Capítulo 20

Ele quase enlouquecera naqueles dez meses. Ela não parava de ir de um lugar para outro. E quase sempre fazia com que ele fosse junto. Ele só não fora com ela nas vezes em que as saídas dela estavam relacionadas ao vestido. Ela o levara inúmeras vezes até a igreja. Ele já decorara quase todos os detalhes da igreja em estilo gótico.

Mas finalmente chegara o dia do casamento. Civil. O religioso seria no dia seguinte. Ele vestira um terno inteiramente preto.

Ah não- ela protestou.

Ah não o quê- ele tinha uma vaga idéia do que ela estava falando. Mas queria confirmar.

Você não vai de preto!

Por quê não?

Porque não e pronto!

Você quer que eu vá de vermelho?

Não! Mas você podia pelo menos pôr uma camisa azul e uma gravata azul marinho.

Essa é a roupa que eu vou pôr amanhã. Ou é preto hoje ou é preto amanhã.

Tudo bem. Então hoje você vai de preto. Mas amanhã...

Amanhã é outro dia.

Está bem, está bem. Eu vou tomar banho.

Angel, você ainda não tomou banho!

Não. Estava cuidando do Julien, lembra?

Ah, claro. Julien. O menino ficava a cada dia mais parecido com ele. Era o que todos diziam. Ele não conseguia se convencer disso. O menino sempre lhe lembraria Lúcio Malfoy. O que implicava que houvesse algumas semelhanças entre ele e Julien.

Mas ele não conseguia esquecer que Julien era seu irmão. Não sabia a razão. Simplesmente não conseguia. Talvez porque não havia nada de Weasley em seu físico.

Naquele momento, seu antebraço começou a latejar. O que havia ocorrido ocasionalmente naqueles últimos meses. Provavelmente acontecia quando Lúcio Malfoy pensava em sua traição. Mas ele via de uma forma diferente. Não considerava como traição. Como poderia trair algo em que não acreditava? A única coisa que fizera fora encerrar essa insanidade.

Vamos- era ela.

Claro. Ah não ser que você tenha mudado de idéia.

Eu não mudei de idéia. Por que? Você mudou?

Não.

Então vamos.

Ela estava linda. Ela usava um vestido azul petróleo que ia até os joelhos. Os cabelos ruivos, que soltos atingiam o meio de suas costas, agora encontravam-se presos em um coque frouxo e jovial. Os pés delicados calçados com sandálias da mesma cor que o vestido.

Julien estava em seu colo. O menino lhe estendia os braços. Queria ir para seu colo. Não conseguia entender. Apesar de não dar grandes sinais de afeto, o menino o adorava. Definitivamente não entendia.

Ela pusera o filho no chão. O menino agora o abraçava. Odiava quando isso acontecia. Agora teria que pegá-lo no colo. Ele pegou-o no colo. O menino sorriu para ele. Ele esboçou um sorriso.

Flú- ele perguntou.

Você enlouqueceu? E sujar o meu vestido?

Antes de desaparecer com um estalo ele olhou para ela e deu de ombros. Só fizera a pergunta por perguntar.

Estava no tabelionato bruxo. Julien olhava ao redor. Estranhava a súbita mudança de ambiente. Ele o pôs no chão. Ela apareceu. Julien virou-se assustado. Ao ver que era a mãe, ele foi até ela. Ela o pegou no colo.

Depois de quarenta minutos, estavam casados perante a lei. Ela agora se chamava Virginia Angélica Weasley-Malfoy.

Agora, só restava o casamento em uma igreja nos arredores da cidade. A igreja fora escolhida por ter apenas uma coluna de bancos. O que encobriria um pouco o fato de não haver membros da família do noivo. Não porque eles não haviam sido convidados. Mas simplesmente porque eles não existiam. Na verdade, o outro Malfoy vivo estava trancafiado em um hospital, tido como insano. E ele não fazia questão de que Lúcio Malfoy fosse a seu casamento. Preferia considerar-se o único Malfoy que sobrara. Em termos oficiais pelo menos.

