Observação1: Saint Seiya e seus personagens originais não me pertencem.
Observação 2: Yong Li, Horemheb e Ishiro são nomes originais cunhados por mim.
Observação 3: O trecho em itálico é da música Passive Agressive, do Placebo. Uma banda maravilhosa, aliás.
Comentários da Autora: Caramba, capítulo NOVE! Feliz com os reviews favoráveis, com a compreensão e o carinho de vocês. Obrigada! Este capítulo foi particularmente difícil para ser montado. Muitas coisas acontecendo...
ps: a estorinha da 'balança' que Horemheb menciona no hospital é uma LINDA lenda do Egito Antigo. Qualquer site meia boca tem, procure pelo 'tribunal de Osíris' ou por 'Anúbis'. Vale muito a pena.
A Gênese
Capítulo 9
Crianças de Deuses
"Every time I rise I see you falling
Can you find me space inside your bleeding heart?
Every time I rise I see you falling
Can you find me space
Find me space…"
- Placebo, Passive Aggressive.
- Ah, aí está você, Li! Pensamos que você não ia chegar a tempo de... você sabe...
- O que houve, Horemheb?
- Eu vim, a pedido de Athena ficar aqui e vigiar Aioria. E de repente os médicos ficaram malucos. Parece que ele teve uma parada alguma-coisa-respiratória e os médicos tiveram de reanimá-lo. Foi horrível. – Horemheb apontou para o lado, Marin, sentada numa cadeira, quase que impossível de se distinguir de qualquer jovenzinha distinta da Grécia, esperando notícias do seu amor, de jaqueta jeans e saias longas. – Ela ficou histérica, foi um escândalo.
Li corou levemente.
- E como ele está agora, Horemheb?
- Não sei. Os médicos aplicaram um sedativo na escandalosa e disseram que voltariam para dizer como ele está. Mas ele não pode estar bem, não é, Li?
- Não, bem não.
- O Mestre, o que ele lhe disse?
- O que acha que meu mestre de 102 anos, virgem, órfão, que já viu duas gerações passarem nos Templos, me disse sobre a morte e sobre o amor?
- Que o Destino não lhe cabe?
- Isso.
- É o que um servo de Osíris diria também. Aliás, acho que não há religião possível em que não te dissessem o mesmo, Yong Li.
- Eu sempre soube o que ele diria, porque é exatamente o que eu diria a alguém se eu fosse procurada pelos monges. O Mestre dos Dragões deve ser sempre calmo e sereno.
- Só não tem medo de morrer quem não gosta da vida. – ele deu de ombros – Mas esta é uma lição que não nos ensinam...
O jovem médico apareceu no fundo do corredor. Para os olhos fracos e tristes de Li, ele parecia um soldado ocidental branco, correndo para ela do fundo de um buraco de luz fria e seca, que é a luz fluorescente dos lugares de saúde.
- Que bom que estão aí. A senhorita está mais calma? – ele apontava para Marin.
- É o que parece, depois do sossega leão que deram para ela, também...
- Doutor, como ele está?
- Normalizado.
- E isso é o que?
- Ele teve uma parada cardíaca. Foi preciso reanimá-lo. Agora ele está estável outra vez. Continuamos esperando que, com o fim do efeito da medicação mais pesada, ele será capaz de deixar o respirador. Então estaremos mais próximos do fim do coma.
- Ele esteve muito mal, doutor? É que eu acabei de chegar...
- Esteve. Podemos dizer que ele esteve entre os mortos e voltou.
Horemheb riu.
- E agora, doutor?
- E agora? Esperar. É tudo que podemos fazer.
O médico se afastou, e Li sentou-se num dos bancos pequenos e brancos, ao lado de Horemheb.
- Por que você riu, Horemheb?
- Você foi buscar nosso Cavaleiro no mundo dos mortos, não foi?
- O que você disse?
- Não seja boba. Sabe o que eu quis dizer.
