – Roxton finalmente relaxou e deu um daqueles sorrisos maliciosos dele.

O amigo já o conhecia bastante para perceber que ele baixou a guarda e perguntou de supetão – Com que mulher você estava sonhando?

Na hora o sorriso morreu na boca do Roxton, ele se sentiu embaraçado, porque realmente estava sonhando com outra mulher. Ele ficou mudo.

- Eu tinha razão, você estava pensando em outra mulher, e não era em Eveline (12).

Novamente o rosto de Roxton se retesou, e a lembrança de Eveline veio-lhe à mente, as coisas entre deles não andavam bem, não que ela não fosse bonita e inteligente, e principalmente não era uma dessas moças da sociedade cheia de frescuras, era uma mulher feita, e completamente apaixonada, o arranjo entre eles foi as mil maravilhas durante um tempo, mas agora já não bastava mais, ele queria mais, queria outra coisa, mas não sabia o quê.

- É Eveline, acho que esse é um dos problemas, você andou tão entusiasmado com ela, e deixou a mulher louca por você, ela perdeu o juízo por sua causa, mas pela sua cara surgiu outra pessoa. – o amigo continuava mudo – e você pretende trocar de "namorada" novamente. Quem é sua próxima vítima?

- Não é ninguém, eu não tenho ninguém em mente, muito menos uma vítima.

- Realmente não é exatamente ruim cair encantada em seus braços, não vi nenhuma mulher reclamar. – ele tentou iniciar uma risada, mas olhando para o amigo percebeu que o clima não estava propício. – Vamos sair daqui, o jardim deve estar mais calmo.

Os dois atravessaram a porta e logo se encontravam ao ar livre, havia algumas pessoas no jardim conversando, mas elas pareciam não querer ser incomodadas assim como eles, então Laurence achou que lá seria um bom lugar para conversarem, porque sair do baile tão cedo estava completamente fora de cogitação.

- O que aconteceu entre você e Eveline? Parecia estar tudo indo muito bem, o arranjo entre vocês estava perfeito.

- Hum, hum – foi toda a resposta que ele conseguiu.

- Nossa, temos aqui um grande orador.

Roxton virou surpreso para ele, e respondeu: - Você não foi à primeira pessoa a me dizer isso.

- Mesmo? Quem mais compartilha da minha opinião? Você precisa me apresentar – ele falou em tom de galhofa.

- Na verdade não consigo lembrar quem me disse isso antes, mas já ouvi com certeza.

- Realmente você esta ficando velho, dizem que a primeira coisa que a gente perde é a memória.

Finalmente Roxton esboçou um sorriso e o clima melhorou. O amigo não querendo perder o momento prosseguiu:

– Eu não quero chateá-lo, mas eu realmente achava que vocês dois estavam indo bem, afinal ela é perfeita para você, e faz pouco tempo que vocês estão juntos. Pensei que com ela a coisa iria durar. Na minha opinião as outras garotas passaram rápido, por serem apenas garotas, não serviam para você, eram um tanto ciumentas, e Eveline é calma, tranqüila, segura de si, nunca traria problemas, pois é uma mulher feita, com a cabeça no lugar e nunca pediria mais do que você pudesse lhe dar.

- Porque você está me dizendo essas coisas, eu e Eveline estamos bem.

- Mesmo?

- .....Num sei, mas não aconteceu nada, só estou enfastiado, ela não é tudo o que eu esperava. Mas mesmo assim não entendo onde você quer chegar.

- É, acho que lhe devo uma explicação. Primeiro estive falando de você com quem realmente se preocupa com seu futuro.

Os dois homens se olharam seriamente.

– Sua mãe está muito preocupada com você, na verdade não com você, e sim com um neto, o neto que não vem, ela acha que passou da hora de você escolher uma esposa e formar uma família, você precisa de um filho para herdar seu título e manter o nome da família. Espere não diga nada, aqui não é bem um lugar para conversarmos e eu não quero dar minha opinião aqui, não no jardim dos Buddenbrook e com uma festa maravilhosa para desfrutar, mas antes de entrarmos quero adiantar algumas coisas, assim você não vai dizer que te peguei desprevenido.

- Grande amigo você é.... – os dois sorriram amigavelmente.

