Título: O julgamento das sete mortes
Ficwriter: Kaline Bogard
Beta: Akemi Hidaka
Classificação: yaoi, sobrenatural
Pares: YohjixKen
Resumo: O que parecia um inocente pedido de ajuda transforma a vida de Yohji numa corrida contra o tempo.
Records of 2004 a.C.
O julgamento das sete mortes
Kaline Bogard
Capitulo 19
Tokyo Bio Technology Center
(Ken) NÃO!!
(Shouji) !!
(Ken) Não vou permitir que Yohji morra!!
Agarrando o japonês pelos pulsos, forçou-o a encostar a mão no peito de Yohji novamente, fazendo-o estremecer ao receber aquele 'choque'.
(Shouji) Ken...
(Ken) Yohji, se você me deixar agora... eu não vou perdoá-lo!!
(Aya) Omi, traga toalhas limpas e um pouco de água. Vou pegar remédio no banheiro.
Vira que algumas partes do sobretudo negro de Yohji estavam retalhadas, com certeza por causa dos dentes afiados daqueles cães famintos. Isso significava que o 'julgamento' tinha sido mais real do que os anteriores...
(Omi) Ok. Já volto.
(Shouji) Ken, o que está fazendo? Deixe-o...
(Ken furioso) Cale-se!! A culpa é sua!! Eu devia ter adivinhado... quando você veio com aquele papo furado na Koneko!!
(Shouji)...
(Ken) Vamos lá, Yohji... não me decepcione...
Apesar das palavras de encorajamento, o próprio moreninho estava desistindo da batalha... seria mesmo o fim? Perderia a pessoa mais importante da sua vida daquela maneira estúpida?!
Prendendo a respiração, Ken abaixou a cabeça e encostou-a no tórax de Yohji. Foi então, pra sua surpresa, que escutou o coração do loiro batendo... sim, batendo muito rápido!! A surpresa aumentou, quando o jogador sentiu uma mão pousando cuidadosa sobre sua cabeça.
(Ken)...
(Shouji) Oh...
O japonês mal acreditou em tamanha garra e força de vontade em sobreviver. Seria mesmo apenas a força de Yohji? Ou Ken era o apoio que lhe dava tanto apego a vida?
Ken ergueu-se e empurrou Shouji pra longe. Depois passou os braços em volta do amante, apertando-o com força.
(Ken chorando) Yohji! Nunca mais me de um susto desses? Ouviu?!
O loiro balançou a cabeça dizendo que 'sim' e escondeu o rosto no peito do jogador, começando a chorar baixinho.
Preocupado, Ken começou a alisar os cabelos loiros e macios, tentando acalmá-lo ao menos um pouquinho.
(Yohji) Eles... esses garotos estão... todos...
Ken apertou os braços ainda mais. Adivinhara o que Yohji queria dizer. Shouji e os outros estavam mortos. Realmente mortos... sabendo disso as coisas finalmente ganhavam um outro sentido.
Aya entrou no quarto, reparando que Yohji havia despertado. Pelo jeito a teimosia de Ken valera de alguma coisa...
O ruivo olhou para Shouji, que permanecia sentado no chão. Aproximou-se dele e estendeu a mão, para ajudá-lo a se erguer.
(Shouji triste) Eu... eu... acho que quase...
(Aya suspirando) Você quase deixou que Kudou morresse, não foi?
(Shouji)...
(Aya) Não tentou trazê-lo de volta de verdade...
(Shouji) Sinto muito... eu o queria tanto ao meu lado que quase cedi a tentação de estragar tudo.
(Aya)... você disse que se ele perder esse jogo, será obrigado a fazer parte do júri, não é? Mas nesse caso, o que aconteceria com a alma dele?
(Shouji)... ficaria junto comigo... todo o tempo que fosse necessário, até a próxima geração, pra ser mais exato.
(Aya) Entendi...
Então Shouji também se rendera ao charme do Weiss loiro. E esse era o real motivo pra tê-lo escolhido, ao invés de qualquer um dos outros três. Pura atração física. Não por que Yohji fosse 'mais forte' ou 'mais fraco' que Aya, Omi e Ken... e sim porque agradara ao garoto japonês.
(Shouji) Melhor que eu vá embora. Aya, recomendo que invadam o laboratório ainda hoje...
