Respostas às reviews do capítulo anterior:

Kirina-Li: Obrigada, Kirina. Sempre é bom receber uma review, não importa onde. Que bom que gostaste (estou a treinar o meu português de Portugal ).

DarkAngelAngst (ou Raquel Santos!): Só tem leitor de Portugal por aqui, eu é que terei de mudar o meu estilo! Estava com saudades de ti. Ah, se eu chamasse a coruja de Ptyx as pessoas iam dizer que sou muito vaidosa... Tens razão: esses dois precisam se beijar!

Capítulo 2

Harry se foi, e Severus se viu mais nervoso do que nunca. Odiava depender de uma pessoa daquela forma. A raiva que quisera invocar quando o outro mago estava presente só agora voltava, mas mesclada a um desespero impotente.

Um dia, dois dias se passaram. Severus tentava se concentrar no trabalho no Castelo e em suas poções, mas a ansiedade o corroía.

Na tarde do terceiro dia, estava preparando um antídoto contra veneno de Erumpent que lhe havia sido encomendado pelo Apotecário de Longbottom quando um estalido forte se fez ouvir. Alguém estava tentando quebrar seus encantos de proteção. Severus quase voou pelos corredores e escada acima, varinha em punho.

— Snape!

Uma alegria estúpida brotou em seu íntimo.

— Potter, pare já com isso.

Severus pronunciou o encanto para que Harry pudesse entrar pela porta que dava para a escada das masmorras e aguardou alguns degraus abaixo até que Harry descesse carregando sua vassoura e um baú.

— Por que não avisou que viria?

— Era muito complicado enviar uma mensagem. Eu não queria perder mais tempo.

— Se tivesse avisado, eu teria arrumado um lugar para você.

— A gente dá um jeito.

— Vamos aos meus aposentos, então. Estou terminando uma poção.

Severus viu Harry largar seu baú e sua vassoura ao lado do sofá onde havia dormido três dias antes, e seguiu direto para seu laboratório, ao lado do escritório. Foi logo baixando o fogo e pegando a concha para mexer o caldeirão. Quando viu que estava tudo bem, que a poção não havia passado do ponto, ergueu os olhos e viu Harry diante de si.

— Posso ajudar em alguma coisa? — disse Harry.

— Já estou terminando. Depois vamos ver onde você vai ficar.

— Eu poderia ficar naquele quarto abandonado, aqui nas masmorras? Acho que é o mais fácil, não?

Perto, mas não tanto quanto eu gostaria, pensou Severus. Então repreendeu a si mesmo, e fechou a cara.

—Sente por aí e descanse, então, porque temos trabalho pesado pela frente.

Os aposentos que caberiam a Harry não eram tão vastos quanto os de Snape — afinal, Snape era chefe de uma Casa e professor de Poções: tinha direito a um amplo escritório e a um laboratório. Harry tinha apenas um pequeno escritório que dava para o corredor, supostamente para atender os alunos, e um quarto de dormir, também com porta para o corredor. As duas peças eram interligadas, e havia também um banheiro com porta na parede dos fundos do quarto. Eles iriam limpar, a princípio, apenas o quarto e o banheiro, já que Harry não tinha tanta necessidade de um escritório.

Passaram o resto da tarde limpando teias de aranha e matando fadas-mordentes com um fadicida não-tóxico que Snape havia inventado. Havia também alguns bandinhos, por sorte não muito disseminados, que eles puderam eliminar com um "Limpar!". O que complicava um pouco a limpeza era que Snape queria guardar tudo o que encontrava como ingredientes para poções.

Ao final da tarde, Harry, exausto, pôde ir tomar banho em seu novo banheiro, enquanto Snape ia para o seu. A banheira era antiga e luxuosa, em mármore verde, e as torneiras tinham a forma de serpentes. Harry ficou vários minutos no banho, descansando. Depois, enrolou-se na toalha nova que comprara em Hogsmeade e saiu para o quarto.

Seu quarto até que ficara bonito. A cama era de casal — Snape lhe dissera que todos os quartos de professores continham uma cama assim. A idéia era que, se o professor fosse casado, o cônjuge pudesse ir visitá-lo. Havia também um amplo armário, uma penteadeira e uma janela enfeitiçada que lançava, durante o dia, uma luz simulada em seu quarto. Era triste não ter uma janela de verdade, mas, por outro lado, ele não precisava se preocupar em ter de manter a janela fechada por segurança.

Ainda estava se vestindo quando Snape bateu à porta.

