i Vamos falar de pesticidas /i

i E de tragédias radioativas /i

i De doenças incuráveis /i

i Vamos falar de sua vida /i

Não entendia nada, mas não tinha tempo para essas futilidades. Respostas eram para os tolos, ele só precisava de sua vida.

Tropeçou e caiu no chão, cortando seu joelho, mas também não tinha tempo para dor, levantou-se rápido e voltou a correr. Se tivesse tempo talvez lamentaria a morte dos pais, mas isso ficaria para depois quando estivesse a salvo.

Era tudo tão estranho. Ele corria para salvar sua vida. Os Aurores haviam matado seus pais, mas os que os perseguiam eram Comensais da Morte.

Ele estava indo para a sala de jantar quando ouviu o barulho. Aurores invadiram sua casa e tentavam levar seus pais, mas como estes resistiram acabaram sendo mortos. Se ele tivesse se atrasado mais alguns segundos não teria visto a cena. Os Aurores pareciam envergonhados por ele ter presenciado tudo, mas foram firmes. O quase ex-professor seu lhe fez sentar para se acalmar e começou a falar algo sobre ele estar seguro, sobre a segurança total de sua integridade física, moral e econômica e que sua guarda seria decidida num conselho tutelar.

Então eles chegaram.

Vestidos de preto e preparados para matar. Para lhe matar. O normal é que atacassem os Aurores, numa espécie de vingança, mas os poucos que se dirigiram a esses tinham o objetivo de não deixar que os Aurores interferissem na sua missão. Assim que ele percebeu o que ia ocorrer correu para o seu quarto e saiu por uma passagem secreta, o que lhe garantiria alguns minutos a mais de vida. Os Comensais não descobririam a passagem, mas assim que vissem que ele estava fugindo fariam de tudo para alcançá-lo.

Não entendia nada, e tinha medo de entender.

i Preste atenção ao que eles dizem /i

i Ter esperança é hipocrisia /i

i A felicidade é uma mentira /i

i E a mentira é a salvação /i

Ele corria para salvar sua vida, mas já tinha certeza que estava morto. Não sabia porque lhe perseguiam, mas se faziam isso tinham uma razão. E por experiência própria de vida, sabia que quando um Comensal queria, um Comensal fazia, principalmente se fosse ordem superior.

Sabia que aquilo tudo não estaria terminado até que ele estivesse a sete palmos ou em segurança sobre os olhos do Ministério, mas involuntariamente via vultos pretos surgirem a sua frente a todo minuto, e cada segundo parecia o fim. Não acreditava e nem tinha esperança, talvez tivesse, mas a verdade é que não via a luz no fim do túnel.

i Beba deste sangue imundo /i

i E você conseguirá dinheiro /i

i E quando o circo pegar fogo /i

i Somos os animais na jaula /i

i Mas você só quer algodão doce /i

Dizem que quando as pessoas estão prestes a morrer elas fazem promessas, certo? Bom, era a sua hora de fazer promessas.

-Prometo que se escapar dessa nunca mais vou chamar um sangue-ruim de sangue-ruim, não vou esnobar na cara dos pobretões que eles não têm dinheiro, vou aturar o Potter e todo tipo de laia, e, Merlim sabe, se eu sair dessa vou lutar firme e só vou descansar quando o Lord das Trevas morrer.

Sabia que para ele seria duro cumprir suas promessas, mas nada lhe seria tão importante quanto a ultima promessa. Tinha um ódio imenso no coração que só seria aplacado com o sangue do maldito bruxo.

i Não confunda ética com éter /i

i Quando penso em você eu tenho febre /i

i Mas quem sabe um dia /i

i Eu escrevo uma canção pra você /i

i Quem sabe um dia /i

i Eu escrevo uma canção pra você /i

Caiu novamente e ao se levantar se deu conta que estava chorando. Não se admirava.

Não se lembrava a ultima vez que chorara ou se até mesmo chorara algum dia, mas realmente não se admirava de estar chorando agora. A verdade é que por mais ódio que estivesse sentido e por mais confusa que sua cabeça estivesse, agora ele só era medo puro.