(Aya)...
Olhou na direção da cama. Não acreditava que Yohji tinha condições de invadir nada... muito menos essa noite.
(Shouji) Essa noite... haverá uma falha na segurança. Procurem o portão G4Y e sigam pelo corredor cuja luz estará queimada. Eu quase permiti que Yohji morresse, esse é o modo de me regenerar.
Fixou os olhos azuis na cama. Yohji não parecia ter ouvido a conversa trocada entre o garoto japonês e o líder da Weiss. Menos mal.
Omi entrou no quarto, chamando atenção do amante por um segundo. Aya seguiu os movimentos do chibi, que chegava com algumas toalhas e uma jarra de água potável. Quando voltou o rosto, Shouji havia sumido.
(Omi) Aqui estão.
(Aya) Ajude Ken. Precisamos invadir o laboratório essa noite.
(Omi surpreso) Aya, é impossível fazer isso hoje!!
Apontou para a cama.
Yohji não dava mostras de estar se recuperando. Não poderiam obrigá-lo a ir até as instalações e...
(Aya) Tem que ser hoje. Shouji vai facilitar as coisas pra gente. Desconfio que ele também quer que tudo termine o mais rápido possível.
(Omi)...
Ken estava escutando a conversa, apesar de não se pronunciar. Tentava tranqüilizar o amante com palavras carinhosas. Podia sentir que o loiro já estava mais calmo, e não tremia tanto.
(Ken) Está tudo bem, Yohji. Sinto muito por não impedir que você sofresse tanto. Eu tentei, mas...
Ouvindo isso, o playboy ergueu o rosto e procurou sorrir.
(Yohji) Eu... estou bem... apenas... fiquei surpreso em descobrir que...
Calou-se, achando bizarro demais o que estava prestes a dizer. Soava tão irreal, que seria ridículo, se não estivesse mesmo acontecendo com ele.
(Ken) Estão todos mortos.
(Yohji)...
(Omi) Deixe-me ver isso, Yohji.
Referia-se as feridas do Weiss loiro, causadas pelos dentes dos cães selvagens.
O playboy olhou para o próprio corpo, empalidecendo ainda mais ao ver as marcas de mordidas no longo casaco. Em alguns pontos o pano havia sido estraçalhado e era visível partes da pele branca que sangrava devido as dentadas.
(Yohji)...
Pelo jeito o elo com o julgamento fora profundo.
(Ken) É preciso dar um jeito.
Pegou o vidrinho de remédio das mãos de Omi e começou a cuidar dos ferimentos.
No quarto reinava um silêncio pesado, incômodo. Agora todos os Weiss sabiam da verdade, e dois deles tinham certa dificuldade em aceitar os fatos.
(Yohji pensativo) Estão todos mortos... ai!!
(Ken) Desculpa.
(Omi) O que faremos?
(Yohji) Falta apenas um jurado... estamos muito perto de acabar com isso...
(Ken) Yohji, você não está bem. Precisa descansar pelo menos essa noite.
(Yohji) Ai...
Estremeceu ao recordar do terrível julgamento. Tinha certeza de que teria pesadelos com a cena por muito tempo. Aquilo nunca se apagaria de sua memória.
(Ken) Não deve fazer isso, Yohji.
(Aya) Shouji prometeu nos ajudar essa noite.
(Omi) Mas, Aya...
(Ken) Não adianta nada forçar uma situação que já é muito complicada.
(Yohji) Calma. Devemos aproveitar essa oportunidade.
(Omi)...
(Ken irritado) Yohji, não seja teimoso. Foi por causa disso que acabou caindo na conversa fiada de Miguel e tendo que passar por todo aquele sofrimento.
(Yohji)...
Não podia rebater os argumentos. Ken estava certo.
(Ken) Depois eu é que levo a fama de inconseqüente.
(Yohji suspirando) Já entendi, Ken.
(Aya) Decida-se, Kudou. O que você vai fazer?
O ruivo não queria obrigar Yohji a nada, mas tinham que tomar uma decisão rápida. A noite já ia alta, e se fossem invadir o laboratório não poderiam perder mais tempo.
(Ken) Descanse, Yohji. Por favor...
(Yohji) Ken, quero acabar com isso. Não agüento mais...