— Potter!

— O que é?

— Vou requentar o almoço. Se soubesse que viria, teria me preparado para fazer um jantar.

— Mas não é preciso nada disso.

— Vá até a cozinha.

— A cozinha de Hogwarts?

— Claro, não é, Potter? De onde mais, da Mansão Malfoy?

— Ugh, Merlin me poupe! — Uma pausa. — Você quer dizer que a cozinha também foi preservada?

— Eu a recuperei, em grande parte. Mas estou cansado de ficar gritando no corredor, Potter. Espero-o na cozinha em meia hora. Vou encantar as portas para permitirem a sua passagem para todos os lugares.

— Até para o seu escritório?

— Desde que você respeite a minha privacidade, naturalmente. Prefiro que bata à porta quando precisar ir lá.

— Certo. Farei isso.

Severus preparara, às pressas, um frango ao vinho. Era o máximo que conseguira fazer, sem ter sido avisado antes. Havia sobrado metade de um frango que havia assado para o almoço. Severus pegara cenouras, batatas e aipo na horta, temperara com cebola, alho, salsinha, alho-poró, louro, tomilho, bacon, juntara alguns cogumelos e bacon de seu estoque e mergulhara tudo no vinho tinto. Para o prato ficar realmente bom, ele teria de ter deixado mergulhado no vinho por muito mais tempo.

Mas Harry estava claramente faminto, depois de uma tarde de trabalho esfalfante, e elogiara a comida. Severus servira um bom vinho tinto para acompanhar — a última garrafa de seu estoque. Precisava ir a Hogsmeade fazer compras ainda naquela semana.

Eles estavam jantando ali mesmo, em uma mesa de madeira na cozinha de Hogwarts. Era um cenário perturbantemente íntimo, mas seu lado mais cínico não deixava Severus em paz: "Então é isso? Agora você virou elfo-doméstico do Garoto de Ouro?"

— Não pense que a vida vai ser folgada aqui. Há muito trabalho a ser feito — resmungou para Harry em voz alta, só para aquietar aquela voz sardônica.

— Eu sei. Eu vim aqui para trabalhar. Faço o que for necessário.

Na manhã seguinte, depois de tomarem café da manhã no escritório de Snape, Snape mostrou a Harry a planta do Castelo, que ele mesmo fizera a partir de suas lembranças, e explicou, passo a passo, os feitiços que estava usando para reerguer o Castelo. Era preciso preparar a argamassa nos tonéis, levitando até os tonéis as pedras danificadas com Wingardium Leviosa, lançando sobre elas um Opprimo (feitiço triturante) e depois misturando água e areia com um Misceo, um feitiço misturante. Depois a argamassa era colocada no lugar com um feitiço Mortarwasi, e amarrada com pesadas correntes por meio de um Incarcerous. Por fim, pedras lisas eram colocadas na superfície exterior com um Petrawasi mais um Feitiço Adesivo. Eram todos feitiços muito complexos.

Seria tão mais simples se eles pudessem, simplesmente, conjurar o Castelo! Mas, além de ser proibido pelo Ministério, o feitiço duraria apenas algumas horas. Ou se um "Reparo" funcionasse... Mas não, o Castelo não estava apenas quebrado em partes. Os pesados feitiços lançado contra ele haviam modificado essas partes. Não adiantava, eles precisavam mesmo reconstruir tudo pedra a pedra.

Nos dias que se seguiram, eles entraram em uma rotina de trabalho. Sempre que podiam, os dois trabalhavam na reconstrução do Castelo. Quando Severus precisava trabalhar em alguma poção, Harry continuava trabalhando no Castelo, cuidava da horta, ou ia a Hogsmeade fazer compras — o que Severus detestava fazer. Os dois se revezavam na cozinha.

Nenhum dos dois era muito dado a conversar e, com tanto trabalho a fazer, quase todas as suas conversas se referiam a trabalho. "Amanhã preciso terminar uma encomenda para Longbottom"; "Deixe que eu cuido da estufa";"Vamos precisar de novas escoras para a parede do lado Norte" — e assim por diante.

À noite, no entanto, depois que eles jantavam, exaustos, era cada vez mais difícil para Severus conter a vontade de agarrar Harry e... Severus não se deixava pensar além disso. Harry chegava sempre com o cabelo molhado do banho, aquele cheiro de sabonete e pele quente misturados, era uma tortura.