- Mas tem mais uma coisa. Eveline marcou um encontro comigo, estive com ela no almoço, ela não estava bem, estava com raiva de você, e não era coisa de momento, ela estava mesmo furiosa, meu caro você está em maus lençóis com ela.

- Não consigo entender o porque, não aconteceu nada, ontem à tarde estivemos juntos e não ocorreu nada demais.

- Bem, acho que um assunto tem relação com o outro de qualquer forma, temos que conversar, pois prometi a essas duas senhoras que falaria com você. Que tal no café da manhã?

- Perfeito, o difícil será estarmos acordados e animados amanhã cedo depois da noite que ainda nos aguarda.

- Você tem razão, mas eu não vou me preocupar com isso, vamos entrar tem muitas moças esperando a nossa companhia. – os dois se encaminharam para a porta e logo que entraram na sala, um homem exclamou:

- Aí estão vocês. Finalmente os encontro, Elinor e Mariane (13) fazem questão da presença de vocês, e o Barão Gastão de Nueil (14) quer lhe falar Laurence.

- Então é melhor irmos logo, atender todos esses chamados.

O resto da noite correu como o esperado, muitas conversas, pessoas fazendo observações sobre as outras, boa bebida, boa comida, boa música. Com toda a atenção que Roxton tinha que dar as pessoas ele logo se esqueceu da conversa com Laurence, mas toda a vez que olhava para a srta Buchanans voltava a sensação que o dominou na pista de dança, de que ele deveria estar em outro lugar, de que ele esteve dançando com outra mulher em outro espaço, num lugar muito diferente daquele suntuoso salão, a sensação que ele perdeu alguma coisa, um vazio que nada preenchia.

Assim que foi conveniente ele voltou para seu apartamento na Vigo Street, ele nunca foi realmente fã de bailes e aquele parecia mais interminável do que os outros. Sua mãe morar, durante suas estadas na capital, numa bela casa, praticamente uma mansão num bairro elegante de Londres, e que tecnicamente a casa era dele, pois ele herdou tudo que foi de seu pai, ele se sentia melhor no seu apartamento, lá sua mãe não controlaria sua vida, e ele tinha mais liberdade.

Era um apartamento no andar térreo, espaçoso e tinha vários cômodos, praticamente todos estavam ocupados com cabeças de animais empalhados, os troféus que ele conquistara ao longo de sua vida como caçador, mas fazia um longo tempo que ele olhava aquilo tudo e nada sentia, as peças perderam o significado, ele não sabia porque, nem quando isso aconteceu, mas era um fato, só não tirou tudo dali porque não conseguiu entender ainda o que aconteceu.

Quando ele chegou em casa, seu mordomo o aguardava com uma xícara de chá. Roxton o informou que teria uma visita para o café da manhã, informou a hora que queria ser chamado e o dispensou.

Depois que o mordomo sumiu das suas vistas ele começou a andar pela casa, sem acender as luzes, os troféus faziam sombras na penumbra e ele tentava identificá-los e lembrar como foi caçar cada um deles, ele procurava reviver aquelas emoções, procurava descobrir porque cada caçada o deixava feliz e animado, mas depois de algum tempo fazendo isso percebeu que não conseguia nem ao menos vislumbrar um pouco daquele sentimento, definitivamente não tinha mais vontade de caçar....se ele não queria mais caçar, o que faria?

O que traria de novo a vida para o seu cotidiano? Durante muito tempo era caçar que o definia para ele e para os outros, ser um bom caçador era tudo o que importava, era o que dava sentido para a sua vida, e agora? Mas uma vez ele se punha a refletir como tinha perdido esta vontade, mas nada, a única coisa que era certa era que ele tinha perdido alguma coisa.

Ele se sentou na sala de jogos e se deixou ficar até o amanhecer, viu a luz pouco a pouco entrar pela casa, mas não se mexeu, sentia como se estivesse de tocaia, lembrava que para apanhar certos animais a tocaia deveria ser feita por horas, mas ele não estava caçando nenhum animal, estava na verdade tentando apanhar um sentimento.

Na hora combinada o mordomo foi chamá-lo não o encontrando em seu quarto, dirigiu-se à sala de jogos, não era a primeira vez que seu patrão passava a noite em claro naquele lugar, ele entrou silenciosamente e pigarreou dando assim um sinal da sua presença, quando Roxton se virou ele informou as horas e saiu.

