Capítulo 19 O cativeiro dos Longbottom

A noite gelada daquele início de novembro caía quando as luzes amarelas se acenderam na varanda da casa. Não havia qualquer movimento na rua e nem um ser humano estava à vista num raio de muitos metros, exceto pelos dois cadáveres estendidos à frente da escadinha que conduzia à porta da casa.

Estranhas gravatas, vermelhas e pegajosas, escorriam de seus pescoços. Os dois bruxos responsáveis pela segurança da casa onde viviam o casal Longbottom e seu filho tinham sido praticamente degolados.

Se não estivessem mortos e se o ruído de coisas sendo atiradas contra as paredes dentro da casa não se sobrepusesse a todos os outros sons, os dois teriam ouvido o choro de um bebê que ecoava forte e vibrante na rua deserta.

Um último grito - de uma mulher - se fez ouvir e, no segundo seguinte, tudo havia acabado.


Alice Longbottom abriu os olhos como se despertasse de um longo pesadelo. Um pesadelo em que quatro monstros com máscaras brancas haviam invadido sua casa. Ela ainda podia ver a face de seu filho Neville contorcida num choro assustado. Mas a imagem realmente viva que permanecera em sua mente fora a daquele sorriso saudoso e daqueles olhos negros brilhando maliciosamente através das aberturas da máscara enquanto o Comensal erguia a varinha e murmurava um feitiço.

Então, senhora Longbottom - uma voz distante a fez despertar completamente. - Como se sente?

A silhueta de uma mulher se projetava contra uma luz forte. Alice reconheceu a risada medonha. Mas o que a fez gelar por dentro foi a visão de Neville engatinhando aos pés da mulher.

Espero que seja mais cooperativa que seu marido, minha estimada sangue ruim - falou Bellatrix num tom pouco acima de um sussurro com o rosto quase colado ao de Alice. - Para o bem do seu moleque.

Alice mirou o teto e depois o chão, cuidando para não cruzar seus olhos castanhos com os negros de Bella. Neville lhe estendeu a mão gorducha, mas Bellatrix o empurrou para longe com um aceno de varinha. O bebê deslizou pelo chão, deitado de barriga para baixo, os olhinhos arregalados de surpresa.

Está bem - murmurou a auror. - O que quiser...

Você sabe o que eu quero - a Comensal ergueu a varinha contra a luz e completou: - Me diga o que vocês fizeram com Lord Voldemort. Onde está meu Mestre?

Alice fechou os olhos e se encolheu na cadeira, gaguejando:

Eu... eu não sei... Harry Potter o venceu, é o que todos sabem...

Crucio!

O próximo som que se ouviu foi o grito agudo de Alice e o barulho de seu corpo tombando da cadeira e se debatendo no chão, dobrando e esticando os membros e as costas de dor.

Vamos, fale. Fale e tudo vai acabar - sibilava Bella nos breves intervalos em que interrompia a maldição.

Mas Alice apenas permanecia no chão com os olhos fechados, respirando com dificuldade e murmurando entre lágrimas que não sabia de nada. Bella então voltou a usar a maldição de tortura.

Ele não foi derrotado! - exclamou Bella quando Alice repetiu que Voldemort fora derrotado pelo pequeno Potter. Depois balançou a cabeça e usou a tortura com mais força.


Eu acho que devíamos levar o bebê de volta e ficar só com os Longbottom - resmungou Rodolfo, impaciente com as longas discussões acerca do bebê Longbottom se arrastando pelo terceiro dia consecutivo.

Não, está errado - falou Bellatrix. - Temos toda a persuasão de que precisamos na forma daquele garoto. Você acha que os dois vão continuar calados quando ameaçarmos fazer alguma coisa com ele?

Bella crispou os lábios e cruzou os braços sobre o peito. Ela não via problema nenhum em usar o bebê se o que queriam era localizar Voldemort a fim de atingir a causa maior em nome da perpetuação da magia, mesmo que a presença daquele serzinho num cativeiro secreto não facilitasse as coisas.

Eu não vou fazer isso - murmurou Rodolfo, enfim. - Não sou um bruxo diplomado para torturar um bebê...

Ela praguejou baixinho, com uma viva vontade de socar o marido. Nem mesmo era ele que estava tendo o trabalho de cuidar do moleque. Logo no momento em que entraram no esconderijo, o primeiro ato de Bartô fora passar a ela, Bellatrix, o bebê e um pacote de fraldas.

Não estou aqui para trocar fraudas de um moleque chorão! - ela exclamara, tentando segurar o bebê esperneando em seus braços.

Está bem, deixe-o gritando por uma frauda limpa. Vamos ver até quando nosso esconderijo vai durar com isso – respondera Rodolfo, rindo de um jeito que a fez se perguntar como um dia concordara em se casar com ele.

Bella se lembrava de ter trocado as fraudas do bebê amaldiçoando mentalmente o marido. Depois disso, também lhe fora passada a responsabilidade pela alimentação de Neville Longbottom. Ela andava o dia inteiro com o pivetinho se arrastando aos seus pés e lhe lançando olhares feios, como se tivesse plena consciência do que estava acontecendo.

Isso a incomodava de tal forma que ela passara todo aquele tempo brigando com Rodolfo e Bartô para que começassem a usá-lo para acabar de uma vez por todas com aquilo. Os Longbottom fariam qualquer coisa quando vissem sua cria redonda e rosada ameaçada.

Colocamos o bebê na soleira de alguma porta e pronto - concluiu Rabastan, empurrando o corpo para trás de modo a ficar estendido na cadeira equilibrada em apenas dois pés.

Bellatrix se largou em outra cadeira, os olhos fixos no chão.

E se mesmo depois disso eles não falarem? - perguntou ela.