(Ken)...
No fundo o moreninho entendia que não era fácil para o amante passar por aquilo. E Yohji não estaria sozinho durante a invasão. Ken, Aya e Omi estariam com ele o tempo todo.
(Omi) Tem certeza?
(Ken) Vai ficar tudo bem.
Omi e Aya olharam para o moreninho. Ambos tinham certeza de que Ken colocaria obstáculos para a incursão que pretendia realizar. Mas o jogador se conformara muito fácil.
Provavelmente Ken também estava cansado.
(Aya) Terminem logo com isso. Não há tempo a perder.
(Yohji suspirando) Custo a crer que estejam... er... mortos...
O espadachim suspirou e sentiu os grandes olhos de Omi fixos em sua pessoa. Compreendia que o amante não permitiria que continuasse omitindo as informações de Yohji por mais tempo.
(Aya) Kudou, você precisa saber de uma coisa...
Respirou fundo duas vezes antes de começar as revelações. Teria que falar muita coisa, e não estava acostumado a diálogos extensos...
Yohji fixou os olhos cor de jade na face do líder da Weiss. Sabia que quando Aya falava, era pra ser ouvido com atenção.
oOo
Ken aproximou-se de Yohji mais uma vez, pra ter certeza de que ele estava bem. Apesar de tudo o que enfrentara a poucas horas atrás, o amante dava mostras de agüentar firme, e se recuperar rápido.
Yohji ia muito pensativo. Não culpava Aya e Omi por manterem segredo sobre tudo que envolvia Shouji e os outros. Nenhum dos dois era obrigado a ajudá-lo, e não saber de tudo aquilo não lhe atrapalhara em nada... então ele que não ia perder tempo com recriminações.
Agora ele descobrira qual era o objetivo daquele julgamento...
Levou a mão ao abdômen, lugar onde recebera a primeira mordida, e que estava mais dolorido. Quase fez uma careta de dor, mas lembrou-se a tempo de que Ken estava prestando atenção em si, e se fraquejasse por um segundo, o moreninho o obrigaria a voltar para a pousada.
Omi sentia-se muito aliviado, por finalmente confessar ao companheiro as informações que fora obrigado a manter em segredo. E tinha certeza de que apesar de não demonstrar, Aya pensava igual.
Os quatro pararam de avançar.
Estavam nas redondezas do laboratório, rodeando-o e buscando o tal portão G4Y. Sem nenhum problema encontraram a entrada.
(Ken desconfiado) Muito fácil...
Não haviam guardas nem vigias. A grade de proteção naquele ponto se mostrava enferrujada e meio corroída. Um golpe da magnífica katana de Aya e não havia mais obstáculos.
Da cerca de arame à pequena porta lateral de entrada eram cerca de vinte metros, que foram facilmente vencidos pelos quatro assassinos. Depois da pequena corrida, Yohji encostou-se contra a parede muito branca, sentindo uma irresistível vontade de deixar o corpo escorregar, e sentar-se no chão de cimento.
Sua perna começava a doer muito, tanto no local em que a 'quebrara' quanto próximo ao tornozelo, onde o 'pai' de Miguel segurara tão brutalmente ao arrastá-lo pelo chão.
Ken adivinhou os pensamentos do ex-detetive e segurou-lhe o braço com delicadeza.
(Ken) Agüente firme, Yohji. Mas se não der, a gente volta...
(Yohji) Não.
Por nada desse mundo desistiria. Havia ido longe demais. Sabia que o fim não ia longe... as palavras de Nyoko Yasutaka ressoando em sua mente... algo ia acontecer... algo ruim... não. Algo ruim já tinha acontecido. O playboy tinha quase certeza de que uma descoberta boa aguardava por ele. Yohji tinha que acreditar nisso!
Aya tomou a dianteira e abriu um pequeno painel que se encontrava ao lado da porta G4Y.
(Aya) Precisa de um código de acesso. Omi...
O jovem hacker se aproximou. Conectou o laptop ao painel e iniciou a discreta invasão, tentando descobrir a senha que abria aquela porta.
(Omi) Descobri!!
A porta se abriu silenciosamente. Cheio de precauções, o líder da Weiss entrou na instalação, deparando-se com um longo corredor. Todas as luzes estavam queimadas.