Ela estava atrasada. Muito atrasada. O tempo lhe dizia que eram apenas vinte minutos. Mas ele sentia que já estava ali há horas. Já procurara detalhes à exaustão na igreja. Já vira todos os defeitos possíveis e imaginários nas pinturas de anjos que havia no teto. Um era rechonchudo demais. O outro, tinha os olhos muito grandes. E havia um outro, com o cotovelo desproporcional.

Também já tentara contar quantos arranjos de flores havia na igreja. Mas não conseguira. O atraso agora contava vinte e cinco minutos. Onde estaria ela?

Sua pergunta foi respondida quando os primeiros acordes de uma música clássica ecoaram pela igreja. Baixou o olhar lentamente, como se o escorregasse pelas pinturas góticas da igreja. E era o que fazia. Então o olhar de prata chegou às portas de carvalho da igreja. Ao vê-la, era como se tivesse levado um murro no peito, tamanho o impacto. Era como se ela tivesse sido alçada ao paraíso de onde caíra. Estava deslumbrante.

Usava um vestido creme, com o corpete em renda florida na mesma cor. A saia, da mesma cor, mas de seda, abria-se levemente, delineando suavemente a cintura dela. A luz que entrava através da porta da igreja fazia com que ela parecesse um anjo. E ela era.

Ele observou enquanto ela era levada pelo pai até o altar da igreja. Então, ele amparou-a enquanto ela se ajoelhava em frente ao sacerdote e então fez o mesmo. Finalmente, podia observá-la. Os cabelos presos em um penteado frouxo, fazendo com que algumas mechas caíssem por sobre o rosto. O colo adornado por um belíssimo colar, simples, de ouro. A maquiagem suave lhe realçava o olhar brilhante e atento ao sacerdote.

Agora que ela estava ali, ao seu lado, o tempo corria. Já chegara o momento das alianças. Levantou-se e ajudou-a a levantar-se. Ele tirou a varinha do bolso de seu paletó. A mãe dela estendia a varinha para Angel. Ela apanhou a varinha. Ela lhe ofereceu a varinha, assim como ele. Ela agora segurava a varinha negra dele. E ele segurava a varinha clara dela. Ele visualizou a aliança que desejava para ela. Seria uma estreita aliança de platina.

Em instantes, a aliança que ele havia conjurado para ela estava na mão delicada dela. Agora observava rapidamente a aliança que agora jazia em sua mão. Também era de platina, como a de Angel, mas era mais larga.

A cerimônia agora chegava ao fim. Ele pousou suas mãos na cintura dela e a trouxe delicadamente para mais perto de si. Beijou-a, um simples toque de línguas e já haviam se separado.

Ela corara. Os olhos brilhavam. E ela sorria.

Caminhavam para o exterior da igreja. Os convidados já começavam a aparatar por toda a igreja para o salão onde seria realizada a festa. Ao chegarem à porta, também aparataram.

O salão estava magnífico. Arranjos florais vermelhos decoravam todo o ambiente. Era uma decoração moderna, sem babados e rendas. As mesas com suas toalhas de seda. Mas a decoração não era tão deslumbrante quanto ela.

Após os cumprimentos aos noivos, a valsa. Ela ainda mantinha aquele sorriso doce e o brilho em seu olhar. Começaram sozinhos na pista. Mas pouco depois, outros casais começaram a dançar também. Ele observava enquanto ela dançava com o pai e com os irmãos. Ela ria, provavelmente do que os irmãos sussurravam durante a dança.

Ele pegou-se a invejá-la. Nunca tivera aquilo. Sempre fora solitário. Mas não era hora de se afundar em lembranças mortas.

Alguém batia insistentemente em seu ombro. Ele virou-se.

Meu primo rico! Finalmente te conheço pessoalmente! Só te conhecia pelo que diziam de você e também pela tapeçaria do Sirius!

Quem era ela? Algo nela era familiar.

Desculpe-me, você é...?

Nossa, me esqueci de me apresentar. Ninfadora Tonks. Mas chame de Tonks. Nunca consegui descobrir o que minha mãe tinha na cabeça quando me chamou de Ninfadora.

A filha de Andrômeda?