Então vamos ter que desistir - falou Rodolfo, com simplicidade.

O que está dizendo? - Bella o mirou muito séria. - Não desistimos, lembra? Vamos fazer tudo para trazer o Mestre de volta!

Rodolfo esboçou um sorriso e resmungou:

Quem nunca desiste são os Lufa-lufas. Diferente de você, eu tenho o hábito de usar meu cérebro para saber quando não vale a pena insistir. Para mim, aqueles ali vão morrer sem dizer nada.

Por que está dizendo isso? - Bellatrix inclinou o corpo sobre a mesa, aproximando o rosto da chama da vela que iluminava aquela reunião com os últimos remanescentes do Movimento Comensal. - Acha que a tortura não é suficiente? Acha que eles vão resistir?

Não - fez Rodolfo, girando a varinha nos dedos com um ar pretensioso. - Eles não sabem de nada, Bella. Insistir nisso vai acabar mandando-os para o St. Mungus. Eu proponho que nos livremos dos três e tentemos outro caminho.

Que outro caminho? Não existe outro caminho! - Crouch se intrometeu na conversa, exaltado.

Que seja - Rodolfo guardou a varinha na capa e mirou Bartô. - Não vou torturar o bebê. Façam o que quiserem, só vou agir com aqueles dois daqui para frente se for para eliminá-los.

Ele empurrou a cadeira para longe da mesa, se ergueu e saiu da sala, a capa preta esvoaçando. Crouch lançou um olhar confuso a Bella, que suspirou longamente antes de seguir atrás de Rodolfo. Do corredor ouviu a risada contida de Rabastan.

Não estava acostumada com aquilo - ser contrariada com argumentos válidos. Geralmente os argumentos lógicos eram dela. Juntou as mãos e deslizou os dedos pela superfície lisa da aliança no dedo anular da mão esquerda. O casamento deles fora simplesmente uma questão de conveniência. E agora já começava a afetar sua forma de agir. Não, aquilo não era nada bom.

Bellatrix encontrou Rodolfo no quarto, junto à janela, com os olhos perdidos na paisagem desolada do quintal da casa que servia de cativeiro para os Longbottom e base para os últimos comensais fiéis a Lord Voldemort. Sim, eram os últimos, os únicos ainda livres que não haviam renunciado a ele.

Estava mesmo falando sério quando disse aquilo? Vai desistir? - perguntou ela, mirando a nuca do marido.

Eu não disse que vou desistir - ele respondeu sem se virar. - É só que... Bella - Rodolfo se voltou para ela e andou rapidamente o caminho entre os dois.

Num movimento rápido, ele a envolveu pala cintura e ficou olhando no fundo de seus olhos negros, como se quisesse ver algo ali dentro além de Lord Voldemort e purificação. Como se quisesse ver a si mesmo ali dentro.

Pare com isso – murmurou ela.

Por quê?

Porque me faz lembrar daquela cara que o Bartô faz quando você fala, com os olhos arregalados, morrendo de medo – respondeu, ao mesmo tempo em que Rodolfo a envolvia com mais firmeza, impossibilitando qualquer tentativa dela de se afastar.

Medo? Por acaso não era você a assustadora?

Acha que eu sou assustadora? – perguntou Bella, segurando o queixo do marido. Era estranho ter com Rodolfo uma conversa tão... matrimonial.

Sim. Na maior parte do tempo – respondeu ele.

Bellatrix soltou um muxoxo de impaciência, mais para disfarçar o incômodo que aquela súbita atitude de Rodolfo lhe provocava que por estar realmente impaciente. Sentiu as mãos dele descerem para sua cintura e a puxarem para mais perto.

Não importava o quanto os dois repetissem que o casamento fora uma farsa para facilitar sua entrada no Reino Unido, era fato que a antiga casa antes ocupada por Elise Malfoy, na periferia de Hogsmeade, tinha quartos suficientes para que cada um ali tivesse o seu, mas Bellatrix e Rodolfo estavam constantemente escapulindo um para o quarto do outro. Após alguns dias, decidiram ficar juntos num quarto de uma vez.

Eu estou sendo assustadora agora? – indagou Bella. Estava colada a ele, as respirações se confundindo.

Rodolfo apenas inclinou o rosto e a beijou. Ela colocou os braços em torno de seu pescoço e deixou que ele a empurrasse em direção à cama enquanto os lábios do marido arrepiavam sua pele. Bella já colocara suas mãos sob as vestes de Rodolfo quando caiu de encontro ao colchão. Não sentia mais o ambiente ao seu redor. Só sentia aquele momento.

Às vezes, quando estavam particularmente inspirados na encenação de casal perfeito, Bellatrix chegava a acreditar que o amava. Gostava de pensar que eram iguais e que, por isso, nada poderia ser mais certo do que serem um do outro. Era um pensamento fugaz, logo afastado, mas que continuava ecoando em sua mente.

Ela não gostava de pensar nisso. Ia contra seus princípios de não ligar para sentimentos. Porque naquele caso não conseguia ignorá-los. Claro, era fácil quando seus corpos tomavam a iniciativa, mas era tudo. E Bellatrix sabia que era isso que incomodava o marido. Rodolfo a amava com a intensidade de quem quer tudo, mas parte dela já pertencia a outro. Pertencia a seu Mestre e a causa. Era a parte dela que ele nunca teria e essa constatação se erguia entre os dois como uma barreira.


N/A.:

Faz taaanto tempo desde que eu escrevi uma N/A aqui que não sei mais o que tinha que dizer o.O Fica só a dedicatória do capítulo: para a Shaula, beta que me convenceu a escrever essa cena final, e para a Jub's, porque você merece por ter sofrido tanto n.n"

Bjos o/

Bel.