(Aya) Venham.
Os quatro assassinos seguiram em frente, sempre alertas. Mas contra tudo o que seria de se esperar, o silêncio reinava. Não haviam guardas nem alarmes, nem câmeras de segurança.
(Yohji baixinho) Parece abandonado.
(Omi baixinho) Não creio que esteja...
Nesse ponto o corredor se bifurcava: a passagem da esquerda estava as escuras, enquanto a da direita se mostrava iluminada. Os Weiss tiveram a impressão de ouvir passos vindo da direção da luz.
Aya lembrou-se das palavras de Shouji, "Procurem o portão G4Y e sigam pelo corredor cuja luz estará queimada.".
(Aya baixinho) Virem a esquerda.
Obedeceram sem questionar.
(Yohji baixinho) Esse lugar me dá arrepios...
O silêncio total e o caminho escuro eram frios e indiferentes a passagem dos assassinos, como se fossem apenas mais um complemento ao cenário de Shouji.
Com certeza era o 'climax' que faltava para tudo se tornar um filme de terror. Tinham assassinos, laboratórios secretos, mortes e até mortos-vivos...
(Yohji pensativo) É quase um plágio de Resident Evil...
Os outros olharam para o playboy, mas não disseram nada. Mais uma vez o corredor se dividiu em dois. No entanto a passagem que estava mergulhada na escuridão era a da direita.
(Ken baixinho) Dá a impressão de que estamos sendo guiados...
(Yohji)...
(Aya) ESTAMOS sendo guiados...
Às vezes o ruivo não tinha muita paciência com as coisas idiotas que aquele jogador formulava.
(Omi baixinho) Ken, Shouji disse que deveríamos seguir o corredor que estivesse tudo escuro.
(Ken baixinho) Ah, é... verdade...
O silêncio se abateu sobre eles mais uma vez. Conformaram-se em apenas seguir a escuridão, evitando encontrar-se com as pessoas que supostamente trabalhavam ali. E a única explicação possível para tal fato era que o garoto japonês interferira de modo sobrenatural nos acontecimentos. Não era a justificativa mais aceitável do mundo, no entanto só tinham a esse argumento.
Finalmente o corredor terminou de modo abrupto, sem nenhum aviso prévio. E o fim do caminho levava a uma única porta.
(Yohji) Ali...
Em cima da porta estava marcado com letras negras e de tamanho médio "Projeto 037 – 1985"
(Aya) O ano em que Shouji nasceu.
(Omi) Cuidado pessoal.
Yohji respirou fundo e avançou. Esqueceu completamente das dores que sentia pelo corpo, de toda canseira e receio. Tinha que descobrir o que aquela porta escondia. Necessitava terminar com tudo de uma vez por todas.
A atitude desafiante e de certo modo segura pegou os outros Weiss desprevenidos. Eles observaram enquanto o companheiro caminhava decidido, mas logo reagiram, seguindo em frente, tentando acompanhar os passos velozes, ávidos por respostas.
Sem pensar em mais nada, além de por um fim naquilo tudo, Yohji colocou a mão na maçaneta e a girou, abrindo a porta. Invadiu o local sem se preocupar em tomar qualquer precaução.
(Aya) Idiota!!
(Ken) Yohji não tem jeito!!
(Omi)...
Os três tentaram entrar na sala, mas antes que conseguissem, a porta se fechou com violência, fazendo um grande estrondo e impedindo-os de seguir o Weiss mais velho.
(Ken) Que porra!!Não precisava de mais nada!!
Forçou a fechadura, mas a mesma não cedeu. Yohji estava trancado lá dentro, e a partir de agora tinha que se virar por conta própria.
(Aya) Que seja.
Olhou ao redor, temendo que alguém tivesse ouvido o estrondo. Talvez algum segurança ou vigia. No entanto nada aconteceu.
Suspirando de leve, o ruivo encostou-se em uma das paredes, em frente a porta e cruzou os braços. Não podia fazer mais nada. Omi sentou-se ao chão, ficando do lado do ruivo. Ken pensou em dar uma bicuda na porta de madeira, tentando arrombar a mesma, mas mudou de idéia. Teve a intuição de que seria inútil e esforço desperdiçado.
Não gostava de ficar como mero expectador, mas nesse caso não cabia a ele decidir.