Agora sabia o que era familiar na prima. O ar levemente Black. Narcisa Malfoy sempre comentava sobre sua irmã, Andrômeda, uma das ovelhas negras da família. Uma delas era Sirius Black. A outra, era Andrômeda Black, que se casara com um trouxa. Andrômeda fora deserdada, assim como Sirius. Draco Alexander Malfoy era o detentor da antiga fortuna dos Black. Herdara a fortuna de Bellatriz Black, quando esta recebera o beijo do dementador, por ser o mais próximo dos Black, considerando apenas os de sangue puro. O que Tonks não era.

Eu mesma. A Gina me convidou. Ela era a minha única companheira no Largo Grimmauld assim como eu era a única companheira dela. E Molly me trata como filha, apesar de não me deixar ajudar na cozinha quando a visito. Você sabe onde é a casa do Largo Grimmauld?

Ele entendia por que a jovem era mantida longe da cozinha. Era visível que a jovem era estabanada. Em dois minutos de conversa, chegara perigosamente perto de derrubar uma bandeja de taças de champanhe. E claro que ele sabia sobre a casa no Largo Grimmauld.

Sim, eu sei. Sou o proprietário.

Então foi você quem adquiriu a casa? Me disseram que havia mudado de dono...

Não, na verdade, eu herdei.

O Ministério não confiscou? Eu achei que sim...Ninguém me disse nada a respeito da herança da família.

Não, não confiscou.

Aquele retrato é horrível, não é?

Que retrato- Não sabia de que retrato ela estava falando.

O do corredor...

Ah, aquele? Não, eu acho até adorável...

Ah, bem, é que ela não deve gritar com você...

Não...

É, bom, é que você não é mestiço e nem faz parte dos bonzinhos da família...

A conversa estava ficando desconfortável para ele. Estavam entrando em assunto que ele preferia esquecer.

Vinho, Alex? Ah, Tonks, vejo que já encontrou seu primo.

Ele apanhou a taça de vinho tinto seco das mãos de Angel, agradecendo intimamente pela interrupção. Angel agora começava a conversar animadamente com Tonks. Ele a abraçou pela cintura, sentindo o calor que emanava dela.

Ele subitamente desejou sair dali. Não conhecia praticamente ninguém. Olhou ao seu redor. Viu Carlinhos, apoiado numa das colunas do salão, girando uma taça de vinho nas mãos enquanto observava um casal de crianças dançando algo que parecia vagamente com uma valsa. Decidiu ir conversar com ele. Queria saber sobre os dragões.

Mas antes que alcançasse o outro, sentiu algo agarrando-se ao seu joelho. Olhou para baixo apenas para confirmar quem era. Julien. O menino, vendo que conquistara a atenção dele, lhe estendeu os braços, pedindo colo. Resignado, mas levemente irritado, ele abaixou-se e pegou o menino no colo. A conversa com Carlinhos ficaria para outro dia. O menino agarrara-se ao seu pescoço, o que o incomodava. Voltou para o lado de Angel, que ainda conversava com Tonks.

O assunto desviou-se para o menino sonolento no colo dele. Enquanto conversava com a amiga, Angel procurou o relógio dele no bolso interno de seu paletó, enquanto ele segurava o menino em seu braço direito.

Onze horas já! Não é à toa que o Julien está dormindo!

Ela pôs o relógio de volta no bolso dele. Pegou o filho no colo e caminhou para o outro lado do salão. Ele a seguiu.

Mãe? Eu trouxe o Julien, tem certeza que não é incômodo nenhum?

Não, de jeito nenhum. Eu cuidarei dele, e seus irmãos o adoram, você sabe disso. Pode ir, qualquer coisa eu te chamo pela lareira.

Chame mesmo. Vamos indo, Alex? Já seguramos os convidados aqui por muito tempo.

Ah, sim, claro.

Ela despediu-se dos irmãos, enquanto ele anunciava que estavam de partida. Encaminharam-se, seguidos pelos convidados, até a lareira, de onde iriam, via Flú, para a lua de mel. A lua de mel seria em uma casa em um vale rodeado por montanhas no interior da Itália.

Ele voltou-se para a lareira, enquanto ela terminava as despedidas e jogava o buquê. Ele ouviu apenas os gritos de quem disputava as flores antes de ser tragado pelo fogo.