Ele não estava muito animado com a conversa que teria com o amigo, sabia muito bem quais as preocupações de sua mãe e não lhe tirava a razão, por um momento invejou Laurence, ele era livre, a mulher de Laurence morreu alguns anos após o casamento, mas antes lhe deu dois filhos homens, o casamento tinha sido arranjado e na verdade o amigo nunca foi muito ligado a esposa, deixou os filhos com a avó e foi fazer o que queria. Assim resolveu o problema dos herdeiros, agora ninguém poderia cobrar nada dele.

Logo que este pensamento passou por Roxton ele começou a se criticar, que absurdo querer ter um casamento sem amor, a morte precoce da esposa, e dois filhos que cresceram sem mãe e com a constante ausência do pai, ele não queria realmente isso para ele, mas pensar em casar não era nada animador, ainda mais casar só para manter o nome da família.

Roxton odiava pensar que nunca teria um filho, ou filhos, pessoas para ver crescer e mostrar o mundo. Mas a mãe dos seus filhos que era o problema, de qualquer forma ele teria que escolher uma mulher, mas qual?

Ele olhou o relógio e imaginou que dentro em pouco tempo o amigo chegaria, e ele teria que arranjar uma explicação para o que ocorreu ontem com a Srta Buchanans, foi tão real, por um instante ele estava numa sala rústica, com um som de vitrola velha e a risada de outra mulher e estavam os dois sós, foi tão real, quase palpável, ele achou que se a moça não tivesse o interrompido ele poderia ter reconhecido todo o cenário e a mulher....nas ultimas horas ele pensou diversas vezes naquilo, tentando ver um rosto.

Menos de meia hora depois, Roxton estava banhado, barbeado e recebendo seu amigo na sala de visitas, não seria a primeira vez que eles tomariam o café da manhã na companhia um do outro, comer, lendo as principais notícias dos jornais, fazendo alguns comentários, falando sobre o tinha acontecido na noite anterior, e planejando as próximas atividades dos dois. E desta vez não foi diferente, fizeram tudo isso e quando terminaram a conversa séria começou.

Nada do que Laurence disse ao Roxton era novidade para qualquer um dos dois, John sabia da necessidade que ele tinha de formar uma família, ter pelo menos um filho, mas não se sentia inclinado a casar.

O amigo deu algumas sugestões que para ele eram inaceitáveis, mas não ligou para as idéias do amigo, porque sabia que ele fazia isso quase como uma obrigação, Laurence disse que cumpriu com sua obrigação em relação ao pedido de Lady Roxton e arrancou do amigo algumas palavras que demonstravam que o assunto não seria esquecido por ele e que o caçador entendia que teria que tomar uma atitude.

Por fim entraram num assunto que tinha que ser resolvido imediatamente: Eveline.

- Bem meu amigo, seu negócio com Eveline está meio complicado.

- Eu não faço idéia do que você está falando, não consigo encontrar um motivo para ela estar zangada, tudo tem corrido normalmente, como nas ultimas semanas, e ontem não fugiu à regra...será que ela enlouqueceu e quer algo mais de mim?

- Meu caro, você parece que nasceu ontem....e isso não é verdade, você sabe exatamente o que aconteceu.

- Sem joguinhos, eu não sei mesmo, o que me preocupa é que Eveline vire um problema, se isso acontecer temos que encerrar esta história imediatamente, mas não gostaria que fosse de alguma forma vulgar ou tempestuosa, nada que possa provocar qualquer tipo de inimizades ou...

- Comentários.

- Nem pensei nesta possibilidade, estava pensando em alguma cena desagradável que ela possa fazer, detesto cenas.

- Que homem não detesta? ...Mas se você não quer uma cena não deveria provocá-la.

- Mas eu não fiz nada! Esta conversa está começando a me aborrecer, se você tem alguma coisa para falar diga de uma vez homem.

- Eu esperava que você confiasse em mim, assim como confio em você e me dissesse o que realmente está acontecendo.

- Já lhe disse: nada está acontecendo, e eu não estou lhe escondendo nada, confio em você. – pela voz de Roxton, o amigo percebeu que ele realmente estava ficando irritado com tantos rodeios, mas não poderia ser diferente, apesar de amigos íntimos algumas coisas nunca poderiam sem comentadas sem alguma preparação.

