Título: O julgamento das sete mortes
Ficwriter: Kaline Bogard
Beta: Akemi Hidaka
Classificação: yaoi, sobrenatural
Pares: YohjixKen
Resumo: O que parecia um inocente pedido de ajuda transforma a vida de Yohji numa corrida contra o tempo.
Records of 2004 a.C.
O julgamento das sete mortes
Kaline Bogard
Capitulo 08
As amarras que não se vê.
... amore.
(Masaru) Impressionante... realmente impressionante! Duas paradas cardíacas aparentemente inexplicáveis em menos de vinte e quatro horas! Não sei nem o que dizer, senhor Fujimiya...
Estavam de volta ao hospital. Tanto Yohji quanto Ken haviam sido internados. O loiro, obviamente, por causa da parada cardíaca, resultada do julgamento. E Ken porque estava em estado de choque, e não despertara ainda desde o acontecido mais cedo.
Shouji garantira que ambos ficariam bem. Então restava a eles apenas esperar.
Por uma coincidência, haviam pegado o mesmo doutor que atendera Yohji da outra vez, e ele se mostrara realmente impressionado com a repetição da 'enfermidade' que o loiro sofria.
(Aya)...
(Masaru) Acho que me precipitei em dar alta tão cedo. Vou manter o senhor Kudou por pelo menos três dias dessa vez. Melhor não correr riscos, não concorda?
(Aya) Sim.
Essa era uma complicação a mais. No entanto, Aya não tinha argumentos para rebater a necessidade da internação. Mas três dias... era tempo demais!!
Olhou em direção as camas. Masaru conseguira providenciar que os amantes ficassem no mesmo quarto. Ambos dormiam tranqüilamente agora.
No quarto também estava Omi, sentado em uma das cadeiras, entre a cama dos companheiros desacordados.
(Masaru) Eles vão ficar bem. Dormirão algumas horas por causa dos remédios, mas acredito que durante minha segunda ronda eles já estarão despertos.
(Aya) Entendi.
(Omi) Obrigado.
O jovem doutor balançou a cabeça e saiu do quarto. Omi e Aya se entreolharam. Antes que dissessem alguma coisa a porta se abriu, e os gêmeos italianos entraram.
(Aya) São permitidas apenas duas visitas por vez.
(Enrico) Não se preocupe. Ninguém nos viu entrar.
(Carlo) Nós ouvimos tudo o que o médico disse. Ele vai segurar Yohji aqui por três dias, não é?
(Omi) É...
(Enrico) Dessa vez não cairemos nos truques de Miguel. Vocês podem dar continuidade às investigações, enquanto Carlo e eu ficaremos aqui, tomando conta dos dois.
Aya torceu os lábios de modo irritado. Esquecera completamente dessa investigação. Mais essa ainda.
(Omi) Precisamos esperar Yohji acordar, e nos dizer o que ele já sabe até agora.
(Aya) Não deve ser muita coisa.
(Enrico) Não vamos fazer nada, antes que ele melhore e saia daqui.
(Omi) Mas...
Será que dava pra confiar? Eles não tinham muitas escolhas.
(Carlo) Nós falhamos uma vez. Não vamos repetir nosso erro, é uma promessa.
(Aya) Certo. Nós entendemos, e só nos resta confiar, não é verdade?
(Enrico) Sim, a não ser que queiram perder esses três dias, e ficar aqui, sem fazer nada, apenas esperando.
(Omi) Isso não!
(Aya) Omi... é melhor você ir para a Koneko. Não é bom deixá-la tanto tempo fechada. Entre em contato com Manx, e descubra as novidades. Avise-a que precisamos de alguns dias, antes de receber uma nova missão.
(Omi) Aya, eu... gostaria de ficar aqui...
Não queria abandonar seus amigos sozinhos no hospital. Bem, ta certo que não ficariam abandonados, mas mesmo assim, o coração de Omi não ficava a vontade em ir embora dali.
(Aya) Omi, faça o que eu estou dizendo.
