Capítulo 21. Jogos políticos
– Elise Malfoy nos deu a pista de onde eles estão em troca da promessa de diminuir sua pena. Nossos agentes já os encontraram – anunciou Crouch para a horda de jornalistas que ocupava o saguão do Ministério da Magia em busca de um pronunciamento acerca da prisão dos seqüestradores dos aurores Alice e Frank Longbottom. – Mas parece que a consciência dela doeu muito e a senhorita Malfoy se suicidou ontem à noite, saltando de uma janela da Ala de Segurança do Hospital St. Mungus para Doenças e Acidentes Mágicos, onde estava internada após resistir à prisão.
A Ministra da Magia Ígnea Cauldwell se mantinha calada ao lado de Crouch, mirando os repórteres e fotógrafos com o olhar entediado. Estava no cargo apenas provisoriamente até que o Conselho dos Bruxos do Reino Unido se reunisse para escolher um Ministro definitivo. Com a nova negativa de Alvo Dumbledore, Bartolomeu Crouch figurava entre os principais candidatos. Com sua violenta ofensiva contra os Comensais, era o preferido da opinião pública.
A um canto do saguão continuamente iluminado por flashes de câmaras fotográficas, Ígnea divisou a figura de Lúcio Malfoy, muito sério, usando vestes negras e segurando ao longo do corpo uma bengala branca com um globo transparente na extremidade. Malfoy estava em liberdade provisória; ele e a esposa eram suspeitos de se aliarem aos Comensais antes da queda de Você-Sabe-Quem. Ainda assim, continuava a agir como se nada tivesse acontecido, visitando o prédio do Ministério com regularidade e cultivando as mesmas alianças com pessoas influentes. Falando sem parar ao seu lado estava Cornélio Fudge, um bruxo franzino cujos cabelos cor de palha começavam a clarear. Fazia gestos urgentes com as mãos.
A Ministra só viria a entender o porquê daquela expressão preocupada de seu assistente alguns dias depois, quando um jornal financiado pelas empresas da família Malfoy levantasse pela primeira vez a hipótese de que Elise não se suicidara, mas teria sido morta pelos agentes do Departamento de Execução das Leis da Magia encarregados de interrogá-la após ser presa, antes mesmo da queda de Voldemort.
Um agente do Departamento de Execução das Leis da Magia se aproximou furtivamente da ministra e lhe passou um pergaminho. Discretamente, ela o desenrolou sobre os joelhos. Era a lista dos bruxos presos em Hogsmeade para ser anunciada à imprensa. Ígnea, no entanto, tratou de amassar rapidamente o pergaminho e esconde-lo na mão fechada. Mais uma crise. Mais uma estava a caminho.
– É bom que a senhorita saiba que foi Igor Karkaroff quem nos deu a dica de que vocês estariam em Hogsmeade – Bellatrix ouviu a voz rouca vinda de algum lugar.
Não sabia de onde. Estava sendo interrogada há tantas horas que seus olhos abertos pareciam ter perdido o contato com o cérebro. Ela via as sombras se moverem na escuridão, mas nada fazia muito sentido.
"Só a dor faz sentido", ela ouvira isso Dele uma vez. Dor para manter a sanidade. Dor para resistir. Com apenas isso em mente, ela passara as últimas horas afundando as unhas nas palmas das mãos. Tinha começado a fazer isso depois que parara de sentir a dor dos dentes cortando os lábios.
– Vamos começar mais uma vez – ela ouviu. – Nome?
– Bellatrix Lestrange – ela falou, sem hesitar.
Os dois agentes que a interrogavam trocaram olhares desconfiados antes de continuarem:
– A senhora não se chama Bellatrix Black?
Ela sentiu seus lábios se contorcerem num sorriso ao responder:
– Não sei de quem está falando.
Instantaneamente, Bellatrix se sentiu empurrada contra uma parede, sua boca foi aberta e ela sentiu uma fisgada quando um líquido tocou seus lábios machucados. Conhecia aquele sabor. Do fundo do abismo onde estava, reconheceu o gosto adocicado da poção Veritasserum e cuspiu, sabendo que pouco adiantava.
Recebeu outro forte empurrão em resposta e riu baixinho. A dor não a assustava ou mesmo incomodava. Ela era sua amiga para resistir. Os que tinham medo da dor jamais poderiam ter servido a Lord Voldemort como ela servira.
