Parte 02

Uma carta brilha no fundo de um corredor muito vazio e escuro. Todas as outras cartas estão lá, ele sabe. Ele sente. Estão todas contorcidas, disformes. No fundo, a carta Vácuo traz Sakura nos braços, e um símbolo em seu peito. Um símbolo estranho, com asas e um coração negro... Ele ouve o murmurar indefinível de Vácuo... E todas as cartas também cantam... O corredor gira... Então ele ouve o murmurar de Sakura, à sua frente, com a Espada em punho, o ferindo meio ao peito. Tudo escurece, os sons cessam.
Apenas o triste murmurar de Sakura permanece.

oOo

"A carta Vácuo." - diz Sayoran, certo de seu sonho ser a chave desse novo mistério.
"Não, dessa vez não."
Yue se senta sob a cerejeira do jardim de Yukito. Meiling observa sua figura, ainda mais magnífica assim tão de perto.
"Não pode ser, Yue! Eu vi!"
"Sim, Sayoran. Mas a carta que fugiu não foi essa, mas Amor."
"A carta que Sakura..."
"Fez por você, sim, Sayoran."
Sayoran estremece. Então, por que sonhava sempre com Vácuo? O que ela queria lhe dizer? Ele rodeia os olhos no lugar, a casa dos avós de Yukito. Sakura ficava toda vermelha ao simples ouvir daquele nome. Ela era feliz com seus sonhos com aquele rapaz gentil e atencioso. Por que ele tinha que mudar tudo? Por que ele tinha que ter dito que a amava, para só faze-la sofrer? Sentiu seu coração se enchia de raiva, culpa, remorso.
"Eu acho que só o Sayoran pode ajudar a Sakura agora, não é?" - Meiling segura a mão de Sayoran, olhando para Yue que acena com a cabeça positivamente.

oOo

"Bom dia, minha filha. Já é muito tarde para o café da manhã! Você não quer esperar pelo almoço?"
"Monstrengas dormem muito mesmo!" – implica Toya.
"Estou sem fome."
Sakura caminha até a sala, se derramando no sofá como se ela vestisse nada além de um corpo vazio. Toya e o pai entreolham-se, espantados. O briguento irmão vai até ela, mas pára no meio do caminho. Ele nota a presença de Kero, na escada, com um olhar desesperado para a menina.
"Aconteceu o que eu vi, não foi?"
Kero se volta espantado para Toya. Como ele pôde recuperar seus poderes? E em tão pouco tempo? Ele se limita a afirmar. O telefone toca. É Yukito, contando sobre a chegada de Sayoran e Meiling. Toya olha Sakura, jogada no sofá, o olhar tão perdido e sem brilho. Ele sente um arrepio frio muito forte lhe correr todo o corpo.
"Yuki... A minha mãe."
Nesse momento, Toya perde a fala ao telefone.
"Toya, o que houve? Toya?"
O rapaz vê a imagem de Nadesiko, ao lado de Sakura, a acariciar seus cabelos sem que essa se dê a menor conta. Ela olha Toya, os olhos suplícios e tristes, como nunca antes.
"Ah... Toya... por favor."
E repentina como apareceu, ela desaparece. Seus poderes estavam fracos ainda.
"Toya? O que foi?"
"Ela se foi, Yukito. Ela se foi..."

oOo

Sayoran, a Tomoyo ligou, quer que a gente vá à loja de Bonecos mais à tarde... Sayoran?
Sayoran está paralisado, ao lado da janela. Do lado de fora, um violinista de rua toca Lacrimosa, de Bethoven. Ele reconhece o murmúrio da melodia como o das cartas no sonho. Era uma canção muito triste, vazia... Como se o violinista tivesse perdido sua alma nas cordas, deslizando em cada nota, morrendo em cada acorde agressivo.
"Meiling, o que você acha que aconteceria se uma carta ligada a Sakura morresse? Acha que ela poderia se ferir?"
"Eu não sei, Sayoran."
"Meiling... Você está tremendo?" – diz o chinês, se virando para sua prima, aflito. – "O que houve?"
"Quando a carta se foi..."
"Diz Meiling!"
"Você precisa ver o que restou da Sakura." – ela sussurra, seus olhos não podendo fitar a expressão do primo.
Meiling ainda estremece com os relatos de Tomoyo. Ela conta tudo a Sayoran, que mal ouve, em se perder a todos os instantes nos acordes suicidas de Lacrimosa.