Em uma daquelas noites, no fim da segunda semana de Harry em Hogwarts, este olhou para Severus e disse:

— Nós estamos fazendo tudo juntos e, er, estamos nos dando bem, não é mesmo?

Severus arqueou uma sobrancelha. Onde Harry queria chegar com aquilo?

— Não tem sido tão desastroso como eu havia imaginado — respondeu Severus.

— Por que não nos tratamos pelo primeiro nome, então? Eu gosto do seu nome: Severus.

Um arrepio de prazer percorreu o corpo de Severus. Aquilo não devia ser permitido, que o simples fato de uma pessoa dizer um nome em voz alta pudesse provocar aquele efeito em outra pessoa. Se cada vez que Harry dissesse seu nome ele fosse ter aquela reação, era melhor proibi-lo de chamá-lo assim! Mas Severus não conseguia pensar em uma outra boa razão para não deixá-lo usar seu nome.

— Se preferir...

— E você me chamará de Harry.

— Sim, meu Lord — respondeu Severus, um tanto irritado.

Mas Harry arregalou os olhos e caiu na gargalhada, e Severus teve de sorrir. Era bom poder rir daquilo sem medo. Pelo menos isso eles haviam ganho ao vencer a guerra. Severus não estava acostumado a fazer as pessoas rirem assim, sem nenhuma malícia. Fora completamente involuntário, mas ele gostou da sensação.

Um dia eles estavam tranqüilamente tomando chá da tarde no escritório de Severus, para descansarem do árduo trabalho, quando escutaram estranhos estalidos.

Severus se ergueu de pronto.

— Alguém está tentando desmontar nossas proteções.

Os dois correram para fora das masmorras e deram com uma figura baixinha e engraçada pulando e lançando encantos com sua varinha.

— Filius! — disse Severus.

O mago baixinho se voltou e abriu um sorriso enorme.

— Severus, seu malandro! Eu sabia que você devia estar por trás disso! E Harry Potter!

— Professor Flitwick!

— Por trás de quê? — indagou Severus, estreitando os olhos para o ex-colega.

— Ah, você sabe... Tem alguma coisa aqui. Eu não sei o que é, mas isso aqui está repleto de feitiços poderosos demais para eu não notar.

— E o que você veio fazer aqui, Filius?

— Eh. Eu estava morrendo de tédio, e senti saudades. Vim passear um pouco pelas redondezas. As coisas mudaram muito depois da guerra...

Harry percebeu que eles teriam de abrir o jogo com Flitwick. Olhou para Severus e viu que Severus tivera a mesma idéia.

— Professor, precisamos conversar.

— Venha tomar um chá conosco, Filius — emendou Severus.

Depois de algumas torradas com geléia de cereja, Flitwick já estava informado de tudo, e saltitante.

— Esplêndido! Temos de avisar as meninas. Com a ajuda delas, em dois meses terminaremos este serviço.

— Meninas? — perguntou Harry.

— Oh, sabe como é, todos somos aposentados... Eu tenho me encontrado sempre com Pomona e Rolanda. E de vez em quando Sybill também aparece. Todas têm saudade dos tempos de Hogwarts, e tenho certeza de que ficarão encantadas de vir ajudar a reconstruir o Castelo.

— Hummm... Severus, se nós arrumarmos o porão de Hufflepuff, "as meninas" poderiam ficar lá. E o professor Flitwick...

— Há bastante espaço para todos no porão de Hufflepuff — disse Severus, que não queria ver ninguém mais além de Harry em suas masmorras. — Só não acredito que Trelawney se disponha a morar em um porão.

— Oh, não — disse Flitwick, rindo muito. — Jamais! Mas não creio que ela possa ser muito útil aqui, para falar a verdade.

Severus concordava plenamente.

A rotina mudou muito com a chegada dos três outros magos. O Frade Gordo já assombrava, feliz, os porões de Hufflepuff. Sprout assumira o cuidado da estufa e da horta; Hooch sempre se apresentava para fazer as compras ou transportar coisas de um lado para o outro. Como eles precisassem agora trazer pedras de outros locais, o auxílio dela era fundamental. Flitwick era mais rápido do que todos eles juntos com os Feitiços, e trabalhava incansavelmente na reconstrução do Castelo.

Harry, Sprout e Severus se revezavam como cozinheiros, e todos faziam as refeições juntos na cozinha.

Com essa divisão de trabalho, Severus podia se dedicar mais às poções. Sentia falta de ter Harry e só Harry consigo, mas tudo em nome do Castelo! Como dissera Flitwick, naquele ritmo eles terminariam o Castelo em dois meses.