O loirinho suspirou de leve e concordou, balançando a cabeça. Depois se ergueu e aproximou-se de Aya, depositando um selinho carinho nos lábios do líder da Weiss.
(Omi) Se cuida, viu?
(Aya) Você também.
Assim que o loirinho saiu do quarto, Aya voltou os olhos frios para os gêmeos, analisando-os com calma. Dessa vez eles não iam escapar do interrogatório. E Aya queria respostas...
(Enrico) Ainda não é hora dessas revelações...
(Aya) Não estou perguntando se é hora ou não. Quero saber a verdade... vocês todos... esses garotos...
Era tão estranho perguntar uma coisa dessas... mas, Aya tinha que saber... tinha que matar suas dúvidas de qualquer maneira.
(Enrico suspirando) Ok, pergunte.
Apertou o gêmeo nos braços, sabendo que não poderia se esquivar às questões que atormentavam o líder da Weiss. Aquele ruivo era mesmo perspicaz.
(Aya) Vocês... estão todos mortos, não é?
oOo
Omi chegou a floricultura, encontrando-a rodeada por várias garotas. Elas aparentavam preocupação sem saber o porque da Koneko estar fechada.
Usando toda a sua lábia, o loirinho conseguiu despistar as fãs, e pô-las pra correr, informando que não abririam a loja naquele dia.
(Omi pensando) E talvez nem amanhã...
Depois o loirinho entrou em contato com Manx, mas felizmente não haviam missões a serem realizadas, e aparentemente não teria nada tão cedo assim, ou seja, poderiam se dedicar a caça aos pais de Shouji.
(Omi) Não creio que Yohji tenha deixado algo anotado...
Apesar de achar assim, o loirinho se dirigiu ao quarto do playboy, entrando no mesmo. Notou que o local estava arrumado, mas isso era graças a insistência do moreninho. Omi sabia perfeitamente que, antes de se acertarem, Yohji não tinha nenhuma preocupação em arrumar o quarto...
Aproximando-se da cômoda, Omi percebeu que Yohji deixara o celular em cima do móvel. Havia um número marcado no visor.
(Omi) Uma chamada não atendida...
O chibi decidiu discar para aquele número, e ver quem havia ligado.
(Emiko) Alo... Yohji?!
(Omi) Oh, não... eu sou Omi, é que Yohji não pode atender, mas eu vi que o senhor tinha ligado pra ele, e achei que podia ser algo importante.
(Emiko)...
Tentava saber se deveria falar ou não com o companheiro do ex-detetive... mas a verdade é que Yohji não havia pedido segredo, então achou que não havia mal nenhum em falar.
(Omi) Eu transmito o recado, pode ficar tranqüilo...
(Emiko) Certo. Eu andei investigando alguns fatos relacionados com os Yasutaka. Yohji conseguiu me deixar com a pulga atrás da orelha. Então, avise-o que eu puxei pelo sistema uma ficha enorme do senhor Yasutaka. O homem foi acusado de perturbar a paz em Endo, e tentar invadir uma instalação do governo por duas vezes.
(Omi surpreso) Em Endo?
(Emiko) Isso. Liguei para a policia de lá, mas os tiras do interior podem ser muito ignorantes... eles se recusaram a passar informações pelo telefone.
(Omi) Mas isso que o senhor disse é muito interessante.
Uma ótima pista na verdade...
(Emiko) Espero que ajude aquele moleque desmiolado...
(Omi sorrindo) Acho que vai ajudar sim. E ajudará muito! Obrigado!
O loirinho desligou o telefone, e tratou de correr até seu quarto, ligando o novíssimo laptop. Sua maquina particular tinha muitos recursos mais que a usada para as missões. Conectou-se a Internet, vasculhando o mar digital atrás do sistema da policia de Endo.
(Omi) Consegui!
Não teve problema nenhum em driblar as defesas eletrônicas do departamento de polícia daquela cidadezinha do interior.
Teve alguma dificuldade em localizar os dados, devido a forma desorganizada com que estavam armazenados.
