Título: O julgamento das sete mortes
Ficwriter: Kaline Bogard
Beta: Akemi Hidaka
Classificação: yaoi, sobrenatural
Pares: YohjixKen
Resumo: O que parecia um inocente pedido de ajuda transforma a vida de Yohji numa corrida contra o tempo.
Records of 2004 a.C.
O julgamento das sete mortes
Kaline Bogard
Capitulo 17
Kimitsu
(Omi) Tenho 98 do arquivo desvendado. Mais algumas horas e saberemos o que eles escondem com tanto afinco.
(Yohji) Deve ser algo importante.
(Ken) Aya, vira a esquerda no próximo desvio.
(Aya) Hn.
Os quatro rapazes estavam em um conversível, se dirigindo para Kimitsu. Eles haviam viajado de avião até o distrito de Fukuda, e alugado um carro com intenção de percorrer a pouca distância que os separava de seu real destino.
Aya dirigia o tempo todo, sob supervisão de Ken, que ia ao seu lado segurando um mapa do caminho. Omi estava no banco de trás, com Yohji. O loirinho se entretinha em aguardar que a etapa final de sua tarefa se acabasse: faltavam apenas 2 para descobrir as informações contidas naqueles arquivos secretos.
Yohji permanecia muito quieto, pensativo. Apenas de vez em quando é que pronunciava alguma palavra, pra mostrar que prestava atenção nas conversas curtas que aconteciam em grandes intervalos de tempo.
Desde o dia anterior, o direito do julgamento pertencia a Miguel, mas o garoto mexicano, que Yohji não conhecia ainda, se mantinha em silêncio, sem tomar nenhuma iniciativa. Isso deixava o playboy muito cabreiro.
Havia visto esse Miguel logo após o teste dos gêmeos, quando todos os jurados se reuniram na sala da casa dos Weiss, só que não tivera tempo de formar uma opinião a respeito daquele moleque. Na verdade mal se recordava da face dele...
Meio perdido em pensamentos, o ex-detetive suspirou profundamente e voltou os olhos verdes pra paisagem lá fora. Nunca fora a Kimitsu antes, se bem que não se tratava de uma viagem de passeio...
(Ken) Está tudo bem, Yohji?
Aquele suspiro soara bem melancólico...
O loiro sorriu e deu uma esticada no corpo. Sorte que era um conversível, e a capota estava erguida, assim não precisaria se contorcionar todo pra espantar a preguiça. Depois cruzou os braços atrás da cabeça, de modo descuidado.
(Yohji) Não se preocupe. Só to um pouco cansado, mas todos estão. Essa viagem não foi brincadeira. Aliás, quer que eu dirija um pouco, Aya?
(Aya) Não.
(Yohji)... você é quem sabe...
(Aya) Omi, as reservas no hotel estão confirmadas?
(Omi) Er... na verdade não é bem um hotel, e sim uma pousada. Kimitsu é tão pequena que não possui hotéis.
(Aya)...
(Yohji) Obrigado por tudo, pessoal.
(Aya) Obrigado você pelo passeio.
(Yohji) ??
(Aya) Todas as despesas serão descontadas do seu salário.
(Yohji) !!
(Ken rindo) Vai ter que trabalhar um ano pra poder pagar tudo! Hi, hi, hi...
(Yohji) Ainda bem que eu tenho de quem emprestar...
Disse isso olhando diretamente para o chibi, mas Omi não deixou barato.
(Omi sorrindo) Claro que eu empresto... depois que você PAGAR o que JÁ me deve... será um prazer...
(Yohji)... deixa pra lá...
Era um dos poucos momentos de descontração desde que partiram de Tokyo. A preocupação era grande, e Aya sabia que Yohji não estava muito bem, apesar de tentar passar aquela descontração toda.
O objetivo do loiro era tranqüilizar o moreninho... mas a perspicácia de Aya já havia sacado tudo. Claro que não iria se meter, pois aquele relacionamento não lhe dizia respeito. Já não basta ter se envolvido tanto...
Não que se arrependesse de ter ido tão longe, pelo contrário. Aya não se arrependia de nada que havia feito na vida, apenas do que NÃO fizera... e também, já estava ali, quase chegando em Kimitsu... agora não tinha mais volta.
(Ken) Aya, a entrada de Kimitsu é pela saída da rodovia 52. Estamos a cinco minutos dela.