Todas as noites, no entanto, antes de irem dormir, Harry passava no escritório de Severus, e eles tomavam um copo de Firewhisky e conversavam sobre seus sonhos e esperanças para quando o Castelo estivesse terminado. Era o momento mais agradável e ao mesmo tempo mais inquietante dos dias de Severus. Muitas vezes, Severus se perguntava se valeria a pena tentar algo mais. No entanto, a perspectiva de perder aquele convívio amistoso era bastante penosa, e o medo da rejeição o deixava paralisado. A verdade era que aquela situação era totalmente nova para Severus. O que sentia por Harry fazia-o sentir-se tão inseguro quanto um adolescente.

Duas semanas depois, no dia 31 de julho, eles deram uma festa para Harry, com bolo, bolhas coloridas, fadinhas e velas flutuando no ar — a decoração havia sido feita por Flitwick, é claro. Todos deram seus presentes, menos Severus.

Mas quando Harry passou em seu escritório para dizer boa-noite, Severus estava estranho. Parecia querer dizer-lhe alguma coisa e não saber como.

Por fim, ele falou:

— Entre aqui um pouco. Tenho algo para você.

Harry entrou.

— Espere aqui — ordenou-lhe Severus.

Severus saiu por uma porta que dava para um pátio interno nas masmorras e voltou um minuto depois carregando... uma gaiola. Com uma linda coruja branquinha, parecida com Hedwig. Severus aproximou-se e estendeu-lhe a gaiola.

— Pronto. Achei que isso pudesse lhe ser útil.

O coração de Harry disparou de alegria, pelo presente e porque havia sido Severus que havia lhe dado. Harry, com a gaiola da coruja nos braços, ficou olhando para ele, louco para beijá-lo. No entanto, só conseguiu murmurar um "muito obrigado, eu não esperava" antes de se retirar ao seu quarto.

Mais duas semanas depois, um mês desde a chegada de Flitwick, Sprout e Hooch, toda a parte externa do Castelo estava pronta, inclusive as torres. Agora faltava apenas dar o acabamento final: encaixar as portas e janelas, trabalhar melhor as escadas. Havia ainda muito trabalho por fazer, mas ver o castelo praticamente pronto por fora era uma injeção de ânimo poderosa.

Harry caminhava pelo Castelo, relembrando vários momentos de sua vida. O dormitório de Gryffindor, o Salão Comunal... As cento e quarenta e duas escadas, algumas das quais sempre mudando de lugar e outras com degraus que desapareciam. Quase tudo estava lá, outra vez. Faltavam os retratos e estátuas, mas com o tempo eles encontrariam outros para povoar o local. Será que encontrariam um retrato da Senhora Gorda? O antigo escritório de Dumbledore, por exemplo, parecia um lugar totalmente diferente sem os retratos e os objetos estranhos. Talvez não devesse pensar no que se perdera. Era muito melancólico. Havia coisas novas por vir. Talvez desta vez tudo desse mais certo do que antes.

Mais tarde, no sofá de Severus, com um copo de Firewhisky nas mãos, Harry se perguntava como seria, quando pudesse se mudar para o Castelo. Se aquelas conversas à noite com Severus acabariam.

Harry estava mais apaixonado por Severus do que nunca. Não queria nem pensar em perder aqueles poucos momentos em que eles ficavam sozinhos. Mesmo que eles nunca chegassem sequer a se tocar. Mesmo que Severus se mostrasse arredio e indecifrável como sempre.

Era um fim de tarde, e Harry havia ido ao Beco Diagonal comprar um livro de poções medievais que Severus vivia reclamando que um aluno lhe roubara, e que agora estava lhe fazendo falta, Herblore. Depois de muito procurar, Harry encontrara o livro em uma prateleira escura, de fundo. Pagara por ele e estava para sair da Floreios & Borrões quando avistou Remus Lupin.

— Harry!

— Remus! Há quanto tempo!

Remus deu-lhe um rápido mas caloroso abraço. Depois da morte de Sirius, no sexto e sétimo anos de Harry, Remus havia se aproximado mais de Harry. Mas, estranhamente, com o fim da guerra, Remus desaparecera.

— Vamos tomar uma cerveja amanteigada no Caldeirão Furado, rapaz!