(Omi) Aqui está... a ficha de Takeshi Yasutaka... confere: preso em 21 de outubro de 1990 e em 17 de março de 1991. Foi solto depois de pagar fiança. Não há mais nenhuma informação... ah, o juiz exigiu acompanhamento de conselheiro policial por dois anos, para ter certeza de que ele não tentaria mais nada... o acompanhamento durou até março de 1994, quando o senhor Yasutaka se mudou de cidade...
A ficha criminal se encerrava ali. Mas eram boas informações. Graças a ligação de Emiko, Omi sabia que os pais de Shouji haviam se mudado para Endo, e depois para outra cidade. Mas, não sabia do destino do casal...
O loirinho suspirou. Lembrou-se então do porque Takeshi havia sido preso: tentara invadir um prédio do governo...
Então a tentação tomou conta do jovem Weiss... invadir o sistema de uma delegacia do interior era um trabalho fácil demais, agora... invadir os computadores de uma sede governamental... podia ser muito difícil...
(Omi sorrindo) Vamos ver se eles podem comigo...
Começou a digitar freneticamente, acionando um programa de defesa, desenvolvido por ele mesmo, enquanto buscava por mais informações sobre aquele laboratório.
Logo descobria informações relativamente descartáveis para o caso: o local era uma extensão do Tokyo Bio Technology Center, criado em 1971 para fins de pesquisa sobre a capacidade da mente humana.
(Omi) Trabalhava com a mente humana? Talvez fosse apenas fachada...
Navegando mais a fundo, Omi descobriu que tal laboratório fora alvo de protestos da população enfurecida em 1979 e 1985. Os revoltosos alegavam serem realizadas no local, experiências terríveis com pessoas. Mas nada ficara provado, e o centro continuara suas atividades até meados de 1993, quando aparentemente o laboratório fora fechado por causa de um acidente interno não divulgado.
(Omi) Interessante...
Tendo um pouco mais de trabalho, Omi conseguiu se infiltrar nos antigos arquivos do laboratório, buscando algo que o auxiliasse na busca. Não sabia porque, mas sua intuição lhe dizia que aquele laboratório tinha muita importância no caso de Shouji... ou pelo menos os pais do garoto acharam que tinha...
Conforme ia mergulhando no mar de informações digitais, Omi descobria que as defesas anti hackers ficavam melhores e mais difíceis de se quebrar.
(Omi) Tanta segurança...
Quase sem querer, o loirinho esbarrou em alguns arquivos armazenados em uma área de dados perdidos. Pouca coisa restara daquilo, talvez decorrente do tal acidente que fechara as atividades do laboratório.
(Omi) Vamos ver o que é isso...
Tentou invadir, mas nesse exato momento, seu programa de defesa enviou um sinal para a tela plana do laptop, ao mesmo tempo em que emitia um aviso sonoro: havia sido descoberto, e a pessoa que operava o sistema do outro lado da rede era boa! Em questão de segundos conseguiria limpar o micro de Omi do sistema do laboratório.
(Omi impressionado) Que sistema anti hacker maravilhoso... só mesmo o governo para criar algo assim...
Como última medida desesperada, acelerou o processo de download, destravando algumas configurações do próprio computador. Sabia que isso abriria uma brecha para o inimigo, mas pelo menos ficaria com aquelas pastas de dados danificados. Devia importante, para estar na parte mais protegida do sistema...
(Omi) Só mais um pouco...
O chibi piscou preocupado. Parecia que seria cortando antes de conseguir baixar todo o arquivo... faltavam segundos para que o pior acontecesse quando...
(Omi) Consegui!!
Um segundo depois de salvar os arquivos, sua conexão caiu, obviamente varrida da net pelo sistema de proteção da instalação governamental.
A primeira coisa que o loirinho fez foi limpar seu rastro da rede. Conectou-se novamente, mudando seu suporte, e apagando cuidadosamente seu rastro com experiência. Mais aliviado voltou sua atenção para os arquivos salvos na memória do laptop.
(Omi sorrindo) Vamos ver o que vocês guardam com tanto cuidado...