(Ken) Tenha cuidado, Yohji.
oOo
Dentro da sala havia luz. Muita luz.
O playboy cobriu os olhos com as mãos, esperando uns instantes enquanto a retina cor de jade se acostumava a claridade.
(Yohji)...
Olhou ao redor. Mal teve consciência de que estava sozinho ali, sem a presença de seus companheiros. Percebeu que se tratava de um modelo de sala cirúrgica de hospital.
Seus ouvidos treinados captaram o som de um bip, característico de um sistema de suporte vital. Olhou para a direita. Havia ali uma cortina branca, tipo as de um quarto hospitalar.
Avançou devagar naquela direção. Seu coração começou a bater mais depressa, sentiu uma pequenina angústia seguida de certo receio por descobrir o que... estaria oculto por trás daquela cortina.
(Yohji sussurrando) Vamos lá, Kudou... acabe logo com isso...
Alcançou o pano branco e puxou, revelando o que havia lá atrás.
(Yohji surpreso) Caralho!!
Era Shouji que estava lá.
O garoto japonês parecia inconsciente. Tinha uma máscara de oxigênio no rosto e um tubo de soro na veia do braço esquerdo. Seu corpo estava coberto por um lençol branco.
Porém o que chamou mais a atenção do Weiss foi que o corpo de Shouji estava ligado aos aparelhos de suporte de vida.
(Yohji) Como...
Notou pela face pálida que fazia muito tempo que aquele menino não tomava sol.
Deu um passo a frente, aproximando-se mais. Observou um cordão prateado que estava preso no pescoço de Shouji. Com cuidado, o loiro estendeu a mão e segurou a pequena placa.
(Yohji) "Projeto 037 – 1985"... o mesmo que diz em cima da porta.
(Shouji) É assim que sou chamado aqui...
O susto de Yohji foi tão grande que ele perdeu a voz por um segundo. Ergueu os olhos e fitou Shouji, que estava parado a sua frente, do lado oposto ao leito. Depois abaixou os olhos e fitou o outro Shouji, que permanecia inconsciente, deitado sobre a cama.
(Yohji surpreso) Dois Shoujis? Vocês são gêmeos?
(Shouji sorrindo) Não. Somos a mesma pessoa...
(Yohji)...
Shouji aproximou-se do garoto que jazia no leito e tocou-lhe a face, numa carícia cheia de cuidado.
(Shouji) Eu sou ele... esse é o verdadeiro Shouji. Isso que está conversando com você é apenas um 'reflexo' do EU que existe dentro de mim.
(Yohji) Ah... isso vai me dar um nó no cérebro...
Sorrindo, o garoto de olhos azuis balançou a cabeça.
(Shouji) Vou explicar tudo.
(Yohji) Aya e Omi me contaram muitas coisas... tudo o que eles sabem, na verdade.
(Shouji) Ótimo. Isso vai me poupar tempo.
(Yohji) E sua mãe também revelou muitas coisas.
(Shouji) Vou completar as informações que desconhece... ou você não quer saber?
O playboy piscou, surpreso com o tom brincalhão, tão diferente da frieza que sempre acompanhava o garoto.
(Yohji) Sim, eu quero saber.
(Shouji) Aya lhe disse que sou o Domador de almas. Fui criado a milhares de anos atrás, quando as primeiras almas amarguradas surgiram... ao nascer a discórdia entre os homens.
(Yohji)...
O garoto japonês afastou-se do "Shouji" que estava deitado no leito e virou as costas para Yohji.
(Shouji) Dor, lágrimas e sofrimento... são coisas que nasceram com os homens... e vão existir enquanto perdurar a humanidade... uma alma cheia de ódio não consegue renascer e começar uma nova vida. Essa é a minha função: colher as almas, purificá-las através do Julgamento das Sete mortes, devolvendo-as ao caminho certo.
(Yohji) Aqueles garotos estão mesmo mortos.
(Shouji) Oh, sim. Todos eles foram assassinados...
(Yohji)...