Remus lhe contou que havia adoecido gravemente depois da guerra e que o Ministério não o havia aceito em St Mungo por causa de sua condição de lobisomem. Assim, Remus tivera de ser internado em um centro especial para lobisomens e levara vários meses para se recuperar. Ao sair, vira-se sem emprego e sem dinheiro. Resolvera trabalhar como Muggle em Londres fazendo pequenos serviços e agora conseguira emprego em uma fábrica de perfumes, devido ao seu aguçado faro.

Depois de umas cinco cervejas amanteigadas, Harry acabou contando a Remus tudo sobre a reconstrução do Castelo e convidando-o a ir com ele para Hogwarts. Remus se mostrou entusiasmado, mas também preocupado com qual poderia ser a reação de Snape à sua presença. Harry disse que conversaria com Snape e que tudo ficaria bem.

Remus e Harry aparataram na pensão Muggle de Remus em Londres, e Remus jogou todas as suas coisas — que não eram muitas — em uma pequena maleta. Remus pegou sua vassoura, uma velha Shooting Star, e os dois partiram para Hogwarts.

Já era, contudo, meia-noite quando chegaram ao castelo. Àquela hora, normalmente, todos já estavam dormindo.

Harry havia avisado que não jantaria em Hogwarts, mas também não havia voltado depois do jantar. Severus tentou dormir, mas não conseguiu. Não conseguia deixar de se perguntar o que teria acontecido. Ao mesmo tempo, repreendia-se por isso. Era ridículo. Harry não lhe devia satisfações. Provavelmente achara algo mais divertido para fazer. Talvez estivesse cansado de sua companhia.

Desistindo de dormir, Severus pensou em trabalhar em alguma poção. Mas estava nervoso demais para isso. Estava se perguntando o que poderia fazer quando escutou um ruído vindo dos corredores.

Devia ser Harry chegando.

Sem acender as luzes, Severus lançou um Feitiço de Desilusão sobre si mesmo, saiu ao corredor e esperou, em meio às sombras, em um local de onde podia avistar a porta do quarto de Harry.

Qual não foi a sua surpresa e horror quando viu Harry chegar acompanhado de Remus Lupin e entrar com ele em seu quarto!

Em estado de choque, Severus voltou aos seus aposentos.

Maldito. Maldito lobisomem. Maldito Potter. Maldito ele próprio, por se deixar envolver uma vez mais.

Mas aquilo não iria ficar assim.

Severus saiu voando novamente aos corredores e bateu à porta de Harry.

Teve de esperar longos instantes. Bateu outra vez, com mais força. Harry entreabriu a porta, só uma fresta.

— Deixe-me entrar — ordenou Severus.

— Er...

Severus empurrou a porta com toda a sua força, e deu direto com Remus Lupin, de pijama, deitado languidamente na cama de Harry.

A fúria se apossou de Severus.

— Saia já daqui. Não quero nenhum lobisomem nas minhas masmorras — rosnou Severus por entre os dentes.

Parecendo assustado, Lupin se ergueu. Harry lançou-se sobre Severus.

— Severus, não faça isso.

— Não faça o quê? Está com medo que eu machuque o seu namoradinho? Eu não encostaria um dedo nesse traste. Só não quero vê-lo aqui, nas minhas masmorras. E você também, saia.

— Severus...

— Harry, vamos. Você não disse que os outros estão no outro porão? Vamos para lá. — Lupin pegou sua mala. — Pegue suas coisas.

Sigrid, a corujinha branca que Severus dera a Harry, piou, desconsolada, em sua gaiola. Severus pensou em tomá-la de volta para si, mas conteve o impulso: isso iria provocar ainda mais discussões, e agora Severus só queria que aquilo acabasse logo para poder se refugiar em seus aposentos.

De braços cruzados, Severus esperou até que Harry guardasse todas as suas coisas em seu velho baú. De vez em quando Harry virava-se para olhar para ele, e Severus o fuzilava com os olhos. Não queria ouvir mais nem uma palavra vinda daquela boca traiçoeira. Quem achava que as cobras eram traiçoeiras era porque não conhecia bem Harry Potter.

Remus foi muito bem recebido por todos no porão de Hufflepuff, onde havia mais dois quartos vagos. Sozinho com Sigrid em seu novo quarto, Harry se perguntava onde é que havia errado.

Será que haveria algum jeito de Severus escutá-lo? De entender que eles haviam chegado muito tarde e tinham achado melhor Remus dormir em seu quarto, já que a cama dava para dois, em vez de acordar o pessoal do outro porão, ou mesmo Severus?

Mas por que ele devia explicações a Severus? Severus não tinha nenhum direito de ter feito aquilo! Se era assim, então por que era que Harry se sentia, de algum modo, culpado? Culpado e arrasado.