- O que perturbou Eveline, foi ela saber que você tinha outra amante, ou está apaixonado por outra mulher.

Roxton olhou intrigado para seu interlocutor e depois começou a rir: - Isso é um absurdo! De onde ela tirou isso? Quem parece que nasceu ontem foi você! Ela jogou contigo para ver se descobria alguma coisa...talvez tenha percebido que ela não me deixa tão entusiasmado como nos nossos primeiros encontros.

- Eu não nasci ontem, e sei quando uma mulher está querendo arrancar alguma coisa de mim, e posso lhe garantir que ela não estava, ela realmente estava nervosa e muito brava, quase não se continha. Você feriu os sentimentos dela! Pisou nos seus brios...

- Claro que não, pare de dizer isto, eu já falei que não aconteceu nada.

- Ela me disse que teve que usar toda a sua força para não fazer um escândalo no ultimo encontro de vocês e que lhe contou uma mentira sobre um compromisso para não ter que ficar encarando você.

- Quer dizer que ela mentiu pra mim e é ela que está brava?! se eu me importasse com isso, se ela pensa que vai fazer joguinho comigo para me fazer ficar com ciúmes está muito enganada...e isso me deu a certeza de que devemos romper o mais rápido possível.

- Com as coisas tomando este rumo realmente você deveria terminar tudo, principalmente estando ligado à outra mulher, e Eveline já sabendo disso.

- Já lhe disse que não tenho ninguém...

Antes que ele começasse uma discussão, pois Roxton já mostrou estar mais do que aborrecido com aquela história o amigo o interrompeu com uma pergunta, a pergunta que na verdade estava na cabeça dele. – Em que mulher você estava pensando ontem durante a valsa, com a srta Buchanans?

Essa pegou Roxton despreparado e ele só murmurou: - Em ninguém...e não adianta me olhar assim! Em ninguém mesmo, só uma aparição um fantasma sem nome...

- Marguerite.

Um frio percorreu a espinha do caçador "Marguerite" ...meu deus Marguerite, era nela que estava pensando, seu sangue esquentou e ele sentiu um calor momentâneo, ao mesmo tempo que não controlava seus pensamentos, estava mais intrigado ainda..Marguerite?! Por que?

- Então meu amigo era mesmo Marguerite?

Um Roxton confuso respondeu: - Como diabos?..eu nem mesmo sabia.....bem se explique.

- Afinal meu amigo ainda mantém seus segredinhos..... - Laurence tentava tirar o clima pesado com uma brincadeira inofensiva, mas percebeu que seu companheiro não estava interessado em brincadeira pelo seu olhar percebeu que ele desejava uma resposta, e uma resposta rápida. – Foi Eveline que me disse.

- Mas como? – suas palavras tinham uma urgência que não passou despercebida pelo amigo.

- Você fala dormindo. – o Lorde ficou constrangido por um momento e ele decidiu continuar – Eveline ouviu você chamando por Marguerite, não foi a primeira vez que você falava dormindo, mas ela nunca tinha entendido o nome, mas desta ultima vez, foi impossível para ela não notar que você chamava por outra.

O outro continuava em silêncio, ainda tentando entender o que ouvia – Você pode imaginar os sentimentos de Eveline, quando ela percebeu que o homem a seu lado esteve pensando em outra durante todos os dias em que estiveram juntos...... – o silêncio continuava – esse é um erro dos mais grosseiros, e acho que você realmente deve terminar sua relação com ela, mesmo porque acho que ela mesma vai provocar o rompimento, mas faça com tato, mantenha um mínimo de decência entre os dois.

- Com certeza...- essas foram todas as palavras que ele pronunciou.

O amigo permaneceu em silêncio por mais alguns minutos e vendo que precisava quebrar o clima e também curioso por saber quem é esta mulher que ele nunca ouvirá falar e que provocou a introspecção do seu companheiro, arriscou: - E então, não vai me contar quem é esta mulher? Alguma namorada que o abandonou?