(Shouji) Para participar do jogo, cada alma escolhida recebe um 'corpo' provisório. Eu, no cargo de juiz e último jurado, escolho o réu a ser julgado, e eles testam o escolhido para tentar derrotá-lo. Se você perder, Karen, Shou, Enrico, Carlo, Margareth e Miguel poderão renascer. Se você vencer o jogo, eu perderei meus poderes como Domador, e renascerei como uma pessoa normal. Terei que escolher um dos seis para assumir meu lugar e continuar com tudo.
(Yohji) Aya me disse...
(Shouji) Eu gosto muito de ser um Domador. Pois isso é o que dá sentido a minha existência, entende? Por mais que eu deseje renascer como uma pessoa normal, a satisfação de ajudar almas como a de Miguel é muito maior. Para tal é necessário um... sacrifício.
Virou-se e fitou o ex-detetive. Se encararam em silêncio por um instante, que pareceu uma eternidade.
(Yohji)...
O playboy estava sabendo da 'trapaça' que Shouji fazia. Pelo jeito estava tudo ferrado mesmo... ele seria o sacrifício dessa vez.
(Shouji) Você conhece minha história, não é? Eu nasci em 1985 e fui raptado em 1989. Foi uma coincidência que eu nascesse como "Shouji" o fruto de uma experiência proibida. A verdade é que todas as minhas encarnações foram muito interessantes...
Parecia quase uma confissão, dita em tom sonhador.
(Yohji) Então você não tinha que nascer como filho dos Yasutaka?
(Shouji) Oh, não. Claro que não. Foi tudo coincidência, como eu disse.
(Yohji) Isso é injusto com aquela família. Pessoas morreram por sua causa, Shouji.
(Shouji pensativo) Existe algo nessa vida chamado de destino, meu caro. Ninguém pode escapar dele, e com Nyoko e Takeshi não é diferente. Não existem escolhas a não ser trilhar o caminho predestinado pelas estrelas.
(Yohji) Não acredito em destino.
Dando de ombros, o japonês de olhos azuis sorriu.
(Shouji) Não faz diferença. Depois que eu fui raptado em 1989 muita coisa aconteceu. Passei por momentos apertados até que em 1994 os cientistas responsáveis pelos testes em meu corpo passaram dos limites.
(Yohji) O acidente de 1994 que fechou as portas da Bio Technology em Endo, não é verdade?
(Shouji sorrindo) Sim. O que ocorreu por lá foi feio. Eu perdi o controle de meus poderes como Domador (não foi minha culpa) e muita gente morreu. Quase todos os envolvidos no projeto 0037 – 1985 faleceram... eu fui um dos únicos sobreviventes... mas...
(Yohji) ... mas...?
(Shouji suspirando) Entrei em coma.
(Yohji) !!
Ambos desviaram os olhos para o "Shouji" que permanecia inconsciente.
(Shouji) Este "Shouji" que está dormindo é o meu verdadeiro corpo. Eu tinha 13 anos quando meu coração parou de bater, mas os cientistas me trouxeram pra cá, e me mantêm nesse estado vegetativo, com medo de 'perder' o projeto. Meu cérebro sobreviveu por mais um tempinho, só que tive morte cerebral no final de 1994, meses depois de ser trazido pra cá.
(Yohji) Como você...
Queria perguntar de onde saíra aquele segundo "Shouji", o que fora até Tokyo, e andava livremente por aí. O "Shouji" que lhe explicava tudo aquilo.
(Shouji) Meu 'corpo' nunca vai despertar, Yohji. Eu vi que não havia saída, além de 'projetar' minha alma e criar um 'corpo' tão provisório quanto o dos jurados.
(Yohji surpreso) Você pode fazer isso?!
Pergunta idiota, visto que ele estava presenciando ao vivo e a cores a demonstração do poder do garoto de longos cabelos negros.
(Shouji sorrindo) Sim. Este que está deitado no leito é o corpo de "Shouji" e este que está falando com você é a alma de "Shouji". Não é tão difícil de entender, nem de acreditar. Ou é?
(Yohji)...
Sim, era muito difícil de acreditar.
(Shouji sorrindo) Que cara é essa?
(Yohji) Você nasceu em 1989... logo... completa 19 anos hoje, não é? Nesse caso, porque sua aparência é de apenas treze anos?
(Shouji) Quando eu entrei em coma, tinha apenas nove anos. Meu corpo suportou o desenvolvimento até os treze anos de idade... depois disso eu precisei me concentrar ao máximo na missão de reunir as almas... e meu corpo simplesmente parou de envelhecer. Minha alma assume a aparência que o corpo apresenta: um jovem adolescente.