Assim que abriu o programa, sua emoção virou decepção. Todo o arquivo estava criptografado. Levaria horas, senão dias, pra descobrir o código certo e traduzir o texto.
(Omi) Que droga!
Pegou o laptop e transmitiu as informações para o palm moderníssimo, depois se dirigiu para a cozinha, onde começou a preparar um café. Se tinha que desvendar aquele código desconhecido, então começaria o mais rápido possível.
oOo
(Aya) Porque não me respondem?
(Carlo)...
Voltou o rosto pálido para a face do irmão, observando-o com cuidado. Depois olhou para o frio líder da Weiss. Aya queria respostas, e não se contentaria com evasivas.
(Enrico)...
O italianinho não parecia disposto a responder a questão tão delicada.
(Aya) Vocês dois estão mortos. Assim como Karen, Shou, Miguel e Shouji.
(Carlo) Se engana...
(Aya) Vai dizer que estou errado? Karen me disse que todos vocês foram julgados por Shouji e perderam, recebendo assim a morte definitiva... é o que vai acontecer com Yohji, não é?
(Carlo surpreso) Oh... você confundiu tudo!!
(Enrico) Sim, as coisas são um pouco diferente do que pensa, Aya.
(Carlo suspirando) Quando recebemos o julgamento de Shouji...
(Enrico)... nós já estávamos mortos...
(Aya) !!
Os gêmeos se entreolharam, e Carlo acabou fazendo que 'sim' com a cabeça, animando Enrico a continuar com as explicações.
(Enrico) Você disse que Carlo e eu estamos mortos, assim como Karen, Miguel e Shou. Nisso você está certo.
(Carlo) Mas não quanto a Shouji. Na verdade, nós não temos certeza se ele está vivo ou não.
(Aya) Como assim?
O ruivo acabou sentando-se em uma das cadeiras, intuindo que aquela conversa seria longa. Os gêmeos se aproximaram da janela, observando a paisagem do terceiro andar.
(Enrico) Nós tínhamos acabado de morrer, quando Shouji veio a nós, e nos desafiou ao julgamento das sete mortes. Éramos almas perdidas, e estávamos confusos, por isso aceitamos.
(Carlo) Miguel já fazia parte do júri. Nós entramos logo após.
(Aya) E porque tudo isso?
(Enrico) Quando se é julgando após a morte, é com intenção de formar o júri primário. Shouji reuniu os sete jurados, para julgar o verdadeiro réu.
(Carlo) Todos os jurados são pessoas que tiveram uma morte violenta, e cruel, que causou danos profundos em nossas almas, criando assim espíritos rebeldes.
(Shouji) Exceto vocês dois.
Os três se voltaram surpresos na direção da porta, onde Shouji estava parado, observando-os. O garoto japonês havia entrado no quarto sem que percebessem.
(Carlo) Oh, Shouji!
(Shouji) Vocês tiveram uma morte terrível, mas tinham um ao outro para compartilhar a dor. E o amor que sentiam era tão grande, que superou tudo o mais, impedindo suas almas de se machucar. Foi por causa desse amor tão surpreendente que eu escolhi vocês...
(Enrico) Sim, nosso amor não foi vencido nem mesmo pela morte.
(Carlo) Muito pelo contrário: ele se tornou mais forte.
(Shouji) Vocês estão presos por uma amarra invisível e indestrutível... o amor... foi esse sentimento que me fez desejar tê-los ao meu lado, e lhes dar uma nova chance.
(Aya) Como... como vocês morreram?
Enrico apertou Carlo em seus braços, e depositou um beijo sobre os cabelos negros e macios.
(Shouji) Não precisa contar, se não quiser... ou se doer demais.
(Carlo) Não... doeria se Enrico não estivesse comigo.
(Enrico) Carlo... você morreu por minha culpa...
(Carlo) Claro que não! Seu bobo! Quantas vezes vou precisar dizer isso?!
O gêmeo mais alto sorriu de modo gentil, depois olhou para Aya.
(Enrico) Nós nascemos em San Marino, na Itália. Nosso pai era um Don.