Céus, tinha 16 anos, não podia morrer ali, assim, no meio do nada e sem saber o porquê.

Estava ali jurando lutar contra Aquele-que-não-se-deve-nomear, mas mesmo que não fizesse isso, mesmo que fosse o capacho de Longbottom pelo resto da vida, tudo o que queria era estar vivo.

i É complicado estar só /i

i Quem está sozinho que o diga /i

i Quando a tristeza é sempre o ponto de partida /i

i Quando tudo é solidão /i

Sempre lhe parecera uma glória não ter amigos, ser independente, não precisar de ninguém. Era horrível descobrir que sua crença era falsa num momento tão aterrorizante.

Andava com alguns capangas e outros idiotas que às vezes o seguiam, mas se fosse a casa de qualquer um deles agora ele estava entrando na boca do lobo. Todos seus conhecidos eram filhos, parentes ou relacionados de algum modo a Comensais.

Então pensou no maldito Potter e seus dois amigos inseparáveis. Uma era sangue-ruim e outro era um pobretão que se misturava com a laia. Podiam ser duas escórias, mas nunca abandonavam Potter, e talvez sem eles o famoso menino talvez já tivesse dançado.

Imaginou o ridículo Weasley naquele momento, provavelmente sentado à mesa, jantando com seus pais e aquela penca enorme de irmãos. Sentia algo muito parecido com a inveja nesse momento.

-Por favor, se houver alguém aí em cima... não me deixe morrer.

i É preciso acreditar num novo dia /i

i Na nossa grande geração perdida /i

i Nos meninos e meninas /i

i Nos trevos de quatro folhas /i

Tropeçou pela terceira vez e caiu ao chão, desta vez não achou forças para se levantar. Estava acabado, estava perdido, não adiantava adiar o inadiável.

Então sentiu algo duro no bolso. Era pó-de-flu. Esquecera-se que pegara o pote que estava em seu criado mudo quando saiu correndo pela passagem secreta. Uma chama de esperança surgiu nele.

Muito cansado e com poucas forças para voltar a correr pela estrada deserta ele se levantou. Tudo o que precisava era que alguém passasse por ali. Ora, não era algo tão difícil, aquela estrada sempre fora um pouco movimentada.

Trouxa, bruxo, sangue-ruim ou qualquer coisa que aparecesse ali com algo que se locomovesse era tudo o que ele queria. Assim que entrasse em Londres invadiria uma casa qualquer e procuraria uma lareira, iria aleatoriamente até achar uma casa bruxa que lhe permitisse fazer contato com o Ministério ou com Alvo Dumbledore.

Olhou para os dois lados da pista, mas não vinha nada.

-Só um carrinho, um só...

Então na direção contrária a qual ele ia começou a vir aquela luz. Ele não sabia como os trouxas pediam carona, mas tirou a camisa branca e começou a balançá-la no alto parado no meio da pista. Se isso não fosse um sinal de que precisava de carona, não sabia o que seria.

i A escuridão ainda é pior /i

i Que essa luz cinza /i

i Mas estamos vivos ainda /i

Então o carro parou.

Ele não podia ver a pessoa ao volante por causa dos faróis altos, mas o motorista lhe gritou para entrar no carro se quisesse carona. Como havia uma criança na cadeira ao lado do motorista ele entrou e se sentou no banco de trás, agradecendo imensamente ao motorista que tivesse parado.

"Merlim, estou vivo. Todo esfoladoórfão, desesperado e sem rumo, mas estou vivo".

-Ora rapaz, não me agradeça nada. Só cumpro as ordens de milord.

O sorriso bobo de Draco se apagou e então a criança no banco da frente olhou para ele com um sorriso macabro no rosto.

Foi a ultima coisa que ele viu.

i E quem sabe um dia /i

i Eu escrevo uma canção pra você /i

i Quem sabe um dia /i

i Eu escrevo uma canção pra você /i