(Aya) Hn.
Era quase noite. Silenciosamente os Weiss concordavam em chegar na cidade e ir direto para a pousada com intenção de descansar, e no dia seguinte se dedicariam as buscas.
De fato o ruivo encontrou a saída da rodovia sem problema algum. Logo puderam divisar os contornos das residências que se entrecortavam contra o céu sombrio da noite.
Não havia ninguém na rua, apesar de não ser tão tarde assim. Com certeza era um dos hábitos do povo do interior.
Encontrar a pousada foi muito mais fácil, visto que a mesma se encontrava na rua principal, a que dava acesso a cidade. Os quatro foram atendidos por uma mocinha muito jovem, provavelmente filha dos donos do local.
A garota olhou meio desconfiada para os quatro, surpresa por confirmar a reserva de dois quartos de casal... mas ali havia quatro homens...
Apesar da desconfiança, a jovem estava muito bem instruída. Logo se refez entregando as chaves dos quartos números 11 e 12 e indicando aos Weiss como chegar aos aposentos. Naquela pousada não existiam carregadores nem elevadores, por isso os quatro tiveram que subir três lances de escadas carregando as próprias malas.
Chegando no corredor onde se encontravam os referidos quartos, Aya voltou-se para Yohji e Ken.
(Aya) Amanhã de manhã vamos à casa dos pais de Shouji. Eu estou com o endereço aqui comigo.
(Yohji) Ok.
(Ken) Entendido.
(Aya) Se Miguel tentar alguma coisa, nos avise imediatamente.
(Ken) Não se preocupe. Ele que tente algo suspeito e vai ver só.
(Aya)...
O ruivo entenderia aquilo como um sim... estava cansado demais pra perder tempo tentando colocar na cabeça daquele moleque que ele não podia controlar o maldito jogo, e que Miguel TENTARIA algo suspeito, porque era justamente pra ISSO que ele era um dos jurados.
Martelar naquela tecla por mais uma vez seria desgastante, cansativo e o ruivo arriscava dizer: inútil.
(Yohji) Boa noite, carinhas.
(Omi) Boa noite, Yohji! Boa noite Ken!!
(Ken) Até amanhã!!
Yohji puxou o moreninho pelo braço e entrou no quarto nº 11, que ambos dividiriam, enquanto Aya e Omi sumiam pela porta do quarto nº 12.
oOo
No outro dia, Yohji e Ken se dirigiram juntos para a recepção, e logo descobriam que a pequena pousada fornecia café da manhã em um restaurante montado no próprio local.
Encontraram com Aya e Omi que já estavam sentados em uma das mesas, aguardando que lhe servissem o café.
(Yohji) Bom di...
Calou-se ao ver a expressão desanimada do loirinho.
(Ken) O que houve, Omi? Vocês...
Ia indagar se os dois haviam brigado, mas calou-se diante do olhar irritado que recebeu do líder da Weiss. Sua intuição lhe disse que não era bem aquilo...
(Omi) Sinto muito, Yohji...
(Yohji)...
(Omi) Terminei de desvendar os arquivos, mas... mas...
O jovem arqueiro suspirou. Não havia muita coisa intacta. O próprio arquivo estava todo deteriorado. Conseguira encontrar muitas páginas corrompidas, mas poucas frases coerentes.
Omi sentia-se um inútil. Mesmo depois de todo trabalho... não pudera fazer nada.
(Ken) O que foi?
(Aya) Estavam todos corrompidos.
(Omi desanimado) Não existe um meio de recuperar os dados que estavam digitados ali.
(Yohji sorrindo) Não faz mal, chibi. Eu é que tenho de me desculpar, por te dar todo esse trabalho.
(Omi)...
Apesar das palavras sinceras, o loirinho não se sentia melhor. Ele queria mesmo ajudar o companheiro a passar por aquilo, mas fora o único que não fizera algo útil. Até o calado e frio líder da Weiss colaborara com incentivos.
(Aya) Eu já disse para você imprimir as páginas, depois nós as estudaremos com calma.
(Omi) Eu deixei imprimindo no quarto...
(Yohji) Omi, você fez o que era possível. Se dependesse da gente, nunca iríamos descobrir os códigos, e provavelmente acharíamos que se tratava de uma dica importante.
(Ken) Talvez perdêssemos tempo tentando desvendar...
(Omi)...