Lupin se juntara aos trabalhos, e em menos de um mês o Castelo estava pronto. Não havia livros ou material para os alunos, mas isso eles só iriam conseguir se recebessem algum tipo de patrocínio. Agora viria a fase de contatos políticos. Para aquela noite, contudo, eles haviam planejado uma festinha no Grande Salão, em comemoração ao final dos trabalhos.

Festa para todos, menos para Severus, que passara todo aquele mês carrancudo e irascível. Ele não iria a nenhuma droga de festa.

Acabara de abrir sua segunda garrafa de Firewhisky e encher mais um copo quando escutou uma batida à sua porta.

— O que é?

— Severus, preciso conversar com você.

O lobisomem. Como ousara descer às masmorras? Severus repreendeu-se por não ter colocado encantos protetores já na escada.

— Volte para a sua maldita festa, lobisomem.

— Severus, não me obrigue a gritar daqui de fora o que tenho a lhe dizer.

Era só o que faltava. Com a raiva fervendo em suas veias, Severus foi abrir a porta.

— Diga logo.

— Deixe-me entrar. Não vou demorar.

Com relutância, Severus deu-lhe passagem. Mas não o convidou a sentar, nem lhe ofereceu um copo de bebida. Em pé, Lupin passou a mão pelos cabelos cada vez mais grisalhos.

— Harry está sofrendo por sua causa.

— O quê? Que lorota é essa que...

— Severus, se você lhe fizer algum mal, eu não vou perdoar nem a mim nem a você. Mas só você é tapado e não vê que ele está louco por você. É evidente que você também é louco por ele. Não teria feito aquele escândalo quando me viu se não fosse. E você o afastou de sua vida por uma bobagem. Eu...

— Saia daqui. Eu não lhe dei o direito de se meter em meus assuntos pessoais. Além disso, não tenho nada a ver com Potter e seus problemas.

— A única coisa que eu queria lhe dizer era isso, Severus. Não seja teimoso. Não há nada entre mim e Harry além da mais inocente amizade. E Harry é louco por você. Desconfio que sempre foi, desde os tempos da guerra.

Lupin saiu, e Severus esvaziou o copo de um só gole. Serviu-se de mais outro.

Era festa, e Harry devia estar contente. Eles haviam atingido seu objetivo. Aquilo era a culminação de três meses de trabalho pesado. Hora de comemorar.

Harry já se mudara para seu quarto no Castelo, na torre de Gryffindor. Nick-Quase-Sem-Cabeça o saudara alegramente. No dia seguinte, eles iriam discutir os detalhes do que fazer a seguir. Os trâmites burocráticos, os lances políticos.

Mas nada realmente tocava Harry, lá no fundo. Sentia-se, novamente, alienado de tudo. Não era certo que uma simples pessoa pudesse ter esse efeito sobre ele. Não era justo.

Eles haviam transfigurado o Grande Salão especialmente para a festa. Os fantasmas das quatro Casas estavam reunidos. Peeves, que começara a jogar baldes de água gelada em todo mundo, fora expulso pelo Barão Sangrento. Trelawney (que se juntara a eles, agora que sua torre estava disponível), conversava com Binns do outro lado do Salão. No centro, na pista de dança, Flitwick dançava com Hooch, e Sprout com Remus. E Harry ali, afundado em uma poltrona, em um canto escuro, tomando seu vinho branco e querendo muito desaparecer.

De repente, no entanto, a porta da frente se abriu e um vulto negro entrou, trôpego, no salão. Harry forçou os olhos para tentar enxergar. O vulto parou ao centro do salão, fazendo com que os dois casais que dançavam parassem. Então o vulto se voltou para Harry e começou a se aproximar, cambaleante.

Harry quase não conseguia acreditar, mas era Severus. Completamente bêbado. Harry se aprumou na poltrona, bem a tempo de ver Severus tentar alcançá-lo e cair por sobre ele na poltrona.

Harry o abraçou com força para que ele não caísse ao chão.

— Harry, eu te amo. Quero que seja meu.

O coração disparado, Harry se levantou, erguendo Severus consigo.

— Venha. Eu vou levar você para o seu quarto.

— Eu só vou... — engrolou Severus — se você ficar comigo.

— Eu fico, Severus. Venha.

E, sob os olhares atônitos e divertidos dos outros magos e fantasmas, Harry saiu do Grande Salão amparando Severus.

continua...