(Yohji)...
(Shouji) Em 1995 eu comecei minha jornada como o Domador desta geração. Abandonei meu 'corpo' neste laboratório para poder agir. O primeiro que encontrei foi Miguel, dois ou três meses após sua morte. Fui reunindo-os um a um, aprendendo com eles e admirando-os por tudo o que haviam passado.
(Yohji) Você é o último jurado não é? Estou com três veredictos 'culpado' e três 'inocente'. Shouji, é você que vai decidir meu futuro, se quer mesmo ajudar os jurados, eu não terei muitas chances...
O japonês sorriu e deu a volta no leito, aproximando-se de Yohji e tocando-lhe o rosto com muito cuidado, quase com reverência.
(Shouji) Eu disse que o julgamento precisava de um sacrifício, não foi, Yohji?
(Yohji) !!
Estava ferrado.
(Shouji) Existe apenas uma maneira de trapacear o jogo: eu preciso de um réu que seja forte o bastante para chegar aonde você chegou, Yohji. Por um instante desejei que você perdesse e ficasse ao meu lado pela eternidade... e quase permiti que morresse mais cedo. Me perdoe.
(Yohji) Aya... me contou.
Devia a vida a Ken. Fora salvo pelo moreninho outra vez naquele julgamento.
(Shouji) Mas... não é seu destino morrer enquanto é julgado por nós.
(Yohji) !!
(Shouji) Você não é o cordeiro deste sacrifício, Yohji.
A surpresa não teve tamanho. O playboy arregalou os belos olhos verdes e ficou calado. Percebeu o momento em que Shouji desviou o rosto, fixando as íris azuis em seu 'corpo', o segundo Shouji que estava inconsciente no leito.
(Yohji) !!
(Shouji sorrindo) Eu sou o sacrifício, Yohji.
(Yohji) Como... como assim?
(Shouji suspirando) Descobri a muito tempo atrás que essa é a única maneira de passar a perna nas regras: se eu morrer antes do jogo acabar... meu veredicto automaticamente será anulado. Como você tem três 'culpado' e três 'inocente' o julgamento é declarado empatado: estará livre das provações e os jurados poderão nascer outra vez.
Yohji estava sem palavras. Analisou a face de Shouji por um segundo. Deixou as informações penetrarem em sua mente. Pouco a pouco ia entendendo o objetivo de Shouji.
(Yohji) Então sua intenção desde o início era que eu viesse aqui para matá-lo.
A verdade nua e crua.
(Shouji) Não apenas isso. Você precisava conseguir o empate, entendeu? Isso sim era crucial. Por tal motivo permiti que as coisas chegassem ao ponto de Shou lhe propor o desafio. Eu precisava que você conseguisse o 'culpado' com Miguel, mas queria poupá-lo da dor... não adiantou nada, já que você caiu na provocação dele...
(Yohji)...
(Shouji sorrindo) Tudo dará certo no final. Eu sabia que tinha que escolher você! Nunca me engano!!
(Yohji) Você manipulou a todos...
(Shouji sorrindo) De certo modo sim. Meu único receio foi quando Margareth deixou o veredicto nas mãos de Karen... tudo podia dar errado nesse momento, mas felizmente saiu como eu planejei.
(Yohji) E a sua vontade de ter uma vida normal? Aya disse que...
(Shouji) Eu não quero uma vida normal! Gosto de ser um Domador de almas, e pretendo continuar meu destino. O tempo de "Shouji" acabou aqui. Só depende de você dar um fim ao julgamento.
(Yohji)...
(Shouji) Meu corpo está vivo graças a esses aparelhos. Puxe a tomada, Yohji. Desligue o fio que mantém "Shouji" vivo. Esse é seu último teste.
O Weiss estreitou os olhos de modo desconfiado. Teve a intuição de que algo estava errado.
(Yohji) Ah, entendi. Tudo isso é um truque, não é Shouji?
(Shouji)...
Continua...
Profile: Zero Seven
SHOUJI YASUTAKA
Nasc.: 02/02 Idade: --
Local: Tokyo. Japão
Desaparecido desde: Dezembro/89