Até que os dois tinham razão... é, então a presença do chibi tinha certa importância. O loirinho se animou e seu semblante se desanuviou. Nem tudo estava perdido.
Uma outra moça se aproximou, trazendo o café da manhã dos Weiss. Logo eles estavam fazendo a primeira refeição do dia em silêncio, de modo compenetrado.
Estavam sozinhos no restaurante, mas imaginaram logo que não eram os únicos hospedes. Apenas haviam levantado cedo demais.
Mal terminaram de comer e saíram. Tinham que ir atrás dos pais de Shouji.
oOo
Com as indicações da mocinha da recepção, os Weiss não tiveram dificuldades em localizar a suposta casa dos Yasutaka.
Era a última da rua, e tinha a lateral voltada diretamente para as altas montanhas que cercavam o lado sul da cidade. Fora construída seguindo arquitetura das casas mais modernas, e nítida a influência ocidental em cada tijolo erguido. Apesar disso parecia ser muito agradável.
(Yohji) Será aqui?
(Aya) O endereço diz que sim.
(Omi) E agora?
(Ken) Não podemos simplesmente chegar e contar tudo o que está acontecendo... vai assustá-los...
(Yohji) Tem razão...
(Aya) Yohji, faça de conta que é um repórter, interessado em casos antigos.
(Yohji) E como eu explico a presença de vocês três? Serão meus auxiliares?
(Ken) Nós três?!
(Aya) Não. Ken e Omi vão voltar a cidade e nos esperar. Apenas Yohji e eu vamos entrar.
(Ken) Mas...
Recebeu um olhar que não admitia revoltas. Omi já conhecia aquele olhar bem o bastante pra não tentar retrucar. Balançou a cabeça e segurou no braço de Ken, puxando-o de leve.
O moreninho emburrou a cara, mas afastou-se também. A pousada não ficava muito distante. Poderiam fazer o caminho a pé.
Yohji acompanhou a cena com um sorriso divertido, e depois voltou os olhos verdes para Aya.
(Yohji) Espero que eles estejam mesmo aqui... se perdermos essa pista... eu to ferrado!
(Aya)...
O que poderia dizer? Não estava nas mãos dele. Tudo o que o ruivo fez foi aproximar-se da porta e tocar a campainha. Durante alguns segundos nada aconteceu. O líder da Weiss decidiu por tocar mais uma vez, de forma impaciente...
(Yohji) Será que não tem ninguém em casa?
(Aya) Só faltava essa...
Aya estava disposto a tocar pela terceira vez, quando finalmente ouviram o som de passos arrastados, junto com uma voz que resmungava algo ininteligível.
A porta foi aberta, e os dois Weiss se viram cara a cara com uma mulher. A mesma era gorda, tinha a pele extremamente pálida. Os olhos eram azulados e meio embaçados. A idade avançada era denunciada pelos cabelos grisalhos nas têmporas e pela pele do pescoço, que começa a enrugar.
(Mulher) Pois não?
(Yohji) Boa tarde... meu nome é Yohji Kudou, e eu gostaria muito de falar com os Yasutaka. A senhora é...
A mulher correu os olhos de Yohji pra Aya. Analisou os dois de maneira desconfiada.
(Mulher) Meu nome é Momnika. Por acaso o senhor é quem?
(Aya irritado) Os Yasutaka moram aqui?
(Momnika) Nyoko Yasutaka mora aqui sim.
Os Weiss se entreolharam. O alívio brilhando os olhos verdes de Yohji, e a desconfiança óbvia nos olhos violetas do espadachim.
(Aya) Apenas Nyoko Yasutaka?
(Momnika) Sim. Quem são vocês? Visitas não são bem vindas aqui...
(Yohji) Somos apenas estudantes da faculdade...
Yohji percebeu perfeitamente o olhar irritado do líder da Weiss, por estar indo contra as instruções dele... mas quando o assunto era 'mulher' Yohji entendia muito bem... não importando a idade da mesma... e o loiro sentiu que 'repórteres' não seriam recebidos pela dona da casa.
(Momnika) Estudantes?
(Yohji sorrindo) Sim. Queremos escrever... uma tese... não, um livro sobre o casal Yasutaka e toda essa tragédia horrível que aconteceu a eles.
(Momnika) Oh...
A velha mulher se deixou levar pelo charme inegável do ex-detetive, e acabou se tornando solidária a idéia de um livro sobre sua querida amiga Nyoko.