- Por que pergunta?
- Eu sou o Máscara da Morte, chinesa. Acha que eu não conheço o cheiro da morte? Eu já estive e já mandei muita gente para o mundo dos mortos e conheço bem a morte. – ele baixou a cabeça, com ar melancólico. – conheço bem demais.
Li deitou a cabeça no ombro dele.
- Devia saber como fazer para as pessoas não morrerem, então.
Ele se inclinou também.
- Devia, mas convenhamos que esta é a parte difícil. Você é mulher, devia entender mais sobre dar a vida do que eu.
- Eu? Sou uma monja. Nunca vou conhecer o amor. Vou morrer virgem e intocada, fazendo preces do mais alto cume das montanhas, em meditação, com coisa de uns 100, 150 anos de idade, se eu viver tanto quanto o mestre Wang.
- Ou não. Você não precisa ser virgem.
- Quem viveria comigo na Montanha do Dragão? Só os mais velhos me cercam.
- E Shiryu?
- Uma lembrança.
- Aioria?
- Esperança. Esperar. Dúvida. Aioria é minha eterna dúvida. Nunca acreditei que me amasse. Como ele poderia? Nós nos vimos algumas poucas vezes. Ele tinha Marin! Ele tinha um mundo, Horemheb! Eu saí da Montanha poucas vezes, mas ele viveu livre, viu todas as mulheres e amou todas quanto quis.
- E amou você, por anos, porque todos os homens são iguais, Li: eles amam o que não podem ter. Como Shiryu.
- Me dói fisicamente magoar o Shiryu.
- Oh! Deixe ele bater cabeça à noite com ciúmes. Faz bem. Um homem goza de sofrer de amor. Se a gente não sofre, acaba amando menos, entendeu?
- Ah, Horemheb... você é o melhor homem mau que já conheci...
- Você também é uma mulher que faz os homens quererem ser bons. Quando eu te conheci, não entendia porque Shiryu e Aioria eram tão loucos por você... sem ofensas: você é pequena demais e usa roupa demais...
- Roupa demais?
- Nunca nem vi seus tornozelos!
- Shiryu já viu meus tornozelos...
- Tenho certeza de que um homem enlouqueceria no sentido sexual da palavra pelos seus tornozelos, mas mesmo assim... eu não entendia que, com tantas mulheres disponíveis, eles sempre estivessem cultuando a imagem de uma mulher inacessível que eles mal conheciam... quando conheci você entendi o que eles queriam dizer, Li. Você é formidável... é difícil dizer o que mais impressiona em você: sua força como guerreira, ou seu espírito doce de mulher.
- Ah, você é tão bonitinho, Horemheb!
- Não puxe meu saco, chinesa.
- Horemheb, onde está o meu Ishiro? Eu estava tão atordoada que esqueci dele.
- Ele percebeu. Sorte sua, ele é compreensível. Mu o levou. Impressionante como Shaka que só ama o próprio umbigo mesmo sem nunca tê-lo visto, se afeiçoou do menino... - Shaka é um bom homem, Horemheb.
- Ah, sim... ótimo.
- Pare de deboche, egípcio.
Horemheb riu novamente. Aquele riso tímido, quase interno de quem normalmente nunca ri. Apanhou um pequeno potinho do terno Armami e o abriu, revelando aos olhos de Li uma pasta negra.
- O que é isso?
- Abra a mão, princesa.
Li deu as mãos a ele, sem olhá-lo nos olhos.
- Isso, Yong Li, é a mesma substância que se usava para pintar os olhos dos faraós mortos. Eu vou desenhar o olho de Hórus na sua mão para proteger você da morte. – ele desenhou o olho cercado de riscos. – Que Anúbis permita uma viagem suave ao Tribunal de Osíris, que seu coração seja sempre leve, que não pese na balança...
Ela olhou o olho desenhado em suas mãos. Abraçou Horemheb com toda a força que podiam seus bracinhos curtos.