(Aya confuso) Um Don?
(Enrico) Don é a maneira como é tratado o chefe da Máfia. Nosso pai controlava toda a cidade de San Marino.
(Carlo) Um Don costuma ter muitos inimigos, e rivais... na luta pelo poder, quem é mais fraco cai primeiro. Nosso pai não era fraco.
(Enrico) Mas nós éramos... éramos o ponto fraco de Don Albarello.
Flashback
San Marino – 1997
A noite se aproximava devagar, escurecendo toda a cidade de San Marino. Apesar disso, havia grande agitação pelas ruas: era aniversário de Don Albarello, e como era costume, todos os anos o milionário oferecia uma festa para seus amigos mais chegados.
E é claro, oferecia uma festa ao povo da cidade, distribuindo comida e bebida a vontade pelas ruas.
Essa era a única data do ano em que ele abria as portas de sua magnífica mansão. Mas nem por ser festa, ele se descuidava. Por precaução triplicava a segurança, contratando homens de confiança, e bem preparados para qualquer eventualidade. Tinha muitos inimigos, era plenamente ciente desse fato.
Seu bem mais precioso era a família: tinha uma esposa linda, dez anos mais jovem que ele, e dois gêmeos maravilhosos, os tesouros de sua vida.
(Don) Enrico, Carlo!! Onde vocês estão, banbinos?!
(Enrico) Papa! Estávamos terminando de provar os doces!!
(Carlo rindo) Anna ficou danada com a gente!!
(Don sorrindo) Roubando doces outra vez?
(Carlo) Papa... só dessa vez!
(Don) Sua mama vai lhes passar um sermão... ainda não estão prontos?
(Enrico) Já vamos nos arrumar, papa.
(Carlo) Parabéns!! Pelos seus cinqüenta anos!!
(Don) Hum... apesar disso, me sinto como se tivesse apenas quarenta e nove...
(Enrico) Oh, papa...
(Don) Ma va, banbinos! Coloquem logo uma roupa apropriada, ou Lucilla vai me estourar os ouvidos de tanto reclamar de vocês dois...
Fez um cafuné nos adorados filhos, e sorriu ao vê-los correr como dois coelhos, escada a cima, em direção aos quartos. Aqueles garotos eram seu verdadeiro tesouro.
oOo
A festa ia animada, quando os gêmeos escaparam para o grande jardim. Estavam cansados de receber beliscões em suas bochechas e cafunés nos cabelos. A grande família era por demais carinhosa.
(Enrico sorrindo) Você viu tia Marianna? Parece que ela comeu todo o espaguete da Itália! Deve ter engordado uns duzentos quilos!!
O irmão fez um beicinho adorável, enquanto cruzava os braços.
(Carlo) Ela me deu um beliscão tão forte que minhas bochechas doem até agora!! Deve estar um vermelhão!!
Enrico aproximou o rosto e depositou um beijinho na marca avermelhada do beliscão.
(Enrico) Você está adorável...
(Carlo sorrindo) E você não está menos do que eu!!
A festa estava toda concentrada no interior da mansão, ou seja, o jardim se encontrava vazio.
Ambos iam caminhando sobre a grama verdinha, escurecida pela noite sem lua. Quando com certa surpresa, ouviram passos que se aproximavam.
(Enrico) Deve ser papa...
Notaram meio apavorados que dois homens usando roupas negras e com os rostos cobertos por máscaras se aproximavam, levando panos em suas mãos.
(Carlo) Enrico...
O pânico os congelou por alguns segundos, mas foi tempo suficiente para que os vilões conseguissem se aproximar o bastante para cobrir-lhes os narizes com os panos, embebidos em clorofórmio, fazendo com que desmaiassem.
A segurança reforçada cometera um erro.
oOo
O primeiro a acordar fora Enrico. O italianinho abriu os olhos, sentindo uma forte dor de cabeça, e uma leve tontura. Tentou levantar-se, mas viu que não podia: tinha os pés e as mãos amarradas.
(Enrico) !!