(Aya) É isso...
O ruivo muito esperto sacara logo qual era a nova estratégia do companheiro, e percebeu que a velhinha cairia fácil naquela história.
(Yohji sorrindo) Coletamos muitos dados sobre eles, mas nada se compara ao ponto de vista de quem passou por tudo pessoalmente...
Momnika balançou a cabeça depressa e sua expressão indicou que caíra no golpe.
(Momnika) Sim, rapaz, foi muito triste, principalmente depois da morte do pobre Takeshi.
Mais uma vez os dois se entreolharam. Informação nova para o andamento do caso.
(Yohji) Sabemos que a situação ficou complicada...
O líder da Weiss cerrou os olhos. Se surpreendia com a flexibilidade daquele loiro. Pelo jeito seria muito difícil Yohji mudar a personalidade...
A velha assentiu e afastou-se, dando passagem para os Weiss.
(Momnika) Venham comigo, por favor. Deixei Nyoko na varanda dos fundos e estava dando um jeito na casa. Eu sou a governanta, vocês sabem...
(Yohji sorrindo) Claro, e parece muito eficiente, por sinal.
Momnika balançou a mão, como se afastasse moscas e começou a caminhar em direção ao interior da casa, sabendo que seria seguida.
Aya e Yohji mal tiveram tempo de admirar a sala, pois a governanta caminhava depressa. Logo saíram em uma bela varanda, bem ao estilo oriental, onde encontraram uma jovem senhora sentada em uma cadeira.
Perceberam de imediato que era Nyoko Yasutaka pois a semelhança com Shouji era inegável. Ela possuía longos cabelos negros, e belos olhos azuis, não tão frios quanto os do filho, porém bem profundos. Aparentava ter mais ou menos quarenta e cinco anos.
Os olhos azuis brilharam de curiosidade ao observar aqueles dois garotos estranhos.
(Nyoko) O que houve, Momnika?
(Momnika sorrindo) Oh, senhora... esses garotos são da faculdade...querem escrever um livro sobre tudo que houve.
A incredulidade cintilou nos olhos da outra. Era óbvio que não cairia naquele golpe com tanta facilidade. Apesar disso indicou duas cadeiras com a cabeça, deixando claro que os Weiss deveriam sentar-se nelas.
(Nyoko) Monm, traga chá para nós, por favor.
(Momnika) Sim, senhora, vou preparar um quentinho... afinal, são universitários, não é?
Com a saída da crédula mulher, Nyoko voltou os olhos para Aya e Yohji e suspirou de forma conformada.
(Nyoko) Vieram terminar o serviço?
A pergunta confundiu os dois assassinos.
(Aya) O que disse?
As íris azuis se desviaram para as montanhas. Só então os dois perceberam que daquele ponto da casa era possível ver muito da paisagem rochosa. Yohji franziu as sobrancelhas ao perceber uma espécie de construção branca despontando na montanha, mas não analisou a mesma por muito tempo. Logo a voz de Nyoko se fez ouvir.
(Nyoko) Vocês não têm cara de estudantes... eu perguntei se vocês vieram acabar o que teve início com a morte de meu marido.
(Yohji) Nós nem sabíamos que seu marido tinha falecido.
Nyoko olhou fixamente para Yohji durante alguns instantes, depois finalmente ela relaxou.
(Nyoko) Parece sincero. Achei que tinham mais jeito de assassinos de aluguel do que de estudantes.
(Aya)...
(Yohji)...
(Nyoko) Como se chamam?
(Yohji) Meu nome é Yohji, e este é Aya.
(Nyoko) O que querem saber?
(Yohji) Esbarramos sem querer na sua história, e de seu filho... por motivo de força maior precisamos saber tudo o que aconteceu com a senhora e seu esposo.
(Aya) Sabemos que Shouji Yasutaka foi raptado quando era quase um bebê... e vocês insistiram em acusar o governo pelo que houve. Depois se mudaram para Endo... tentaram invadir um laboratório...
(Yohji) Por duas vezes... mas falharam, Takeshi acabou preso e depois disso se mudaram pra Kimitsu. Precisamos saber tudo o ocorreu durante esses fatos.
Momnika veio trazendo uma grande bandeja com chá, biscoitos e bolo. Deixou sobre uma mesinha e saiu silenciosamente.