- Obrigado, Cavaleiro de Câncer.
O estado de Aioria, como previra o médico, melhorou em alguns dias. Ele abandonou o respirador, saiu da UTI e foi para um quarto normal, onde permanecia em coma, belo como se estivesse dormindo. Saori permitiu que Yong Li ficasse no Santuário, persuadida que foi pelo astuto Horemheb. Ele convenceu-a que seria melhor ter Li sob suas vistas. Ignorando a amizade de ambos, Saori permitiu mesmo que Li treinasse o pequeno Ishiro na Arena, junto da onde se treinavam todos os meninos. Era uma estratégia, sim, mas era também um rasgo de culpa tardia pelo que havia acontecido com Aioria.
Então, toda manhã Yong Li descia soberana da casa de Virgem para a Arena, com um simples cabo de madeira nas mãos, para apanhar Ishiro na primeira casa e descer com ele para treiná-lo, junto com os outros meninos.
O treinamento de Ishiro era simples: ela segurava a barra de madeira horizontalmente com as duas mãos e Ishiro tinha de tentar atingir Li. Se em dois minutos ele não fosse capaz de acertá-la, ela avançaria para atacá-lo. Simples assim. Diferente dos monges, Ishiro era agressivo e lutava furiosamente. Entretanto, não tinha a concentração e o poder de observação dos monges. Quase sempre ele terminava tomando dois ou três golpes com a madeira e caía longe. Da última vez, bateu com a cabeça no chão e ficou caído, com os cabelos ensangüentados.
- Está machucado? – li perguntou suavemente, mas sem demonstrar muita preocupação.
Ishiro viu os meninos em volta, dando golpes uns nos outros, esperando pela reposta dele.
- Não.
- Então levante-se. Vamos continuar.
Um dado momento, cansado de ouvir gozações dos colegas, Ishiro tomou a vareta da mão de Li, quebrou-a nas pernas e atirou-a longe, num típico ataque infantil.
- Não vou treinar com essa madeira ridícula! Eles treinam uns nos outros, mãe! Eu sou fraco e fico brincando com essa madeirinha! Se eu não lutar com eles, serei sempre fraco e bocó!
Li ficou furiosa.
- É isso que acha? Que o que te faz falta é dar sopapos nos seus coleguinhas? Pois fique olhando!
Li tomou uma outra vara de madeira, olhou para o manequim de ferro que Shina usava para que os meninos praticassem socos e chutes, atirou a madeira contra o manequim. No meio da trajetória, estendeu as mãos: a vara iluminou-se de um brilho azul forte, varou o manequim cortando-o ao meio na ida. Na volta, arrancou o que faltava e voltou para mão de Li, onde perdeu seu brilho.
- Você tem espírito fraco, por isso é fraco. A vara de madeira não é diferente de uma armadura de ouro: precisa de um espírito forte. Fraco como é, poderia usar minha jiàn e ainda assim estaria desprotegido. Uma arma forte não defende um homem fraco, isto é fato.
- Mãe, desculpa. – o menino ajoelhou-se aos pés de Li. – Me ensine a ser forte? Como Aioria e você.
- Para ser realmente poderoso, Ishiro, você deve conhecer o poder intimamente. E obedecer é conhecer o poder do ponto de vista do mais fraco.
- Eu vou obedecer, mãe.
- Sem perguntar.
- Sem perguntar, mãe.
- Assim está melhor.