Reparando com mais calma, notou que estava dentro de uma espécie de caminhão. O local era escuro, mas estavam se movendo. Podia sentir os sacolejos do veículo e ouvir o som do motor.
(Enrico) Carlo!!
Forçou os olhos, tentando fazê-los se acostumar com a penumbra do caminhão baú. Seu desespero crescia ao pensar que algo de ruim poderia acontecer ao gêmeo.
Foi com alívio indescritível que reconheceu as formas familiares do irmão, deitado do outro lado do caminhão.
Com dificuldade, Enrico se arrastou até alcançar Carlo, observando-o cuidadosamente, e respirando fundo ao ver que ele parecia bem, apenas estava desacordado.
Só então o garoto se permitiu pensar em toda a situação. Haviam sido seqüestrados, e ele não tinha idéia de quanto tempo se passara, nem desconfiava de quem poderia ser o vilão por trás daquilo tudo. Sabia apenas que estavam encrencados.
Só algum tempo depois foi que Carlo despertou, mostrando-se tão confuso quanto Enrico, só que mais assustado ainda.
(Enrico) Você tem que ser forte, Carlo!
Mas o outro começara a chorar, sentindo tanto medo...
(Enrico) Carlo... eu preciso de você! Sei que a situação não é boa, mas não me deixe sem apoio!!
O gêmeo ergueu os olhos negros, marejados de lágrimas, e fitou Enrico, fungando de leve.
(Carlo) Você não está com medo?
(Enrico) Claro que estou!! Mas eu tenho você ao meu lado, então, vou tentar ser forte para protegê-lo, está bem?
(Carlo sorrindo) Eu também vou protegê-lo, Enrico!! Juro que vou!!
(Enrico) Papa vai nos salvar, você vai ver.
Mais confiante o italianinho balançou a cabeça concordando.
oOo
O caminhão só parou horas depois, para alívio dos gêmeos, que não agüentavam mais ficar naquelas posições.
Os seqüestradores abriram as portas do caminhão, e puxaram os garotos, levando-os para dentro de uma cabana escondida no meio de uma floresta.
Foram colocados em uma sala, e trancados lá, ainda amarrados.
(Carlo) Enrico... eu não quero ficar com medo... mas... mas...
(Enrico sorrindo) Carlo... eu não queria que você passasse por isso...
(Carlo) Mas você ficaria só...
(Enrico) E sofreria tudo sozinho, para não vê-lo chorando.
(Carlo) Oh, não vou chorar mais! Se você tivesse sido trazido sozinho, eu não agüentaria ficar só com papa e mama...
(Enrico)...
(Carlo) O que quer que aconteça, não pense mais assim. Aonde você for, eu irei também! Ouviu?
(Enrico sorrindo) Sim... irmão.
Mas a verdade é que Enrico estava tão temeroso quanto o gêmeo, apenas não se permitia demonstrar o medo, porque sabia que isso assustaria Carlo ainda mais.
oOo
Apenas horas depois foi que os seqüestradores voltaram. Entraram na cabana, indo até a sala, onde Enrico e Carlo estavam. Eram três bandidos dessa vez.
O mais alto, que parecia ser o líder, retirou a máscara e sentou-se em frente aos dois irmãos.
Era um tipo alto e forte, de tronco largo, e descendência aparentemente irlandesa.
(Vilão) O pai de vocês está desesperado. Ofereceu recompensas milionárias para quem os encontrasse...
(Enrico)...
(Carlo chorando) Papa...
(Vilão) Essa é uma luta dura, a liderança da facção está em jogo... não é nada pessoal, garotos.
(Carlo) !!
(Enrico) Você é rival de papa...
(Vilão) Isso é uma coisa que vocês não precisam mais saber.
Puxou um canivete, assustando os dois garotos. Mas o homem usou a arma para soltar as pernas e as mãos dos gêmeos. Depois se ergueu.
(Vilão) Seu pai deve muito para a minha família. E eu vim cobrar a divida.
Sacou um revolver, apontando-o para os gêmeos.