Nyoko serviu uma xícara de chá verde fumegante para os visitantes e uma pra si própria.
(Nyoko) Por favor, sirvam-se.
(Aya) Não, obrigado.
Os dois assassinos preferiram apenas o chá.
(Nyoko pensativa) Porque vocês querem saber de tanta coisa? Mera curiosidade? Acho que não... me surpreende que saibam tantos detalhes... com certeza não são apenas jornalistas.
(Aya) Não somos jornalistas.
Nyoko deu um gole no chá e observou as montanhas mais uma vez. Depois encarou Aya com seriedade. O assassino ruivo percebeu que ela ainda desconfiava de que estavam ali para matá-la.
(Nyoko) Meu filho está lá...
Apontou para as construções brancas que Yohji tinha notado.
(Yohji) Aquilo é...
(Nyoko) Sim, é a Tokyo Bio Technology Center que pertencia a Endo, e se mudou pra cá em 1994.
(Aya) Então vocês os seguiram.
(Nyoko) Takeshi e eu tínhamos um sistema de 'vigilância' sobre a partição de Endo. Conseguíamos vigiar tudo 24h por dia, com ajuda de minha irmã e meu cunhado.
(Yohji) Mais informação nova.
(Nyoko) Quando percebemos que eles estavam se mudando, usamos todas as nossas fontes para descobrirmos o local de destino. Foi assim que viemos parar em Kimitsu. Acho melhor contar tudo desde o princípio.
Voltou a servir chá para os Weiss. Depois reclinou-se na cadeira e relaxou.
(Yohji) Isso é muito confuso.
(Nyoko) Você vai entender. Eu me casei com 20 anos, estava grávida... mas acabei abortando. Meu médico recomendou que eu não engravidasse mais, pois seria muito arriscado.
(Yohji) Mas você insistiu, não é?
(Nyoko) Sim. Takeshi e eu queríamos tanto ter um filho... o nosso filho... eu resolvi que valia a pena tentar... e engravidei pela segunda vez.
(Yohji) Então Shouji nasceu...
Ao ouvir isso a jovem senhora sorriu e lançou um olhar divertido na direção do playboy.
(Nyoko) Você é meio apressadinho, não, garoto?
(Yohji)... é que muita coisa depende disso...
Na verdade a vida dele estava totalmente depositada naquele encontro. Felizmente conseguira encontrar a mãe de Shouji... mas não sabia tudo sobre o ocorrido... não tinha tempo a perder...
(Nyoko) Sei. Mas você se enganou. Shouji não nasceu da minha segunda gravidez. O bebê nasceu morto... foi terrível. Meu marido e eu tínhamos criado tantas expectativas... tantos sonhos...
(Yohji) Sinto muito.
(Aya) Você arriscou.
(Yohji)...
(Nyoko) Por muito pouco não morri. Depois disso o médico me revelou que eu nunca mais poderia ter filhos...
(Aya)...
(Yohji) Mas...
A senhora olhou fixamente para o playboy durante alguns segundos.
(Nyoko) Foi então que a Bio Technology entrou em cena. Meu tio trabalhava nessa organização, e me disse que eles estavam recolhendo voluntários para as pesquisas e que uma em específico poderia me interessar...
(Aya) Começo a entender.
(Nyoko) Não sei o que eles fizeram em meu corpo, pois a despeito de tudo, consegui engravidar e tive uma gestação muito tranqüila. Quando faltavam poucos dias para o nascimento, meu tio descobriu que a intenção do laboratório era tomar a criança de mim... e fazê-la crescer sob estudo dos cientistas envolvidos na pesquisa. Quando Takeshi e eu soubemos disso, nos desesperamos, e fugimos de Endo para Tokyo.
(Yohji surpreso) Vocês já moravam em Endo antes?
(Nyoko) Sim.
(Aya) Tentaram se esconder em uma grande cidade.
(Nyoko) Acertou. A casa estava em nome de conhecidos nossos, e depois de nossa fuga, meu tio desapareceu... nunca mais tivemos notícias dele, desconfio que foi morto... por nossa culpa, mas não há provas disso, já que não existe um corpo...
(Aya) Provavelmente tem razão.
(Nyoko) Shouji nasceu em Tokyo, em casa... e não fizemos o registro do garoto em cartório. Depois que ele foi seqüestrado tivemos muita dor de cabeça para conseguir uma certidão falsa.