Dias passavam. O coma de Aioria, por mais macabro que fosse, já se incorporava á rotina dos moradores do Santuário. Todo o fim de tarde Ishiro e Li iam ao hospital vê-lo. Ishiro mexia as pernas e braços dele, massageava-o com cânfora para que ele não atrofiasse. Li sabia muito bem que o hospital oferecia o serviço de fisioterapeutas, mas acreditava que o amor e a dedicação do pequeno Ishiro certamente eram mais eficazes do que o estica-e-puxa das fisioterapeutas recém-formadas que riam envergonhadas de massagear as pernas fortes e musculosas de Aioria, que com o passar dos dias e meses ficava cada vez mais magra e mais fraca. Não raro, no final da visita, Ishiro agarrava-se às pernas de Aioria e chorava para não ir embora. Ia chorando no colo de Li até chegarem à Acrópole, onde enxugava as lágrimas e fazia-se de forte para não decepcionar seus mestres.
Li, sentada sobre o olho de um furacão, deixava o pequeno Ishiro na casa de Áries e subia até Virgem, onde, finalmente, depois de um longo dia, podia dar curso às suas muitas lágrimas, todas as que ela silenciou durante o dia para não desesperar Ishiro, as mesmas que ela mantinha em segredo para seguir firmemente os preceitos dos Dragões, mas que durante a noite, sem censura, desciam de suas faces. Shaka ouvia Li chorar, soluçar até o choro se tornar gemidos fracos e ela cansar-se e dormir.
"Como eu consigo entender essa mulher... eu era tão parecido com ela, tão forte e tão soberbo... eu posso suportar tudo: a dor física, a fome, a solidão. Para tudo nos treinaram nossos mestres: exceto para o Amor. Nós, tão serenos diante da vida e das coisas! Tudo sabemos, tudo dominamos... e um mero sentimento humano comum a todos os homens, nos desmorona porque não fomos treinados para aceitar o caos e a desordem. Shaka de Virgem poderia suportar qualquer pressão... qualquer uma... exceto Mu... pobre Li! Divina que é entre os Dragões pelo seu nascimento real, seus poderes falham ante esta barreira humana... como eu falhei diante dela, anos atrás... Buda, ilumine Li para que ela não sofra como eu sofri... e nem faça os que ela ama sofrerem como eu fiz... que mais uma de suas crianças escolhidas não pene o fardo da solidão do poder... o poder é tão só!"
O coma de Aioria durava exatos três meses e ele tinha perdido, até então, nove quilos. Continua...
Nana: Se divirta muito nas suas férias. Estou postando alguns capítulos, espero que você possa lê-los como uma "saideira". Tenho certeza de que você voltará recarregada, cheia de energia e idéias novas. Obrigada pelo comentário sobre a disputa da armadura. Foi o que realmente me deu mais trabalho de elaborar. Distinguir as vozes de Ikki e Aioria foi custoso, mas foi legal! Agora, mesmo com pena, estou maltratando Aioria... tudo por um bom drama...! Beijos, linda!
Eloarden Dragoon: Tadinho do meu Shiryu! Mas eu não fico arrasada não, afinal podia ser pior: já pensou se eu amasse o Seiya? Ia viver em guerra com a humanidade! :P
As novidades do Leãozinho estão aí. Só resta você decidir se são boas ou ruins... tadinho!.
Mikage-sama: Olha aí! O Leãozinho está de volta, por enquanto! risadinha perversa.
Não, juro, eu sofro de fazer maldades com ele... mas é pelo bem da estória! Ah, sim, eu tenho o MSN instalado mas nunca usei... bom, se você quiser me adicionar, é joyceverlaine... ( quem sabe, né? ).
Amy: Senhorita, preciso dizer que estou já em crise de abstinência da EV? Não, né? Tenha pena de uma pobre escritora que maltrata o pobre do Aioria na esperança de ver vocês maltratarem o pobre Milo... ( caraca, quanta maldade! Somos as Nazarés do FF . net ! ). SAUDADESSSS!
A galera que está sempre por aí ( Elindrah, Perseus Fire... ): obrigada, crianças! Muito obrigada! A tia Joyce Verlaine ama e aprecia a leitura de vocês. Mesmo sem manifestações, como eu já disse, sinto vocês aí e isso me serve de inspiração, sempre. BEIJOS!