Sua risada se tornou mais alta quando as pancadas se repetiram. Sabia que estava irritando-os e isso a fazia se sentir infinitamente bem. Ela não seria uma boa Comensal se não fosse assim.
Sentiu o sangue quente escorrendo pela garganta e traçando arcos rubros de suas narinas até o queixo. Jogou o rosto para trás e ouviu gritos. Logo em seguida, os homens pararam. Mais movimentos e Bellatrix foi deixada na cela sozinha.
Ela riu mais constatando que suas suspeitas estavam corretas. Eles não se atreveriam a matá-la, precisavam de alguém para punir. E Bellatrix sabia que a morte não era punição perto do que estavam reservando para ela.
Azkaban. Dementadores. Todos tinham medo dos dementadores. Até Rodolfo tinha. Mas Bellatrix não teria sido escolhida por Voldemort para receber seus ensinamentos de Artes das Trevas se os dementadores a assustassem. Seu riso se transformou numa gargalhada insana ao pensar que, assim que seu mestre se reerguesse, os dementadores mudariam de lado novamente e ela estaria livre.
Uma luz ofuscante invadiu a cela e ela viu uma bruxa em vestes brancas entrando com uma maleta. Talvez fosse algum tipo de especialista em feitiços de tortura, ela pensou. Mas o que a bruxa fez não foi nem de longe torturá-la.
Ela abriu a maleta e retirou a varinha e alguma bandagem. Começou a limpar os hematomas do rosto de Bellatrix com água fria conjurada da ponta da varinha, proferindo feitiços de cura logo em seguida.
Ao perceber isso, a prisioneira se agitou e, com uma energia que ela não julgava ainda possuir, se pôs de pé e empurrou a medibruxa. Por mais que a mulher tentasse continuar seu trabalho, Bellatrix a impediu tapando o rosto com as mãos, até que a bruxa desistiu e saiu.
Os interrogadores voltaram e as perguntas recomeçaram.
"Você se casou com Rodolfo Lestrange?", "Você e Lestrange estiveram com Alice e Frank Longbottom?", "Qual era a sua ligação com Você-Sabe-Quem?", perguntas e mais perguntas.
Bellatrix apenas maneava com a cabeça e, semiconsciente, respondia:
– Não tenho nada a dizer.
Ao que eles finalmente pareceram desistir e lhe estenderam o depoimento para que assinasse, ela apenas cruzou os braços e falou, com um sorriso insano dançando nos lábios:
– Vocês sabem que tudo isso é uma palhaçada. O Lorde das Trevas vai voltar, e é bom todos saberem disso.
– Monique Seleheim, Janice Weser, Marjory Berkley, Ana Vronsky, Joanne Sinek ou Bellatrix Lestrange, como ela insiste em se identificar, é na verdade Bellatrix Black, 22 anos, inglesa, partidária de Você-Sabe-Quem há pelo menos quatro anos – anunciou Fudge, num tom de pretensiosa vitória aos jornalistas. Posava para as câmeras, encenando um cumprimento a Alastor Moody pela prisão dos últimos Comensais livres.
– Há evidências de que a senhorita Black mantinha contato com o primo? – indagou uma repórter de volumosos cabelos castanhos e dentes que se projetavam para frente.
– Achamos que ela se envolveu com os Comensais da Morte levada por Sirius Black, preso em primeiro de novembro por associação com partidários das trevas, traição e pelo assassinato de Pedro Pettigrew. Temos evidências de que Bellatrix Black foi responsável pela morte de Ernest Brown. Era conhecida pelos nossos agentes como assassina altamente eficiente, além de ter se dedicado à espionagem. Há suspeitas de que tenha servido de ligação entre Você-Sabe-Quem e seus simpatizantes na Alemanha, Romênia e Bulgária.
Os detalhes sobre o passado de Bellatrix foram expostos naquela tarde de entrevistas, enquanto a jovem era interrogada no Departamento de Mistérios. Fora dali, contrariando o que Fudge afirmava, a perseguição continuava, maior e mais violenta do que nunca.
A notícia da prisão de quatro Comensais acusados de torturar o casal Longbottom até a insanidade nem havia tido tempo de esfriar quando os jornais, impulsionados por toda a influência que o sobrenome Malfoy ainda tinha, começaram a efetivamente cobrar explicações sobre o suicídio de Elise Malfoy. Apontavam como indício da farsa uma entrevista do próprio Crouch, dada dias após a prisão da jovem, afirmando que o depoimento de Elise Malfoy nada acrescentara às investigações.