(Yohji) Eles demoraram para encontrá-los.
(Nyoko suspirando) Sim, mantivemos o disfarce por quatro anos. E então eles nos encontraram... não sei como... e nem sei porque não nos mataram, mas levaram meu pequeno filho... sabíamos que eles voltariam pra Endo.
(Yohji) Recorreram a polícia antes de mais nada, e não foram ajudados.
(Nyoko) Ninguém acreditou que o Bio Technology estava realmente envolvido. Supunham que éramos um casal buscando nossos cinco minutos de fama.
(Aya) Resolveram voltar pra Endo.
(Nyoko) Fomos para a casa de minha irmã. E de lá começamos a intensa vigília. Takeshi era muito ousado, e tentou invadir o laboratório por duas vezes... e foi pego as duas... acho que não o mataram apenas pra não chamar demasiada atenção sobre o Bio Technology... em 94 eles sofreram um acidente interno e muita gente morreu... foi por isso que fecharam as portas e buscaram novo local em Kimitsu.
(Aya) Como sabe tanto?
(Nyoko) Minha irmã era uma hacker. Não havia sistema que não pudesse invadir ou código que não conseguisse quebrar...
(Yohji) Era?
A expressão da jovem senhora assumiu um tom de desanimada nostalgia.
(Nyoko) Como eu disse, achei que vocês vieram terminar o que teve início com a morte de meu marido... ele foi o primeiro que sofreu as conseqüências: foi fuzilado quando voltava pra casa. Ele tinha passado o dia todo rodeando o laboratório...
(Aya) Começaram a eliminar os integrantes da família...
(Nyoko) Depois foi meu cunhado. Apunhalado pelas costas enquanto trocava informações com uma das secretárias que trabalhava lá dentro e nos vendia dados valiosos. Ela também foi assassinada.
(Yohji) A garota sabia dos riscos.
(Nyoko) Por último foram minha irmã e meu sobrinho. Ano passado, eles foram atropelados enquanto atravessavam a rua, voltando da faculdade.
Ao ouvir isso o ruivo empalideceu um pouco, e cerrou o punho. Sabia perfeitamente o que aquela mulher deveria sentir.
(Yohji) Pobre garoto. Não tinha nada a ver com isso...
(Nyoko) Oh, não... ele tinha dezoito anos, e era um hacker tão bom quanto a mãe. Meu sobrinho também nos ajudava a invadir os sistemas do centro tecnológico.
(Aya) Só sobrou a senhora?
(Nyoko) E Shouji. Meu filho está naquele laboratório, e eu não vou desistir dele. Sei que está vivo, e é por isso que me mantenho aqui. Essa é toda a história.
(Yohji) Incrível. Não era nada do que eu esperava...
(Nyoko) Porque tanto interesse nisso?
(Yohji) Eu fui envolvido nessa história, contra a minha vontade.
(Nyoko) E agora é o fim pra mim? Só vou parar quando morrer... Shouji está muito perto, e sofro por não poder vê-lo... mas um dia eu vou conseguir...
Então ela esticou a mão e começou a mexer em um vaso de flores, uma espécie de samambaia. Do meio das folhagens retirou um potente binóculo, de longo alcance. E um pequeno caderno de notas.
(Aya) !!
(Yohji) A senhora...
(Nyoko) Eu observo esse laboratório dia após dia... sei que vou encontrar a brecha, e conseguirei reaver meu filho.
Aya sentiu que não descobririam mais nada daquela mulher. Haviam finalmente desvendado toda a história de Shouji, porém não significava que o mistério estava acabado, muito pelo contrário... o ruivo desconfiou de que teriam de invadir o tal laboratório pra coletar as peças que faltavam...
Suspirando, o líder da Weiss ergueu-se.
(Aya) Não vamos incomodá-la mais.
(Yohji sorrindo) Obrigado pelo chá. Estava muito bom.
(Nyoko)...
Observou os dois rapazes depositarem as xícaras sobre as mesas.
(Yohji) Até logo.
(Nyoko surpresa) Vocês... não vieram mesmo me... me...
(Aya) Matá-la? Não. Não temos nenhum interesse em sua morte.
(Nyoko desconfiada) Vocês não são estudantes universitários...
(Aya) Não.
O playboy procurou algo nos bolsos, e acabou encontrando o que queria dentro de sua carteira: um pequeno cartão.