Roxton olhou para o amigo ainda sem entender direito o que estava acontecendo, e mais para tentar colocar as coisas em ordem em sua cabeça do que para matar a curiosidade do amigo, respondeu: - Não, ela não foi minha namorada, amiga ou qualquer coisa neste sentido. Foi ela que financiou a Expedição Challenger para a Amazônia.

- E? Continue...

- Não tem muito mais, viajamos, descobrimos o mundo pré-histórico do Challenger e voltamos, depois eu nunca mais a vi.

- E como ela era? Vamos tem mais alguma coisa. – ele não entendia porque Roxton estava tão lacônico.

- Ela era terrível! Mentirosa, arrogante, convencida, ambiciosa, preocupada só com si mesma e com as vantagens financeiras que ela obteria, em outras palavras estava disposta a arriscar a vida de todos por pedras preciosas ou coisa que o valha.

- Nossa! Parece que ela te enfureceu....ela deve ser muito feia também – ele comentou já sabendo a resposta, ele só queria colocar mais lenha na fogueira que ele percebeu que já estava queimando.

Roxton deu um suspiro e disse sem se preocupar em esconder seus sentimentos: Ela era linda! Uma das mulheres mais lindas que eu conheci! Cabelos encaracolados pretos, olhos verdes enormes que pareciam querer engolir o mundo, pele branca, traços ao mesmo tempo delicados e fortes, não sei exatamente como explicar.... também era muito corajosa e atirava muito bem. Poucas mulheres não ficariam histéricas na frente de um dinossauro e ela se comportou muito bem, nos momentos de perigo.

Laurence olhava o amigo e percebia que havia algo mais, que tinha alguma coisa que ele não tinha dito: - John, somos amigos e você pode confiar em mim, o que houve entre vocês? Ou melhor, se houve alguma coisa muito forte, porque você não dá um jeito nisso?

- Mas não houve nada....não vou esconder de você que desejei aquela mulher, que homem não desejaria possuir uma beleza daquelas, mas nada aconteceu, não houve tempo, ela não era uma dessas mulheres que com meia dúzia de galanteios você seduz, e nós não tivemos tempo e nem sei se eu gostaria de investir tanto em alguém com aquele caráter.

Vendo que sua resposta não satisfazia o amigo, e nem ele próprio ele acrescentou – Sei que isto não o convence, mas quero deixar bem claro, que fiquei mais espantado que você quando soube que estive sonhando com ela, eu realmente não a vi mais, nem sequer pensei nela, encontrei os outros membros da expedição algumas vezes, mas ela nunca, e realmente não tem motivo algum para que eu pense na Srta Krux.

- Então este é o nome dela, Srta Krux..........e para quem não pensa nela, você anda sendo surpreendido por ela muitas vezes, sonhando com ela enquanto está dormindo e ontem no baile foi acordado mesmo!

- Realmente...isso é o que me intriga.

- Não só a você meu amigo......mas está ficando tarde e eu tenho alguns compromissos, à tarde você estará no clube?

- Sim, claro. Tomarei a chá no clube.

- Então até mais tarde, e aí poderemos falar mais sobre este assunto.

- Nem em sonho, este assunto morreu. Só tenho que pensar como vou me desembaraçar de Eveline.

- Você que sabe meu amigo, até mais.

Laurence saiu, e Roxton ficou mais uma vez sozinho na sala que ele conhecia tão bem, mas alguma coisa havia mudado e ele não sabia o que, tudo que ele queria é que aquela sensação de perda tivesse ido embora com o amigo.

Continua

Notas

Primavera, Verão, Outono, Inverno....Primavera, Verão.... , inspirado no título de um filme de origem asiática.

(8) Daisy Buchanans personagem feminina principal do livro "O Grande Gatsby" de F.Scott Fitzgerald.

(9) "Os Buddenbrook: decadência duma família" obra do escritor alemão Thomas Mann.

(10) Laurence Darrel personagem do livro "O Fio da Navalha" de William Somerset Maugham.

(11) Hans Castorp personagem principal do livro "A Montanha Mágica" de Thomas Mann.

(12) Eveline Hill personagem do conto "Eveline" de James Joyce, faz parte do livro Dublinenses.

(13) Elinor e Marianne Dashwood personagens principais do livro "Razão e Sensibilidade" de Jane Austen.

(14) Barão Gastão de Nueil personagem do conto "A Mulher abandonada" de Honoré de Balzac.

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