(Enrico) Não!
Entrou na frente de Carlo, protegendo-o com o próprio corpo.
(Carlo) Enrico...
(Vilão) Venham comigo.
(Enrico) !!
Abraçou o gêmeo, e ambos seguiram aquele cara estranho, saindo para o quintal. Começava a escurecer novamente... a escuridão criando sombras sinistras no mato que cercava a região.
Os seqüestradores caminharam até um poço, encoberto parcialmente por uma moita.
(Vilão) Agora eu vou terminar com isso.
Usou a arma para acertar um golpe de leve na nuca de Carlo, fazendo-o tontear.
(Enrico) Não!!
Mas o italiano foi firmemente preso por um dos comparsas que ainda usava máscara. Diante do horror de Enrico, o chefe do grupo pegou seu irmão nos braços e o colocou sobre a borda do poço, fazendo com que o gêmeo caísse lá dentro.
(Enrico) NÃÃÃÃÃÃOOOOO!!
O garoto usou toda a sua força para livrar-se do aperto dos braços do cara mascarado, e sem pensar duas vezes correu até o poço, saltando atrás de Carlo. Os vilões acompanharam aquela cena mal acreditando em tamanha coragem.
(Vilão) !!
O cara aproximou-se da borda, e apontando o revolver disparou os seis tiros contra a escuridão reinante lá dentro.
Por um segundo apenas escutaram, mas o silêncio era total. Satisfeitos, os três deram as costas ao poço, e se afastaram dali.
O poço não era muito largo, mas era suficiente para acomodar dois garotos magrinhos.
Logo que Enrico mergulhou atrás do irmão, pode visualizar o corpo do mesmo flutuando sobre as águas turvas, cheias de folhas apodrecidas.
Carlo estava meio tonto devido a pancada recebida na nuca, e se afogaria. Mas felizmente Enrico o alcançou antes que o pior acontecesse. Logo tomava o gêmeo nos braços, apertando-o com carinho.
(Enrico) Carlo... você está bem?
Nesse instante ouviram a primeira detonação. Enrico percebeu que os seqüestradores estavam atirando neles! Sua preocupação foi cobrir o irmão, com seu próprio corpo, protegendo-o o das entonações.
Duas balas se perderam nas águas escuras, inofensivas para os dois irmãos. Mas as outras quatro não tiveram o mesmo destino: Enrico recebeu os quatro balaços nas costas, pego em cheio.
Estremeceu, sentindo uma dor forte, seguida de uma queimação terrível.
(Enrico) Carlo...
Apesar da dor, não soltou o corpo do irmão.
Carlo balançou a cabeça, recuperando os sentidos lentamente. Olhou para a face contraída de Enrico, notando o filete de sangue que escorria pelo queixo de quem tanto amava.
(Carlo) ENRICO!!
(Enrico) Eles me acertaram...
A voz saiu fraquinha, baixinha...
Carlo se desesperou, livrou-se do abraço apertado, e inverteu as posições, tomando Enrico entre seus braços.
(Carlo) Agüente firme!!
Enrico sorriu de leve, e moveu a mão, segurando fracamente no rosto do gêmeo. Carlo se viu preso pelo olhar profundo do gêmeo, e Enrico refletia tanto amor nas íris negras, que o gêmeo menor sentiu uma leve tontura.
(Enrico) Sobe...
E indicou as paredes do poço com a cabeça.
(Carlo) !!
(Enrico) Você consegue... vai...
A água estava gelada, e chegava quase ao meio do poço, obrigando os dois gêmeos a se esforçar para não afundar. Carlo estremeceu ao simples pensamento de abandonar o irmão naquele lugar horrível, escuro e frio.
(Carlo) Não... não!!
(Enrico) Vou... ficar muito... tris... te... se você... mor... rrer aqui...
O italianinho começou a chorar, incapaz de conter o tremor por todo o corpo, e o pânico que ameaçava dominá-lo.
(Carlo) Nunca! Prefiro ficar com você! Não me peça para abandoná-lo aqui, Enrico, eu nunca faria isso! Eu te amo!!