(Yohji sorrindo) Somos floristas. Venha nos visitar algum dia.
Entregou o cartão para Nyoko, que leu, revelando a surpresa nos olhos negros.
(Nyoko) "Koneko no Sumu Ie"... bem apropriado... vou acompanhá-los a saída.
Levantou-se e tomou a frente. Os Weiss a seguiram em silêncio. Logo saíram na rua. Nyoko parou embaixo do batente e colocou as mãos sobre os olhos para protegê-los do sol.
(Yohji) Muito obrigado pela ajuda.
(Nyoko) Não creio ter ajudado muito... bem, eu tinha certeza de que vocês iriam me matar... por causa da data de amanhã...
(Yohji) A data de amanhã? O que tem amanhã?
(Nyoko) O aniversário de Shouji... meu filho fará dezenove anos amanhã...
(Yohji) Impossível!
(Aya) !!
(Nyoko) Vocês sabem de algo, não é? Não importa. Se não estão contra mim, estão a meu favor. Sinto que alguma coisa vai acontecer logo... e será muito ruim... tomem cuidado, garotos.
Fechou a porta na cara dos Weiss.
Yohji e Aya se entreolharam. Shouji jamais poderia ter dezenove anos!!
(Yohji) Nossa...
Fez umas contas mentais, percebendo que Emiko estava certo. Se Shouji tinha dezenove anos, e fora seqüestrado com quatro... tudo tinha se passado no ano de 1989...
(Yohji irritado) Ahhhh!! Como pode ser?! É impossível!!
(Aya)...
(Yohji) Jamais vou acreditar que Shouji tenha dezenove anos!!
(Aya) Vamos embora.
O ruivo deduziu que ficar parados na porta da casa de Nyoko Yasutaka não ia ajudá-los em nada. Só torrariam no forte sol que despontava a toda, quase no centro exato do azul celeste.
(Yohji suspirando) As coisas complicaram, não é? Achei que encontrando os pais de Shouji tudo teria um fim...
(Aya) Tudo indica que o final da história está lá.
O espadachim apontou as montanhas, onde sabiam que estava construído o laboratório do governo que tirara Shouji dos braços de seus pais.
(Yohji) Tokyo Bio Technology Center...
(Aya) Vamos invadi-lo essa noite.
(Yohji) Certo...
Um arrepio correu pelas costas do playboy, fazendo-o ter a mesma premonição da senhora Yasutaka. O Weiss loiro sentiu no sangue, que algo ruim ia acontecer...
oOo
Logo que os assassinos mais velhos chegaram à pousada, foram recepcionados por um Omi e um Ken tão sorridentes, que ambos se surpreenderam.
(Yohji sorrindo) Ei, o que houve, Ken? Por que tanta felicidade?
(Omi) Nós sentamos e estudamos todas as folhas impressas do arquivos, e descobrimos algumas coisas interessantes.
(Aya) O que?
(Yohji) Aproveitaram bem a manhã.
(Ken) E depois vamos querer um relatório completo da visita aos Yasutaka...
(Yohji sorrindo) Claro!
(Omi) Vocês sabem que o laboratório de Endo foi fechado em 94 por causa de um acidente interno, não é?
(Yohji) Sim.
(Ken) Mas, descobrimos que a causa do acidente foi... Shouji.
Yohji e Aya se entreolharam. Muita informação fora descoberta nessas poucas horas.
Kimitsu era mesmo a chave de tudo.
(Omi) Aqui estão as páginas que imprimimos. Foram mais de trinta... um relatório extenso...
(Ken) A informação está bem confusa e dispersa, mas desvendamos boa parte das frases cortadas pelo meio.
(Omi) De acordo com a pessoa que escreveu isso, os cientistas tentaram despertar em Shouji um tipo de poder que ele definitivamente não possuía.
(Ken) Algo deu errado. Pessoas morreram, e pelo jeito foi muita gente mesmo.
(Aya) Por isso eles fecharam as portas em Endo.
(Yohji) Se refugiaram em Kimitsu.
Os Weiss estavam reunidos no quarto que Aya dividia com Omi. Trocavam as informações coletadas pela manhã, enquanto aguardavam que o almoço ficasse pronto.