Depois da prisão de Bellatrix Black, Rodolfo Lestrange, Bartolomeu Crouch Jr. e Rabastan Lestrange em Hogsmeade, ficou bem claro que Elise não tinha mesmo como saber onde eles estavam. Rabastan afirmou que seu irmão e sua suposta cunhada – já que o Ministério insistia em colocar em dúvida o casamento dos dois – eram os líderes do grupo de seqüestradores e só haviam retornado à Inglaterra dias depois de Elise ser presa. O Ministério, por outro lado, se recusava a admitir outra fonte que pudesse ter indicado Hogsmeade como possível esconderijo do grupo, sem querer trazer à público suas íntimas relações com o Ministério da Magia alemão, que acabara de enviar Karkaroff à Inglaterra em vez de deportá-lo para seu país natal.
A questão em pauta era: se Elise se mantivera calada, de onde viria o tal "arrependimento" que Crouch afirmava tê-la levado a dar cabo da própria vida? A própria imagem do chefe do Departamento de Execução das Leis da Magia já estava seriamente desgastada a essa altura, pois mesmo os jornais francamente a favor do Ministério eram obrigados a chamar a atenção para o fato de que o filho de Crouch fora preso na companhia dos torturadores do casal Longbottom.
Poucas semanas após a prisão dos últimos Comensais, o que era apenas uma questão mal explicada tomara a proporção de uma verdadeira crise quando se começou a fazer perguntas sobre a suposta forma como Elise Malfoy morrera. Porque ninguém jamais ouvira falar de um bruxo adulto ter morrido por causa de uma queda de dois pavimentos. Talvez, se estivesse inconsciente e tivesse batido com a cabeça – mas o medibruxo legista indicara como causa da morte múltiplas lesões dos órgãos internos, típicas de pessoas que haviam sido submetidas a longas seções de tortura.
A comissão de políticos influentes que se unira em torno de Lúcio Malfoy só terminou por se desmobilizar em meados de dezembro, segundo seus membros, porque Cornélio Fudge lhes apresentara provas plausíveis de que o Ministério nada tinha a ver com o caso, responsabilizando apenas o Departamento de Execução das Leis da Magia e, em especial, seu chefe, por não ter dado a devida assistência à prisioneira. O inquérito que pretendiam instaurar para forçar o Ministério a apurar a verdadeira causa da morte de Elise não foi sequer iniciado, mas a imagem de Bartolomeu Crouch já estava completamente destroçada.
Num último esforço para limpar sua honra, Crouch anunciou que entregaria o cargo, mas só depois que terminassem os julgamentos dos supostos Comensais presos. No início do mês de janeiro de 1982, restavam apenas os seqüestradores do casal Longbottom para serem levados a júri e o chefe do Departamento de Execução das Leis da Magia estava decidido a fazer daquilo uma lição para os que o acusavam de tentar obstruir as investigações para inocentar o filho. O próprio Crouch examinou cada pergaminho tirado da casa em Hogsmeade e, junto com Moody, usaram as novas informações para preencher os espaços obscuros do quebra-cabeça que estavam montando desde a prisão de Comensais da Morte na Alemanha. Foi quando começaram a surgir os elementos que condenariam Bellatrix, Rodolfo e Rabastan à pena perpétua em Azkaban – uma série de cartas trocadas na segunda metade do ano de 1980, que mais tarde constituiu o que se convencionou chamar de Tribunal Verde e Prata.
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Respondendo a comentários:
Lily Dragon: Não, a fic não acabou ainda, tem mais 2 capítulos n.n"
Certo, as margaridas talvez tenham sido exagero, mas pode ter certeza que eu vou pensar nisso (bem, eu gosto de escrever massacres...) Espero que tenha aproveitado a viagem o/
Ju (que fez seu comentario via msn): Bem, talvez o fato de eles não terem tido mais tem juntos tenha contribuido pra que não matassem um ao outro XD. Porque eles não são lá muito moderados em suas reações n.n' Eu também acho que eles teriam conseguido pelo menos causar um grande prejuízo se não tivessem sido pegos de surpresa! E é bem típico do Rabastan se dar mal por ser intrometido o/
Essa cena da prisão foi uma das que eu mais gostei de escrevere, foi também a cena que me fez juntar a Olga e a Bella dentro da minha cabeça e tirar daí a inspiração para escrever Olhos Sombrios.
E obrigada por ler, gostar e se indignar com as minhas fics n.n'
bjos o/
Bel.