Ao ouvir isso, Enrico começou a chorar também. Não sentia mais dor, apenas uma fraqueza que ameaçava jogá-lo em um mar de escuridão, envolvendo-o no manto da morte, arrebatando-o dos braços quentes de Carlo.
Os gêmeos se fitaram por um segundo. O amor fluindo de seus corpos, de seus pensamentos, alcançando um nível que a simples compreensão humana não seria capaz de entender.
Amor, apenas amor.
(Enrico) Eu... também... t... te... a...mo... tan...
Não pode completar a frase. Estava morto.
Carlo apertou o corpo do irmão nos braços, sentindo o restinho do calor tão familiar, que se esvaia, roubado pela morte, e pelas águas turvas daquele poço. O choque foi tão grande, e a dor tão insuportável, que o italianinho simplesmente perdeu a voz e a razão.
Não podia continuar o caminho sem Enrico. Essa era uma possibilidade que ele jamais levaria em consideração.
Passou a mãozinha fria pelos cabelos molhados do irmão, na última caricia de amor. Não havia mais nada no mundo pra ele, agora que perdera a única pessoa que amava mais que própria vida.
Sentindo que o frio da água escura estava lhe congelando lentamente, Carlo sorriu, sentindo o gosto salgado das próprias lágrimas que escorriam pela bela face. Aquelas lágrimas eram as únicas coisas quentes dentro de si. Tudo o mais se perdera, no momento em que Enrico parara de respirar.
(Carlo) Eu te amo tanto...
Tudo o que seu coração desejou foi a morte! Pediu pela morte, em uma prece desesperada e ardorosa. Não havia mais esperança pra Carlo.
Então parou de se esforçar, relaxando o corpo, permitindo que as águas escuras o tragassem. Ambos afundaram no poço, juntos. E foi assim, juntos e abraçados, que alcançaram o fundo lodoso, onde seus corpos descansariam por toda a eternidade.
oOo
(Enrico) Eu queria que você se salvasse, irmão... mas por outro lado, queria que ficasse comigo.
(Carlo) Essa foi a escolha mais fácil da minha vida: abandonar você e sair do poço... ou... segui-lo, Enrico.
(Enrico) Eu nem imaginava que pudéssemos ficar juntos, mesmo depois da morte, mas para mim, isso é o que importa. Estar vivo... ou estar morto... não é a questão. Estar com Carlo é que me faz feliz.
(Aya) Essa história...
O ruivo estava emocionado, embora não demonstrasse. Aqueles gêmeos tinham um passado muito triste... se todos os outros garotos fossem assim...
(Shouji) Enrico e Carlo estão presos por uma amarra indestrutível. O amor foi tão forte, que um morreu pelo outro e um não sobreviveu sem o outro.
(Aya)...
(Enrico) Mesmo esse julgamento, só me importa porque Carlo está comigo.
(Carlo) Eu te amo tanto...
(Aya) E os outros?
(Shouji) Você tem que perguntar a eles. Apenas eles podem decidir se aceitam ou não revelar suas histórias.
(Aya) E você, Shouji? Também está morto?
(Shouji) Ainda não.
(Aya surpreso) Ainda?
(Shouji sorrindo) Minha vida está nas mãos de Yohji. Apenas ele pode me salvar ou... me condenar...
Olhou na direção da cama, onde o playboy ainda estava deitado, adormecido. Aya não havia entendido bem aquela frase de Shouji. O garoto japonês viu as dúvidas que brilhavam nas íris violetas e sorriu.
(Shouji) Aya, todos estão arriscando algo neste jogo, não apenas Yohji. E de todos, eu sou o que tem mais a perder.
(Aya sério) Quem é você, Shouji?
Shouji fixou os olhos em Aya, e sorriu de modo diabólico. Era a primeira vez que o ruivo via aquele tipo de sorriso na face sempre tão controlada do jovem japonês.
(Shouji) Eu sou o Domador, Aya. Sou aquele que recolhe as almas... e as salva...
Continua...