(Omi) Não descobrimos o que fizeram com Shouji, mas é lógico pensar que trouxeram o garoto com eles, não é? Se ele foi à causa direta de tudo isso, os cientistas não o abandonariam em Endo, e a verdade é que Aya estava nas antigas instalações e não descobriu nada sobre essa história.
(Aya) Apenas ruínas.
(Ken suspirando) Ótimo. Sabemos que Shouji tem um tipo de poder, é a única explicação. Mas e os outros garotos? Será que eles faziam parte das experiências em Kimitsu e fugiram com Shouji?
(Yohji) Está aí é uma coisa que ainda não entendo, Ken. Onde esses garotos se encaixam? Por que tudo isso de 'julgamento'. Não era mais fácil dizer toda a verdade, sem rodeios?
Omi olhou para o lado de Aya, mas o ruivo ficou quieto, fez apenas um sinal com a cabeça, quase imperceptível, pedindo que o chibi continuasse guardando segredo sobre os fatos. Ainda havia chances de Yohji ganhar aquele jogo, e o líder da Weiss queria preservar o companheiro de qualquer influência. Começava a desconfiar que o playboy não seria totalmente imparcial, se soubesse de toda a verdade. Era melhor que se calassem, pelo menos por mais um tempo.
(Omi suspirando) Só pudemos apurar isso, de todas as páginas impressas. O experimento que envolvia Shouji falhou. As conseqüências foram terríveis: a morte de muitas pessoas (não temos os dados exatos) e o fechamento da instalação em Endo.
(Yohji) Caralho. A coisa foi feia por lá...
(Aya) Isso foi em 1994? Ele tinha treze anos.
Ken e Omi voltaram os olhos na direção do líder da Weiss, achando absurdo aquilo que o ruivo tinha pronunciado.
(Ken) Ora, Aya. Shouji tem treze anos agora. E na época... na época ele deveria ter... ué...
O moreno fez umas contas mentais mas acabou se embananando todo.
(Omi surpreso) Pela lógica ele teria 3 anos!! Mas isso é impossível, com essa idade ele nem tinha sido raptado ainda!
(Aya) Segundo Nyoko Yasutaka, Shouji completará 19 anos amanhã, dia 02 de fevereiro de 2004.
(Omi) !!
(Ken) Mas que porra é essa?
(Yohji) E isso não é tudo, garotos. Descobrimos que Takeshi Yasutaka está morto. Foi o primeiro a ser assassinado...
Ken e Omi se entreolharam. Pelo jeito ouviriam muitas coisas surpreendentes!
oOo
Horas depois, os Weiss estavam terminando de se aprontar. Os quatro sabiam que só completariam o quebra-cabeças quando reunissem a última peça que faltava encontrar. E ela estava bem escondida no laboratório da Bio Technology .
(Omi) Aya... você acha que está certo escondermos as coisas de Yohji? Isso pode prejudicá-lo...
(Aya sério) A única exigência que Shouji me fez foi que não revelasse nada a Yohji. Na última vez eu pretendia contar tudo, porque pensávamos que o idiota não havia passado na prova dos gêmeos. Agora é diferente...
(Omi) Se você diz.
(Aya) Faltam apenas dois jurados. Creio que temos chances.
(Omi) Está na hora, Aya. Vamos ver se eles já se aprontaram?
(Aya) Hn.
Rumaram para o quarto dos companheiros, e depois de dar duas batidas na porta, entraram.
Yohji terminava de fechar o longo sobretudo escuro, enquanto Ken dava um nó nas mangas do casaco que prendera na cintura.
(Ken) Estamos prontos.
Os quatro se olharam em silêncio. Sabiam que arriscavam muito naquela invasão... não tinham um plano bem definido, não conheciam a estrutura do laboratório... nem faziam idéia de quantos guardas poderiam haver lá dentro...
Contavam apenas com o laptop do loirinho, e com suas habilidades de assassinos bem treinados. O que já era muita coisa, diga-se de passagem. Só que nenhum dos quatro se sentia a vontade para confiar apenas na sorte...
(Aya) Vamos logo.
Yohji tomou a dianteira e abriu a porta. Levou um susto ao dar de cara com um garoto estranho parado a frente do quarto. O rapaz era alto, da mesma estatura de Aya, tinha cabelos encaracolados e escuros, e belos olhos verdes, contrastando com a pele morena.
(Yohji)...
(Miguel) Chegou a hora... muchacho... é a minha vez de julgá-lo.
Continua...
